O Verão de 2004 foi o período mais triste da democracia portuguesa. Durão pirava-se do Governo e do País, deixando o seu nome pelo chão, Barroso. Manuela Ferreira era Leite azedo para o PSD, amargo que levou à doidivanas promoção de Santana flopes. A cassete de Carvalhas tinha a fita gasta. Portas fechavam-se no CDS à inteligência e à relevância. No PS, Ferro era dobrado e enfiado na Pia. Todos esperavam o regresso Vitorino do António, mas ele não tinha verga para salvar o navio. E Sampaio concordou com o naufrágio, oferecendo-nos o pior Governo pós-Invasões Francesas de que se conservam actas; o qual ainda conseguiu o miraculoso feito de ter durado 5 meses – mas não se sabe como, tantas eram as histórias inacreditáveis, difundidas pelo próprio círculo tribal de Santana, exultando com a pulsão estroina do pantomineiro. Nesse período, Sócrates assumiu o destino que há muito era evidente ser seu. Para nossa felicidade.
Antes, já tínhamos assistido a várias debandadas que confirmavam o diagnóstico: a Revolução dos Cravos continuava encravada. Sá Carneiro foi imolado não se sabe ainda hoje porquê. Com Soares, o Poder queria-se oligarca, hippiecrisia instalada, social-cinismo. O Bochechas era popular, era a bifana e o coirato, mas também a pataca Moderna, o tio da América, as amizades inflacionadas. A leste dos acontecimentos, o monolítico Eanes fazia renovações de 360 graus, tendo existido apenas para levar Anibal à 1ª maioria absoluta. E absoluto foi o deserto cultural e cívico do cavaquismo, o império dos patos bravos e dos bravos que nos comiam por patos. Cavaco permitiu que a máquina salazarista voltasse a funcionar em pleno, agora à custa de novos colonizados: nós, pela Europa. Depois, embuchado por não conseguir mastigar o cavaquistão, arrotou o partido. Queria um emprego com menos reuniões e colegas de melhor higiene ética, mas onde se continuasse a viajar pelo Mundo em grupos animados. Conseguiu-o após uma década de espera, deixando Guterres ser o bálsamo que a Nação esfregou, sôfrega e calada, nos cartões de crédito. Sete anos depois, apaixonadamente educados na arte de tudo gastar, o consumismo médio da classe baixa era alto demais – e o seu peso abriu um pântano na coragem do simpático engenheiro. Trocava-se de funâmbulo: saía um ordinário, entrava um mauista.