Aviso aos pacientes: este blogue é antianalgésico, pirético e inflamatório. Em caso de agravamento dos sintomas, escreva aos enfermeiros de plantão.
Apenas para administração interna; o fabricante não se responsabiliza por usos incorrectos deste fármaco.

Trump cumpre

Trump e Melania lançaram cada um a sua criptomoeda dias antes da posse presidencial. Se formos à rua perguntar a quem passa que bicharoco é esse, mesmo aqueles que expliquem correctamente o conceito não fazem ideia do que realmente explica o seu valor. Porque se até em actividades tão regulamentadas e controladas como a banca e bolsa há demasiada complexidade a impossibilitar que seja plenamente apreendida por mecanismos de transparência, num Oeste selvagem como o do mercado das criptomoedas essa impossibilidade multiplica-se a si mesma – visto que, apesar de serem baseadas numa tecnologia transparente (blockchain), são frequentemente associadas a atividades ilícitas devido ao anonimato que proporcionam. A facilidade de transferência de valores através de fronteiras sem a necessidade de instituições financeiras tradicionais pode tornar o suborno mais acessível e menos rastreável, para além de permitir financiar terrorismo e tráfegos de droga, armas e seres humanos.

O lançamento destas moedas em cima da cerimónia de inauguração para o segundo e último mandato de Trump na Casa Branca é uma exploração comercial a outrage do cargo presidencial e das instituições democráticas dos EUA. Trata-se de um convite aberto à corrupção, pois cada um deles detém de 80% para cima das unidades de cada moeda. O valor vai depender da oferta e da procura, mas também de decisões do próprio Trump que afectem o mercado das criptomoedas. Por cima disto, ele (portanto, também a sua mulher) terá acesso a informação privilegiada sobre a evolução e peripécias desse mercado que lhes permitirão tomarem decisões estratégicas para fazerem transações lucrativas e evitarem potenciais perdas. Finalmente, os próprios podem inflacionar fraudatoriamente o valor das suas moedas.

Trump prometeu ir secar o pântano da corrupção em Washington. Com esta operação críptica, atinge plenamente esse objectivo. É que deixa de ser necessário ir a Washington corromper este e aquele. Basta um telemóvel, em qualquer parte do mundo, e começar a comprar $TRUMP. Retorno garantido.

“I’m not a monster, I’m just ahead of the curve.”

Ninguém sabe o que Trump irá fazer nos meses e anos que durar o seu poder na Casa Branca. Não se sabe não apenas no sentido geral de se desconhecer o futuro, seja de quem for, mas especialmente por Trump poder contradizer-se imparavelmente ao longo dos 4 anos sem que sinta qualquer embaraço, remorso, perturbação. Ao contrário, ele acha-se superior por ostentar uma absoluta ausência de reservas morais em ser imoral. Afinal, são essas as regras do mundo do crime, onde ele fez fortuna e fama.

A democracia americana quis dar o poder máximo a um criminoso que fez campanha gabando-se de ser criminoso e de ir perdoar outros criminosos caso ganhasse. A culpa não é da democracia. Nem dos americanos. É do Joker.

Revolution through evolution

Parental favoritism isn’t a myth
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Ancient genomes reveal an Iron Age society centred on women
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Researchers identify three psychological profiles that could determine the evolution of mental, cognitive and brain health in aging
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Aerobic exercise: a powerful ally in the fight against Alzheimer’s
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Morning Cup of Joe Linked to Better Health
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Cavity-nesting birds decorate with snake skin to deter predators
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Will Users Fall in Love with ChatGPT? A Perspective From the Triangular Theory of Love
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Dominguice

A quântica não atina com a gravidade. Ou talvez ao contrário. Ou ambas. Ambas: a precisão fatal, a fatal imprecisão. Que daria essa mistura, calhando existir um universo feito dessa radical diferença? O nosso, pois. O que leva a concluir sermos também exactamente assim, mistura inevitável de precisão com imprecisão. Porque só com as duas se pode viver. Ser vida.

Resta a questão: o que é a sageza? Não a ignorância que se julga conhecimento, antes o conhecimento que se encanta na ignorância.

Leram primeiro no Aspirina B

Adorava que fosse Augusto Santos Silva a suceder aos 20 anos trágicos (15, descontando o primeiro mandato de Marcelo) que conspurcaram a Presidência da República por actos e omissões de duas das mais gradas figuras da direita. O contraste não poderia ser maior. Porém, ele não é um bom candidato. E isso mesmo admitiu ontem ao lançar António Vitorino, aproveitando para expor Seguro como o vácuo em expansão que é. Acontece que Vitorino é um bom candidato, pelas razões listadas, mas não é um candidato forte. Ele passou ao lado da luta pelo poder no PS e isso selou o seu destino como segunda figura, como funcionário. Não é líder.

Quanto a mulheres, especulando sem relação com a vontade das próprias que o mais certo é ser inexistente, Maria de Lurdes Rodrigues igualmente seria uma sucessora à altura da missão de voltar a dignificar e credibilizar a função presidencial. Contudo, ela é ainda mais fraca como candidata do que Santos Silva, por razões óbvias que não justificam gasto do teclado. Mariana Vieira da Silva idem quanto à capacidade presidencial, mas é nova demais e o currículo político também não está maduro. Francisca Van Dunem igualmente conseguiria restituir patriotismo e dignidade ao Palácio de Belém, mas não conseguiria ser eleita por causa do racismo e misoginia ocultos e calados. Marta Temido não tem ainda perfil presidencial, poderá nunca o vir a ter. Não vejo mais ninguém.

Pelo que vou avançar com um cidadão que nem sequer aparece nas sondagens: José Luís Carneiro. Tratava-se de uma figura para mim desconhecida quanto ao seu perfil até à recente campanha para secretário-geral do PS. Sabendo dele só o que aparecia na comunicação social, nada dele sabia. Era apenas mais um nome, um quadro do PS. A mesma experiência tive com o Pedro Silva Pereira, que para minha grande surpresa se revelou um talento excelente na política nacional. E ainda com Paulo Campos, pelo que mostrou de alta tarimba política sempre que enfrentou os caluniadores encartados a propósitos das PPP.

Carneiro teve um resultado muito acima das expectativas, ele que foi dado como um mero e triste figurante na procissão triunfal de Pedro Nuno Santos até ao trono. Aposto que tal se deveu a características que nestas eleições presidenciais poderiam ser decisivas. Recordemos o que está em jogo: temos a decadência do regime representada por Marques Mendes, temos um projecto conservador que tentará puxar o regime para um semipresidencialismo com laivos de sidonismo representado por Gouveia e Melo, e depois temos uma inanidade ambulante de nome Seguro que quer engolir o PS. Neste contexto, Carneiro seria o representante da visão semiparlamentar do regime, oferecendo todas as garantias de cumprir com sentido de Estado as suas responsabilidades presidenciais. Tendo 53 anos (um miúdo), o fenótipo adequa-se na perfeição a recepções a outros chefes de Estado e viagens ao estrangeiro. E porque é que ele ganharia as eleições? Porque é simpático. Quanto mais exposição tiver, mais gente gostará dele, mais razões se descobrirão para estabelecer laços afectivos com a sua personalidade.

Não tendo este pardieiro os meios para lançar uma vaga de fundo com o seu nome, aqui fica um salpico à superfície.

Terá Montenegro reconduzido no cargo de director da PJ um perigoso extremista?

Luís Neves, actual director da Polícia Judiciária, recentemente reconduzido no cargo pelo Governo, desmentiu hoje, categoricamente, a teoria de que há uma relação entre a imigração e o aumento da criminalidade, em Portugal. Num universo de mais de 10 mil reclusos, apenas 120 são estrangeiros. Vivem, neste momento, mais de um milhão de imigrantes no nosso País.

O que levanta uma dúvida, onde é que o Governo obtém os números da criminalidade? Nas redes sociais do partido daquele senhor que hoje apareceu disfarçado de comandante da TAP? Aparentemente, nos dados das autoridades é que não é.

Cofinados – V

«The ideal subject of totalitarian rule is not the convinced Nazi or the convinced Communist, but people for whom the distinction between fact and fiction, true and false, no longer exists»


 

Hannah Arendt

 

Em 1977, três psicólogos — Lynn Hasher, David Goldstein e Thomas Toppino — publicaram um estudo onde se descobriu que a repetição de uma informação leva a que aumente a probabilidade de ser considerada verdadeira, independentemente da sua factualidade ou justificação. Consagrava-se, na literatura científica, o conceito de “efeito de ilusão de verdade”, onde a exposição a uma dada informação cria familiaridade com a mesma e, acto contínuo, confiança na sua plausibilidade. É a lógica dos fenómenos de aculturação e propaganda, por exemplo, e opera em conexão com outros processos cognitivos e sociais que reforçam o seu efeito, como o viés de confirmação e o efeito manada, entre muitos outros. Ou seja, somos animais sociais e temos pavor genético ao ostracismo, pelo que, desde a mais tenra infância, procuramos estar em sintonia constante com a identidade dos grupos a que pertencemos. A cognição serve os interesses da genitália, estes o da reprodução, para citar um bacano cujo nome me escapa e largar uma caricatura. Pertencer a minorias, ainda mais ser rebelde, tem custos que podem ser muito elevados e até fatais. Isto é do conhecimento comum, todos concordam. Saltemos para a Portela.

Podemos imaginar que num universo paralelo, bué parecido com este, existe um José Sócrates que, num 21 de Novembro lá deles, à noitinha, aterrou numa Lisboa em tudo igual à nossa. Mas com esta diferença: não teve elementos da Judiciária à sua espera. Pelo que pôde ir para casa, sem cobertura mediática, e no dia seguinte foi apresentar-se no Ministério Público para prestar declarações, ainda sem notícia de tal na comunicação social. Podemos continuar a imaginar que ao longo desse dia chegava ao conhecimento público que Sócrates estava a ser interrogado, embora não se soubesse porquê. Depois, posto que tinha ido voluntariamente colaborar com as autoridades, o juiz paralelo considerava não haver perigo de fuga, nem razão para prisão preventiva. Podia sair em liberdade, e um senhor com um notável bigode viria explicar quais eram as suspeitas na berlinda, e que o caso iria ser investigado de forma rápida e implacável dada a importância social e política do mesmo. Por sua vez, o advogado paralelo de Sócrates apresentaria a versão do seu cliente e manifestava confiança na Justiça. Neste outro universo, a opinião pública continuaria a ficar chocada, uns, e em êxtase, os restantes. Mas não teria sido feito um julgamento instantâneo nos meios de comunicação social ao serviço dos procuradores e da PGR, nem se teria instigado um linchamento de rua febril.

No nosso universo houve a decisão de politizar o caso desde o início. Essa decisão reunia os interesses dos procuradores da Operação Marquês, os interesses de Joana Marques Vidal, os interesses de Paula Teixeira da Cruz, os interesses de Passos Coelho, os interesses de Cavaco Silva e os interesses do Alex, uma juliana pérfida ocupando o topo da hierarquia do Estado em sinergia. Por isso foi montado um espectáculo inaudito na sociedade portuguesa, onde se convocaram os jornalistas para encherem o País com as imagens da detenção humilhante de quem entrava em Portugal, não de quem tentava sair. Ao mesmo tempo, muniram esses mesmos jornalistas de balelas dadas como verdades blindadas pela autoridade do Ministério Público. A intenção foi a de anular qualquer vestígio de presunção de inocência, apresentando a detenção e posterior prisão como o resultado inevitável das provas já recolhidas pelas autoridades numa extensa e profunda investigação. A cobertura mediática que se seguiu, com o editorialismo a colocar a carne toda no assador da agenda política em andamento, instituiu cognitiva e sociologicamente ser impossível que Sócrates não fosse culpado de crimes de corrupção. As dinâmicas do ódio político e do ressentimento popular, o populismo larvar desde 2008 a ser alimentado pelo PSD e Cavaco, geraram um frenesim selvático que também era politicamente desejado como factor de pressão sobre os eventuais juízes que viessem a lidar com as acções da defesa de Sócrates.

A coisa podia ainda ficar pior para o ex-primeiro-ministro? Podia e ficou. A dimensão de responsabilização moral do caso é incontornável, mesmo na hipótese de não existir crime de corrupção, tendo provocado danos graves a terceiros com protagonismo e influência na sociedade portuguesa, assim como exigiu de António Costa uma resposta que protegesse o Partido Socialista nessa situação de original e altíssimo risco eleitoral totalmente imprevisível quanto ao seu desfecho. Isso, juntamente com a avassaladora operação política e mediática em curso, impediu que na área socialista se conseguisse separar o que era moral do que era judicial, na prática levando a uma cumplicidade com os abusos e crimes na Justiça e com o linchamento mediático sistemático. Sim, Sócrates teve um punhado de visitas em Évora, houve amigos que não o abandonaram, e até Soares exibiu um último fogacho como animal político. Mas Costa ao lá ir e lavar as mãos selou o divórcio do PS, e mais ninguém quis arriscar ficar contaminado por uma pessoa que, mesmo que viesse daí a anos a ser dada como inocente, entretanto não merecia apostas às cegas nem sacrifícios temerários. A cicuta tinha de ser tragada até à última gota.

10 anos já se foram. Sócrates continua a reclamar-se inocente, o editorialismo converteu-se à necessidade de se castigar o diabo mesmo que não haja corrupção, os caluniadores profissionais continuam a explorar o filão, e a Justiça está afundada em incompetências e crimes que o regime aceita e não tenciona sanear. Não admira, e deve-se ter compaixão, que o cidadão comum repita calúnias e não tenha nem literacia nem motivação para entender o que está realmente em causa na Operação Marquês. Que é isto: se não há provas de corrupção, se nunca existiram, se prenderam para investigar, se gastaram milhões de euros a vasculhar tudo o que puderam apanhar na devassa da privacidade dos arguidos, então o que está realmente em julgamento na Operação Marquês, neste tempo em que o poder é supremo na esfera da Justiça, é o Estado de direito democrático.

A condenação do jornal Correio da Manhã e cinco jornalistas pela violência com que atacaram a jornalista Fernanda Câncio faz parte desta história. A espiral do silêncio deixou-a abandonada quando as calúnias se abateram sobre ela, e depois quando foi ela a abater os caluniadores. E se não admira que vedetas hipócritas e soberbas do comentariado como Ana Gomes e Pacheco Pereira, os quais se vendem como reserva moral da Nação, tivessem omitido nas suas prédicas a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, já constatar a mesma ausência de referência, perante as suas audiências televisivas, em figuras como Daniel Oliveira, Pedro Marques Lopes e, especialmente, Paulo Pedroso, foi para mim descoroçoante. É que dos directores de jornais e estações de TV, assim como dos dirigentes partidários, nada há a esperar quanto à defesa ideológica e ética da cidade. Pelo que tal papel está entregue a raríssimos protagonistas no espaço público. Se nem eles ousam cumprir-se na parrésia de se colocarem ao lado da vítima dos poderosíssimos algozes, para não serem pintados como “defensores de Sócrates” pela pulharia, isso é mais uma evidência do triunfo obtido por quem fez da Operação Marquês um julgamento de excepção.

Castanhas

O Diário de Notícias entrou em Janeiro com uma nova configuração da edição digital. Não sei qual a conexão dessa alteração com a celebração dos 160 anos do jornal, provavelmente nenhuma, mas a efeméride redondinha liga-se incautamente a uma enigmática decisão tomada pelos donos do jornal: deixaram de destacar na página os artigos de opinião. Quem quiser ler esses autores, tem de ir à barra superior, entrar e depois escolher sem qualquer destaque editorial. Anteriormente, como em todos os outros meios e desde sempre, os artigos de opinião mais recentes estavam presentes logo abaixo dos destaques do dia. O mundo continua a girar, mas que terá levado à duvidosa inovação?

Tenho uma hipótese explicativa: os actuais donos do DN querem agradar ao Montenegro, e passaram a ver nas opiniões publicadas o rosto feroz do extremismo. Os tempos parecem, assim, propícios aos “moderados” que se calam e deixam passar as camisas castanhas.

Cofinados – IV

«What can be asserted without evidence can also be dismissed without evidence.»


 

Christopher Hitchens

 

Se José Sócrates cometeu crimes de corrupção, como primeiro-ministro, onde estão as provas? Onde estão nas 4000 páginas de despacho acusatório, 53 000 de investigação, 77 000 de documentação anexa, 8 000 de transcrições de escutas telefónicas, 13,5 milhões de ficheiros informáticos, 103 horas de vídeos de interrogatórios e 322 de depoimentos áudio de testemunhas? E se isto parece muito, se parece bastante, acrescentemos ainda esse pormenor de, como primeiro-ministro, Sócrates já ter os seus dias intensamente expostos às mais variadas testemunhas dos próximos no Governo e no partido, mais os ocasionais na sua preenchidíssima agenda, mais os jornalistas, mais os populares. Donde, a tal corrupção no valor de 30 milhões, com a sua extraordinária logística executiva e bancária, talvez tenha sido organizada por ele e cúmplices com recurso exclusivo à telepatia. Sem o perigo de gerar registos para autoridade ver, ainda por cima à borla e não carecendo de bateria.

É uma hipótese. A de não existir sequer uma singular prova de corrupção. A ser assim, tal não faria prova de não ter realmente existido corrupção, óbvio, pois sabe-se lá. Até Deus se desiludiu, não só com Adão mas também com um terço de todos os anjos que existiam quando Lúcifer teve o seu amok, palavra da Bíblia. O que leva a pensar que Deus não é grande espingarda como criador, por um lado, e que algo parecido nos pode acontecer a todos, por outro. Contudo, a não existência de provas teria uma interessante consequência: o tribunal ficaria tentado a inocentar Sócrates ou, ao invés, a inventar uma condenação. Que também o pode fazer, querendo.

A condenação do jornal Correio da Manhã e cinco jornalistas pelo Tribunal da Relação de Lisboa a indemnizar a jornalista Fernanda Câncio num montante agregado a rondar os 25 mil euros, por danos causados pela publicação de notícias que atentaram contra o seu bom nome e honra, alimenta a suspeita de não se encontrar no processo matéria para satisfazer a máquina sensacionalista insaciável da Cofina. Porque é simples. Na noite da detenção de Sócrates no aeroporto, talvez até bem antes, algum criminoso no Ministério Público entregou a jornalistas a primeira versão do que viria a ser a acusação. Em Novembro de 2014, apostavam tudo no Grupo Lena, pelo que saiu essa versão na imprensa logo no dia seguinte. Depois essa historieta caiu e vieram outras, e outras. Se alguma delas se aguentasse, porventura a Cofina precisaria de publicar mentiras, inventar à descarada?

Os factos suscitam várias conjecturas. Talvez a Cofina quisesse perseguir Fernanda Câncio por ódio, inveja, vingança de algum dos seus chefes, e bute com calúnias para cima dela. Talvez a Cofina quisesse atacar Fernanda Câncio por ela ser um alvo político disponível dada a sua relação pessoal com Sócrates ao tempo, e bute com calúnias para cima dela. Ou talvez a estratégia e cultura da Cofina seja a de explorar a ignorância, misoginia e miséria moral da sua audiência sempre que pode, e a jornalista surgia como presa indefesa, donde bute com calúnias para cima dela. Vou gastar os 10 euros que tenho no bolso para marcar uma tripla nisto.

Neste caso, provou-se a ausência de escrúpulos, decência, respeito pelos privilégios constitucionais dados ao jornalismo para o ser. Trata-se de um caso isolado, um insólito pedaço de merda nos anais da Cofina, um azar do caraças a envolver cinco abnegados jornalistas, mandados e mandantes? Pois, pá.

Revolution through evolution

Researchers find betrayal doesn’t necessarily make someone less trustworthy if we benefit
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Walking just 5 minutes a day makes a difference
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Feeding your good gut bacteria through fiber in diet may boost body against infections
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Is there really a mid-career crisis? Job satisfaction follows a U-shaped curve only among highly skilled workers, according to new study
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Using robots in nursing homes linked to higher employee retention, better patient care
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Electrohydraulic wearable devices create unprecedented haptic sensations
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Words activate hidden brain processes that shape emotions, decisions, and behavior
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Dominguice

O funeral de Carter originou uma situação fascinante, cuja causa principal radica na ausência de Michelle Obama. Como ela não esteve presente na Catedral Nacional de Washington, o protocolo sentou Trump e Obama ombro com ombro. De imediato, Trump começou a conversar com o tal fulano que espalhou não ter nascido nos EUA. As imagens mostram um Trump inclinado para Obama, e um Obama exemplarmente composto, respondendo sem olhar para Trump nem ter a mínima inclinação do tronco na sua direcção. Mas o que surpreendeu tudo e todos foi o registo descontraído, sorridente, risonho que o diálogo ia gerando. Um outro elemento de surpresa fascinante veio através de Harris, que não resistiu a olhar para os dois na palheta atrás de si (portanto, ouvia-os) e que perdeu as defesas emocionais ao se deixar apanhar com um esgar de profunda aversão na sequência — o qual, na minha interpretação, veio de ela achar indecente a falta de decoro que os dois estavam a manifestar, comportando-se como se estivessem num café. Também parte saborosa desta incrível reunião de soberanos norte-americanos foi a pancada na barriga que Bush dá a Obama quando foi sentar-se, sinal de intimidade, e o olhar esgazeado de Trump para Harris quando esta chegou. Ele estava desesperado por um olhar dela, o qual não obteve para seu visível desgosto. Após a cerimónia, respondendo a jornalistas, Trump exibiu-se como o narcisista megalómano que é. Parecia feliz da vida por Obama ter dado sinais de que gostava dele. Estava-lhe tão penhorado que até largou um alucinado “We have a little different philosophies”, de repente fantasiando que eram politicamente parecidos. É esta a insaciável carência de um ego frágil, sempre à procura de atenção e validação, condenado à maldição de Tântalo. Obama não disse nada publicamente sobre a conversa entre os dois.

O fascínio deste momento veio de estas pessoas se terem comportado como pessoas que são, não como actores nos palcos do poder supremo. Precisamos de nos lembrar mais vezes disso, pois tal convida à participação política.

Vamos lá a saber

Quando Trump ameaça anexar o Canadá e tomar pela força militar a Gronelândia e o Canal do Panamá, está apenas na desbunda a captar tempo de antena ou está realmente a testar os limites do que considera ser um segundo mandato com poder absoluto?

Cofinados – III

«Injustice anywhere is a threat to justice everywhere.»


 

Martin Luther King Jr.

 

Uma das perversões de se nascer em liberdade é a de não se saber o que é uma ditadura, uma tirania. Mas pode-se levar a inteligência para uma aproximação ao que está em causa nesses regimes não democráticos expondo a sua conexão com a liberdade de expressão e liberdade de imprensa: não as permitem, são das primeiras liberdades a serem anuladas. Na Rússia, China, Arábia Saudita, Cuba, Irão, Coreia do Norte, por exemplo, são miragens.

Nos países onde o liberalismo filosófico molda as constituições, como Portugal, pressupõe-se que a democracia é o melhor sistema político para o maior número de cidadãos. Por inerência, pretende-se que esses cidadãos exerçam a sua cidadania da melhor forma possível para se cumprir o ideal democrático. Tal implica ter cidadãos educados e informados, de forma a que as suas decisões, da intervenção pública ao voto ou ao exercício de cargos políticos, possam ser autónomas, justas, eficazes, bondosas. Nesta utopia, ao jornalismo é oferecido um papel institucional da maior importância: o de elevar a voz do cidadão comum a um plano de notoriedade que fique ao nível da voz dos poderes máximos, e de ser um espaço de liberdade intelectual e política para indivíduos e organizações, assim fortalecendo e cumprindo a democracia pela veiculação da diversidade de opções políticas, e ainda por se fazer o controlo público do exercício do poder governamental e em demais esferas estatais de soberania e administração. É, portanto, uma bela e difícil missão a do jornalismo. Imprescindível missão em democracias — o reino do primado das leis livres — para estas estarem em perpétua realização. A do jornalismo jornalismo.

O acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou a decisão da 1º Instância no processo onde Fernanda Câncio ganhou a causa estabelece algo mais do que o valor da indemnização. Ao condenar o jornal Correio da Manhã e cinco jornalistas, a Justiça está a dar como provada uma situação de difamação sistemática organizada por um grande grupo de comunicação com potenciais consequências devastadoras e duradouras para a vítima, algo congénere a uma prática de violência psicológica e social institucionalizada. Isto porque foram condenados três jornalistas que assinaram notícias intencionalmente falsas, mais o então director-adjunto Eduardo Dâmaso, mais o então director Octávio Ribeiro. É uma responsabilização horizontal e vertical, retrato da cultura da casa e da estratégia da Cofina que transcende os danos individuais causados a Fernanda Câncio, impactando negativamente o ecossistema mediático, a sociedade e o próprio Estado de direito.

O jornalismo que o quer ser não pode violar direitos fundamentais, como o direito ao bom nome, à privacidade e à presunção de inocência. Deve respeitar o rigor, a verdade e a ética profissional, conforme previsto na lei e no Código Deontológico dos Jornalistas. A dimensão do impacto da Cofina na perseguição a Fernanda Câncio ilustra os perigos do uso irresponsável do jornalismo enquanto ferramenta de ataque e manipulação. O peso da Cofina no panorama mediático português amplifica exponencialmente as consequências destas práticas, exigindo uma resposta proporcional de entidades reguladoras, do público e do próprio sistema judicial para restaurar os princípios fundamentais do jornalismo e da democracia. Resposta essa que não veio nem virá, se exceptuarmos o caso judicial na berlinda. Como se viu, como se vê.

A Cofina serve-se das proteções especiais que o Estado de direito, através da Constituição, concede à imprensa livre e responsável para violar repetidamente os seus deveres éticos e deontológicos, e ainda consegue a cumplicidade do sistema político e da sociedade que nem levanta cabelo ou solta um pio. Um sistema político e uma sociedade que, lá no fundo bem escondido, desprezam a liberdade.

Cofinados – II

«A cynical, mercenary, demagogic press will produce in time a people as base as itself.»


 

Joseph Pulitzer

 

Se perguntarmos a alguém da Cofina (sereis sempre a Cofina, seus pulhas, escusado disfarçarem-se com outro nome), eles são os primeiros a proclamar o seu domínio mediático em Portugal. E há suficientes razões para ser credível a pretensão, posto que lideram na imprensa em papel e no Cabo, alcançando a enorme maioria da população directa e indirectamente. O seu registo sensacionalista capta o espaço público no boca-a-boca, sendo pasto irresistível para as iliteracias, défices cognitivos, preconceitos, medos e ressentimentos da turbamulta. Este domínio fica exponenciado ao se dar a amplificação da sua agenda nos outros órgãos de comunicação social onde haja directores, editores e jornalistas que visem atacar os mesmos alvos da Cofina. Que são todos os restantes meios, sem excepção, RTP incluída.

Para uma empresa que quisesse fazer jornalismo, com este enorme poder viria uma ainda maior responsabilização, maior rigor deontológico, maior escrúpulo ético, maior cuidado com a sociedade e as pessoas. Mas é ao contrário, e ao contrário tem de ser, pois a legalidade, a decência e o bem comum não são compatíveis com um modelo de negócio baseado na exploração do pior que a natureza humana tenha oculto, ou às escâncaras, neste e naquela, em ti e em mim. Não há nada de nadinha de nada inovador no que a Cofina faz, nos restantes países onde haja liberdade de imprensa existem análogos e mercado para os seus produtos. A indústria da calúnia é universal e antecede o próprio nascimento da imprensa. Mas, como estamos em Portugal, é destes escroques que temos de falar.

Se não faz jornalismo, que faz a Cofina? Não há mistério, sequer pudor. Os seus donos querem usar o tabloidismo como arma política — no caso, querem a direita a mandar na barraca. Isso, que é desde sempre normalizado por se valorizar superiormente a liberdade que o permite, adquire outra natureza quando os aparelhos mediáticos são manipulados para se pintar de “jornalismo” o que é perseguição fulanizada com o intento de causar violência psicológica, violência social, danos profissionais e perdas financeiras. No caso de Fernanda Câncio, essa opção da Cofina apareceu como oportunismo inserido na estratégia mais vasta do seu conluio com agentes da Justiça dispostos a cometerem crimes por variegadas razões. Nesse ambiente dissoluto onde se sentiam protegidos pela sistemática violação das leis sem qualquer consequência, ousaram inventar à descarada, à maluca, notícias com o exclusivo propósito de infernizar a vida de uma cidadã que nem sequer arguida foi na Operação Marquês.

Pode acontecer na escola, no emprego, na tropa, no local onde se mora. Se formos vítimas de assédio, vítimas de mentiras, vítimas de uma animosidade, até ódio, nascida da alucinação e da imbecilidade, espalhando-se à nossa volta sem podermos reagir nem fugir, vamos sofrer. Sofrer gravemente. Nós e quem nos queira bem. Com sequelas na saúde que, em altíssima probabilidade, poderão ficar para o resto da nossa passagem por este planeta. Não é preciso explicar isto, certo? Então, agora imagina-te a seres tu a vítima do mesmo mas vindo do grupo de comunicação mais poderoso no rectângulo e ilhas. E acrescenta a isso não seres engenheiro ou sapateiro, mas um jornalista que depende da sua reputação para se poder realizar profissionalmente.

Pois, não apanhas meio átomo de jornalismo no pesadelo. Porque o jornalismo não foi inventado para encobrir o crime organizado.

Cofinados – I

«It is difficult to get a man to understand something when his salary depends upon his not understanding it.»


 

Upton Sinclair

 

A 24 de Dezembro, Fernanda Câncio informou numa rede social ter entrado na sua conta o valor de uma indemnização que o esgoto a céu aberto e cinco jornalistas tinham sido condenados a pagar-lhe por actos de difamação e calúnia. No dia seguinte, noutra rede social, repetiu a divulgação. Tratando-se desta jornalista, com a sua notoriedade, tal implica que todos os principais jornalistas e políticos em Portugal — dos patrões e editores da “imprensa de referência” aos dirigentes dos partidos com representação parlamentar e membros do Governo — tivessem nesses dias recebido a informação relativa ao acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa em causa, o qual confirmou a decisão da 1ª Instância. E tratando-se de atentados contra o seu bom nome e honra por mentiras ligadas à Operação Marquês, crucialmente por serem mentiras que inventavam diálogos atribuídos a supostas conversas privadas com Sócrates captadas pelas autoridades, esta confirmação da Relação de Lisboa tem, ou permite tirar, incontornáveis ilações e ponderosas lições para a comunidade jornalística e política. Donde, os ingénuos ficaram à espera que se publicitasse e discutisse com urgência e profundidade na comunicação social as questões suscitadas pela condenação. Esta é a segunda indemnização (!) que os mesmos pulhas lhe pagam por causa da perseguição que fizeram com o objectivo de destruir a sua reputação e prejudicá-la profissional e socialmente com o maior dano possível. Estamos a 7 de Janeiro. Que aconteceu, entretanto, a respeito?

Como qualquer um pode confirmar em segundos por busca no intervalo de tempo, quase nada é a resposta. Saíram duas notícias, duas. Primeiro no JN, dia 27, depois no DN, a 28. Ambas com uma enigmática característica: existem na edição em papel, nunca existiram na edição digital desses jornais. Portanto, não estão acessíveis para memória digital futura, não podem gerar comentários nem partilhas a partir desses órgãos. Porquê? Qual o critério? Não sei, mas sei que o alcance das mesmas ao ficarem presas no papel é o mais baixo possível, é residual, é absolutamente irrelevante.

No mundo da opinião, e que tenha apanhado, apenas Luís Aguiar-Conraria falou no assunto. Esse texto, bem-intencionado, meritório, apresenta também a sua curiosidade. O autor começa por declarar ser amigo de Fernanda Câncio, o que tem como primeira impressão aumentar a sua autoridade moral por via da honestidade exibida antes dos argumentos. Todavia, numa leitura final, após a digressão que em parte é acerca de si próprio, podemos questionar se ele teria tido a mesma atitude de defesa isolada de um alvo de assassinato de carácter da Cofina calhando não existir esse laço relacional e afectivo. Especialmente, quando a vítima foi apanhada no vendaval de calúnias ligadas à Operação Marquês e a Sócrates. Os 10 euros que tenho no bolso vão para a aposta na negativa.

A duplamente indemnizada, há meses, já chicoteou o silêncio cínico, cobarde, moral e politicamente cúmplice dos seus colegas de profissão e respectivos chefes e patrões, a que se junta o prolixo comentariado: Media livre de qualquer jornalismo. Acontece que, repetindo-se o fenómeno, tal sentimento de desilusão, desgosto e nojo deve ser estendido à sociedade inteira. Voltarei a esta miséria.