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O frete do Pontal

Que continuem a dizer que é no Pontal, ainda vá, mas festa? É verdade que o tempo não está para grandes festas, e os números que se conheceram ontem também não ajudaram, mas os militantes que marcaram presença naquela coisa mereciam uns valentes puxões de orelhas. Então o líder vai para ali todo entusiasmado com o trabalho realizado pelo Governo e o ar dos ouvintes é de enfado total? É que nada os animou, nem o anúncio do fim da crise, nem a ambição de renovar o mandato do Governo, nada lhes arrancou umas palminhas convincentes. Claro que no Algarve há coisas muito melhores para fazer do que ter de fazer o frete de ir ouvir o Passos, mas podiam ter disfarçado um bocadinho. Eu, no lugar dele, depois de uma recepção daquelas, voltava para a Manta Rota e não saía de lá tão cedo. Para ver se os militantes aprendem.

Em que estado se encontra a credibilidade da Nação?

Uma das principais preocupações dos opositores de Sócrates era a credibilidade. Caluniaram-no, insultaram-no, perseguiram-no de todas as formas possíveis e impossíveis e depois acusaram-no de falta de credibilidade. E resultou. Rapidamente, políticos, jornalistas e comentadores de todo o tipo sempre que abriam a boca era para exigir um governo que devolvesse a credibilidade ao País. Deve ter sido a palavra mais repetida durante a campanha eleitoral. Bastava isso para mais de metade dos nossos problemas se resolverem como que por magia. Com um governo credível enfrentar a crise internacional seria uma brincadeira de crianças. Obviamente, um governo credível podia ser qualquer um desde que não fosse liderado por Sócrates. Com a chegada da direita ao pote muitos respiraram de alívio, Portugal era de novo um país credível. E apesar de cedo se ter percebido que os mercados não se impressionaram com os lindos olhos dos novos governantes, dos mesmos fazerem exactamente o oposto do prometido, de mentirem descaradamente, a credibilidade do Governo parecia inabalável. Mas, passado um ano, curiosamente, já mal se ouve falar de tal coisa. Ainda há uns resistentes, Cavaco, por exemplo, quando confrontado com a derrapagem do défice, garantiu que a troika teria em conta a credibilidade do País. Lá está, para o PR, as políticas do Governo podem revelar-se um verdadeiro desastre, os ministros podem ser autênticas anedotas, algumas de muito mau gosto, que nada disso afecta a credibilidade do País. É uma coisa à parte, assim como se tivesse saído na Farinha Amparo. Mas e os outros, como é que em tão pouco tempo se esqueceram da palavrinha?

Até que enfim temos um primeiro-ministro que responde a tudo o que lhe perguntam

Sócrates era acusado de não responder às questões que lhe eram colocadas pela oposição nos debates quinzenais. Chegou a tal ponto que mesmo que respondesse a tudinho, no fim, para a oposição e para um batalhão de comentadores, era como se não tivesse respondido a nada. O que teria acontecido se alguma vez se tivesse recusado a responder a perguntas por não respeitarem o tema do debate? A gritaria seria tanta que ainda hoje o episódio seria lembrado e esfregado na cara dos socialistas. Agora é normal o primeiro-ministro fazer a triste figura que fez ontem no Parlamento, que incluiu queixinhas à Presidente da Assembleia e tudo. Já ninguém acusa ninguém de ser arrogante e daquele comportamento se dever ao facto do Governo ter maioria, por exemplo. Ainda por cima, a pergunta de Seguro não me parece nada despropositada numa discussão sobre assuntos europeus, nem sei por que razão Seguro não lhe disse isso mesmo. É até muito provável que, durante o Conselho Europeu, alguém lhe faça a mesma pergunta e queira saber o que está a falhar. Digo eu, porque para os senhores da troika está tudo a correr lindamente. É caso para perguntar o que terá de acontecer à economia portuguesa para que os senhores deixem de fazer de conta que tudo corre como previsto.

Ainda só passou um ano e o primeiro-ministro já se mostra maçado como se estivesse no fim do segundo mandato. Portanto, para a próxima, é favor os senhores deputados enviarem para o seu gabinete uma listinha com todas as perguntas, de preferência na véspera do debate, para não o apanharem de surpresa.

Passos Coelho e a bola de cristal

Passos Coelho voltou hoje a informar-nos que não tem nenhuma bola de cristal, que não pode prever o futuro. Mas parece-me que não é bem assim. O que se passa é que a bola de cristal antes de 5 de Junho do ano passado funcionava na perfeição, o que permitia ao então candidato a primeiro-ministro ver o futuro com clareza, aposto que era na bola que via as gorduras do Estado a desaparecerem, os juros da dívida a descerem, o rating do País a subir, etc. Depois das eleições, tudo mudou, a maldita bola passou a ter dias, ou minutos. É que Passos Coelho consegue dizer na mesma entrevista que não consegue prever o futuro, e na frase seguinte mostrar-se absolutamente seguro que estamos no caminho certo, que 2012 é sem dúvida o pior ano para os portugueses e que o fim da crise já está à vista! Num momento há “riscos e incertezas” que, aliás, parecem ser exclusivos deste Governo, nos anteriores não havia nada disso, e, no momento seguinte, pelo contrário, a visão de um futuro risonho e a certeza de estarmos a um passinho da felicidade. A culpa só pode ser da bola.

Um primeiro-ministro à espera de ordens

A grande, e única, bandeira deste Governo é o cumprimento do memorando de entendimento, sendo que o principal objectivo é cumprir a meta do défice. Do ponto de vista do Governo, essa meta justifica toda a austeridade que nos foi imposta. Pois bem, perante a derrapagem da execução orçamental e o falhanço mais que certo no cumprimento da meta do défice, o primeiro-ministro diz, e repete, que é muito cedo para anunciar mais medidas de austeridade. Cedo? Não se percebe, está à espera de quê? Os iluminados que nos governam desejaram ardentemente a vinda do FMI e companhia, para eles a sua vinda só pecou por tardia, ou seja, os portugueses deviam ter levado a injecção de austeridade muito mais cedo. Será que mudaram de ideias? Não. Para mudar de ideias é preciso tê-las e quanto à austeridade, Passos Coelho até diz que se for necessário adoptará novas medidas, o problema é que não é ele que decide se é ou não necessário. Quando as ordens vindas do exterior eram para impor austeridade, o Governo até foi além do que lhe exigiam, mas o Mundo não mudava só no tempo do anterior Governo, continua a mudar a grande velocidade e a verdade é que a receita da austeridade já teve mais adeptos. Portanto, não massacrem o nosso pobre primeiro-ministro com questões a que ele não sabe responder. Cobardemente, limita-se a fazer o que lhe mandam, e ainda ninguém lhe deu essas ordens.

E multar os professores incompetentes, não?

Agora é que vai ser! O ministro da Educação vai, finalmente, pôr ordem nas escolas. E como? Fazendo a vontade a todos os que acham que são os pais os únicos responsáveis pelos problemas de indisciplina, e não só, dos seus rebentos. A partir de agora acabou-se, os pais serão multados, poderão perder os apoios sociais para os filhos, medida que para muitos alunos poderá significar o abandono bem antes dos dezoito anos. Poderão ser obrigados a frequentar aulas de educação parental, seja lá isso o que for, etc. Mas há coisas que o ministro não esclarece. Por exemplo, nos casos, bastante frequentes, em que os alunos só são indisciplinados com um professor, não levantando qualquer problema aos restantes, continuam a ser os pais os únicos com direito a punição? As faltas injustificadas também não foram esquecidas e pais e alunos serão castigados. Os esquecimentos de material serão equiparados ao absentismo e darão igualmente direito a falta injustificada (e se há gente distraída neste país, só escapam mesmo os membros do Governo…). Mas, a menos que os professores passem a ser obrigados a comunicar aos pais a necessidade de levar os tais materiais, como poderão os pais ser responsabilizados por estas faltas? Eu, se fosse ao ministro, não sobrecarregava os professores com mais tarefas, até porque consta que eles também andam com bastantes dúvidas relativamente a uma série de coisas que irão mudar no próximo ano lectivo, andam é sem tempo para as escrever em cartazes, lá está.

Só lhe faltam as asas

Diz o pobrezinho do Relvas que tem direito ao bom nome, que tem família e amigos. Pois tem, mas há cerca de um ano esta pobre vítima teve o descaramento de dizer que “se fosse parente do engenheiro Sócrates escondia que era parente dele”, o que diz bem da besta que agora se vitimiza. E como argumento a favor da sua inocência remeteu para a Justiça, diz ele que “se tivesse extravasado as suas competências, o seu nome apareceria no despacho de acusação do Ministério Público”. Portanto, a Justiça funciona lindamente, mas deve ser recente esta competência da Justiça, é que Sócrates também nunca foi acusado de nada o que não impediu o partido deste verdadeiro anjo de o tratar como um autêntico criminoso, ainda com menos direitos que os criminosos comuns.

E foi isto que foi fazer ao Parlamento. Mas diga-se em abono da verdade que quem o permitiu foram os deputados da oposição que aparentemente gostam mais de se ouvir a si próprios do que aos inquiridos. Ao fazerem 300 perguntas de uma vez, à mistura com outras tantas considerações, permitem que o inquirido não responda a coisa nenhuma e fale do que bem entender. Eles lá sabem, mas depois não se queixem das perguntas que ficam por responder.

Vivemos no país mais aborrecido do mundo

Não se passa absolutamente nada neste país, muito menos alguma coisa que valha a pena ser investigada por espiões. Nem sei por que raio ninguém propõe o fim dos serviços secretos. O tédio é de tal ordem que o antigo chefe dos espiões, coitado, se entretém a enviar aos políticos mensagens de telemóvel e emails com informações que se podem encontrar em qualquer jornal. Sabendo disso, os políticos, que todos os dias recebem milhares de mensagens, não ligam patavina a mensagens enviadas por espiões, não mostram nem uma pontinha de curiosidade, sabem perfeitamente que não há ali nada confidencial, aquilo são só resumos de imprensa, uma seca, no fundo. E é óbvio que nunca lhes respondem, pelo contrário, são imediatamente apagadas. Claro está que os políticos, mesmo os de topo, nunca falam entre si sobre assuntos de espionagem, é que não há nadinha para falar.

Ou isso ou os actuais governantes estão convencidos que a média de idades dos portugueses é para aí cinco aninhos e ainda assim com algum atraso para a idade.

Desonestidade, mentira e estupidez natural

Apesar de já se terem apercebido que existe uma grave crise internacional, o desporto favorito da direita continua a ser acusar os governos socialistas pela situação em que nos encontramos. Alguns não sabem mesmo fazer mais nada, como é o caso do ministro não se sabe bem do quê, de seu nome Álvaro, que ontem no Parlamento lá disse para quem quis ouvir que a economia portuguesa está doente desde os anos 90, e que a culpa foi das obras públicas e do endividamento. Quem tenha acabado de chegar, vindo de Marte, e ouça uma coisa destas, fica a pensar que, nos anos 90, Portugal era um país rico e desenvolvido e que os socialistas uma vez chegados ao poder desataram a gastar o dinheiro dos contribuintes porque sim, porque lhes está na massa do sangue. Não sei o que é pior, se é ouvir estas atrocidades da boca desta e doutras aventesmas, se é o facto de ninguém, nem mesmo do PS, lhe lembrar qual era a realidade do País há vinte anos atrás. E a realidade é que, apesar de termos sido governados durante dez anos por um génio da Economia, quando os socialistas chegaram ao poder estava quase tudo por fazer, estradas, hospitais, escolas, redes de esgotos e respectivas estações de tratamento, todo o tipo de equipamentos desportivos e culturais, habitação social, etc., etc. A verdade é que tínhamos décadas de atraso em relação aos nossos vizinhos europeus. A pressão exercida pelas populações e partidos da oposição para que o Estado arrepiasse caminho era mais do que muita, e justificada. Portanto, o tal investimento público tinha mesmo de ser feito, sob pena de nenhum Governo sobreviver, não foi só por se pensar que essa seria a melhor forma de dinamizar a economia, como agora dizem estas bestas. Além disso, não investir também implicaria recusar os fundos europeus, recusar alinhar naquilo a que se poderia chamar parcerias público-públicas, já que os projectos com direito a financiamento europeu implicam que o Estado também invista, ou seja, que se endivide. E o que diriam todos, os europeus, que nos acusam de endividamento excessivo, e as mentes iluminadas da direita que acusam os governos socialistas de tudo e mais alguma coisa, se as tais obras públicas não tivessem sido feitas, evitando assim o endividamento? Com toda a certeza os socialistas seriam acusados de total incompetência, de terem tido oportunidade de modernizar o País e de não a terem aproveitado, e muito provavelmente, perguntariam para que servem as contas em dia se Portugal continua a ser um dos países mais atrasados do mundo ocidental. O taralhouco do Álvaro diria que tinha vindo do Canadá, século XXI, portanto, prestar os seus magníficos serviços a um País ainda a viver na época medieval. Que, por acaso, seria exactamente onde nos encontraríamos caso a direita tivesse governado desde os anos 90.

Agora vejam lá, não se ponham com discussões

Passos Coelho afirmou ontem numa visita à base aérea do Montijo que espera que um novo aeroporto em Lisboa não seja necessário na próxima década. É um desejo extraordinário. Sendo assim, espera que, por exemplo, o sector do Turismo não cresça nos próximos anos. Está a ser coerente, já com o fim do TGV e a aposta em linhas de transporte exclusivo de mercadorias se tinha percebido que o Governo não vai à bola com magotes de turistas a entrarem-nos pelo País dentro. Estou a exagerar, o primeiro-ministro não vai construir um novo aeroporto, mas vai investir uns milhões numa pista de apoio à Portela, só não sabe bem onde. Não sabe ele, mas sabem os oficiais da Força Aérea. Tem de ser em Sintra, parece que há problemas técnicos que inviabilizam as hipóteses Montijo e Alverca. Acho curioso é que, depois de anos e anos a discutir-se se seria melhor construir um novo aeroporto ou investir na hipótese Portela mais um, nunca tenha se tenha falado na base aérea de Sintra. Onde é que andavam estes oficiais?
Mas Passos Coelho disse mais, disse que não queria “adiantar rigorosamente mais nada, sob pena de nos próximos dias o país inteiro desatar a fazer uma discussão imensa sobre o investimento que se teria de fazer numa decisão que não está tomada.” Ou seja, podemos discutir os investimentos à vontade mas só depois do Governo tomar as decisões. Pois claro, se for antes, as discussões só atrapalham. Bem, pelo menos, podemos discutir a decisão, que já está tomada, de não construir o novo aeroporto em Alcochete. Lembrar que até a Ferreira Leite, insuspeita de querer esbanjar dinheiro, chegou a dizer que avançaria para a construção do novo aeroporto por módulos. Se calhar estava enganada e sai muito mais barato passar a próxima década a investir milhões em pistas alternativas e depois mandar tudo às urtigas e, finalmente, construir o novo aeroporto… algures.

Como é que ainda ninguém se tinha lembrado disto?

Claro que as medidas que têm sido anunciadas não são de austeridade. O primeiro-ministro disse recentemente que não via motivos para mais austeridade e viu muito bem. A verdade é que, apesar de sermos brindados com novas medidas quase diariamente, a palavra ‘austeridade’ praticamente desapareceu da comunicação social e não tem aparecido colada às mesmas. Mas, hoje, pela boca do primeiro-ministro, ficámos a perceber melhor porquê: são medidas correctivas! E é óbvio que as medidas correctivas não têm nada a ver com as medidas de austeridade, o Governo nem precisa de explicar. As de austeridade não servem para corrigir nada, destinam-se antes a castigar-nos pelos maus hábitos que adquirimos no passado. Castigo por termos andado a viver acima das nossas possibilidades. E só voltam, se voltarem, quando o Governo avisar. Até lá, felizmente, só teremos medidas correctivas. Que bem pensado. Deve ter sido por isso que a taxa de saúde e segurança alimentar anunciada pela ministra da agricultura, aparentemente, não foi discutida no Conselho de Ministros de ontem, como tinha sido noticiado, e percebe-se, é daquelas medidas que poderia lançar a confusão entre as correctivas e as de austeridade e lá se ia o brilharete do primeiro-ministro no debate quinzenal.

Agora digam lá que nós somos a Grécia. Os gregos não percebem nada disto, só falam de austeridade. Pior ainda, em pacotes de austeridade. Depois admiram-se. Por cá, nem austeridade quanto mais em pacotes. E ainda dizem que este Governo não é criativo.

Será o lóbi dos quiosques?

Concordo com a proibição do fumo em locais fechados. Aceito (que remédio) pagar o que pago de imposto em cada maço de tabaco. Acho muito bem que se desincentive o consumo e que se façam todas as campanhas anti-tabagismo. Concordo com isso tudo. Mas expliquem-me, devagarinho, qual a vantagem de proibir as máquinas de venda automática, que já não é assim tão automática, pois temos sempre de pedir que nos liguem a máquina. Haverá alguém que deixe de fumar se tiver de comprar o tabaco ao balcão? Além disso, se a preocupação são os jovens, alguém devia avisar o Governo que eles fumam, cada vez mais, tabaco de enrolar e que o mesmo não costuma ser vendido nas tais máquinas.

Lendo nas entrelinhas

A principal queixa de Cavaco no famoso prefácio é a suposta deslealdade institucional de Sócrates, mas será que Cavaco está satisfeito com a lealdade de Passos, aquela devida a quem o levou ao colo até ao pote? O primeiro ano do segundo mandato não correu propriamente bem a Cavaco, e Passos vai dando umas no cravo e outras na ferradura. Mas os elogios pontuais que faz ao papel do Presidente não devem ser suficientes para que Cavaco esqueça episódios como aquele em que Passos, numa atitude para lá de provocadora, decidiu enfrentar uma manifestação imediatamente a seguir a Cavaco ter evitado cruzar-se com uma outra. Isso e respostas como aquela em que Passos diz que não joga pingue-pongue com o Presidente. Mas com quem é que Passos julga que está a falar? São afrontas que Cavaco não tolera nem esquece, e numa altura em que a sua popularidade anda pelas ruas da amargura deve ser coisa para o deixar a espumar de raiva. Ora, lendo nas entrelinhas, algo que sempre ouvi dizer que tem de ser feito sempre que Cavaco abre a boca, não é de descartar a hipótese de que este seja um ataque do tipo dois em um. O objectivo principal é vingar-se de Sócrates, claro, mas é também um sério aviso a Passos. Se tudo correr normalmente, ainda têm pela frente uns anos de convivência e é bom que o sucessor de Sócrates não esqueça que, por vários motivos, lhe é exigida lealdade a dobrar, ou a triplicar, e que se continuar a armar-se em engraçadinho, como tem feito, Cavaco não lhe perdoará, importando-se pouco ou nada com as consequências para o País de uma guerra entre Belém e S. Bento. Bem vistas as coisas, se calhar, não foi uma coincidência o envio para o Tribunal Constitucional da lei do enriquecimento ilícito no dia seguinte ao do conhecimento do prefácio.

Entretanto, quando confrontado pelos jornalistas, Passos respondeu que não havia a tradição de comentar no exterior questões de política interna. Uma resposta algo atabalhoada que me fez lembrar aqueles futebolistas que, indiferentes às perguntas, respondem sempre da mesma forma. Ou será que Passos, se for questionado em território nacional, tenciona comentar este assunto?

Para quando o fim dos debates quinzenais?

Só da cabeça do maluco do Sócrates é que poderia ter saído a ideia de os debates passarem a ser quinzenais. E o melhor é o primeiro-ministro, não digo acabar com eles, mas passar a fazê-los, no mínimo, de três em três meses. Chega muito bem. Afinal, tendo em conta a quantidade de ideias e soluções para resolver os problemas do País que o Governo tem para apresentar até um debate por ano chega e sobra. De certeza que os assessores estão fartinhos de lhe dizer o mesmo. É que, como se viu ontem com a trapalhada da Lusoponte, por exemplo, um simples debate pode estragar tudo, ou seja, revelar o grau de impreparação do primeiro-ministro e do Governo. Ainda por cima numa altura em que se tem feito um esforço colossal para disfarçar a sua incompetência num Governo onde cada vez manda menos. Pois, o tal Governo de sonho que andava na sua cabeça durante a campanha, em menos de um ano, está a transformar-se em mais uma promessa eleitoral falhada. Além disso, aposto que os líderes da oposição não se opõem ao fim dos debates quinzenais. Seguro prefere debates na televisão. Louçã e Gerónimo são uma sombra do que eram no tempo de Sócrates. Já o líder da bancada do CDS ficaria tristíssimo, o homem adora ouvir-se e por ele os debates com o primeiro-ministro até podiam ser diários. Mas deve ser o único.

Pesadelo

Durante décadas o PSD tentou impingir-nos o seu sonho de ter no Poder uma maioria, um Governo e um Presidente. Uma fórmula quase mágica que resolveria todos os nossos problemas. Havia, contudo, um problema que impedia a sua realização: os portugueses, piegas, tinham medo de pôr todos os ovos no mesmo cesto. Era com esta desculpa esfarrapada que tentavam disfarçar o facto de eleição após eleição não terem projectos alternativos credíveis, de elegerem líderes que não lembram a ninguém, de se apresentarem sempre sem uma ideia digna desse nome e de consequentemente não conseguirem ser eleitos. A cada eleição lá tinham de adiar o sonho. Mas tudo mudou nas últimas eleições e, bem vistas as coisas, não poderia ter sido em melhor altura, com o país numa situação tão difícil e com uma crise internacional gravíssima tinham finalmente a possibilidade de mostrar o que valiam. E passados oito meses já dá para termos uma ideia de quanto valem todos juntos. Quanto ao Governo, o que o salva de parecer tão ou mais anedótico que o Governo do Santana Lopes é ter de executar o memorando da Troika. Quanto a ideias, é o costume, nem vê-las. Corrijo, têm uma ideia: ir além do que o memorando exige. Fora isso, todos os dias, feriados incluídos, lá vem um ministro com uma anedota qualquer. Com a maioria as coisas não correm melhor. Provavelmente, o sonho não incluía uma maioria de coligação, mas teve de ser. É que, apesar das condições em que o PS concorreu às eleições, o PSD não conseguiu chegar à maioria sozinho. E o que temos podido observar é um dos parceiros de coligação a fingir-se de morto, a tentar passar ao lado de tudo o que é austeridade, sem um pingo de solidariedade para com o Governo. Só um cego não vê que a paz que aparentemente existe está podre. Quanto ao Presidente, e à relação que mantém com o Governo, nem é preciso falar. Nunca se tinha visto nada assim e espero que não se volte a ver. A procissão ainda vai no adro, mas restará alguém que chame a isto um sonho?

Este Sol sempre a brilhar também não ajuda nada

Passos Coelho tem feito tudo para pôr os portugueses na linha. É essa a imagem que desesperadamente quer passar aos senhores da Troika, que chegam hoje a Portugal. A medida mais recente foi o fim da tolerância de ponto no Carnaval. Coitado, deve ter ficado aborrecidíssimo com muitos presidentes de Câmara e empresários que decidiram manter o feriado, contribuindo assim para agravar a nossa avaliação em matéria de preguiça. Mas nem tudo está perdido, o Parlamento estará a funcionar na terça-feira de Carnaval. É sem dúvida uma excelente notícia para o Governo, e logo no dia em que a Troika chega a Portugal. Mas persiste um problema que, para mim, é ainda maior do que haver ou não tolerância de ponto, é que o Carnaval são dois dias, mas os senhores da Troika ficarão cá duas semanas. E o problema é que, muito provavelmente, serão duas semanas de lindos dias de Sol e de temperaturas amenas. É grave. Afinal, lá na terra de onde vêm os senhores, dias de Sol em pleno Inverno são tão raros que quando acontece devia ser feriado. Como é que o nosso pobre primeiro-ministro vai convencer os senhores que não estamos todos de férias a gozar o bom tempo?

Para ajudar a resolver o problema, os deputados deveriam propor o encerramento de todas as esplanadas, parques, jardins, miradouros e afins durante, pelo menos, os próximos quinze dias. Ficariam ainda mais bem vistos.

Quando é que foi que nós mudámos?

Nem sempre o primeiro-ministro nos viu como um povo que só pensa em férias, pontes e feriados. Não há muito tempo, partia-se-lhe o coração de cada vez que o Governo socialista aprovava medidas de austeridade, coisa que obviamente não merecíamos. Os mauzões dos políticos é que eram os responsáveis pela situação em que o País se encontrava e os únicos a merecer castigo. De tal forma que, apesar de nessa altura os portugueses ainda terem direito aos subsídios de férias e Natal, a todos os feriados e pontes e mais umas quantas tradições que impedem o crescimento da economia, o então líder da oposição, quase a chorar, veio pedir desculpa por ter aprovado um aumento de impostos. Claro que não foi uma atitude piegas, não me ocorre é a palavra certa para a classificar.

A estratosfera está a ficar sobrepovoada

O ministro das Finanças, em entrevista ao Financial Times, lembrou os ingleses que nós, os portugueses, temos a tradição de ser bons navegadores. É uma rica frase, não sei é se algum membro do actual Governo de direita a pode usar como argumento. Então não eram portugueses, logo bons navegadores, os governantes que antecederam os actuais? Não é a direita que repete incansável que os portugueses que nos governaram nos últimos quinze anos levaram o País para o abismo? Se calhar o ministro enganou-se, queria dizer que os portugueses de direita são excelentes navegadores, tirando os que, por azar, nos governaram no passado e que não estou a ver o ministro elogiar a brilhante navegação: Cavaco, Barroso, Santana. Pronto, sobram os actuais governantes. Desde os Descobrimentos que não se viam tão bons navegadores nestas paragens. Mesmo em mares altamente conturbados, em que ninguém faz ideia alguma do que virá a seguir, temos os governantes mais optimistas de que há memória. Cumprirão tudinho o que prometeram e, sobretudo, o que não prometeram, avistam ‘pontos de viragem’ que mais ninguém vê, e quanto maiores são os obstáculos (juros a bater recordes, recessão e desemprego a agravarem-se, meio Mundo a garantir que estamos cada vez mais próximos da Grécia, etc.) maior é a certeza de que estamos no caminho certo rumo à prosperidade. Noutros tempos, lá está, isto não era navegar com sabedoria, era viver na estratosfera.

Aposto que os pensionistas do Banco de Portugal não assinaram a petição

Já lá vai o tempo em que nunca se enganava. Afinal, tem de vir emendar o que diz, e já tem dúvidas quanto ao que recebe e muitas mais quanto ao que gasta. Mas, bem vistas as coisas, o culpado é o mesmo de sempre. Estavam as continhas tão bem feitinhas e tinha de vir aquele grandecíssimo filho da mãe obrigá-lo a escolher entre o vencimento de PR e as míseras pensões. Imagine-se o ódio que deve ter sentido quando soube que o Governo de Sócrates se preparava para levar para a frente esta medida. Deve ter entendido a coisa como uma afronta pessoal. Austeridade sim, mas a sua excelentíssima pessoa deveria ter ficado a salvo de tal barbaridade. Mesquinho e vingativo como é, deve ter jurado fazer a folha ao responsável, e fez. Mas a vingança não lhe valeu de nada, o vencimento foi-se mesmo e as continhas que fez com a Maria saíram furadas. Como se não bastasse agora queriam ficar-lhe com os subsídios do Banco de Portugal. Era só o que faltava! E a verdade é que com esta bronca toda nunca mais se ouviu falar de tal coisa, e nem o facto de ter estado reunido ontem com o Governador do Banco de Portugal levou a que alguém escrevesse uma linha que fosse acerca do assunto. Podem fazer as petições que quiserem, o que interessa é que os cortes na pensão já eram.

Made in PSD

Numa conferência que se destinava a promover os produtos nacionais, o primeiro-ministro aproveitou para falar de um produto que tem tido muita saída e que conhece particularmente bem: os militantes do PSD. E fez muito bem em revelar a sua irritação perante as acusações de que tem sido alvo. Que culpa tem o PM que a fama deste produto tenha galgado as fronteiras e seja requisitado por tudo o que é accionista estrangeiro? É, obviamente, um produto que se vende a si próprio, sem necessidade de promoções, muito menos por parte do Governo. Quais renováveis qual quê, os chineses compraram a EDP porque viram nesse negócio uma oportunidade imperdível de realizarem o sonho de trabalhar com esses ases da gestão. Só não percebo por que razão os membros do Governo preferem andar com a bandeirinha portuguesa na lapela, sujeitos a serem confundidos com algum pastel daqueles que ninguém conhece lá fora, e não andam com o símbolo do partido, esse sim uma marca de qualidade inconfundível.