Como é que chegámos aqui?
Primeiro, a Manela escondeu dos portugueses o que iria passar-se com a Grécia e a Irlanda em 2010. Nas campanhas eleitorais de 2009, que foram três – e para além de ter tido o acerto de escolher Aveiro para partilhar com os jornalistas as suas suspeitas de ter o telemóvel sob escuta – do que a senhora falava era de um peso insustentável dos investimentos presentes a fazer-se sentir nas gerações seguintes, não daí a um ano e meio. O debate, nessa altura, estava polarizado entre a aposta europeia de injecção de dinheiro nas economias, de modo a defender o emprego e promover a retoma, e a mera reacção a essa política. Tal como o de Passos, também o PSD de Ferreira Leite adiou até às últimas a apresentação do programa, só para se concluir que essas ideias mal enjorcadas não tinham qualquer interesse para o eleitorado.
Depois, o Presidente da República validou o boicote sistemático que a oposição jurou fazer ao Governo minoritário. Para Belém, a situação não punha em causa o regular funcionamento das instituições, pelo que não tinha de mexer uma palha para alterar fosse o que fosse de substantivo na situação criada. Veio a crise dos mercados e o Presidente continuou a confiar plenamente na capacidade do Governo para resolver os desvairados novos problemas que ninguém tinha previsto (a não ser a Manela, e talvez o Medina Carreira, mas nenhum deles o disse em tempo útil, quiçá por distracção). E o Presidente não se limitou a confiar, foi também um apoiante da sua manutenção, como o prova o empenho que teve em ver aprovado o Orçamento para 2011. Caso não estivesse o Governo a dar o seu melhor em situação tão difícil e perigosa, o Presidente teria logo agido de acordo com a sua responsabilidade constitucional e pessoal – como celebrada autoridade em Economia e Finanças, grande estadista e irrepreensível cultor da verdade que bem sabemos ser.
Por fim, a direita tinha de reeleger Cavaco, sem o qual nenhum plano podia ser posto em marcha. Atingido esse objectivo, havia de deitar abaixo o Governo na primeira oportunidade. O ambiente começou a ser criado na noite das eleições com um ataque de ódio a todos os candidatos derrotados, jornalistas e terceiros. Continuou nas semanas seguintes com notícias que as fontes de Belém plantavam acerca de uma insuperável ofensa sofrida pelo Presidente por palavras de Santos Silva ditas algures na campanha de Alegre. Teve no discurso da tomada de posse o seu apogeu golpista, antecipando e repudiando as medidas que o Governo estava a 48 horas de levar a uma cimeira europeia extraordinária. E completou-se a jogada com a dramatização da ausência de apresentação prévia a Cavaco das medidas anunciadas no dia 11 de Março. Restava só esperar sentado pelo chumbo do PEC, e consequente ida para eleições, já com a entrada do FMI garantida e a forte possibilidade de ter um Governo PSD-CDS.
Sim, basta recordarmos: quem é que andava a pedir a chegada do FMI? Esses são os mandantes deste plano, executado sem uma hesitação por Cavaco e o títere Passos – e contando com o inestimável apoio do BE e do PCP, também interessados em ver o FMI a aterrar na Portela para se animar a luta e poderem dar ordens ao povo.