Nem baixar o défice! Tudo começou a tornar-se claro por volta de 2007/2008, ia o governo com mais de dois anos de exercício e satisfeito da vida com o défice herdado, de 6,3%, quando, de repente, se deu conta de que o mesmo caíra para uns escandalosos 2,8%! Como fora possível? Sócrates não queria; achava que ter um défice elevado era bom, significava que Portugal poderia num dia glorioso avistar-se da Lua: as suas obras sumptuosas, douradas, faraónicas seriam o cartão de visita do planeta! E ele, o seu responsável.
Mas enfim, azar, aconteceu. O défice baixou. E que fez o nosso homem? Ouviu dizer que rebentara um escândalo em Wall Street, umas vigarices valentes, uns “subprime”, uma bolha imobiliária que rebentara e que, diziam-lhe, estava a causar um tsunami na Europa, com fecho de empresas e quebra acentuada das receitas. Viu ali então uma ocasião única para voltar a elevar o défice e aumentar a dívida para níveis mais compatíveis com o seu gosto e as suas teorias económicas extravagantes, que, sabe-se hoje, assentam no princípio de que quanto maiores as dívidas dos Estados melhor, e que as dívidas não são para pagar em nenhuma circunstância. Esta informação chegou-nos directamente de Poitiers, com o selo de garantia do Correio da Manhã. Não ouvimos o mesmo que o director do jornal nem o orador o confirmou, mas, se eles o dizem… vamos discordar porquê?
Foi assim que, apesar das ordens estritas da União Europeia para que nenhum Estado-Membro apoiasse a economia e que, nos diferentes países, se deixassem as empresas em dificuldades ir à falência – caso da Alemanha, que deixou imediatamente falir a Volkswagen -, Sócrates, teimoso, insistiu em aumentar os apoios aos desempregados e conceder incentivos à economia, prevendo, inclusivamente, investimento público para compensar a falta de investimentos privados e não deixar morrer a economia. Tudo, claro, contra as directrizes da Comissão que até nem tinha adoptado um pacote de medidas de estímulo intitulado “Plano de Relançamento da Economia Europeia”.
Contente por finalmente estar a conseguir aumentar a dívida e o défice para valores totalmente do seu gosto, e não vendo, não vendo mesmo, tão enebriado estava com os gastos sumptuosos, que os especuladores começavam a encontrar na zona euro um filão promissor e potencialmente inesgotável, começou a pedir à oposição que lhe desse todo o apoio possível ao aumento do endividamento. Foi isso, não foi? E aí, ironia!, constatou que a dita oposição, sim, lhe dava todo o apoio : não queria impostos, não queria sacrifícios, havia limites! Ele queria gastar mais e eles até alinhavam!
Só para contrariar, porém, e contra tudo o que pensava, até mesmo contra as novas directrizes da União Europeia, Sócrates começou a reduzir a despesa e a seguir uma via de maior austeridade, através dos PEC.
E a oposição? Uns, que não, que não podia ser, que havia direitos adquiridos. Outros, que não, que assim não, que havia maneiras simplicíssimas de cortar na despesa, que não se justificavam aumentos do IVA, nem cortes de 5% nos salários, nem suspensão das transferências para a Madeira, nem escalões no ensino. Que fariam melhor e mais rápido sem sacrifícios para os portugueses, que já se sentiam no limite.
Transpostos estes argumentos para o megafone do presidente da República e depois para o das televisões, tomaram o poder.
O resto da história e os limites da austeridade já são de todos conhecidos.
Mas aventesmas como esta ou Freitas ou Henrique Monteiro do Expresso e outros pulhas, que até admitem que a crise é sistémica e que a sua origem nacional é altamente discutível, continuam a debitar que Sócrates foi o responsável pelo estado a que chegámos, agora revigorados pela descoberta de que, para ele, as dívidas não se pagam (o que desde a primeira hora do seu governo se demonstra, não é?) e, portanto, os défices não se baixam. Até quando vamos ter de aturar estes vómitos?