O cantar as “velhas” é uma preciosidade da cultura popular terceirense. Trata-se de um género de cantigas ao desafio, tradição herdada talvez das trovadorescas cantigas de escárnio e mal-dizer. A brejeirice está sempre presente em cada “velha”, composta por dois tercetos e uma quadra. O seu nome deve-se ao facto de ser normalmente referida uma velha, tendo como contraponto um velho, que com frequência são “avó” e “avô” dos contendores. Actualmente o par mais famoso de cantadores de “velhas” é formado pelo genial João Ângelo, um fenómeno de talento e popularidade, e pelo engenheiro José Eliseu, que se dedicou à prática para ajudar a manter viva esta tradição. Uma “velha” é tanto mais bem conseguida quanto mais disfarçado estiver o significado da brejeirice.
Por desfastio, às vezes escrevo alguma, para me divertir ou divertir os amigos. Aqui deixo três exemplos.
Lição de gramática
Tua avó foi à lição:
“Fá-lo é verbo, falo, não
– É substantivo comum.
Mas, se levar o pronome,
Falo fica, em vez de nome,
Verbo como qualquer um.”
Tua avó bem aprendeu
E a teu avô ensinou:
“No quinhão que Deus te deu
Só o verbo te calhou.”
O orçamento
Teu avô muito suava
De tanto que trabalhava
Para ganhar o sustento.
Tua avó fazia a conta
E não encontrava a ponta
Do novelo do orçamento.
Ela quase enlouquecia
C’o resultado que dava,
Pois quanto mais lhe mexia
Mais o orçamento minguava.
O voto
Uma velhinha sem jeito
Fala mal de tudo a eito,
E não queria votar.
Para fugir ao dever
A velha foi-se esconder
Numa furna à beira-mar.
Tanto o velho procurou
Que deu com ela na furna,
Mas a velha até gostou
De pôr o voto na urna.