
Portugal em extinção

Cristiano Pereira oferece-nos uma viagem visual e sonora ao mundo de Artur Gonçalves. Muita gente se anda a rir com a figura, num típico fenómeno de sobranceria cultural que esconde o intento maligno de terraplenar a identidade pátria. Pela minha parte, não compreendo como o Presidente Jorge Sampaio conseguiu acabar os seus dois mandatos sem o condecorar. Afinal, terá existido mais algum português com a coragem, e bom gosto para gravatas, que esta capa ostenta?… Shame on you, Mr. President.
Signor Presidente del Consiglio
Para os meus alunos – eles rondam os 20 anos – o telemóvel existiu sempre. Como para mim o telefone. É isso: o mundo já veio feito assim. E é essa gratificante falta de perspectiva histórica, no dia-a-dia, o que permite imaginar-nos eternos. O que é, de resto, a melhor disposição para vivermos. Imagine-se o que era uma consciência contínua da nossa temporalidade. Não dávamos um passo. Íamo-nos arrastando. Sim, fazer-nos esquecer a morte é uma das espertezas da vida.
Tudo isto por causa das eleições italianas de ontem. Não se vê logo a relação? Exacto. Mas eu explico. O chefe do governo de Itália chama-se «Presidente do Conselho»… de ministros, claro. Também Mussolini tinha o cargo de «Presidente del Consiglio dei Ministri», e ignoro se a designação é anterior ao Regime Fascista.
Nós dizemos «primeiro-ministro». Mas dizemo-lo desde há trinta e pouco anos. Porque, antes, também o nosso chefe de governo se chamava «Presidente do Conselho». Só isso. Nunca se ouviu chamar a Salazar ou a Caetano «Presidente do Conselho de Ministros», mesmo em discurso indirecto, mesmo numa notícia de jornal. Isto era uma das finuras da nossa ditadura. O senhor não era o chefe de um grupo de pessoas, mas um chefe sem mais, um «Presidente». Havia portanto dois presidentes no país. E, na percepção pública, um deles era mais «presidente», e esse não era o da República. Era o outro, o eterno.
Nessa nossa atemporal percepção – eu tinha a idade dos meus alunos hoje – Salazar havia existido sempre. Por isso, o fim do Verão de 1968 foi um tempo tão delicioso. Falava-se do «sucessor», trocavam-se boatos. E isto na rua, lugar inaudito. Era o princípio do fim? Ninguém o sabia. Mas sabia-se que era o fim de qualquer coisa, de alguém. Do Presidente Eterno. Que só o tinha sido dos seus ministros.
Gapingvoidmania
Sonda Agustina pousa na blogosfera
O Abrupto publicou, em primeira mão, o mais recente livro de Agustina Bessa-Luís, Fama e Segredo da História de Portugal.
Não é uma estreia absoluta, mesmo entre nós. Alguns blogues são mesmo só literatura. Mas, durante uns dias, um blogue foi casa onde Agustina recebeu. Parabéns, JPP.
«E o que fizemos nós da educação?»
Destaco para aqui o comentário de Jorge Carvalheira ao post «É proibido ensinar. Aprender é vergonha». Trata-se de um texto notável do autor dos magníficos contos O Mensário do Corvo (Quasi, 2002).
Excelentíssimos senhores, alto aí e pára o baile, que tudo o que é demais parece mal! Sobretudo parece mal gastar tanto latim a repetir o que já foi dito mil vezes em vão. Só pode ser um exercício de desobriga de consciência. Está de acordo com a quadra, mas não deixa de ser uma vilania.
Deixem-se por isso de gestos de virgens ofendidas, como se fosse cair o carmo e a trindade, como se a tragédia da educação nacional fosse algo de surpreendente, de inesperado e único. É que a pátria inteira é feita de gestos tais há muitos anos, mas os senhores não querem saber disso, porque todos nós assobiamos para o ar e não queremos ver isso, porque é demasiado mau de ver, e porque nos fizeram assim.
Os senhores são cidadãos dum país que já tinha dignidade e alma, num tempo em que suecos, helvétivos, finlândios e dinamarcos ainda não tinham saltado a cancela do curral da barbárie. No tempo do rei Dinis os portugueses arroteavam terras, afiavam as lanças, construíam castelos e não se queixavam de ser pobres.
Os senhores pertencem a um povo que um dia foi levado para a Índia “ao cheiro desta canela”, ao serviço de interesses que nunca foram os dele, mas que por lá ficou até hoje.
Os senhores viram este povo gastar 500 anos a fazer filhos às pretas debaixo do embondeiro exactamente como os cafres, a merecer o estatuto de cafre da Europa, exactamente como se cafre fosse. Isto enquanto a Europa ia à escola e à oficina, e experimentava, e inventava, e progredia.
Os senhores viram este povo, ao longo de séculos, ser conduzido por elites crapulosas que sempre o cavalgaram com desprezo, e como alimento da barriga só lhe serviram mitos de fumo e nevoeiro. Os senhores viram o que foi feito de tanta riqueza que chegou nas caravelas, e puderam ver já que o mesmo destino tiveram os fundos que vieram da Europa, sem proveito nenhum para o país. Os senhores viram este povo, no séc. XIX, no tristíssimo papel do urso de feira, governado por estrangeiros, comido vivo por ingleses e outros filhos da puta civilizados, tentando apenas e sempre sobreviver à miséria.
Os senhores viram este povo a pagar as facturas da Índia em La Lys, viram-no a pagar as facturas do império na guerra das colónias, viram-no a fugir da fome, a salto, para a Europa, aos milhões, com a alma atulhada de mitos heróicos e putrefactos. Os senhores viram este povo a meter à força na cabeça que o ponto mais alto da pátria era o pico do Ramelau, na parte leste da ilha de Timor.
Os senhores viram este povo um dia fazer em desespero as atrasadas contas com a história e tomar o freio nos dentes. Tão bem tomado ele foi, e tão grande era a culpa histórica, que a clique dos poderosos, dos inteligentes, dos cosmopolitas, fugiu toda para o Brasil e ainda hoje não anda muito à vontade por aí. Tão bem tomado ele foi que o Moreira Baptista se borrou pelas calças abaixo no quartel do Carmo. Os senhores viram este povo voltar a casa, depois de 500 anos de forrobodó, e encontrar a casa em ruínas e a horta por cavar. E viram como, em oportuna manobra de recurso, este povo foi levado a integrar-se na Europa, que era afinal a sua terra, mas onde não teria lugar sem sofrer uma aturada catequese.
Depois disso o que fizeram os senhores, o que fizemos nós todos, o que fez este povo de si mesmo, da vida, da liberdade que tinha? O que fizemos da pouca indústria, o que fizemos das pescas, o que fizemos da agricultura, o que fizemos da justiça, o que fizemos da saúde, o que fizemos do dinheiro alemão, o que fizemos nós da educação?
Pois fizemos o que somos capazes de fazer. Pusemos tudo num pandemónio, levámos a banca à glória, porque desde a Índia (de Ceuta?) havíamos trocado uma boa capa por um mau capelo.
Somos óptimos, individualmente, e a trabalhar sob um capataz alemão. Colectivamente, não sabemos governar-nos, não temos capacidade para gerar uma elite que nos dirija. Somos desorganizados, corruptos, irresponsáveis, infantis, cafres, cafres, cafres. Os espanhóis viram-se livres da gangrena imperial, que também os aniquilou, há 100 anos. Nós apenas ontem. É o tempo que nos falta, para atingir a modernidade.
E o que fizemos nós da educação? Entregámo-la ao “génio” do PPD durante mais de 20 anos consecutivos. Demos-lhe o Deus Pinheiro, e a Manuela Leite, e um tal Couto dos Santos, e outros tantos. Demos-lhe a Weltanschauung do Cavaco, e demos-lhe o Roberto Carneiro, que talvez soubesse o que fazia e por isso mesmo se demitiu. Só nos faltou dar-lhe o saber do Dias Loureiro, porque esse fazia falta na polícia. E a subtileza de catrapilo do Jorge Coelho, atarefado a construir o túnel por baixo da Serra da Estrela.
Agora, 1200 criancinhas por ano vão aos fagotes à professora na sala de aula. E nós queixamo-nos de quê?
JORGE CARVALHEIRA
A despedida que antes de o ser já o era
Na verdade nunca escrevi com a regularidade que esperava no Aspirina. Por isso, acabo por partir sem nunca ter realmente chegado. Na adolescência, quando aparecemos em casa quando nos dá na bolha e saímos quando nos apetece, as nossas mãezinhas costumam dizer, num momento de irritação: «isto aqui não é uma pensão». Por isso, muito obrigado por me abrirem as portas da vossa casa que indecentemente eu tratei como uma pensão. E as minhas desculpas pela falta de assiduidade. Voltarei brevemente à blogosfera, com mais tempo e disponibilidade. Abraços a todos.
Blogues, jornais… e livros
«O monopólio da “verdade” e da palavra, detido em teoria no passado pelo poder político, pela imprensa tradicional e pelas editoras, já se entendeu que só se impunha ou parecia impor-se por não haver possibilidade de lhe opor uma concorrência séria. Mas hoje há gente a escrever nos blogues com competência e lucidez iguais ou superiores às dos jornalistas», escreve João Camilo no seu blogue Blue Everest, no post «Blogues e jornais: crédito?».
Se desejar ler mais João Camilo (desde há muito, professor universitário na Califórnia), passe pela livraria e peça Retrato Breve de JB, editado pela Fenda. É a reedição de um livro revelador, saído em 1974, triturado pela revolução. Ainda vamos a tempo. Do livro. E da revolução.
Eu também quero ser coglione
«Contra os coglioni, marchar, marchar», grita o Cavalieri Berlusconi, cada vez mais desesperado. Mas os coglioni agigantam-se. E talvez o tirem finalmente do poder, onde esteve demasiado tempo, a fazer demasiados estragos. Terça-feira saberemos.
A tortura da privação de inteligência
Eis um exemplo da importância política de um pensamento apolítico. As universidades, mesmo em Portugal, têm todas as condições para produzirem saber (r)evolucionário. Basta pensar no assunto — qualquer um.
É proibido ensinar. Aprender é vergonha.
Há muito tempo que andava à procura de quem o disesse melhor do que eu alguma vez o conseguiria. E encontrei. No Expresso de sábado passado, Guilherme Valente, o editor da Gradiva, citava o francês Laurent Lafforgue, expulso do Haut Conseil de l’Éducation, por ter afirmado coisas como isto:
«Depois de ter começado a interessar-me seriamente pelo estado da educação no nosso país (…), cheguei à conclusão de que o nosso sistema de ensino público está em vias de destruição total. Esta destruição é o resultado de todas as políticas e de todas as reformas conduzidas por todos os governos a partir dos anos 60. Essas políticas foram desejadas, aprovadas conduzidas e impostas portodas as instâncias dirigentes da Educação Nacional, particularmente pelos famosos especialistas da Educação Nacional, os corpos de inspectores (recrutados entre os docentes mais dóceis e submissos aos dogmas oficiais), as direcções das administrações centrais, as direcções e corpos de formadores das IUFM dominados pelos famosos didactas e outros especialistas das ditas ‘ciências da educação’, pela maioria dos especialistas das comissões de programas, em suma, pelo conjunto da nomenclatura da Educação Nacional. Essas políticas foram inspiradas a todo o sistema por uma ideologia que consiste em não conferir valor ao saber e que quer fazer prioritariamente desempenhar à escola não a instrução e a transmissão do conhecimento, mas outros papéis, na crença imposta em teorias pedagógicas delirantes, no desprezo pelas aprendizagens fundamentais, na rejeição do ensino organizado, explícito e progressivo, no desprezo pelos conhecimentos de base ligados à imposta aprendizagem de conteúdos nebulosos e desproporcionados, na doutrina do aluno ‘no centro do sistema’ e que deve ‘construir ele próprio os seus saberes’. Esta ideologia dominou igualmente as instâncias dirigentes dos sindicatos maioritários (…). Toda esta gente não tem hoje outro objectivo que não seja o de alijar a sua responsabilidade e mascarar por todos os meios a realidade do desastre. Confesso não saber se têm agido de boa-fé, ou se, pelo contrário, não terão organizado deliberadamente a destruição da escola. Também não sei quais de entre eles – uma minoria certamente – não participaram nesta loucura colectiva, nem quais, tendo participado, têm hoje consciência das consequências dramáticas dos erros acumulados desde há dezenas de anos e estarão hoje dispostos a partir numa outra direcção. ‘A priori’, tenho a mais extrema desconfiança relativamente a todos os membros da nomenclatura da Educação Nacional».
[ Leia-se, no Expresso, o artigo todo de Guilherme Valente. Nunca as mãos lhe doam. ]
Também em Portugal é bom tom não ensinar («Somos todos alunos», não é?) e é melhor tom não aprender (exige disciplina, essa coisa chatíssima). De todas as desgraças que a correcção política nos trouxe, esta é a mais desgraçada: porque priva as crianças do direito a desenvolverem-se. E o que sobra… é essa prática contentinha do professor que nada exige e nada ensina, porque poderia ser acusado de querer ensinar. Sobram essas pedagogias «delirantes», esses «conteúdos nebulosos», essa «loucura colectiva» dos senhores pedagogos e seus chefes, para quem tudo está sempre muito bem, porque até a sugestão do mais parvo dos néscios é… aproveitável. Isto é uma mentalidade de Esquerda? Receio que sim, e desta Esquerda me envergonho.
Somos poucos os que não temos vergonha de ensinar. Mas, quem sabe, atingiremos alguns que não tenham medo de aprender. Eles são a reserva do futuro.
E então? Foi tão bom para vocês como foi para mim?

(não quero deixar de agradecer todas as muitas mensagens de apoio que recebi)
Porque é Abril, mês da direita fugir para o Brasil, decidimos lá em casa fechar portas (salvo seja) no dia 8. E enquanto não fechamos, nem fugimos, podem sempre encontrar-me no Frágil (salvo seja). Não sei se a blogosfera acaba ou não, mas deixa de fazer muito sentido continuar no Aspirina.
Vim cá parar em regime de artista convidado porque o Luís Rainha e o José Mário Silva devem ter exagerado no vinho e eu, já se sabe, estou sempre exagerado. Não sei se estão arrependidos. Sei que eu não estou. Sei que me diverti, muito. Sei que escrevi sempre o que quis, como quis, sem dar cavaco (salvo seja, cruzes credo) a ninguém. Sei que as ilustrações do Jorge mereciam melhor companhia que os nossos escritos. Sei que vi o fundo da garrafa ao Nuno e ao Fernando e que gostei (salvo seja). Sei que isto acaba com o Luís a fazer rodriguinhos e o Valupi a fazer graçolas à Deus. Sei que até o Daniel Oliveira me vai fazer falta (salvo seja, mesmo!). Não consegui conhecer a Joana Amaral Dias, mas que se lixe, vou daqui de barriguinha cheia (salvo seja).
Gosto do Aspirina (e não é só por causa dos meus textos) e para continuar a ler os aspirineiros, espero que o projecto continue. Nem que seja só para o João Pedro Henriques não ter razão.
Se os leitores do aspirina tinham a certeza de que a minha direita é decadente, espero que tenham aprendido que a minha direita até gosta bastante desse estatuto.
Deus existe, eu avisei-vos.
Até amanhã, camaradas!
Rodrigo Moita de Deus
O jornalismo que teima sair do armário
Última página do Diário de Notícias. Leio com gosto a crónica do editorialista. A assinatura prende-me o olhar. Ruben de Carvalho, jornalista. Jornalista?
A última vez que ouvi falar de Ruben de Carvalho, para além das crónicas, foi como candidato à câmara municipal de Lisboa pelo Partido Comunista Português. Uma organização sobejamente conhecida pelos seus independentes.
Ruben de Carvalho, o jornalista, é jornalista como Diana Adringa, Mega Ferreira, Marcelo Rebelo de Sousa, Paulo Portas, Maria Elisa, Vicente Jorge Silva, José Saramago, Maria João Avillez e outros nomes na mesma da isenção ideológica.
Jornalista, porque é mais fácil, mais cómodo, mais popular.
Tenho para mim a secreta tese de que poucos jornalistas gostavam mesmo de ser jornalistas. Jornalistas de economia gostavam de ser empresários, jornalistas desportivos gostavam de ser treinadores e jornalistas de política…enfim, vocês sabem. E como também se nota, jornalistas que escrevem notícias, gostavam mesmo de escrever editoriais.
Não me interpretem mal. Compreendo que os jornalistas sintam a necessidade e a apetência pela participação cívica. Compreendo que não possam ser insensíveis às suas convicções e até vou mais longe admitindo que o jornalismo de causas e de opinião é, não só, legítimo como até desejável.
O que a mim me causa algum rubor é o teatrinho de sombras. Esta coisa do “agora sou isento mas amanhã já não sou”. Como se as convicções fossem pecado ou razão para ter vergonha. E porque alguém entendeu um dia que os jornais e os jornalistas têm se ser isentos, independentes e amorfos intelectualmente acabamos nesta ridícula figura de apontar o dedo à braguilha uns dos outros trazendo à liça o humorístico código deontológico.
RMD, Jornalista.
Perdidos no paraíso

Que eu iria encontrar na Irlanda um país de alguma fartura, já o sabia. Que havia nele estranhas bolsas de pobreza, já estava avisado. Mesmo assim este burguês à son insu estranhou.
O contraste era visível, tanto em Cork como em Dublim. Não há, decerto, aquele luxo espampanante e paspalho dos casacos de peles de Estocolmo ou de Dusseldorfe. Para tanto, os irlandeses são gente com outro tino. Mas o que havia já contrastava que chegasse com a pobreza em fato de treino: a perplexidade nos rostos, a falta de perspectivas por trás do olhar.
Explica o geógrafo galego Xoán Paredes que não é por falta de emprego nem de dinheiro. Emprego há-o, e dinheiro há-o até a mais. O que existe é um Estado ultra-protector, católico a mais não poder, e amigo dos pobrezinhos, que ele sustenta sem integrá-los. Uma «dependência crónica», no dizer de Paredes, eis o resultado. À falta de mais interesses, o dinheirinho vai para a bebida. E assim os vemos em bandos pelas ruas, esses moços de 18, 20 anos, nos olhos uma noção do tempo já esboroada. Lost in Paradise. Como se dirá isto em irlandês?
Vão longe os tempos em que – modestamente – um insuspeito sugeria se engordassem os bebés irlandeses e se os servisse à mesa dos ‘bifes’. Para os miúdos perdidos nas ruas de Dublim, tanto se lhes daria. E sempre teriam tido uma bela vida.
Eu que não sou de intrigas…
Está a ser estudado o encerramento de alguns dos 11 departamentos da Polícia Judiciária no país. diz o ministro na TSF.
E antes mesmo que alguns, mal intencionados, com a mania que têm graça, venham com as suas inacreditáveis conspirações posso garantir-vos, em nome do governo da república, que o encerramento de departamentos e a actual instabilidade directiva no seio da organização não afecta, de maneira nenhuma, o normal desenrolar dos processos, mesmo os mais sensíveis, como o caso Freeport ou o caso dos tabuleiros de xadrez de Jorge Coelho. Perceberam? RMD
Interrompemos a programação para um post não fracturante
E o jogging? Como correu o jogging?
Foi uma entrada directa no top dos fellatios jornalísticos: “Um dia de sucesso diplomático que já estava preparado” diz o Diário de Notícias sobre a viagem do nosso amado Primeiro a Angola. Reparem que o avião aterrou faz poucas horas mas a viagem é já “um sucesso diplomático”. E é. Pois é. Em Portugal deu, pelo menos, umas doze ou quinze páginas nos principais diários. E depois aquele “que já estava preparado” do género “um governo que prima pelo planeamento e que sabe o que está a fazer”. Vou ali beber um copo de vinho e já volto.
Em quase todos os jornais, o destaque é o jogging do nosso líder. Que se lixe a fome, a corrupção, a liberdade de imprensa ou qualquer outra miudeza que possa ensombrar o relacionamento entre nações civilizadas. O primeiro vai fazer jogging para a marginal às oito da manhã. O Público informa que a coisa “não estava no programa”. Era quase segredo e o engenheiro sempre foi bastante discreto quanto à sua vida. Por exemplo, nunca ninguém sabe onde vai passar férias ou que desportos gosta de praticar. E esta só se soube por causa de uma “inconfidência” de um dos parceiros de passada do engenheiro. E que grande inconfidência esta. Os jornalistas de diferentes órgãos de comunicação ficaram todos a saber e publicaram todos a boa nova.
Não podemos desvalorizar esta coisa do jogging. Antes de Sócrates já personalidades como Tony Blair e Bill Clinton deram a conhecer-se às massas pelas suas correrias. Guterres ainda tentou duas ou três vezes, mas a prática da modalidade era incompatível com o corte de cabelo. No caso de Bill Clinton o exercício físico para a fotografia nunca compensou o excesso de hambúrgueres e o homem lá teve baque no coração. Era jogging para americano ver. Mas isso não interessa a ninguém. O que realmente interessa é que o jogging é uma trademark da terceira via. Marques Mendes que se cuide e que mude de modalidade.
Tudo normal. O que eu não acho normal é obrigarem os jornalistas a viajar sete horas, escrever três ou quatro mil caracteres sobre o assunto. Ao invés de aproveitarem a viagem para fazer perguntas interessantes podiam simplesmente fazer copy paste dos comunicados de imprensa da central de propaganda sem deixar o conforto da redacção. RMD
Consultório sentimental

(o outro Rodrigo igualmente fantástico e merecedor dos maiores louvores)
Sobre o défice de criatividade do país, um anonymous atira quase certeiro: e a betalhada a por Rodrigo no nome dos filhos?
O fenómeno existe e preferia explicar-lhe que a superabundância de Rodrigos se destina a honrar-me. Incomprensívelmente não é assim. Nem sequer está relacionado com a betalhada.
Explico. No meu tempo, só havia dois Rodrigos: o da fotografia e Deus. Mas desde que o Tozé Brito (esse criativo) começou a fazer as novelas da TVI e desde então não há cabeleireira que não acabe com um filho Martim, Bernardo, Francisco e sobretudo Rodrigos. Resmas deles. Admito que sempre é melhor que Suelanias, Edinilsons e outros que mais. Admita que é especialmente irritante para os dois Rodrigos que já cá estavam. RMD
flabbergasted…
Leio que o Manuel Fonseca abriu uma editora de nome Guerra e Paz. Uma editora chamada Guerra e Paz? Guerra e Paz? Porque não ‘Os Irmãos Karamazov’ ou “Cousine Bete”?O que leva alguém a chamar Guerra e Paz a uma editora? E já agora porquê chamar “Por do sol” a um restaurante, “25 de Abril” a uma praça, “rouxinol” a uma bibenda, “sol e mar”a uma pensão, “snoopy” a um cão? RMD
Mais três achegas para confirmar a superioridade moral da Civilização Ocidental

1- após o final da II Guerra Mundial, os ingleses montaram os seus pequenos sucedâneos de Auschwitz, onde foram interrogados alguns suspeitos de comunismo. Tortura, privação de sono, falta de alimentação, uso de adereços surripiados à Gestapo; tudo valeu para sacar informações aos detidos.
2- no Afeganistão, local da primeira batalha da “guerra de civilizações” e país recentemente arrancado às garras do fundamentalismo, a Justiça já se distanciou das práticas bárbaras dos talibans. Agora, os corpos dos condenados só são expostos por períodos decentes e o estádio de Cabul deixou de ser palco de execuções e amputações públicas; as autoridades andam em busca de um local decente para tais espectáculos. Ah: hoje em dia, os adúlteros são, ó cúmulo do humanismo!, lapidados com “pedras mais pequenas”.
3- as forças armadas dos EUA ponderaram seriamente a hipótese de assassinar civis e militares americanos só para terem à mão um bom motivo para invadir Cuba.
