Ontem de manhã, reparei que a minha cadela tinha sangue no focinho. Quando lhe abri a boca, vi que a parva tinha estado a roer um pedaço de vidro branco muito afiado com cerca de dois centímetros e que sangrava das gengivas. Retirei o vidro e perguntei-me onde teria ela encontrada esse pedaço de vidro absolutamente triangular e aguçado que nem uma lâmina. Fiz uma rápida inspecção à casa, temendo o pior, mas não consegui encontrar nenhum objecto partido. Deitei o pedaço de vidro no saco do lixo e, como medida de precaução, tive a pachorra de fechar o saco e de o deitar lá fora, no contentor da rua. Quando voltei, desinfectei o corte na gengiva da cadela, que parou imediatamente de sangrar.
Durante a noite, fui acordado abruptamente por um estrondo. Lembro-me vagamente de um movimento brusco do braço e de sentir a mão bater num objecto. Ao tentar acender a luz, não encontrei o candeeiro – ele tinha caído ao chão, partindo-se em mil bocados. A cadela, assustada, começou a ladrar. Lá me levantei muito contrariado para apanhar os pedaços de vidro espalhados pelo quarto e foi então que reparei num pedaço de vidro branco. Com cerca de dois centímetros. Absolutamente triangular. E aguçado que nem uma lâmina. Uma lâmina manchada de um sangue que não era meu.