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inConstâncio

Esteve bem quando se zangou contra quem acusa a supervisão do Banco de Portugal de ter falhado. A sua razão nem carece de demonstração, basta conhecer a superficialidade e irresponsabilidade das acusações.

Esteve péssimo, segundo o critério do interesse público e valores correlativos, ao deixar António Marta só contra Dias Loureiro. É claro que a versão de Dias Loureiro não tem ponta por onde se lhe pegue, mas a falta de coragem é sempre nefanda. Pura e simplesmente, não se acredita que o encontro com Dias Loureiro não tivesse sido relatado ao pormenor a Vítor Constâncio. O Governador está a fazer diplomacia, sacrificando a credibilidade.

Encavanço

Dias Loureiro resolveu fazer bluff e apostou tudo contra o Banco de Portugal e a Presidência da República – numa espectacular fuga para a frente. Isto faz dele um imbecil de grau 10 na escala Loureiro (a qual só tinha 5 graus até à passada sexta-feira).

Pensar que poderia pôr em causa Vítor Constâncio, acabando com ele de vez, vai revelar-se um tiro saído pela culatra aquando da ida do Governador, hoje, à RTP. Para as crianças no auditório, o terceiro homem na reunião de apenas dois em 19 de Abril de 2001 às quatro da tarde* é o Vítor, o tal que já disse não ter recebido de António Marta nenhuma informação relativa a problemas no BPN. Falta só a Constâncio manter a constância e assinar a certidão de óbito: confirmar que Dias Loureiro foi ao Banco de Portugal, em 2001, protestar contra os apertões do supervisor. Para tal, basta assumir que Marta lhe contou o teor do encontro, como é altamente previsível que o tenha feito.

Todavia, é no ataque à Presidência que Dias Loureiro se revela uma figura a merecer grande romance, filme grande e série de televisão grandalhona. Na entrevista, o nome do Presidente da República foi apresentado como caução da sua inocência. 23 anos de amizade com Cavaco eram o trunfo com que pretendia cortar a vasa da suspeita. Como poderia ele ter prevaricado se o próprio Presidente conhecia os seus padrões morais e éticos? Esta soberba afirmação não oferece sombra de dúvida: Cavaco entrou de cabeça no caso BPN. É uma daquelas situações em que se sabe como se entra, mas não se faz a menor ideia como se vai sair.

Um dos cenários possíveis será o de uma inédita derrota na eleição ao 2º mandato. Eanes, Soares e Sampaio fizeram o pleno dos 10 anos na presidência, e todos auguram o mesmo para o presente inquilino do Palácio de Belém. Todos? Não, há um ex-ministro de Cavaco, eminência parda do PSD e actual Conselheiro de Estado, apostado em criar uma originalidade na História da democracia, pois não é possível ao Presidente manter o apoio a Dias Loureiro sem com isso perder a confiança do País. Contudo, como este figurão já saltou para as costas de Aníbal e anunciou que não vai largar, fazê-lo cair vai partir muita loiça. O seu bluff é de tal ordem – atente-se: consegue chantagear Cavaco na TV, que não fará aos outros? – que a própria continuidade de um partido chamado PSD está agora mais em causa do que nunca. Este não é tempo para loucos como Filipe Menezes, incapazes como Ferreira Leite, deprimidos como Pacheco Pereira, decadentes como Pulido Valente ou malabaristas como Rebelo de Sousa. Este é o tempo para sociais-democratas com eles no sítio, capazes de aproveitar a queda de um império para levantar uma civilização.

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* Dias Loureiro, na entrevista e declarações pós-desmentido de António Marta, repetia a oração 19 de Abril de 2001 às quatro da tarde como um mantra. É um dos vários sinais de ser muito provável estar a mentir, procurando realçar uma parte indiscutível, mas irrelevante, da ocorrência como prova de certeza em relação ao todo. O mesmo para o raciocínio primário com que reagiu ao desmentido: [...] peço às pessoas que pensem um bocadinho e ponderem se agora, no momento em que o BPN e a SLN estão a ser alvo das maiores suspeitas, alguém de bom senso acha que eu iria invocar uma conversa com o Dr. António Marta se ela tivesse sido aquela que ele disse que foi? Bom, estamos perante um clássico da argumentação falaciosa, pois são precisamente as maiores suspeitas que justificariam esse acto desesperado. A cultura de impunidade e cumplicidades com os poderes político e económico toldaram-lhe o discernimento e levaram-no para um modus faciendi a que eventualmente estará acostumado, só que agora servindo a ameaça de arrastar tudo e todos na queda. Tal é a profundidade do encavanço.

Afinal, que faz na vida Marcelo Rebelo de Sousa?

De Marcelo não devemos esperar uma análise crítica da política, nem juízo moral da sociedade. Para o primeiro exercício, falta-lhe independência. Para o segundo, sobra-lhe mundanidade. O que ele faz é outra coisa: relações públicas. Os seus clientes são escolhidos por critérios que escapam ao escrutínio público, sendo essa a regra do jogo. Se soubéssemos quem eram os clientes, não suportaríamos a sua defesa. Talvez os clientes sejam escolhidos apenas pelo capricho de um inveterado inventor de factos políticos, ou resultem de uma qualquer estratégia que lhe organiza todo o discurso, até os livros que despacha capados. Seja como for, é superficial; portanto, irresponsável. Por isso é complacente com Manuela Ferreira Leite, Cavaco e Dias Loureiro.

Fica uma questão: se Marcelo conseguisse despir a camisola dos seus amigos e vestir a da comunidade, como seria a política em Portugal?

Estamos em risco de perder um comentador político

Imagino uma escola em que uma professora de meia idade entra na aula e olha para trinta bárbaros vestidos de igual, dizendo grosserias e obscenidades, entre telemóveis ainda vivos e fios dos MP3, entre roupa “de marca” comprada na feira do Relógio e cabelos em bico com gel, os rapazes a pensarem no wrestling e no skate e as raparigas vestidas para matar a pensarem nas fotos que vão colocar em trajes menores no Hi5. Que olhar pode ter a professora, já com várias aulas em cima, para uma audiência desatenta que a última coisa que quer saber é o que é uma raiz quadrada ou um soneto, numa sala húmida e pouco iluminada, perdida num subúrbio policiado?

Pacheco Pereira tem cada vez menos contacto com a realidade e, ainda por cima ou em consequência, anda deprimido. O seu estado leva-o a esta surpreendente vocação para a comédia, exibida supra. Mas também poderá ser tentativa de suscitar convite para entrar na equipa de argumentistas dos Morangos Com Açúcar.

No país dos loureiros – X

O caso BPN, independentemente dos resultados que as autoridades venham a apurar, e das respectivas consequências, permite retirar já duas lições da maior utilidade para qualquer português:

1ª – Caso te vejas à frente de Grupo detentor dum banco e com negócios nos sectores da agro-indústria, tecnologias de informação, cerâmica, cimentos, seguros e saúde, não faças reuniões com mais de duas pessoas. Estás a perceber? Mais de duas pessoas, por exemplo 9 ou 3, é demais. Evita. Reuniões com duas pessoas são aquelas que implicam a presença de outra pessoa para além de ti, mas é só. Estás a perceber? Se percebes isto, estás pronto para contratar ex-ministros do PSD.

2ª – Caso sejas ex-ministro do PSD, e tenhas de tratar de algum assunto no Banco de Portugal, não digas nada no local de trabalho, pede ajuda a um outro ex-ministro do PSD, e vai lá sozinho. Depois, pede para falar com o vice-governador a sós. Se for preciso, conta o episódio 7 anos mais tarde. Mas só se for mesmo preciso, não há qualquer necessidade de andar a chatear as pessoas com este tipo de assuntos.

No país dos loureiros – VII

Mas tem que estar nas contas o prejuízo! E ele diz “E está”. “Você não sabe contabilidade”. ‘Távamos os dois. “Venha cá daqui a duas horas que eu explico-lhe tudo, tenho que ir procurar aqui nas contas onde é que isso ’tá” e tal… E mostrou-me 10 itens, para aí, onde ele diz “Onde eu reflecti o prejuízo de tudo isto. Está aqui reflectido. Se reparar, agora as contas estão auditadas. Vá ver as reservas que há, se há reservas, se não há. Portanto, neste ponto, do ponto de vista legal, ’tá tudo bem e pode assinar as contas”. Portanto, para mim, acabou aí o negócio de Porto Rico. Foi, toda a minha conduta foi esta e nada mais do que esta.

No país dos loureiros – III

Oliveira e Costa, devo dizer, é um homem brilhante! É um homem brilhante, um homem muito inteligente, um trabalhador incansável. Eu não acredito, se quer que lhe diga, que ele tenha alguma vez lucrado pessoalmente com alguma coisa que lhe tenha corrido mal naquele banco… naquele banco ou naquele Grupo. É a minha convicção pessoal. Ele pode ter feito o que fez, não sei, não faço ideia, ele saberá. Agora, não acredito que ele tenha feito isso para seu interesse pessoal. O que eu vi foi sempre uma dedicação… Vi que ele tinha um sonho.

Começou o julgamento do cavaquismo

O cavaquismo está por estudar. Tal deve-se a diferentes razões, a principal sendo a permanência dos seus responsáveis em posições de alto, e fundo, poder. Outra razão de peso está nos agentes da comunicação social, onde não há protagonistas independentes. Todos os grandes grupos querem apenas fazer negócios, não denunciar aqueles com quem negoceiam. No plano individual, para reforço do mesmo, o fenómeno mais fácil ao cimo da terra é o de comprar jornalistas. O jornalista português, por formação e faro, não quer investigar. Se confidenciar a alguém, colega, familiar ou amigo, esse seu desejo, ouve logo pedidos alarmados para não o fazer. A cobardia é sistémica, e conforta. Mas, se mesmo assim insistir em investigar, e se, por talento ou sorte, chegar a algum conteúdo comprometedor, não irá resistir às prendas que o esperam, as quais são sempre muito mais eficazes do que as ameaças. Aqueles que são comprados transformam-se em aliados, enquanto os que são apenas ameaçados até podem ter a infeliz ideia de optarem pelo martírio, o que seria uma chatice. É por isso que em Portugal não há corruptos presos ou acusados ou expostos. É por isso que em Portugal até as equipas de investigação se baralham e conseguem encrencar os processos. Se preciso for, roubam-se uns computadores, desaparecem umas provas, as testemunhas desdizem-se. Finalmente, os partidos da esquerda radical não querem combater o suposto inimigo, apenas garantir um espaço à mesa. Os seus recursos, próprios e legais, não são utilizados para o estudo e diminuição da corrupção que lhes dá lenha para os inflamados discursos. Assim, o cavaquismo está por estudar. Ou melhor, está agora a ser estudado no Tribunal Central de Instrução Criminal através da observação desse espécime chamado José Oliveira e Costa. Amanhã, na RTP, teremos outro grande momento para a ciência, com Dias Loureiro. Caso algum dia se disseque um cavaquista de calibre equivalente ao destas figuras, as descobertas mudarão a História de Portugal.

Pateta Alegre

Manuel Alegre fica bem em Portugal. Não faz parte da esquerda caviar, antes é lídimo representante da esquerda robalo e perdiz, herdeira latifundiária. Na sua juventude foi um romântico, um aventureiro, e um romântico aventureiro. Deve ter comido gajas até mais não, num frenesim a misturar poesia, boémia coimbrã, cantorias, revolução, clandestinidade internacional e anos 60 e 70 muito libertinos e muito ganzados (se não comeu, tivesse comido). Na política pós-25 de Abril ficou sempre na prateleira, tornando-se numa jarra decorativa tanto no Parlamento como no PS. O dia 22 de Janeiro de 2006 foi o mais feliz da sua vida passada e futura, pois ficou à frente de Soares nas eleições presidenciais, tendo obtido votação superior a 1 milhão de votos e o 2º lugar. Qualquer um destes três resultados já teria correspondido ao acúmen da sua carreira política, mas juntos só encontram análogo no que Salomão terá sentido aquando da festa de inauguração do Templo. Desde esse dia que adormece a rememorar a noite das eleições, os gráficos, os jornalistas, os abraços, os telefonemas, os charutos, a cara do Soares a assumir o desastre e, no final, descendo em catadupa, os algarismos que perfazem o número 1000000. Ei-los galhardamente alinhados, brilhantes e tonitruantes, ocupando a extensão máxima do ecrã mental. Depois, sorridente, adormece. É isto todas as noites, vai para 3 anos.

Na última entrevista, só se aproveita o momento em que diz gostar de falar com Sócrates. O modo como o diz é sincero, menino. E nós ficamos a imaginar a franqueza dos encontros. O resto é uma continuada celebração narcísica, revelando que os seus 72 anos têm algo de pateta. E tudo de Alegre.

Contexto, pretexto e subtexto

CONTEXTO

Ela está a fazer uma hipérbole, e não uma ironia, quando projecta a imagem de um período sem democracia e outras afirmações congéneres. Por isso alguns constataram que o registo de voz não transmitia duplicidade de sentido, inerente à ironia. Tratou-se, isso sim, de uma declaração sincera através de um recurso retórico que só por má-fé, ou preguiça intelectual, é ocasião de vitupério.

PRETEXTO

O PS perdeu uma excelente ocasião para ficar calado. Essa – e por várias razões, até para aproveitar inteligentemente o letal embaraço – teria sido a melhor opção. Ao invés, saiu uma declaração emocional disparatada que só criou ruído e desviou o foco do alvo.

O PSD continua refém da imbecilidade, vindo falar no Sócrates e seu autoritarismo. É preciso ser-se muito estúpido, adiante e etc.

Os blogues que debocharam estão certos: os blogues estão ao serviço das palhaçadas. Pelo menos, é isso que eu faço.

Menezes veio, mais uma vez, pedir ajuda. Está louco. A sério. Mas teve supina graça ao falar em golpe de Estado a propósito da sua demissão da presidência do PSD. Raia, ou ultrapassa, a genialidade.

SUBTEXTO

O mais interessante, e o verdadeiramente interessante, está no subtexto das declarações. E há duas dimensões:

– Por um lado, ela revela-se incapaz de lidar com a complexidade, e aparece perigosamente adepta de um voluntarismo que tresanda a impaciência ou ignorância. Esta hipótese é consistente com o seu percurso político e respectivos resultados. A escolha da solução City Bank, por exemplo, não teria sido, afinal, a vitória do que parecia mais fácil? Inclusive, esta hipótese permite consolidar uma explicação retrospectiva para Barroso a ter preterido em favor de Santana.

– Por outro lado, ela está a expressar um pensamento comum na direita mais comum, o de que não vale a pena fazer reformas. Isso está à vista com o conflito na educação, o qual nunca teria acontecido com Governos PSD ou CDS. Então, o que as declarações também transmitem é um fundo elogio a Sócrates, juntamente com a assunção de impotência própria.

CONCLUSÃO

A Manela é uma menina mimada, indicada para segundas linhas e, ainda mais agora, para papéis simbólicos. Prestará um superior serviço ao PSD, e ao País, se encontrar rapidamente um sucessor que consiga distinguir entre o mau e o pior, o bom e o melhor. Atacar um Governo reformista é sempre o pior, mesmo quando pareça mau não ter alternativas, pois se está a atacar Portugal. Não, esse ser não se chama Passos Coelho.