Se houvesse alguma dúvida de que não era mais possível suportar uma “situação” sustentada apenas na chantagem e no desprezo pelas mais elementares regras da democracia, o gesto final deste tiranete vindo das Beiras encarregou-se de a desfazer.
Zé Manel
__
Em sintonia com a Fernanda, também eu me deslumbro com a decadência do PSD. É um partido que não produz pensamento e é alérgico à inteligência, mas cujos quadros e conselheiros habitam no topo da pirâmide social, tendo acesso às melhores fontes onde se poderão informar e instruir. A sua ocupação, ubíqua, da comunicação social implica que tenham à mesma de produzir um qualquer discurso. Sem surpresa, é o discurso da hipocrisia mais obscena e do ódio. A surpresa vem da longa duração deste miserável registo, que incrivelmente – depois de uma violenta e opressiva campanha de assassinato de carácter contra Sócrates, como nunca tinha sido feita em Portugal contra um político – lhes custou as eleições em 2009, e ameaça as de 2011, sem que retirem as devidas ilações. Só que eles não aprendem, nem quando todas as sondagens valorizam uma postura responsável e a favor da governação. A gula e prepotência dos oligarcas precisa das injecções de dopamina que só a instabilidade política oferece quando estão afastados do pote – os interesses dos mais frágeis nunca incomodaram os abastados, não seria agora que tal anestesia iria desaparecer.
A suposta direita nacional (tão estúpida que me recuso acreditar corresponda à verdadeira direita), assim que Ferreira Leite foi eleita presidente do PSD entrou em campanha eleitoral sem outro projecto que não fosse o de vencer pela destruição moral do adversário. Foi um plano concertado com Cavaco Silva, cujos discursos e acções o confirmam para além de qualquer dúvida. Resultou desta indigência política um absurdo intelectual: o grotesco dirigido contra Sócrates – fazendo dele alguém que seria capaz dos esquemas mais sofisticadamente malévolos e criminosos e, simultaneamente, alguém destituído das mais básicas competências governativas – espalhou-se de forma tóxica contra todo e qualquer um que tivesse ligação política, administrativa ou opinativa com o Primeiro-Ministro. Milhares e milhares de cidadãos eram, de repente, agentes e cúmplices de ilegalidades, incúrias e gestão danosa, segundo os publicistas do PSD. Este caldo esquizóide, de acordo com as previsíveis dinâmicas da psicopatologia, gerou fenómenos paranóides, onde quem se atrevesse a manifestar o seu apoio ao Governo era acusado de ser assessor do mefistofélico gabinete, e também fenómenos delirantes, em que se começou a pedir ao PS para decapitar a sua liderança e entregarem a cabeça de Sócrates ao PSD, já que eles tinham chegado ao limite do desespero com tanta derrota e humilhação seguidas às mãos daquele… daquele… monstro!
O Zé Manel, nesta incarnação em que já não precisa fingir ser jornalista, tem sido de uma transparência ofuscante. Ei-lo aqui a desabafar o quanto lhe custa ver um tipo chegado das Beiras a ganhar eleições democráticas. É uma “situação” insuportável, diz-nos febril. Ele, logo ele, o pau para todo o serviço de Belém, que conhece como poucos o que significa o desprezo pelas mais elementares regras da democracia. Dificilmente encontraremos melhor retrato do que é o actual PSD do que o dado por estas infelizes criaturas a ladrar a quem passa na estrada.