Todos sabemos, porque todos os dias disso somos lembrados, que o endividamento é um dos principais problemas do País. Também sabemos que existe uma dívida pública e uma dívida privada, contraída pela banca, empresas e famílias. Portanto, de uma maneira ou de outra, somos todos responsáveis pelo endividamento do País, é o que se conclui. Mas afinal parece que não é bem assim. No último debate quinzenal fomos surpreendidos por uma revelação verdadeiramente espantosa, a de que o primeiro-ministro pertence a uma raça de homens que, não sendo os próprios “a causa do endividamento”, gostam de pagar o que devem. Ele falou no singular, mas não me parece adequado, se o primeiro-ministro fosse um caso único, não seria uma raça, mas sim uma aberração. Adiante. Como é que, ao contrário dos restantes portugueses, esta raça de homens não é responsável pelo endividamento? Somos quase tentados a pensar que é uma raça acabada de chegar de um planeta distante, o que explicaria muita coisa, mas não, temos a certeza que estes indivíduos vivem há muitos anos entre nós. Nesse caso, como é que evoluíram e se distinguiram de todos os outros? Apesar de só agora termos conhecimento da existência desta raça, há coisas que podemos deduzir. Por exemplo, é mais do que certo que esta raça de homens nunca usufruiu de serviços prestados pelo Estado. Nunca frequentaram escolas públicas, nunca puseram um pé nos transportes públicos, nunca viram um minuto de emissão da RTP, nunca recorreram ao SNS, ou melhor, provavelmente, os indivíduos desta raça nunca adoecem. Nunca, mas nunca utilizam as auto-estradas, circulam apenas por estradas secundárias e caminhos de cabras. De certeza que nunca recorreram ao crédito, nem em nome individual nem em nome de eventuais empresas por onde tenham passado, e muito menos se candidataram a quaisquer fundos ou subsídios estatais. E é óbvio que não consomem energia, nem pensar, não contribuem para a factura mais pesada das importações. Aliás, não devem consumir nenhum tipo de produtos importados. Isto é extraordinário, e o estudo desta raça, para além de poder fazer de nós um país riquíssimo, talvez traga a solução para muitos dos problemas que afectam a Humanidade. É só perguntar-lhes qual o segredo. Tem é de ser com jeitinho e com muito cuidado com as palavras, pois, aparentemente, esta raça é muito sensível e bastante medrosa.
Enfim, a Natureza não é perfeita.