Aviso aos pacientes: este blogue é antianalgésico, pirético e inflamatório. Em caso de agravamento dos sintomas, escreva aos enfermeiros de plantão.
Apenas para administração interna; o fabricante não se responsabiliza por usos incorrectos deste fármaco.

O tráfego de influências

A notícia dos 4.500 euros mensais pagos pela Solverde a um primeiro-ministro em exercício, sendo que tal corresponde apenas a um terço do que esse primeiro-ministro recebe de outras empresas e da mesma forma, é uma belíssima ocasião para revisitar o Face Oculta e a originalidade, sem registo anterior na história judicial portuguesa, nem repetição posterior, de se ter condenado um cidadão a 5 anos de prisão efectiva por crime de tráfico de influências. Cidadão ao tempo a trabalhar na banca, numa função comercial onde tinha de se relacionar de forma personalizada com os seus actuais e potenciais clientes.

Suposta influência essa que não gerou qualquer ganho para o suposto pagante, um infeliz e banal sucateiro, e pagamento esse que nunca foi provado pelas autoridades. Mas havia escutas, robalos, e um outro primeiro-ministro que se tinha de espiar e abater. Donde, pois é.

Com o Montenegro, como com Dias Loureiro, Cavaco, Passos, Portas, Relvas, não há escutas de coisa alguma. Ou, quando as há, vigora exemplarmente o segredo de justiça e o pudor dos jornalistas. Estes amigos apenas se entregam ao tráfego de influências.

Curso de ciência política

«Em Portugal havia um partido muito grande pelos princípios do governo absoluto; o partido constitucional começou por pouco, cresceu, formou-se, e elevou-se a uma magnitude tal que hoje está dividido não sei em quantos partidos, mas em um considerável numero d'elles. Em todos os partidos ha gente de todas as qualidades, que professam e que seguem a mesma fé por differentes convicções. No partido que sustentava em Portugal os principios de governo absoluto havia muita gente tão amiga do seu paiz, tão zelosa da independência nacional, tão respeitadora de todas as utilidades públicas, e com tanta auctoridade para se chamar patriota, como qualquer outra que o seja. Mas havia o que tambem ha em todos os partidos, gente que nenhuma consideração d'essas tinha, mas que seguia aquelle partido porque era o mais forte, porque lhe parecia o mais forte, e que o sustentava porque lhe satisfazia, ou promettia satisfazer, ambição, cubiça, todas as paixões boas e más da natureza. Entre os muitos homens que havia n'esse partido, que nos guerreavam, que me teriam sacrificado a mim tambem se me apanhassem, d"onde me vieram, assim como a nós todos, padecimentos, perseguição e extermínio: entre esses homens ha muitos a quem eu hoje e sempre daria a minha mão, a quem hoje e sempre desejaria chamar ao grémio da que supponho melhor communhão portugueza, e estaria prompto a entrar com elles em qualquer negociação politica. Esses homens foram fieis aos seus principios, porque eram seus principios, na honra d'esses homens tenho a garantia de sua probidade politica, que é a base de toda a associação. Mas com aquelles, sr. presidente, que defendiam a usurpação, não por estarem capacitados dos direitos do principe, que tinham posto no throno, mas porque esse principe tinha força; mas com aquelles que nos dizem hoje que já então professavam outras doutrinas, e que assoalhavam doutrinas oppostas, a estes nem a minha mão, nem o meu braço, nem coisa alguma; tenho horror d'elles; tenho mais, tenho nojo.— O ministério que veja aonde estão estes homens: não é do nosso lado. (Apoiados.) O ministério que examine, que veja, que declare debaixo de que bandeira estão os homens sinceramente realistas, e aonde os deshonrados apostatas. O realista é homem que professa os princípios monarchicos como eu, mas que lhe não admittiu até agora as modificações que lhe impõe o pensamento do seculo, que defendeu sinceramente porque sinceramente prezava a monarchia; esse é um homem de bem: posso estimál-o e desejo honrál-o; o renegado miguelista é um infame com quem não quero nada. (Apoiados.)


Garrett : memórias biographicas_Francisco Gomes de Amorim_1884

Revolution through evolution

Small amounts of moderate to vigorous physical activity are associated with big reductions in dementia risk
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Lifestyle and environmental factors affect health and aging more than our genes
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Air inside your home may be more polluted than outside due to everyday chemical products
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‘Healthy’ vitamin B12 levels not enough to ward off neuro decline
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Bar-Ilan University study reveals how being alone can weaken social identity, with broad implications for group processes and societal cohesiveness
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Impacts of workplace bullying on sleep can be ‘contagious’ between partners
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Why GPT can’t think like us
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Assim Montenegro tivesse um plano para o País

Confesso que pensei que o primeiro argumento que Montenegro usaria relativamente à sua actual participação na empresa da família seria o da falta de tempo. Afinal, é o primeiro-ministro de um país,  um cargo com uma agenda bastante preenchida. Mas não. Em vez disso, resolveu partilhar as ideias que tem para o futuro da empresa.  Não teria mal nenhum não fosse o caso de nunca o termos visto tão entusiasmado a partilhar as ideias que tem para o desenvolvimento do país que governa. Só lhe conhecemos as críticas ao governo anterior, denunciando a dificuldade que tem tido em despir o fato de líder da oposição. E o seu maior empenho tem sido o de alimentar a percepção de que os imigrantes, embora necessários, calculo que até na manutenção das suas vastas propriedades, são uns bandidos.

Mas, enfim, se calhar,  a culpa é do raio da lei que o impede de alterar o contacto telefónico associado à empresa.

Da pimenta e do refresco

Luís Newton está metido numa embrulhada judicial e escreveu este texto: Eu, político, me confesso

Obviamente, ignoro se é culpado de coisa alguma. Portanto, para mim não há a mínima dúvida sobre a sua actual condição de inocente. Era preciso tomar conhecimento de uma condenação transitada em julgado a respeito do caso para eu mudar de opinião. Ou então pagarem-me para investigar o processo e mostrarem-me provas da sua culpabilidade.

O que ele veio dizer é, essencialmente, isso mesmo: sou inocente, tratem-me como inocente. Por estar na berlinda, foi buscar o que de melhor se encontra na Constituição para reclamar ter direito à sua protecção. De caminho, queixa-se de pulharias vindas dos órgãos de comunicação social e da sociedade digitalizada. Fez muitíssimo bem.

Único problema? Este Luís Newton jamais tomaria uma posição pública cívica e politicamente análoga para defender os mesmos princípios constitucionais e morais estando em causa um adversário político, com o qual não tivesse qualquer laço relacional de estima, apanhado na mesma situação. E cometendo a injustiça de tecer considerações arrogantes sobre o seu carácter não o conhecendo pessoalmente, nem sequer por interpostas pessoas, tenho a profunda convicção de que ele se riria, ou terá rido, alarvemente com a malta do partido por ver a competição enterrada no mesmo lodaçal em que agora se encontra.

Pence junta-se à resistência

Se Trump acha que a Ucrânia começou a guerra (e que, portanto, a Rússia é a vítima no conflito), e se acha que Zelensky é um ditador, enquanto Putin será um democrata, então devia ser consequente com as suas palavras e decretar o apoio militar à Rússia. Ou mesmo decidir a invasão da Ucrânia pelas forças americanas (por exemplo, pelo lado da Hungria, um natural aliado contra os nazis ucranianos). Dessa forma, nem teria de negociar o acordo para as terras raras com um cruel ditador que ameaça os países vizinhos, bastaria dividir os recursos com o democrata e pacifista Putin uma vez consumada a anexação do território.

Isto de ter um pato-bravo megalómano que se julga acima da lei e da soberania de países e povos terceiros a chefiar uma superpotência não se resolve fazendo-lhe as vontades. Nunca foi assim no passado, não será no futuro.

João Oliveira, conselheiro de Putin

«É este o contexto em que devem ser interpretadas as declarações e as ações de Trump sobre o fim da guerra na Ucrânia.

Não há ali nenhum posicionamento geral de recusa da guerra e promoção da paz. Pelo contrário, estamos perante mais um presidente norte-americano que revela estar empenhado na gestão do militarismo e da corrida aos armamentos da forma que lhe for mais conveniente.

A sua motivação não é promover a solução que é verdadeiramente necessária no conflito, que tem de ser uma solução de paz e de segurança colectiva na Europa, isto é, de todos os países, do Atlântico aos Urais. As suas declarações sobre as relações entre os EUA e a Rússia devem ser interpretadas em função do objetivo de provocar o distanciamento da Rússia face à China por conveniência táctica norte-americana.»

Fonte

A figurinha de 2025

Talvez Ruben Amorim ainda venha a ser campeão nacional e europeu pelo Manchester United. Não é impossível, numa eventual futura época. Mas neste momento, três meses após a sua triunfal mudança para Inglaterra, ele é o pior treinador que alguma vez passou pelo clube. De longe.

O interesse do caso, que vexa o nacionalismo parolo dos portugueses e seu actual Presidente da República, não consiste na intenção de causticá-lo nesta fase aziaga da sua carreira. Antes, na investigação do seu sucesso, o caminho que o levou, em tão pouco tempo, para um clube com a dimensão mundial do MU. E a chave dessa investigação está no que Amorim foi dizendo antes de entrar no clube inglês, já com o contrato assinado, e depois no que continuou a dizer ao ir acumulando empates e muitas derrotas. Que foi isto, primeiro, a promessa de colocar a equipa a jogar à sua maneira, logo a partir do jogo inicial consigo à frente. Chamou-lhe a “ideia”, uma ideia que levava no avião para revolucionar o modo de dar pontapés na bola daquela rapaziada. Ao constatar que o seu idealismo não estava a puxar a carroça, começou a pensar no assunto. Disse que a equipa estava com jogos a mais durante a semana, daí os resultados negativos, e também a dificuldade para que a tal ideia desse um ar da sua graça. A solução para os problemas no relvado, afiançou, viria dos treinos, assim conseguissem ter tempo para tal. Esse tempo foi conseguido mas as coisas continuaram na mesma, pelo que ele foi dizendo outras coisas. Por exemplo, “a equipa precisa de um choque”, “este é o pior plantel na história do clube”, e “o MU pode descer de divisão”. Não contente, e para explicar ter batido o recorde do clube para derrotas seguidas em casa, lembrou-se de dizer que os jogadores tinham problemas em Old Tradfford por quererem muito agradar aos adeptos. Sem dúvida, uma explicação com poder explicativo.

O cúmulo deste duvidoso, embora original, método de motivação ocorreu a 19 de Janeiro, após a derrota em casa com o Brighton. Foi noticiado (sem ter sido desmentido) que o treinador do MU deu um animado responso aos jogadores, ainda a quente no balneário. E que no entusiasmo de lhes manifestar o desagrado pelo seu desempenho chegou a partir um televisor. Facilmente imaginamos que a causa imediata para a destruição do equipamento terá resultado do seu afã em indicar onde devia estar um certo jogador, ou mais do que um, dentro do campo. O ecrã que exibia a inépcia da equipa a defender (aposto nesta versão os 10 euros que tenho no bolso) foi o alvo de uma bem colocada pancada (ou arremesso de um par de chuteiras) que o impediu de continuar a exibir misérias futebolísticas.

Que tem tudo isto a ver com o percurso de altíssimo sucesso de Ruben Amorim antes deste ciclo onde está a ganhar cabelos brancos? Algo que pode ser aplicado em qualquer outra actividade onde a incerteza seja indomável. A ideia, esta validada por milhares de anos de repetição, de que mais vale ter sorte do que juízo.

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Dominguice

Pinto da Costa é o dirigente desportivo com mais sucesso na história do desporto em Portugal. O seu currículo triunfal começou antes de ter sido presidente do FCP, na época de 77-78, ao chefiar o departamento de futebol e levar Pedroto a ser campeão nacional. Depois como presidente, a partir de 1982, o clube teve uma ascensão meteórica até à supremacia no futebol profissional e nas modalidades amadoras. A sua liderança transcendia o desporto, assumindo-se como actor político que representava os interesses económicos e sociais de uma região. Ao mesmo tempo, impôs uma cultura de controlo policial sobre o Porto — Porto clube e Porto cidade. As suspeitas de corrupção da arbitragem nunca se provaram, apesar dos óbvios indícios. O seu carisma sardónico ficou inigualável no mundo do pontapé na bola.

Dos bonzinhos não reza a história, eis uma possível lição de vida a tirar da sua biografia.

Há coragem no CSM

Na terça-feira, o plenário do Conselho Superior da Magistratura rejeitou uma impugnação — por maioria — de José Sócrates contra o grupo de trabalho que pretende estudar formas de acelerar a tramitação do processo Operação Marquês. Esta notícia foi completamente desprezada pelo editorialismo e pelo comentariado. Se sairmos à rua a perguntar do que se trata, um em mil conseguirá acertar (e estou a ser desvairadamente optimista).

Mas trata-se de algo com alguma importância. Começando pelo CSM, importava saber qual o resultado da votação para além da informação relativa à falta de unanimidade. Imaginando que houve apenas 1 voto a favor da impugnação, importaria saber de quem e a sua justificação. Mas, ignorando isto e ficando com aquilo, eis que a questão levantada teve, pelo menos, o mérito de receber plena legitimidade e justiça por parte de uma parte do CSM. Não é pouco, tendo em conta o que está em causa.

E o que está em causa já foi verbalizado publicamente por Sócrates em Dezembro:

«Entretanto, o Conselho Superior da Magistratura criou um grupo de trabalho para “acompanhar de perto” o Processo Marquês, instituindo assim uma tutela administrativa sobre o poder judicial num processo penal. O Processo Marquês já era um processo de exceção, agora é-o formalmente — uma lei para todos, outra para este processo.

Nunca uma coisa destas aconteceu. Mas o Processo Marquês está cheio de primeiras vezes e ninguém diz nada — o único tópico permitido no debate público são as manobras dilatórias da defesa, nada mais deve existir.»

Assim é, exactissimamente. Estamos perante um processo de excepção, não só com o acordo mas também a cumplicidade activa do regime, do sistema partidário, da imprensa e da sociedade. A mole de fanáticos e broncos que se baba com o linchamento de Sócrates em nada se distingue, quando muito até merece compaixão, da legião de especialistas nas mais variadas áreas do Direito, da política, da História e da comunicação profissional que se calam, uns, e alinham com a acusação, outros, perante a violência exercida sobre os cidadãos apanhados na Operação Marquês.

Donde, maior a curiosidade para conhecer quem é aquela e/ou aquele que no CSM deixou a prova da sua coragem e da sua liberdade.

Nunca houve, nunca haverá

O mandato de Donald Trump é assumida e legitimamente um projecto de violação da Constituição dos Estados Unidos e de imposição de uma práxis criminosa como critério último (quando não primeiro) de decisão governativa. Projecto assumido porque foi anunciado na campanha, e projecto legítimo porque o eleitorado americano quis dar o poder, agora com a maioria do voto popular, a quem tentou derrubar e enfraquecer as instituições democráticas.

Nesse sentido, estamos perante algo que se inscreve numa possibilidade do sistema político norte-americano. Era possível, mesmo que impensável por ter sido altissimamente improvável durante dois séculos e tal, aparecer alguém como Trump para fazer o que Trump está a fazer. Apareceu, e também se chama Trump. Logo, este ciclo faz parte da evolução da democracia nos EUA; e por extensão, dada a sua importância histórica, da evolução da democracia — e do capitalismo — no mundo.

Um dia Trump estará morto. Se tudo correr bem, tal não acontecerá sem ele ter esgotado estes últimos 4 anos na Casa Branca para que foi escolhido sem qualquer falha, ou dúvida, no processo eleitoral. Outras pessoas continuarão a pensar de modo diferente do seu nesse país, outras pessoas continuarão a nascer por lá, ou lá a se tornarem americanos, que quererão viver de acordo com outros valores. Não fazemos ideia de como será a democracia nos EUA em 2050. Sequer em 2030.

Que fazer dado o impacto de termos uma superpotência outrora liberal a juntar-se à Rússia e à China no culto de ditadores? Temos de nos orgulhar daqueles que preservam a nossa democracia, defendem a nossa liberdade. E se para continuarmos assim for preciso combater, mesmo que só no plano das ideias, não há combate mais belo.

Nunca houve, nunca haverá.

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