Aviso aos pacientes: este blogue é antianalgésico, pirético e inflamatório. Em caso de agravamento dos sintomas, escreva aos enfermeiros de plantão.
Apenas para administração interna; o fabricante não se responsabiliza por usos incorrectos deste fármaco.

Tal como

Tal como a saúde é apenas a ausência de doença, e só se dá por ela quando falta, também a vitória é para mim difícil de gozar, exuberantemente, porque é apenas uma derrota que não acontece, embora se acontecesse doesse muito. Vem isto a propósito do Benfica-Sporting do mês passado, que os leões venceram galhardamente por 3-1, mas que não me deu, confesso, senão um prazer moderado, discreto e não contagioso, na sua aparência superficial e em todo o caso imcomparável à depressão abismal para a qual uma derrota sportinguista me teria atirado. Se perguntado, direi que padeço de um excesso de civilização que me impede de exteriorizar o prazer que sinto, mas a secreta verdade é que também não senti nenhum prazer por aí além. Eu devia fazer-me sócio de um clube péssimo, uns underdogs sem esperança que estivessem sempre na mó de baixo (e que eu abandonaria sem contemplações se ameaçassem subir para a de cima), porque acho que é o meu amor pelas causas perdidas que me leva a desprezar as vitórias: querendo por princípio ver a minha equipa vencedora, é afinal no sofrimento que as suas derrotas me causam que eu, perversamente, pareço recobrar as minhas forças. Mas dar mais importância à dor da derrota do que à alegria da vitória, desperdiçando de passagem a modesta felicidade que o futebol, espelho da vida, nos oferece às vezes nas tardes chatas de domingo, não será recusar a graça e deixar que o lado negro da vida oculte o que nesta abunda de claro e luminoso – como sucede, por exemplo, com as doenças de Inverno, que parece que nunca mais acabam, mas depois, quando fazemos bem as contas com um calendário à frente, percebemos que não duraram mais do que um par de semanas num ano inteiro? O problema é vasto: inclui como ficou visto a tradicional questão do tempo psicológico e da sua relação com o tempo real (bem conhecida dos torcionários, por exemplo, peritos em transformar uma maldade de segundos num sofrimento de séculos), mas não só: também a questão da memória selectiva, que opera tanto em função da intensidade da experiência como do momento em que ela ocorreu (de onde o particular cuidado que, sendo possível, deve ser posto na preparação da morte, visto este acontecimento, por definição o último e o mais intenso da vida de cada um, condicionar de forma decisiva a maneira como o de cujus, após um derradeiro olhar sobre o passado, determinará o sentido da sua extinta existência); enfim, prende-se igualmente com a físico-química dos gozos e com a questão da sua intensidade óptima, bem como da oposição que se estabelece entre prazeres suaves e paixões aflitivas (ou aflições passionais, como se queira): ri melhor quem ri mais alto? Fode melhor quem abana mais a cama? Come melhor quem come mais, ou mais caro ou mais depressa, e depois fica mal-disposto, pobre e flatulente? Há todo um mundo de questões que o saber moderno ainda não conseguiu resolver.

OS NOSSOS FILHOS DA PUTA

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Syriana é um filme que revela o óbvio: os regimes Ocidentais são cúmplices das ditaduras mais torpes e corrompidas do planeta em troca de petróleo. O Fundamentalismo religioso é um germe de uma doença grave que tem na falta de democracia, na miséria e no desespero o seu caldo de cultura. Em nenhuma região do mundo a democracia progrediu tão pouco como no Médio Oriente. O petróleo tornou-se numa maldição negra. Em troca destas reservas de combustível os Estados Unidos da América apoiam regimes feudais como o da Arábia Saudita, fazendo recordar a grande máxima da política internacional cínica e realista que sempre norteou esta grande potência: quando perguntaram, salvo erro, ao Presidente Truman o que pensava do líder da Nicarágua colocado pelos Estados Unidos, o Presidente Somoza Garcia (pai do Anastásio Somoza corrido pelos sandinistas), Truman respondeu com astúcia: “é um filho da puta, mas é o nosso filho da puta.”

Bush é solúvel pelo riso?

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Ao contrário de outros pontos do planeta, em que a História acontece como uma tragédia e repete-se como uma comédia, a América Latina é uma região do globo em que a tragédia e a comédia coexistem no tempo e no espaço.
Por vezes, o humor é completamente involuntário, como a Bíblia em hebraico mostrada numa exposição da polícia política brasileira, durante a ditadura, como “material subversivo em língua chinesa”, mas muitas vezes, o riso é um escape contra a repressão e a adversidade – uma espécie de seta atirada aos céus para protestar contra os deuses.
Para além do “nosso filho da puta”, lembro-me de quatro historietas edificantes e uma moral da história:
1. Os latino-americanos costumam citar uma frase atribuída ao ditador mexicano Porfírio Dias que resumiria grande parte dos seus dramas: “ o problema do México era estar muito longe de Deus e muito perto dos Estados Unidos”.
2. Consta que durante a ditadura de Pinochet, encontraram-se numa recepção diplomática o ministro da Marinha do Paraguai e o ministro da Justiça do Chile, tendo o chileno perguntado ao paraguaio porque razão o Paraguai tinha Ministério da Marinha se não tinha mar, a que o ministro respondeu, com lógica, mais estranho, do que isso, é o Chile ter Ministério da Justiça…
3. Numa colectânea de anedotas anti-comunistas, o membro do Politburo do Partido Comunista de Cuba Abel Prieto regista uma anedota elucidativa: Perguntaram a um cubano quais eram os três triunfos da revolução, o cubano respondeu rápido: a educação, a saúde e o desporto. Fizeram-lhe uma segunda pergunta, quiseram saber quais eram os três principais falhanços do regime de Fidel Castro. O cubano pensou durante um tempo e disse: o pequeno-almoço, o almoço e o jantar.
4. Qualquer habitante da América Latina olha com inveja para o poderoso vizinho do norte. Uma das características mais faladas é a ausência de golpes de Estado na América do Norte. Depois de muito estudarem, os investigadores nativos concluíram uma razão de peso: em Washington não há embaixada dos Estados Unidos da América!
Nos últimos tempos, “o pátio das traseiras dos Estados Unidos” tem dado más notícias ao presidente George W. Bush. Sobre as dificuldades de reacção dos Estados Unidos correm duas versões: a primeira diz que os EUA têm estado demasiado ocupados no Médio Oriente para dar atenção à América Latina. A segunda, afirma que os Estados Unidos foram para o Médio Oriente para não terem de pensar na América Latina.
A verdade é que as sucessivas Administrações, o FMI e o Banco Mundial fizeram mais pela revolução, com a famosa doutrina de Washington, que muitos anos de propaganda comunista.

Muito bem acompanhados

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O excelente Portal Galego da Língua noticia aqui uma Semana da Galiza em Braga, de interessante programa.

Ainda demora. Mas é bom ir-se a gente habituando à ideia de que o nosso contacto com a Galiza tem este efeito inesperado: de repente compreendemos melhor este nosso tão simples, e para nós tão óbvio, País.

A Galiza faz parte de um Estado, enquanto que, aqui, o Estado somos nós. Tem uma língua, uma das «línguas espanholas» (escreve a Constituição vizinha), língua que é tão «espanhola» como a nossa. Nicles, niente. Tem um anseio de afirmação frente ao Grande Resto que bem nos serviria de inspiração, a nós, que deixamos o Grande Resto ditar-nos coisas.

Enfim, descobrimos que não estamos sozinhos, que estamos até muito bem acompanhados.

A Galiza é o nosso melhor livro de boas maneiras. Parabéns, Braga.

Pifei a ilustração aqui.

Memória auxiliada

Um amigo meu, de um um grupo que está contra a passagem da antiga sede da PIDE para condomínio de luxo, foi interrogado e vai a tribunal. O grupo dele pretende que as pessoas recordem o que foi a PIDE. Entre outros crime relevantes é acusado de ter interrompido a passagem de carros durante um minuto. Pode-se dizer que, para a memória, o ministério público é melhor que as pílulas de alho do Dr. Rogoff (?).

Sem acentos

Depois de entregar, no aeroporto das “baratas”, quinze bloquistas, para seguirem viagem para o Sahara Ocidental. Encontro-me no meio de Madrid num meio de um carnaval estranho de um bar alternativo,chamado “Ladinamo”. Está tudo mascarado. Eu “vou à internet”. O computador tem como sistema operativo o Linux, e eu, reformista de MAC, estou longe da vanguarda. Leio com estranheza o texto do Fernando sobre um Joel que nem sequer conheço. O mundo é pequeno e Portugal é minimo. Eu cá, até posso aceitar que o tipo é um excelente pai de família e que tem um canídeo que gosta muito dele. Eu estou farto é de entrevistas em tom de engraxatório e de textos sem raiva, nem nada. Mas ainda bem, Fernando, que tu o adoras. O amor é o sentimento mais belo do mundo.

Generation U

Longe de mim sugerir seja o que for. Mas outro dia entrei na Livraria Portugal e vi expostos estes romances, todos recentíssimos, todos (suponho) de autores portugueses: «És o meu segredo», «Pede-me o que quiseres», «Não me digas que foi um sonho», «Não me contes o fim». E isto fez-me pensar. Não me perguntem o quê. Eu próprio não sei. Mas talvez alguém saiba.

Sucedeu no Sheraton

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Há-de julgar-se que não, mas as coisas passaram-se exactamente assim.

Eu queria escrever uma charla (esta mesma) sobre um texto contido num site que descobri, do jornalista Joel Neto (o link vai aí não tarda), onde ele reúne trabalhos que publica, e onde vi referido «NS», que supus (e bem) ser a revista onde ele agora escreve. Não tendo ainda a certeza disso, digito no Sapo «joel neto ns», e que vejo eu logo a oferecer-se? Isto do Nuno Ramos de Almeida, a cuja leitura o destino me havia poupado.

Tinha agora uma certeza que não tivera, a de que «NS» era a revista onde o Joel Neto actualmente escreve, e tinha também um problema: a opinião sobre ele do meu prezado colega aspirínico. Como acho o Joel um magnífico jornalista (mas eu sou suspeito, porque não sou do métier, e sou ainda por cima amigo dele), fiquei desolado com o que o Nuno escreveu e em que vocês entretanto ficaram (e bem) entretidos, deixando-me aqui a falar sozinho.

Tudo isto é tortuoso? É. E porquê? Porque eu não queria falar da «NS» (que nunca vi, de resto, pois não chega cá tão longe), nem do Nuno, nem propriamente do Joel, nem sequer, imagine-se, do site dele que aduzi. Que queria eu então? Só isto: recomendar-lhes o texto «Lisboa vista de cima», um retrato de Vasco Graça Moura como tão depressa não o verão, já que, em entrevistas, ele diz só o que pretende passar e, quando retratado, fascina o jornalista.

Ora, pela primeira vez, alguém, o Joel, faz a VGM um retrato despido de reverência. Resultado: saem os dois a ganhar.

Seja maricas, preto, judeu ou comuna, eu mato quem eu quiser

Jorge Ferreira está indignado. Diz ele:

«Uma das novas ideias do Bloco de Esquerda é criminalizar o “ódio homofóbico”. (…) A ir por diante, o que já não se exclui, dado o carácter gelatinoso da maioria absoluta socialista e as ramificações do chamado “lobby gay” por todos os partidos, pergunto: até onde é que a liberdade de expressão pode ir na crítica à homossexualidade para os iluminados dirigentes do Bloco? Quem disser ou escrever por exemplo, que a homossexualidade é imoral, vai preso? Será que o Bloco quer prender, entre outros, João César das Neves? Mais uma vez não se discute o conteúdo da opinião de cada um, mas apenas a possibilidade de a expressar. Para o Bloco a liberdade é selectiva. Só se pode criticar sem risco de cadeia quem e aquilo que o Bloco, de cima do seu supremo julgamento de opinião, determinar. Cruzes canhoto!»

Das duas uma, ou Jorge Ferreira não sabe ler ou Jorge Ferreira é perigoso. Ou não leu que «o BE quer ainda ver o ódio homófobo ser incluído na moldura de homicídio qualificado, a par do ódio racial, religioso ou político» (“Público” de terça-feira) e fala do que não sabe, ou leu e está a pensar usar da sua «liberdade de expressão» à navalhada. Venha então a correcção, senhor Jorge Ferreira, antes que os homossexuais da sua rua fiquem um pouco preocupados. Bem sei que é da Nova Democracia, mas, apesar de tudo, não o tenho em tão má conta. Será pouco informado e razoavelmente demagógico, mas seguramente pacifico.

PS: Outros blogues, como de costume, seguiram o diz que diz. Para eles uma notícia: ler blogues ajuda, mas não chega.

TCHI BUMMMMM!

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A facilidade com que se propõe a energia nuclear em Portugal é comovente. Já toda a gente percebeu que será um bom negócio para alguns, o que poucos parecem querer considerar são os riscos. Os defensores da solução nuclear afirmam que as probabilidades de acontecer um desastre são extremamente reduzidas, mas, pelo caminho, escamoteiam algo decisivo: o que é que aconteceria se tudo corresse mal?
A magnitude dessas implicações devia exigir cuidado. Calcular um risco de uma viagem de avião, que implica uma centena de pessoas, é diferente do que analisar as implicações da construção de uma central nuclear que, independentemente da probabilidade do desastre, envolve dezenas de milhões de pessoas.
Mesmo que a central nuclear não rebente e não tenha uma fuga de radiação, há sempre a interrogação do que fazer com detritos letais que ficam activos mais de 10 mil anos. A esse respeito é interessante ver um exemplo lateral, mas significativo, da dimensão do problema: o Congresso dos Estados Unidos da América criou uma comissão para discutir o problema da sinalização dos resíduos. O objectivo do grupo era resolver o seguinte desafio: Que sinais são possíveis de inventar para que a humanidade no espaço de 10 00 anos saiba que numa determinada área existem substâncias muito perigosas. O resultado desses trabalhos foi paradigmático: os cientistas concluíram ser impossível sinalizar eficientemente estes resíduos.
Esta conclusão devia levar-nos a pensar sobre a irresponsabilidade de um determinado tipo de decisões que põem em causa, de uma forma irresponsável, a vida de centenas de gerações.
Para deleite dos cépticos, aqui fica uma curta descrição que o sociólogo alemão Ulrich Beck fez desses trabalhos de Hércules:

Continuar a lerTCHI BUMMMMM!

Negacionismos II

Um leitor (de nome Luís Lavoura, que eu não conheço mas a quem agradeço) sugeriu-me que aclarasse o meu último post, sobre o assunto em epígrafe, e eu vou tentar:

Vasco Pulido Valente escreveu há dias um post no seu blog “O Espectro” onde elenca de forma exemplar os tipos mais comuns de “negacionismo”, cada qual criado em função de um interesse político diferente. O último desses tipos é o que faz equivaler o holocausto à repressão stalinista (Auschwitz = Gulag), que teria sido criado, segundo VPV, para recuperar a reputação política da RFA (e prejudicar a da URSS), em função da lógica e dos interesses da Guerra Fria.

Estou de acordo com VPV quando ele afirma que essa comparação é uma falácia: comparando apenas elementos formais, neste caso sistemas de repressão (e deixando de lado as diferenças substanciais que existem entre os fundamentos ideológicos, os interesses sociais e os objectivos históricos dos dois regimes, que são totais) temos que o sistema dos campos prisionais existente na URSS ao tempo de Stalin pode melhor ser descrito como uma herança do czarismo e a repressão dessa época como uma variante sobre o tema do despotismo oriental, sem qualquer intuito genocidário ou sequer exterminador, enquanto, pelo contrário, “Auschwitz” (tomando o mais emblemático dos campos por símbolo do sistema de que faz parte) incarna um crime de genocídio organizado com frieza industrial e meticulosidade burocrática, executado por gente – de que Eichmann ficou como símbolo – que exterminava homens, mulheres e crianças – que obviamente não podem ser descritos como “adversários” ou “inimigos” políticos – em câmaras de gás e fornos crematórios como agora vemos na televisão eliminar aves, sem a sombra de um sobressalto moral e apenas porque havia um plano vindo “de cima” que era preciso executar: incarnam a “banalidade do mal”, na famosa expressão de Hanna Arendt; não são os únicos seres malignos existentes ao cima da Terra, longe disso, mas incarnam um malignidade nova, diferente e mais perversa: são o impossível tornado possível – e comparar isso ao “Gulag”, para além de ser uma falsificação da história, é uma imoralidade – porque ignora a especificidade de Auschwitz e as razões pelas quais ele ficou para as gerações futuras como o exemplo do mal absoluto e da desumanidade total. Até aqui, de acordo.

Onde eu acho que VPV não tem razão é na identificação da origem desta forma de negacionismo: ele diz que foi na “primeira” Guerra Fria, na propriamente dita, para melhorar a reputação da Alemanha enquanto parceiro ocidental (Hitler terá feito isto, mas Stalin fez igual) e eu digo que não, até porque nessa altura ainda não tinha sido inventado, como conceito oponível a Auschwitz, o “Gulag”: Adorno – arquétipo do intelectual alemão do pós-guerra, indiscutivelmente pró-ocidental e autor de uma reflexão ética fundamental sobre a questão do holocausto judeu e da responsabilidade alemã – diz que não pode haver poesia depois de Auschwitz – mas não do Gulag, porque, por maior que fosse o seu anti-comunismo, ele não mete tudo no mesmo saco.

O Gulag como conceito unificador, supostamente comparável a Auschwitz, e categoria da luta ideológica, nasce, paradoxalmente, muitos anos depois da morte de Stalin, em pleno desanuviamento, e num país onde a denúncia das práticas stalinistas tinha tido muito menos eco do que na Alemanha ou nos países anglo-saxónicos: esse país é a França, onde o “Arquipélgo de Gulag” – o livro de Soljenitzin que deu o nome à coisa – teve uma recepção muito mais importante do que no resto do Ocidente, e por razões de conjuntura política interna – a saber, a possibilidade que se colocou, em meados dos anos 70, do PCF aceder à área do poder. Foi esse facto que conduziu a uma levée de boucliers da direita intelectual e à constituição de uma frente “anti-totalitária” (incluindo desde Aron e Revel aos jovens turcos conhecidos pelos “nouveaux philosophes”, ex-esquerdistas como Bernard Henri-Lévy ou André Glucksmann) que se empenhou na denúncia dos traços estruturais que aproximariam a URSS (e, por associação de ideias, o PCF) das mais sinistras práticas do nacional-socialismo. Esta ofensiva ideológica teve múltiplas dimensões, mas entre elas a historiográfica não terá sido a menos importante: e aqui é impossível não reconhecer o papel fundamental de François Furet, autor de uma história do comunismo como “mal do século” que se pretende tanto a sua certidão de óbito como a sua apostasia final (ou não fosse Furet, para variar, um ex-PCF).

VPV não creio que vá nestas cantigas: quem tenha formado o seu conhecimento da história europeia do século XX na leitura de A.J.P. Taylor, nem precisa de esperar por 1980 para descobrir as maldades de Stalin, nem tende a confundi-lo com Hitler, e a esquecer que o principal sacrifício humano para a libertação da Europa do nazi-fascismo foi feito pela URSS. Mas a relação de amor-ódio dos nossos intelectuais com a França leva-nos muitas vezes a importar o pior que ela produz: neste caso, aquilo que Hobsbawm define como uma “Guerra Fria” tardia, que, se em França começou tarde, em Portugal parece que ainda não acabou.

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