Aviso aos pacientes: este blogue é antianalgésico, pirético e inflamatório. Em caso de agravamento dos sintomas, escreva aos enfermeiros de plantão.
Apenas para administração interna; o fabricante não se responsabiliza por usos incorrectos deste fármaco.

Dominguice

Tudo é contextual. Que o mesmo é dizer mutável, provisório, em devir. Paisagens alteram-se, pessoas mudam, memórias desaparecem. O nosso corpo é o mesmo e sempre outro a cada instante. A Lua não está hoje à mesma distância da Terra em que estava ontem. E, de repente, um coração sai de órbita e dá por si noutro sistema solar, numa galáxia muito distante.

Assustador? Não, libertador. Só aqui chegámos porque aqui não estávamos.

Silêncio e gozo

[...] desejo juntar à suspeita de viés político na investigação do processo EDP, que está na base da referida reclamação, uma outra informação que entretanto foi tornada pública pela revista “Sábado“ – um dos procuradores do processo EDP desempenhou funções de assessor num gabinete ministerial no Governo PSD-CDS. Repito: um dos procuradores foi assessor num governo PSD-CDS.
Este facto, Senhora Procuradora-Geral, este simples facto, devia levar a Procuradoria a olhar a suspeita de motivação política com outros olhos.
Veja bem. Primeiro facto, o alegado favorecimento à EDP por parte de um governo socialista é investigado há doze anos por um antigo assessor do governo do PSD-CDS. Absolutamente extraordinário. Segundo facto, esse mesmo procurador, que ocupou funções num gabinete de um governo PSD-CDS, decidiu não investigar o financiamento da campanha eleitoral do PSD de 2015. Finalmente, esse é também o procurador que abriu um inquérito crime contra o atual primeiro-ministro socialista, criando uma crise política, fazendo cair o Governo e provocando eleições antecipadas. Julgo que nada mais é preciso dizer.

José Sócrates

Não existem ladrões que se dediquem nas suas horas vagas ao policiamento da urbe, mas existem polícias que durante as horas de serviço se aplicam na ladroagem e demais crimes de catálogo. Existem, há casos transitados em julgado. Idem para militares no exercício de funções militares. Até juízes aparecem em tribunal no papel de acusados e de lá saem no embrulho de condenados. O que faz supor não serem os procuradores do Ministério Público feitos a partir de um ADN imune à prática de ilícitos.

Se um procurador for apanhado a fanar uma carteira no Metro ou ao leme de um veleiro com sacas de cocaína no porão, as autoridades não terão grandes dúvidas sobre o que fazer com ele. Mas como se lida com um procurador que utiliza os recursos da Justiça para perseguir e lesar inocentes ou que abdica de utilizar esses mesmos recursos para investigar um potencial crime em ordem a proteger os suspeitos? Quem se lembra de ver noticiado, discutido, analisado algum caso desses? Será que sofremos todos de amnésia ou que é impossível existirem procuradores com esses comportamentos? É que não temos registo de tal. Do que nos lembramos bem é do foguetório à volta do episódio do então procurador Lopes da Mota. Recordemos: dois outros procuradores alegaram terem sido pressionados por ele, numa conversa, acabando o Conselho Superior do Ministério Público por lhe aplicar uma pena de suspensão de 30 dias. Pensemos: uma conversa entre procuradores pode alguma vez ser uma forma de pressão? A farsa deste caso interessa só pelo aproveitamento político que foi feito. A mesma lógica para as campanhas caluniosas, assumidas ao mais alto nível do PSD e CDS, contra Pinto Monteiro e Noronha do Nascimento, então procurador-geral da República e presidente do Supremo, respectivamente.

Nunca houve o menor indício de abusos do poder na Justiça para favorecer políticos socialistas, ainda menos para perseguir políticos de direita. Não existe nenhum procurador com queda para apanhar direitolas nem existe nenhum super-juiz que dê entrevistas onde revele não precisar de julgar arguidos para os considerar culpados, calhando serem do PSD e o processo estar nas suas mãos. Mas a perseguição ao PS existe, é factual, contabilizável, sistémica. Em parte, porque o PS tem estado mais tempo na governação, é o factor estatístico. E, no fundo, porque a direita portuguesa sabe não ser competitiva no plano do projecto político, pelo que escolheu explorar o ressentimento e rancor corporativos dos agentes judiciais para encher os seus canhões mediáticos.

Se tivesse aparecido um procurador com um cargo de assessoria num Governo socialista no currículo a abrir investigações que duram 12 anos a ex-governantes do PSD, a recusar investigar suspeitas sobre financiamentos ao PS, e a inventar uma cagada judicial capaz de derrubar um Governo e uma maioria absoluta de direita no Parlamento, mais o interesse nacional, provavelmente assistiríamos a um cerco à Procuradoria-Geral de República, seguido da defenestração do sujeito. Porém, como na realidade o alvo é sempre o PS, e como aqui o denunciante é Sócrates, reina supremo o silêncio dos cobardes e o gozo dos cúmplices.

Ventura é o mercado da calúnia a funcionar

Os básicos da direita decadente estão em pânico por causa dos broncos da direita fascistóide. O império Balsemão entrou em modo de guerra total a Ventura, depois de olhar para sondagens onde se desenha um cenário em que o Chega pode ficar próximo do PSD em votos. Seria desopilante se não fosse o segundo acto da tragédia. O que Ventura faz na sua técnica retórica onde apela ao medo e à alucinação está suportado na estratégia de degradação do regime que a direita política e mediática tem praticado contra o PS desde 2004. Não há novidade. Há continuação, evolução.

A campanha para tratar o PS como um partido corrupto, onde qualquer decisão governativa ou autárquica socialista deveria ser considerada legalmente suspeita, não foi uma invenção do chegano-mor. Começou com Santana Lopes e teve desbragado seguimento com Ferreira Leite, e depois sucesso eleitoral com Passos Coelho. Uma ministra do Pedro anunciou o “fim da impunidade” ao comentar a notícia sobre buscas a ex-ministros do Governo anterior. Cavaco Silva, a partir de Belém, alimentou e amplificou essa campanha. Golpadas judiciais, em conluio com um domínio mediático totalitário que as explorou para criar o maior dano possível nos alvos, apelaram ao fanatismo e ao ódio contra os socialistas. Uma vedeta da indústria da calúnia, cuja obra como “jornalista” consiste em repetir que o “sistema político é corrupto” e que não é preciso provar a culpa de Sócrates para o aviltar e achincalhar obsessivamente, foi escolhido como representante e exemplo vivo dos mais altos valores da identidade cultural da Grei. Agentes da justiça cometem crimes, juízes abrem a boca a queixar-se do “excesso de garantias” dadas a arguidos e acusados, sindicalistas dos órgãos de Justiça vocalizam o seu desprezo pela classe política. Jornalistas usam o seu estatuto para violar o Estado de direito e disparar contra quem apareça a querer defendê-lo.

O efeito que 20 anos desta pulhice irracionalizante tem na sociedade deu-se a ver em 2017, quando Passos Coelho inventou um populista racista e xenófobo de seu nome André Ventura, fulano acabadinho de sair de um programa de paineleiros da bola. A intuição passista era a de que já havia condições para o PSD começar a agregar os alienados e miseráveis disponíveis para ouvir a cassete da extrema-direita. Tinha razão, só que antes do tempo. Incrivelmente, Rui Rio veio confirmar-lhe a aposta ao ceder à normalização do Chega via Açores. Uma normalização que mereceu declarações de apoio de Ferreira Leite e de Cavaco ao tempo, assim como de figuras do aparelho laranja, todos felizes da vida com a associação do PSD à chungaria.

A esquerda pura e verdadeira acaba a contribuir para a credibilização de Ventura sempre que repete alucinações equivalentes, diabolizando o PS e chafurdando num primarismo de permanente suspeita moral e de delírio conspiracionista. Para o bronco a assistir à retórica sectária de BE e PCP contra o PS, a conclusão é a de que o voto no Chega se justifica para “limpar” essa cambada de malfeitores.

Portanto, foi muita gente, durante muitos anos, a fazer a cama onde o traste do Ventura se veio deitar radiante e ufano. Agora, lidem com a concorrência.

Trump e a alface

Os eleitores republicanos que ontem deram uma vitória esmagadora a Trump nas primárias do Iowa tiveram de enfrentar frio extremo — nalguns locais podendo chegar a -37º — ao saírem de casa para ir votar. Ou seja, não apenas sofreram o desconforto da deslocação e eventual espera como, literalmente, arriscaram a sua saúde ao participarem na escolha do candidato. É um belíssimo exemplo da essência da democracia, o cidadão não abdica da sua liberdade nem debaixo de uma colossal intempérie. Ao mesmo tempo, o resultado da soma dessas liberdades democráticas conduz ao paradoxo de se ter dado o arrasador triunfo a quem é o principal responsável pelo mais grave ataque à democracia norte-americana, a invasão do Capitólio, e se assume como um escroque megalómano acima da lei.

Trump obriga a reescrever os livros de ciência política. Conseguiu o impensável ao se tornar presidente dos EUA, continua a deixar transidos de espanto aqueles que anseiam por racionalidade humanista nos sistemas políticos. Deixa-nos descoroçoados, mergulhados em pessimismo, face à possibilidade de poder voltar à Casa Branca. Mas eis que a democracia nos vem salvar do desespero. Porque ela aceita até aqueles que a querem destruir ou diminuir, enquanto nas tiranias todos os democratas são perseguidos, censurados, presos, assassinados ou expulsos.

A violência de 6 de Janeiro de 2021, em que energúmenos feriram e mataram polícias a defenderem as principais instituições da democracia americana, é o mais nítido retrato do que Trump é e quer. É uma besta violenta, quer ser rei absoluto. O facto de, mesmo assim, poder voltar a concorrer à presidência significa que a força da democracia não é a da exclusão, antes a da inclusão. E a democracia continuará a ser uma das mais fundantes realizações da civilização bem depois de Trump já estar a comer alface pela raiz.

Revolution through evolution

Distinct sex differences persist in countries with higher standards of living
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Love scrambles the brain and scientists can now tell us why
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Doctor says gratitude can benefit your health in a number of ways
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Watching others visibly dislike vegetables might make onlookers dislike them, too
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More siblings mean poorer mental health for teens
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Scientists identify how dietary restriction slows brain aging and increases lifespan
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Even the oldest eukaryote fossils show dazzling diversity and complexity
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Continuar a lerRevolution through evolution

Dominguice

Depois de terem passado quase 20 anos entretidos, e felizes da vida, a caçar socráticos, os geniais direitolas estão agora apavorados a verem os chungas em modo “triunfo do grotesco” e os socialistas com dinâmica de vitória. Fruto podre do laranjal, a nova AD é a imagem ofuscante da indigência política. E o Presidente da República, num ciclo inenarrável e vexante que começou na tomada de posse de Costa para o que viria a ser uma maioria boicotada por Belém e dissolvida à golpada, foi parar à boca de um José Paulo Fafe que numa sala da Assembleia da República o tratou como farrapo encardido. O legado de Marcelo é este, e é ainda pior. Não se lhe conhece uma única posição acerca dos crimes na Justiça, conhece-se a sua conivência com eles.

Ventura, Montenegro e Marcelo. Estão cada vez mais parecidos, chafurdam na decadência.

Qualquer um pode dar uma notícia, e dá

Os tempos da espera ansiosa pelo vespertino (o meu caso), e depois da sua leitura voraz, num percurso de secções idiossincrático, há muito que acabaram. O alívio por encontrar o ardina, o prazer de comprar o jornal no quiosque, o ritual de ir à papelaria buscar o diário religiosamente guardado, não voltam. A digitalização matou o papel sarapintado de notícias e informações quotidianas. Os que cresceram nesse mundo foram desistindo e vão desaparecendo. Os que nasceram a partir dos anos 90, já não apanharam esse mundo.

Significa que o jornalismo perdeu a sua função social, cultural e política? Não. Até se pode elaborar o argumento simétrico: numa crescente e imparável fragmentação mediática, onde a informação é ubíqua e há oferta de conteúdos gratuitos, o papel do jornalismo torna-se ainda mais importante do que no passado. Porque aparece como oásis de epistemologia e práxis da racionalidade democrática. Só que para isso é preciso que os propalados jornalistas sejam veramente feitores de jornalismo.

O valor do jornal em papel estava menos na sua componente informativa enquanto versão autêntica dos factos e mais na fiação de um espaço para a comunhão comunitária. Os suportes digitais que se pretendem réplicas do papel são incapazes de criar efeito semelhante porque o ecossistema actual atomizou os receptores. No meu telemóvel tenho toda a Internet, não só não preciso como não tenho mais disponibilidade para agregados informativos cuja actualidade se esgota ainda antes de estarem prontos para publicação. Mas o espaço para a comunhão comunitária continua a ser de necessidade fundamental.

Para o jornalismo fazer dinheiro tem de abandonar o mercado das notícias. Renascer no mercado das muralhas da cidade.

Se o Presidente do Supremo, perante um golpe, avisa os políticos…isto quer dizer o quê?

Tendo ainda tempo para estudar uma saída airosa por intervenção de alguém com tino (não se sabe quem), o Ministério Público jamais irá reconhecer que errou (abusou) na operação Influencer. Basta ver a linguagem de resistência com que admite hoje que uma das suspeitas sobre João Galamba não tinha fundamento, porque a portaria em causa tinha outro objecto. Não viram, pá.

 

[…]uma portaria que afinal nada tinha a ver com o projeto de uso dos terrenos dos gasodutos da REN para a passagem de cabos de fibra que iria favorecer a Start Campus”. (Expresso)

 

[…] foi “suscitada dúvida sobre se a redação da Portaria nº 248/2022 teve por base atuação” dos donos da Start Campus, Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, “pelo que admite o MP que esses factos, por ora, não sejam considerados fortemente indiciados.”

 

Podemos rir? “Foi suscitada dúvida”; “por ora, não sejam considerados fortemente indiciados” – que linguagem é esta? E que descaramento. Por ora? Fortemente indiciados?

Activam a ventoinha, sujam as pessoas e depois é que surgem as dúvidas. Se foi preciso o João Galamba responder-lhes à distância para esclarecer este assunto, porque não o ouviram antes e em directo? Será isto competência?

 

Pois bem, sendo esta a linda cara com que a Justiça se apresenta, o Presidente do Supremo acha, e disse-o ontem, que o risco da falta de independência do sistema judicial e dos tribunais é que é o grande problema.

 

Num discurso proferido na cerimónia da tomada de posse da juíza conselheira Graça Amaral como vice-presidente do STJ, Henrique Araújo apontou “sinais evidentes de desgaste e deterioração” das democracias, considerando, por isso, que o sistema judicial deve ser eficiente e imune a “tentativas de ilegítima intrusão ou condicionamento por parte do poder político“.

“Alimento a esperança de que Portugal não caia no erro de empreender reformas judiciais irrefletidas que ponham em causa o princípio da separação dos poderes e da independência do poder judicial”, reforçou o presidente do STJ.” (DN)

Ainda pensei que se estivesse a referir à possibilidade de o sistema judicial estar infiltrado por elementos da direita e da extrema-direita com o objectivo de perverter o sistema político, mas não. O último parágrafo quer mesmo dizer que tudo está muito bem como está e que os políticos não devem atrever-se a mexer em nada.

Mas o problema é mesmo o de existir uma independência tão grande e tamanha dos magistrados que se traduz numa total discricionariedade e impunidade e, em relação aos políticos, no abuso, no desrespeito pelos mais elementares direitos e na interferência na governação. Só que isto não mereceu da parte do digno juiz uma linha que fosse. E isso, sim, é assustador. A Justiça erra e abusa flagrantemente do poder que tem, mas a preocupação é manter a soberba e punir quem se atreva a discordar. Vai ter que haver aqui uma volta.

Mário Soares na gaveta

Comovente o entusiasmo de Vieira da Silva apelando ao partido para honrar o que de mais importante Mário Soares deu a Portugal: a defesa intransigente da liberdade — ou seja, do Estado de direito democrático e respectiva Constituição.

Acontece que Vieira da Silva, como Ferro Rodrigues e António Vitorino que também foram vocais no congresso do PS a respeito de questões judiciais, fala em nome pessoal. A denúncia de termos um Ministério Público politizado, ou mesmo como ameaça à legalidade, esboroa-se e desaparece de imediato na voracidade da agenda mediática. Aos procuradores criminosos basta esperar sentados, com a certeza absoluta de estarem numa posição blindada e inexpugnável. Ninguém os vai investigar, jamais um político ou partido com ambições de vitória eleitoral iniciará um movimento de exposição e responsabilização dos seus abusos. Dos seus objectivos, indeléveis e públicos crimes.

Comovente mas grito rouco na tempestade da actualidade. Vieira da Silva também deixa saudades, foi um magnífico governante, é um exemplar cidadão. Só que o seu partido já não é o de Mário Soares desde (pelo menos) 22 de Novembro de 2014.

Ser assim e querer que a direita seja respeitada (nomeadamente pelos eleitores)

Uma tal Maria João Marques, feminista de direita que escreve no Público, mas que revela ignorar muita coisa, acusa hoje António Costa de insultar o centro-direita (a direita moderada, segundo ela) ao chamar-lhe “diabo”.

O diabo é a direita”, mas o único sucesso de Costa veio de governar à direita


[…]O centro moderado distingue-se. Reconhece dignidade humana a toda a gente, sem as desclassificar pelas ideias políticas, ou por serem sindicalistas, ou empresários, ou intelectuais, ou trabalhadores braçais. Ou não. Porque assisti – estupefacta – ao discurso de António Costa no congresso do PS e este disse, literalmente: “O diabo é a direita.” O primeiro-ministro diz de mais de metade das pessoas que votam em Portugal, segundo as sondagens, e que ele governa, que são “o diabo
”.[…]

OMG. Mais uma que gostaria que os leitores fossem parvos. Mas, se não forem, passa vergonhas. Como, estou certa, será o caso hoje. Ela sabe, todos sabemos, de onde vem a expressão “vir lá o diabo”. Passos Coelho utilizou-a no Parlamento ao criticar as medidas do Governo de António Costa, como o aumento do salário mínimo, ou a reposição dos salários e das pensões, entre outras, que supostamente levariam o país ao caos. Esta expressão está agora categoricamente esvaziada do seu sentido profético catastrofista, o que permite virá-la contra a própria direita e com alguma graça. Daí “o diabo estar na direita”, já que pela mão da esquerda não veio. Pelo contrário, o diabo existiu, porque os tempos foram propositadamente duros, mas eclipsou-se. Não é insulto nenhum e, se fosse, o primeiro a recorrer ao diabo teria começado o insulto.

Acresce que a idealização que a colunista faz da actual direita, como muito educada e respeitadora dos moderados da esquerda não tem qualquer correspondência com a realidade. “Andar aos gambozinos”, “bebedeira”, “bandalheira”, ou ainda “culpados pela crise nos Açores” são expressões recentemente utilizadas pelo PSD para insultar, aí sim, o PS. O PS e os portugueses um pouco mais exigentes. Isto por não saberem o que de substancial poderiam dizer. Maria João está, portanto, a ser ou burra ou desonesta ao descontextualizar uma expressão e ao ignorar o que os seus andam, eles sim, a fazer.

[…]Diabolizar opositores políticos ou reputá-los de perigos para a democracia não são argumentos que se aceitem no debate público dirigidos a partidos como o PSD, o CDS ou a IL. Degradam o debate político. Trazem o esgoto da polarização das redes sociais para os palcos mais institucionais. É próprio de políticos como Trump, Lula, Bolsonaro, Morales ou Milei.”

 

Pois muito bem. Não fazem esses partidos outra coisa. Não só insultam, como demonstrado, como também pretendem esconder que não hesitarão em convidar o Ventura para formar governo se necessário for, embora todos saibamos que tal irá ou iria acontecer. Passos Coelho (mais uma vez), que parece ser o grande ídolo da Maria João e o protótipo do político bem educado (!! as graves e descaradas mentiras da sua campanha eleitoral de 2011 inserir-se-ão no conceito de “boa educação”?) afirmou não há muito tempo que o Chega era um partido normal e democrático. Afinal quem reabilita e traz o “esgoto” e o “trumpismo” para a campanha parece ser o PSD, não é?

Mas continua esta falsa indignada:

Um primeiro-ministro que há meses queria indignação geral por se ver retratado numa caricatura de uma manifestação de professores, agora chama “diabo” ao outro lado. Uma caricatura que o desumaniza não é permitida, mas um primeiro-ministro a desumanizar opositores, com ar sério, já está tudo bem. Aplausos ouviram-se. Costa quer limitar a liberdade de expressão alheia, mas manter para si direito ao discurso de ódio.[…]”

Desumanizar opositores”? “Discurso de ódio”? Por causa de uma expressão utilizada pelos Passos? Esta mulher passou-se? Quanto à caricatura, não seria mais do que justa uma indignação geral por se verem professores – educadores -, que deviam ter comportamentos exemplares, a descerem tão baixo ao ponto de desenharem aqueles ofensivos, violentos, exagerados, quase-racistas, e deslocados cartazes?

A desonestidade da articulista estende-se depois a outro tema:

[…]“(Não menciono o alegado sucesso da “devolução de rendimentos”. Afinal, diminuir os impostos diretos para mais que compensar com o aumento dos impostos indiretos e terminar com a maior carga fiscal de sempre são papas e bolos para enganar os tolos.)

 

Além de não ser esse “engano por papas e bolos” que os indicadores nos dizem (basta ver os gráficos comparativos com a Europa), a Maria João está fartinha de saber que a carga fiscal não é composta apenas por impostos e que a portuguesa não é das mais altas, pelo contrário. Os chavões que aqui debita sobre a carga fiscal são mentiras.  E, se não sabe que são mentiras, é desqualificada para escrever em público.

Definição de carga fiscal (segundo o glossário do CFP):

“Em termos de finanças públicas, a carga fiscal ou pressão fiscal de um país corresponde à relação percentual entre o total dos impostos e contribuições efetivas para a Segurança Social e o Produto Interno Bruto (PIB). Nos países membros da União Europeia, pode ainda considerar-se no cálculo deste indicador os impostos cobrados por Instituições da União Europeia.”

Está claro?

 “Note que as taxas dos impostos não aumentaram, desceram, mas o total de impostos cobrados aumentou porque a economia cresceu! Portanto, a MJM deturpou deliberadamente o significado das palavras, o que é uma forma ardilosa de mentir!” – esta resposta foi-lhe dada por um leitor nos comentários ao artigo. Espero que leia e medite sobre a possibilidade de a direita ser respeitada quando escreve  tolices como estas e quando recorre a uma linguagem brejeira e a mentiras.

O que não existe não pode acabar

«Como se, e esse é outro ponto, em tudo o que nos diz respeito, incluindo a propriedade e a gestão dos meios de comunicação, dos títulos em que trabalhamos, fosse melhor não mexer, não perguntar, não escrutinar.

Nunca percebi isso. Por que motivo os jornalistas dizem “não somos notícia”. Somos tão notícia como todos os outros, caso haja notícia no que somos ou no que estamos a passar. Nunca entendi por que é que os jornalistas acham que não devem escrever, reportar, sobre jornalismo e jornalistas. E nunca percebi por que motivo os jornais, como as rádios e as TV, quando têm problemas, sejam eles quais forem — deontológicos, laborais, económicos, o que seja, se inibem, evitam, fogem de falar deles.»

Crónica de uma jornalista sem salário

Este texto da Fernanda Câncio, na oportunidade relativo à situação salarial nos títulos da Global Media, é uma rara (única até agora?) reflexão sobre a endémica cobardia dos profissionais que constituem a dita “imprensa” em Portugal. Nas palavras acima citadas, vindas de uma praticante de verdadeiro jornalismo, fica o retrato de uma classe dúplice, conivente com abusos e deturpações dos seus patrões para não perder o emprego ou a carreira ambicionada. Daí não levantarem cabelo, não largarem um pio, não agitarem as águas paradas se na berlinda estiverem os chefes, os administradores, os sócios que pagam as contas e os salários.

O mal não se fica por aí, acrescento eu. Ao estarem dessa forma a violar a missão que supostamente fizeram sua ao obterem a carteira de jornalistas – a qual vem com direitos e deveres que o cidadão comum não tem – estes profissionais passam igualmente a ser coniventes com culturas editoriais de agendamento e engajamento políticos. Dou só um exemplo que ilustra na perfeição este modus operandi: Filipe Santos Costa. Enquanto esteve no Expresso, foi um leal servidor da propaganda pró-PSD e anti-PS disfarçada de jornalismo político. Assim que saiu e mudou de horizontes profissionais, por razões que ignoro mas que associo à hipótese de sentir que não era dos favoritos para também ir ocupar a cadeira de director do pasquim, passou a criticar abertamente a casa do antigo patrão. Igualmente o seu sectarismo contra o PS reduziu-se para um nível próximo do zero. Deixo de fora os casos dos pseudo-jornalistas, também directores, que passam a ter interesses accionistas, ou que se sentam na mesa da administração, e que transformam os órgãos de comunicação social em ostensivos projectos políticos ao serviço do patronato em causa.

Assim, não reconheço que exista imprensa em Portugal. Temos exemplos individuais de pessoas que realmente produzem jornalismo, não temos um único órgão onde o jornalismo como ideal seja a cultura editorial. Nem sequer na RTP, sem que isso escandalize alguém. Não admira, portanto, que o debate político em Portugal seja paupérrimo. Os profissionais que o cobrem e muitas vezes dirigem, que opinam sobre ele maníaca e febrilmente, são os primeiros a abjurar a deontologia jornalística.

Aliança Decadente

O apagamento estalinista do nome de Freitas do Amaral na propaganda da AD do Montenegro, Melo e Pereira, não é uma ofensa ao censurado e ostracizado mesmo depois de morto. O próprio estaria aliviado por não ficar em tão decadente companhia, e teria compaixão para a miséria moral assim assumida pelos infelizes trastes. A ofensa é só para a nobre memória do PSD de Sá Carneiro e de um CDS que teve a coragem de se constituir numa conjuntura particularmente hostil para o seu posicionamento político, onde foi conotado com o regime salazarista pelo sectarismo de um PCP então à beira de impor uma nova ditadura.

O tempo veio a mostrar que as figuras odiadas na retórica da esquerda nos idos de 70 e princípios de 80 — Freitas do Amaral, Basílio Horta, Adriano Moreira, Lucas Pires, Narana Coissoró, outros — eram cidadãos verdadeiramente democratas e patriotas. Freitas do Amaral teve uma carreira política que honrou o melhor que se pode conceber na dimensão política: foi livre em tudo o que fez. Livre quando emulou Marcelo Caetano na academia nos anos 60, livre quando aceitou ser o primeiro líder do CDS em 74, livre quando triunfou com a AD em 1979 e 1980, livre quando dignificou a vitória de Mário Soares em 1986, livre quando abandonou o CDS em 1992, livre quando conquistou o lugar de Presidente da Assembleia Geral das Nações Unidas em 1995, livre quando foi ministro num Governo socialista em 2005, livre ao deixar vasta e relevante obra jurídica.

Naturalmente, logicamente, obviamente, uma figura que viveu a liberdade com esta magnanimidade tem de ser alvo de vinganças de calhordas imprestáveis. Não lhe perdoam a sua exemplar decência e infinita superioridade civilizacional.

O Nuno Melo foi chamado para a “cacetada” e a “peixeirada” e o Gonçalo da Câmara Pereira – fadista e agricultor – para a defesa dos “valores tradicionais”?

Está para se saber o que ganhará o PSD com o convite feito ao líder do CDS, um partido à beira da extinção – e ao do PPM, um partido que se considerava, além de anacrónico, já extinto, para integrarem uma nova Aliança Democrática com vista às eleições legislativas de Março. Esta Aliança Democrática – perdão, a pretensa memória de uma Aliança Democrática passada – é suposto dar um ar mais sério e a gravidade que não tem ao sorriso “cartoon” do Montenegro, que, a par do timbre vocal, afasta milhares de eleitores. Ora bem, esta, e não a outra Aliança, um ar mais sério não virá dar com certeza, mas o discurso de peixeira do Melo, uma forma de barulho, assaz incomodativo, diga-se, poderá contribuir para atenuar o efeito Mona Lisa do tal sorriso. Embora, enquanto alternativa e disfarce, para mim, em nada melhor. Em vez de valor, acrescenta odor. A esgoto. Ou melhor, a peixe podre.

Mas o homem fez bem ou fez mal? É evidente que, num primeiro momento, o recrutamento destes dois partidos moribundos e ausentes do Parlamento dá azo a que se goze com a necessidade do PSD de desenterrar esqueletos para obter mais meia dúzia de votos. No fundo, o convite só corrobora a sua fraqueza. Por outro lado, para o CDS e o PPM é uma oportunidade única e inesperada de voltarem à ribalta.

Quer isto dizer que a decisão foi boa para o CDS e o PPM e má para o PSD?

Para os dois primeiros foi mais do que boa: saiu-lhes a sorte grande. Não tinham representação parlamentar e passam a ter, sem nada terem feito, nos anos de ausência, para o merecer. Para o PSD, depende do que o staff de Montenegro pretende. Para tirar votos ao Ventura, o Nuno Melo tem um estilo de vendedor de cobertores muito parecido e a vacuidade é semelhante. Para combater a esquerda “woke”, o Câmara Pereira quase não precisará de falar. Basta cantar o fado e ir às touradas. Para espalhar mentiras, o PSD tem prática e especialistas que cheguem. Portanto, eu diria que, se o objectivo é tirar votos ao Chega através de uma assunção do seu estilo e dos seus alegados valores, pode ser que consigam. Mas reparem que estamos sempre a falar de uma estratégia de roubo ou não de votos dentro da direita. E de abaixamento do nível da campanha.

Para quem jamais votaria numa direita de Montenegro, Melo, Ventura e Rocha – um bando de demagogos e de mediocridades políticas – esta decisão é irrelevante ou, pior para os seus mentores, pode acabar por qualificar ainda mais o PS e o Pedro Nuno Santos por simples comparação.

Revolution through evolution

Sniffing women’s tears reduces aggressive behavior in men
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The (wrong) reason we keep secrets
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Hearing aids may help people live longer
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Better mental, physical health in older people tied to living near nature
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Ants recognize infected wounds and treat them with antibiotics
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Humans can tell if chickens are excited or displeased, just by the sound of their clucks
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Could we have psi abilities if our brains didn’t inhibit them?
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Continuar a lerRevolution through evolution

Dominguice

António Costa e Pedro Nuno Santos fizeram dois excelentes discursos no congresso do PS. Excelência não só como peças oratórias autónomas mas também na comparação com a concorrência. Costa sai e deixa saudades, o sr. Santos aparece e parece ir ganhar. O PS mostra-se cheio de força e, cada vez mais, o singular esteio do regime democrático nascido de Abril. Pois estas duas tão prendadas criaturas, nesta altura do campeonato, conseguiram a vexante façanha de não terem feito uma singular referência à Justiça. Há mil razões para isso, todas lógicas, todas válidas. E PNS poderá, no discurso de encerramento, tocar na matéria, ignoro. Seja como for, não o fez ao elencar os sucessos da governação socialista, o que significa o que significa.

Certos procuradores do Ministério Público, e certos juízes, não desfrutam de poderes exclusivos e supremos para se substituírem ao Parlamento, ao Governo e à Constituição. Os crimes que cometem, com a cumplicidade da indústria da calúnia, o proveito de certos políticos e o beneplácito da sociedade, são crimes. Crimes cometidos por agentes da Justiça a operar com os instrumentos e protecções ao dispor dos agentes da Justiça. O PS não se pode vangloriar de ser o partido da liberdade, herdeiro da coragem de Mário Soares, se continuar com medo desses criminosos.

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