O caso da Madeira e as reacções que entretanto suscitou (ou não suscitou e devia ter suscitado) permitem-me tirar algumas conclusões. Estas pessoas que nos governam e que deitaram abaixo um governo legítimo, bem intencionado, competente, patriota e com uma visão para o desenvolvimento do país, em nome de uma suposta credibilidade e transparência, tinham conhecimento da ocultação de dívidas substanciais pelo governo regional da Madeira (impossível o deputado Guilherme Silva, membro destacado do PSD, não saber) e encenam agora o número da grande surpresa, não só cá como lá fora.
Ora, se fosse mesmo uma surpresa, como se compreende que, em nome da tal credibilidade e da moralização da vida política, de cuja ausência acusavam o governo anterior, se limitem a dizer que, enfim, não se compreende, mas que é ao povo da Madeira que cabe fazer o seu juízo? Ao povo da Madeira? Mas se é esse povo o beneficiado com as falcatruas! Porque não antes à maioria esmagadora dos portugueses, cujos interesses o primeiro-ministro é suposto defender e em nome de quem actua?
A vinda da Troika não deve ter escapado a Alberto João, mesmo vivendo numa ilha. Também não lhe deve ter escapado que as continhas iriam ser esmiuçadas.
Não será preciso ter uma inteligência superior para perceber que tudo foi combinado com Alberto João de modo a que este solicitasse uma auditoria às contas da ilha (para poderem vir dizer isso mesmo, e que eu mesma já ouvi: ”Mas se até foi o presidente do governo regional a solicitá-la! Querem maior prova de honestidade?”). Mas, atenção, só agora, quando o pouco tempo que medeia até às eleições de Outubro já é, de si, impeditivo de uma não candidatura de Alberto João.
Ou seja, apesar do buraco, havia que eleger AJJ, logo, vai-se mais longe do que o exigido no Memorando, alegando que se trata de ganhar credibilidade a nível externo e mostrar empenho, quando, no fundo, se procura arranjar dinheiro tributando os continentais para “prevenir”(sinónimo de cobrir) surpresas, que, afinal, não o eram.
Haveria apenas uma maneira de desmentir estas conclusões: a retirada da confiança política a Jardim, que, aliás, como se vê no vídeo, confessa ter escondido deliberadamente as dívidas, e uma intervenção do presidente da República, censurando tal comportamento, pedindo a aplicação rigorosa da lei para estas infracções ou até, dada a confissão feita pelo próprio, demitindo-o. Penso que tem poderes para isso. Se nada disto for feito, fica o golpe de teatro e o que isso revela de desonestidade, partidarismo e compadrio, que o actual governo sobrepõe sem hesitar e com grandes dotes teatrais ao interesse da população portuguesa em geral. É uma má opção, até porque a “moralização” do caso AJJ só poderia trazer dividendos políticos a esta coligação.