Declaração Política OE2014
Pedro Marques, Deputado do PS
Este Orçamento de Estado nasce ferido de morte, porque ferida de morte está a credibilidade da política orçamental deste Governo.
Prometeram consolidação orçamental. Prometeram menos défice e menos dívida. Mas ao contrário do prometido, quais são os resultados que têm para apresentar?
Mais de 5.000 milhões de Euros de sacrifícios perdidos para a recessão! Toda a austeridade de 2013, todo o enorme aumento de impostos, deitado para o caixote do lixo. A depressão provocada pelo choque de expetativas e o corte de rendimentos, anulou , para efeitos orçamentais, todo o resultado dos sacrifícios que o governo pediu aos portugueses.
O défice com que iniciaram o ano de 2013, é assim, nas contas do próprio Governo, exatamente o mesmo que transitará para 2014. Um fortíssimo e repetido desvio de todas as promessas do Governo. 5.000 milhões de austeridade, de aumento de impostos, perdidos para a recessão. Uma dívida pública que não para de subir, com um desvio de 5.000 milhões de Euros e mais 54.000 desempregados, do que nos prometiam há um ano.
Prometeram consolidação, tivemos dor e desilusão!
Mas também ao contrário do que repetiram, aí está um novo e enorme pacote de austeridade para 2014. Quase 4.000 milhões de Euros de novas medidas de austeridade, ao contrário do que foram repetindo aos portugueses. Sempre estes 4.000 milhões de Euros que nos perseguem, que este Governo propôs à Troika inscrever no Memorando na longínqua quinta avaliação. Lembram.se, sras e srs. Deputados?
E qual a via que escolheram? Os cortes de rendimentos de funcionários públicos e de pensionistas. Que como se sabe, para as famílias, é o mesmo que aumentar impostos. Na vida das pessoas, cortar retroativamente os rendimentos é o mesmo que aumentar impostos. Portanto, ao enorme aumento de impostos, acrescentam, sob outra forma, outro enorme aumento de impostos, agora impostos de classe.
E nem a demagogia do Governo que ia fazendo o seu caminho, de que medidas anunciadas à Troika em Maio não são medidas novas nos bolsos dos portugueses, nem essa demagogia encontra respaldo nesta proposta de Orçamento.
Ao contrário do que disseram repetidamente aos portugueses, aí está um impressionante alargamento dos cortes de vencimentos aos funcionários públicos. Não há novas medidas de austeridade? Perguntem às centenas de milhares de funcionários públicos com salários mais baixos, a partir dos 600 Euros, se a sua expetativa era verem agora cortado o seu salário. Perguntem às dezenas e dezenas de milhares de funcionários públicos a quem vão mais do que duplicar o corte de vencimentos, se estavam à espera deste corte?
Perguntem às dezenas de milhares de pensionistas de sobrevivência se esperavam um corte nas suas pensões, para as quais descontaram uma vida inteira os seus falecidos cônjuges. Perguntem aos pensionistas da Caixa Geral de Aposentações se esperavam a diminuição das suas pensões, quando ouviram Passos Coelho dizer em 2011 que cortar o valor das pensões já atribuídas seria o Estado a apropriar-se de algo que não lhe pertence.
Perguntem a estes pensionistas se estão chocados. Se estão chocados com o facto de a palavra do Primeiro-Ministro não ter nenhum valor. Se estão chocados por a linha vermelha de Paulo Portas se ter afinal transformado numa enorme burla grisalha.
Ou se os choca mais, afinal, o corte retroativo das suas pensões, ao fim de uma vida de trabalho e de descontos, julgando que o Estado de Direito lá estaria para os proteger. Ao menos a estes, que tendo chegado ao fim da idade ativa, nada mais podem fazer para mudar a sua situação. Não podem , com 70 ou mais anos, ir à procura de trabalho para compensar os rendimentos que o Governo agora lhes quer tirar. Choque de expetativas? Não, é mais um país a chocar com a parede!
Qual é, em suma, a credibilidade de uma política orçamental de um Governo que faz repetidamente o contrário do que prometeu, e que ainda por cima falha repetidamente todos os seus resultados? Que perde toda a austeridade para a recessão, e que de seguida, não retira nenhuma ilação, e continua no mesmo caminho?
Alguém pode acreditar nos objetivos deste Orçamento? Como pode o Governo achar que o aumento do desemprego e o profundo corte de salários e pensões vai benignamente garantir uma estabilização do consumo privado? Como pode o Governo considerar que o Investimento vai agora crescer, se os empresários, quando inquiridos, sempre referem que não investem, porque não há procura para os seus produtos? Mas alguém pode investir quando as classes médias e os pensionistas continuam esmagados pelo aumento de impostos, e vão ter ainda mais cortes de rendimentos?
Não, a única saída desta situação é parar com a adoção de novas medidas de austeridade recessiva. Dito de forma muito clara, se uma terapia de choque provoca tantos efeitos secundários, que o paciente está a morrer da cura, a solução é dar ainda mais uma dose, ou mudar a terapia?
E não se desculpem com a Troika. Se o Governo propôs à Troika a inclusão no Memorando dos 4.000 milhões de Euros de austeridade para 2014. Se, como ficou bem evidente na reunião da Comissão Parlamentar de Acompanhamento do Memorando, o Governo iniciou esta nova ronda de avaliação trimestral sem se entender quanto ao objetivo do défice para 2014. Como queriam que a Troika aceitasse alguma alteração de trajetória?
Não! O que se exigia do Governo nesta situação tão difícil, era clareza, coesão e liderança. Para mobilizar os portugueses e para convencer os credores de que outra estratégia era possível e necessária.
Mas este é um capital de que já não dispõe o Governo de Portugal.
Porque este Governo não é claro, é dissimulado, piorou aliás muito na nova formação governativa, com os rodriguinhos do Vice Primeiro-Ministro e os problemas com a verdade da Ministra das Finanças.
Coesão, essa degradou-se severamente no episódio da TSU há um ano, e perdeu-se em definitivo na crise política deste Verão.
Liderança, nunca teve, nem um líder dentro do Governo, nem capacidade de liderar e mobilizar o país.
É imperiosa outra estratégia orçamental, mas para tanto seria necessária outra capacidade de mobilizar o país, e até outros parceiros europeus, para lutar na Europa pela mudança de políticas.
Mas para isso o país teria que acreditar no Governo, mas para isso as políticas do Governo teriam que estar do lado do país. Já nada disso se verifica, e essa é a tragédia deste Orçamento.
Este Orçamento é assim a cara do Governo, pouco credível e muito deprimido. Afunda o Governo num mar de contradição, mas, pior, afunda ainda mais o país na recessão.