A Iberia tem os melhores especialistas de marketing do planeta. O slogan da companhia é: “a pontualidade é o nosso objectivo”. Uma forma elegante de desarmar os clientes furiosos, pelo riso desbragado. Dir-me-ão vocês: – não me diga que nunca houve nenhum voo da Iberia que tenha chegado a tempo? Houve claro, mas até um relógio parado dá, duas vezes por dia, a hora certa. Durante toda a minha vida, os grandes atrasos têm um nome: Iberia.
Eu quando tomo um avião da garbosa companhia castelhana acrescento mais três horas para ligações, para não me espalhar. Infelizmente, cada vez que compro um bilhete dessa companhia, dou um passo para o abismo: perdi o avião para Tutxla Gutierres, quase faltando a um encontro com a guerrilha zapatista, em 1996; foi difícil conseguir sair de uma Colômbia sufocante, numa guerra sem fim, entre guerrilha e paramilitares, em 2002.
Actualmente, os atrasos são menos emocionantes, apenas falto a reuniões, mas quando me falam que eu exagero e que há pessoas que não se queixam, nem sequer das sandochas duvidosas a cinco euros, eu lembro-lhes: também se diz que um grupo numeroso de macacos munidos de máquinas de escrever, com um tempo infinito, é capaz de escrever as obras completas de Shakespeare. Quando me interrogam o que é que isso tem a ver com o esforço da Iberia, eu respondo: dois macacos, cinco minutos…
Máximas poéticas para a fundamentação do consumismo selvagem
Consultório sentimental
O JPT não acredita que a mobilidade social tenha acabado com a luta de classes. Insisto com ele. Abril criou mobilidade social. Fenómeno novo no país mas rapidamente apreendido. O povo, em vez de lutar pela igualdade, passou a lutar para deixar de ser povo. Passou a querer ser classe média. E depois de classe média passou a querer ser classe alta. Foi vê-los, infectados pelo vírus do consumismo, a comprarem casas, carros e a tirarem cursos superiores.
E agora, depois deste enorme triunfo, depois de lhes darem a possibilidade de viver e tratar mal quem fica por baixo, atrevem-se a falar de igualdade? Nem pensar! Já não há povo nem classes baixas. Há cidadãos com mais dificuldades que outros. Mas ninguém quer ser povo outra vez. Luta de classes? Claro que sim. Para mantê-las. RMD
E quando subia no elevador lembrei-me desta historieta
Em casa deles havia um gato.
Gato emproado que gostava tanto de se exibir que mais parecia gente grande que felino desmiolado. Nunca me esforcei por esconder a antipatia pelo bicho. Por todos os bichos do género. Era sabido que só não lhe pisava a cauda por excesso de testemunhas. Certo dia, comigo sozinho na sala, acontece a tragédia.
Um pássaro exibia-se na janela aberta. Para a frente e para trás. Para trás e para a frente. Para a frente e para trás. Atormentava o gato. E o gato deixava-se atormentar, fazendo sombra no parapeito aos movimentos do passoroco. Se te apanho, conseguia eu ouvir. Ai se te apanho. E o pássaro, para a frente e para trás. Para trás e para a frente. Para a frente e para trás. E o gato, para a frente e para trás. Para trás e para a frente. Para a frente e para trás. Atazanado para além da lucidez, não resiste e lança-se apontando as mortais garras. E o pássaro, bem planeado, em pleno ar zinga (!) dá-lhe prodigiosa revienga.
Juro-vos que vi a expressão do gato fintado. Tinha ar de Paulo Ferreira depois de ver o Cristiano passar. Nem teve tempo de lamber o orgulho ferido. Ficou o Ferreira sem contrato e o gato sem planar. Lá se foi o bicho, tipo desenho animado, com um miaaaaaaaau decrescente de proa apontada ao passeio…dezasseis andares mais baixo. As sete vidas gastaram-se todas daquela vez.
Eles perderam o gato e eu perdi-os a eles. Está bom de ver que eles não compraram a tese do pássaro rabujador e ainda hoje me tomam de gaticida. RMD
Se eu fosse árabe tinha resolvido a polémica dos cartoons assim
Prémio: “Lá na Covilhã não havia nada disto”
Sócrates confessou-se impressionado com o facto das crianças finlandesas saberem falar inglês aos sete anos. Conclusão: o povo português elegeu um primeiro-ministro que não sabe que todas as crianças, mesmo aquelas nascidas na Covilhã, conseguem assimilar várias línguas durante a infância. É só preciso que as ensinem. RMD
Deixem-me rir
Ao Diário de Notícias, Paulo Portas afirmou que o seu novo espaço de comentário político (“O Estado da Arte”, estreia hoje, às 23h00, na SIC Notícias) pretende contrariar a «overdose de esquerda e de esquerdismo» instalada em Portugal. Uma overdose que chega a ser ostensiva no caso das televisões, acrescento eu. Veja-se o que acontece nesses espaços similares de análise “a solo” que a RTP concede, todas as semanas, ao esquerdista Marcelo Rebelo de Sousa e ao esquerdista António Vitorino.
VIAGENS #9 -POLÓNIA VARSÓVIA 05
O incrível mundo novo de VPV
Esta madrugada perdi algum tempo nas caixas de comentários do Espectro. Perdi tempo? Não de todo. Foi um raid de reconhecimento pelos novos cafundós do País.
Vozes ululavam na noite. Os pretextos, também, eram capitosos: o alegado défice de diplomas de Clara Ferreira Alves, a alegada pedofilia de Manuel Teixeira-Gomes. Apresso-me a dizer: nem uma coisa nem a outra os impediram (to say the lest), a eles, Manuel e Clara, de serem bons autores deste amado idioma. Mas não é isto, patentemente, que interessa aos exímios escrivães da noite.
O País não lê. Não era novidade, agora é uma evidência.
Falta dizer que o cronista Vasco Pulido Valente achou um novo suporte. Bem-vindo, senhor, a estas lúgubres paragens. Que você escreva aqui – como certo comentador lembrou – aquilo que não ousa dizer na imprensa, eis o que só nos conforta.
E nos tira esta má consciência, que já pesava.
A minha análise da noite
Tradução simultânea
Ão-ão-ão-ão-ão, ão-ão-ão, ão ão-ão, ão-ão-ão-ão ão-ão-ão-ão-ão, ão-ão ão-ão-ão. Ão-ão-ão. ão-ão-ão-ão-ão, ão-ão ão-ão-ão-ão-ão, ão-ão-ão ão-ão-ão-ão-ão. Ão-ão-ão ão-ão ão-ão-ão-ão-ão. Ão-ão-ão. ão-ão-ão-ão-ão, ão-ão ão-ão-ão-ão-ão, ão-ão-ão ão-ão-ão-ão-ão. Ão-ão-ão ão-ão ão-ão-ão-ão-ão. Ão-ão-ão ão-ão ão-ão. Ão-ão-ão ão-ão ão-ão-ão-ão-ão, ão-ão ão ão-ão-ão.
[O verdadeiro discurso de agradecimento de Philip Seymour Hoffman, sem a voz off meticulosamente sincronizada que os produtores dos Óscares sobrepuseram, à má fila, durante o espectáculo transmitido esta madrugada para todo o mundo.]
O grande esquecido da noite dos Óscares
Diogo Freitas do Amaral
Tem as suas incoerências, ai pois tem. Tem as suas peças de teatro com cheiro a naftalina, ai pois tem. Tem o rosto associado, na memória dos gajos de esquerda como eu, a um certo modelo de casaco verde escuro assustador, ai pois tem. Tem aquela vozinha professoral particularmente irritante, ai pois tem. Tem uma certa arrogância intrínseca que a recente “deriva esquerdista” (tão verberada pela direita) não apagou, ai pois tem. Tem no currículo a mais ridícula nota alguma vez emitida por um ministério, desde que Mohammed Saeed al-Sahaf (o genial ministro da Informação de Saddam Hussein) foi inexplicavelmente afastado do cargo por essa força obscura chamada realidade, ai pois tem. Mas caramba, não se pode dizer mal de um homem que utiliza em 2006, ainda por cima com propriedade, a palavra topete, um dos mais preciosos e esquecidos substantivos da nossa língua.
Poste sobre o tema do dia
Esta coisa do poder de síntese é óptima. Aqui vai outra:
Ia escrever um ensaio enorme sobre o assunto mas depois consegui resumi-lo numa frase
Até nisso ela era especial
Anúncio de um outro blogue de direita, conservador, reaccionário, para além do Aspirina B
Sexta Coluna RMD



RMD
