«A mulata do engenheiro» de Inácio Rebelo de Andrade
Poderia chamar-se «O futuro não estava lá» porque esta narrativa de 315 páginas tem essa conclusão: trata-se de um logro, uma ilusão, uma mentira. Carolina, menina nascida em Angola, filha de um branco e de uma negra, andava de olhos abertos mas não via. No Colégio de Nova Lisboa as criadas e as serventes eram negras; as professoras eram brancas. Na missa dominical os brancos ficavam nas filas da frente e os negros nas filas de trás. Na estação de comboios a caminho da fronteira com o Catanga (ao tempo belga) via as carruagens com bancos estofados para os passageiros brancos e bancos de ripas para os negros. Nem uma prolongada estadia em Lisboa onde frequentou a Universidade e onde conheceu o marido afastou da sua mente a ingenuidade de pensar que em Angola era possível uma convivência cordial entre brancos e negros. Foi preciso um empregado do Clube da Companhia de Caminhos-de-ferro de Benguela adverti-la de modo brutal para descobrir essa verdade: «A senhora não pode nadar aqui. Esta piscina é só para brancos. Faça o favor de sair!» O episódio da piscina provoca na protagonista uma amarga reflexão: «Tão segura das suas certezas, com tantas leituras, com tantos estudos, porque ignorara até esse dia que na sua terra, onde nascera meio-branca, meio-negra, os brancos mandavam porque eram brancos e os negros obedeciam porque eram negros?» Obrigada a regressar a Lisboa por não suportar o ambiente hostil da sua terra, Carolina percebe que está condenada a viver entre duas terras, entre dois mundos, entre dois universos. Viaja no paquete Príncipe Perfeito em Novembro de 1959 do Lobita para Lisboa mas sabe que o seu futuro não está em Lisboa tal como não estava em Angola.
(Editora: Novo Imbondeiro, Capa: Francisco Amorim)