Dizer-se “queremos uma justiça rápida” dá votos e é popular. Nos dias que correm é mais popular do que dizer-se “queremos justiça”. Calha que uma vai com a outra no sentido estrito de que a demora injustificável da justiça significa, para quem a procura, uma denegação de justiça. É por isso que não pode haver populismos nesta área tão sensível.
Não queremos combater a corrupção com formulações de tipos penais que afrontam os nossos direitos, os de todos nós, como aconteceu com a bandeira do “enriquecimento ilícito”, defendida com arrogância, numa espécie de monopólio da virtude, e combatida com princípios, para ser finalmente afastada pelo TC.
Outra bandeira da MJ foi a alteração do Código de Processo Penal, através da aprovação aplaudida pela maioria parlamentar no sentido de permitir-se o julgamento em processo sumário aplicável a crimes cuja pena máxima abstratamente aplicável é superior a cinco anos de prisão, isto é, podendo a pena ser de 25 anos.
Desde que o presumível criminoso fosse apanhado em flagrante delito por qualquer autoridade judiciária ou entidade policial ou por outra pessoa (tipo eu) e, num prazo que não exceda duas horas, o detido tenha sido entregue a uma autoridade judiciária ou entidade policial, tendo esta redigido auto sumário da entrega, está ditada a justiça…rápida e em tribunal singular, nos quais, como se imagina, estão os juízes mais experientes.
As discussões, desde logo na primeira comissão, foram sérias, mas nunca vislumbrei uma dúvida no espírito do legislador veloz.
“Está visto, está visto”, foi uma das frases gloriosas que ouvi por parte do Governo.
Percebe-se, sem se aderir a tamanha filosofia, até porque a alteração legislativa resultante da Lei n.º 20/2013, remeteu o julgamento de crimes como os descritos para tribunais singulares.
Acontece que não vale tudo. E o TC, em fiscalização concreta, deu razão à razão umas 8 vezes, se não estou em erro.
Finalmente, em processo de fiscalização abstrata, decidiu-se declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 381º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na redação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, na interpretação segundo a qual o processo sumário aí previsto é aplicável a crimes cuja pena máxima abstratamente aplicável é superior a cinco anos de prisão, por violação do artigo 32º, n.ºs 1 e 2, da Constituição.
Aqui se arruma com o “está visto, está viso”, e ao longo deste acórdão (174/2014) são explicadas as garantias do arguido e como a sua limitação é, nesta configuração, um passo para o erro na condenação.
Que diz a Ministra?
Fuga para a frente, declaração vazia, vamos, vamos manter o bom dos processos sumários, isso que já lá estava e que nada tem a ver com este horror. Os processo sumário já existia; fazer dele o que se queria fazer é que escapa ao bom-senso. Ninguém é contra o processo sumário, não vale a pena tentar virar o prato.
A MJ pode continuar a dizer o que quiser porque o TC já recordou que “o princípio da celeridade processual não é um valor absoluto e carece de ser compatibilizado com as garantias de defesa do arguido. À luz do princípio consignado no artigo 32º, n.º 2, da Constituição, não tem qualquer cabimento afirmar que o processo sumário, menos solene e garantístico, possa ser aplicado a todos os arguidos detidos em flagrante delito independentemente da medida da pena aplicável”.
Esperemos que a MJ derrotada, outra vez, legisle reconhecendo os buracos que as suas propostas apresentam, em vez de fingir que eles não estavam lá.