Todos os artigos de Isabel Moreira

Julgamentos sumários – a ver se a gente se entende

 

Dizer-se “queremos uma justiça rápida” dá votos e é popular. Nos dias que correm é mais popular do que dizer-se “queremos justiça”. Calha que uma vai com a outra no sentido estrito de que a demora injustificável da justiça significa, para quem a procura, uma denegação de justiça. É por isso que não pode haver populismos nesta área tão sensível.

Não queremos combater a corrupção com formulações de tipos penais que afrontam os nossos direitos, os de todos nós, como aconteceu com a bandeira do “enriquecimento ilícito”, defendida com arrogância, numa espécie de monopólio da virtude, e combatida com princípios, para ser finalmente afastada pelo TC.

Outra bandeira da MJ foi a alteração do Código de Processo Penal, através da aprovação aplaudida pela maioria parlamentar no sentido de permitir-se o julgamento em processo sumário aplicável a crimes cuja pena máxima abstratamente aplicável é superior a cinco anos de prisão, isto é, podendo a pena ser de 25 anos.

Desde que o presumível criminoso fosse apanhado em flagrante delito por qualquer autoridade judiciária ou entidade policial ou por outra pessoa (tipo eu) e, num prazo que não exceda duas horas, o detido tenha sido entregue a uma autoridade judiciária ou entidade policial, tendo esta redigido auto sumário da entrega, está ditada a justiça…rápida e em tribunal singular, nos quais, como se imagina, estão os juízes mais experientes.

As discussões, desde logo na primeira comissão, foram sérias, mas nunca vislumbrei uma dúvida no espírito do legislador veloz.

“Está visto, está visto”, foi uma das frases gloriosas que ouvi por parte do Governo.

Percebe-se, sem se aderir a tamanha filosofia, até porque a alteração legislativa resultante da Lei n.º 20/2013, remeteu o julgamento de crimes como os descritos para tribunais singulares.

Acontece que não vale tudo. E o TC, em fiscalização concreta, deu razão à razão umas 8 vezes, se não estou em erro.

Finalmente, em processo de fiscalização abstrata, decidiu-se declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 381º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na redação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, na interpretação segundo a qual o processo sumário aí previsto é aplicável a crimes cuja pena máxima abstratamente aplicável é superior a cinco anos de prisão, por violação do artigo 32º, n.ºs 1 e 2, da Constituição.

Explicando melhor, “como o Tribunal Constitucional tem reconhecido, o julgamento através do tribunal singular oferece ao arguido menores garantias do que um julgamento em tribunal coletivo, porque aumenta a margem de erro na apreciação dos factos e a possibilidade de uma decisão menos justa (entre outros, os acórdãos n.ºs 393/89 e 326/90). É desde logo a maior abertura que a intervenção de órgão colegial naturalmente propicia à ponderação e discussão de aspetos jurídicos e de análise da prova que permite potenciar uma maior qualidade de decisão por confronto com aquelas outras situações em que haja lugar ao julgamento por juiz singular”

“Daí que a opção legislativa pelo julgamento sumário deva ficar sempre limitada pelo poder condenatório do juiz definido em função de um critério quantitativo da pena aplicar, só assim se aceitando – como a jurisprudência constitucional tem também sublinhado – que não possa falar-se, nesse caso, numa restrição intolerável às garantias de defesa do arguido”.

“Acresce que a prova direta do crime em consequência da ocorrência de flagrante delito, ainda que facilite a demonstração dos factos juridicamente relevantes para a existência do crime e a punibilidade do arguido, poderá não afastar a complexidade factual relativamente a aspetos que relevam para a determinação e medida da pena ou a sua atenuação especial, mormente quando respeitem à personalidade do agente, à motivação do crime e a circunstâncias anteriores ou posteriores ao facto que possam diminuir de forma acentuada a ilicitude do facto ou a culpa do agente”

“E estando em causa uma forma de criminalidade grave a que possa corresponder a mais elevada moldura penal, nada justifica que a situação de flagrante delito possa implicar, por si, um agravamento do estatuto processual do arguido com a consequente limitação dos direitos de defesa e a sujeição a uma forma de processo que envolva menores garantias de uma decisão justa”.

Aqui se arruma com o “está visto, está viso”, e ao longo deste acórdão (174/2014) são explicadas as garantias do arguido e como a sua limitação é, nesta configuração, um passo para o erro na condenação.

Que diz a Ministra?

Isto.

Fuga para a frente, declaração vazia, vamos, vamos manter o bom dos processos sumários, isso que já lá estava e que nada tem a ver com este horror. Os processo sumário já existia; fazer dele o que se queria fazer é que escapa ao bom-senso. Ninguém é contra o processo sumário, não vale a pena tentar virar o prato.

A MJ pode continuar a dizer o que quiser porque o TC já recordou que “o princípio da celeridade processual não é um valor absoluto e carece de ser compatibilizado com as garantias de defesa do arguido. À luz do princípio consignado no artigo 32º, n.º 2, da Constituição, não tem qualquer cabimento afirmar que o processo sumário, menos solene e garantístico, possa ser aplicado a todos os arguidos detidos em flagrante delito independentemente da medida da pena aplicável”.

Esperemos que a MJ derrotada, outra vez, legisle reconhecendo os buracos que as suas propostas apresentam, em vez de fingir que eles não estavam lá.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Aprovado, agora mesmo, por unanimidade (iniciativa do GPPS)

VOTO DE CONDENAÇÃO DA APROVAÇÃO, NO UGANDA, DA CRIMINALIZAÇÃO DA HOMOSSEXUALIDADE, PUNINDO-A COM PRISÃO PERPÉTUA

No dia 24 de Fevereiro de 2014, o presidente do Uganda, Yoweri Museveni, promulgou um atentado insuportável aos direitos humanos: uma lei que criminaliza a homossexualidade, punindo-a com prisão perpétua, ao arrepio dos apelos internacionais que, em vão, tentaram travar mais um passo contra a comunidade LGBT.

O anúncio da aprovação foi feito com regojizo, com aplausos a que todos assistimos, num Estado que insiste em afirmar na sua legislação que “o conhecimento carnal com outra pessoa do mesmo sexo é contra a ordem da natureza”.

Os estimados 500 mil ugandeses assumidamente LGBT e os incontáveis cidadãos e cidadãs que vivem na opressão ditada pelo medo, não gozam de qualquer forma de proteção legal contra atos de violência. Assim, espancar um gay ou uma lésbica é a decorrência tida por natural num país onde respeito desta matéria de direitos humanos se insiste em afirmar que “a homossexualidade é um modo de vida que a sociedade não deve aceitar”.

A popularidade que este agravamento da punição das pessoas LGBT gerou confronta a Assembleia da República, as Organizações Internacionais, a União Europeia em particular e cada um de nós com o dever de afirmar sem reservas que temos por intolerável qualquer tipo de juízo negativo sobre a orientação sexual das pessoas, vivam estas onde viverem, seja qual for o discurso social dominante no país em causa.

É nosso dever, perante um mundo no qual, sob um silêncio aflitivo, 80 países mantêm leis homofóbicas promovidas pelo Estado, com penas de prisão, e até com pena de morte, dizer uma e infinitas que vezes que a que a homossexualidade é uma orientação sexual normal e saudável, que a homofobia representa a ignorância e o medo em ação e constitui um atentado grave no campo dos direitos humanos e que cabe aos Estados, à luz do quadro de valores inscritos em Declarações Universais, convenções como a Convenção Europeia dos Direitos Humanos, e Constituições, como a portuguesa, que não tolera discriminações fundadas na orientação sexual, dar o exemplo transformador de mentalidades segregadoras.

Cabe a todos nós derrubar diariamente a identificação de gays e lésbicas com classificações históricas e cíclicas como a de “antinatural”, “doença” ou “desvio”. Se revivemos com a história não longínqua o envio de gays e lésbicas para campos de concentração, para a deportação ou para experiências médicas, à conta das referidas qualificações, sabemos que o fim da discriminação com base na orientação sexual ainda hoje está a fazer o seu percurso. 

Precisamente, há quatro dias foi aprovado o ensaio de uma solução final para aquela comunidade LGBT, cujos rostos começaram já a ser identificados.

Neste espírito, a Assembleia da República, reunida em plenário, condena veementemente a lei aprovada pelo Uganda no dia 24 de Fevereiro de 2014, que criminaliza a homossexualidade, punindo-a com prisão perpétua.

 

Palácio de São Bento, 27 de fevereiro de 2014,

Os Deputados

 

Por que será?

1. Um projeto de lei (coadoção) é aprovado na generalidade.

2. Segue-se o processo na especialidade.

3. Marca-se a data para a votação final global.

4. Sai da cartola uma proposta de referendo sobre coadoção e adoção.

5. O TC tem o prazo de 25 dias para se pronunciar.

6. O TC pronuncia-se pela inconstitucionalidade da proposta de referendo.

7. Entretanto o projeto de lei (já me esquecia, e as crianças) está suspenso.

8. Os autores têm duas hipóteses legais: desistir ou reformular.

9. Em que prazo? Bom, todas as decisões têm um prazo, expressamente previsto ou encontrado numa norma por analogia ou, no limite, por acordo, numa lógica de razoabilidade.

10. No limite, a partir da data da convocação das eleições europeias, tornando-se impossível a convocação de referendos, a possibilidade de reformulação caduca.

11. Mas há quem pense que a faculdade de decidir se se desiste ou se se reformula, ao contrário de coisas pouco importantes, como o limite de validade de uma iniciativa legislativa, os prazos de decisão do TC em preventiva, os prazos do PR para vetar, entre tantos, é ..nenhum. É discricionário. O prazo termina … no final dos tempos. Pelo meio, talvez bastante antes – do final dos tempos – caducaria o projeto de lei da coadoção subitamente suspenso (final da legislatura).

12. É isto.

Por que será?

 

 

 

 

 

 

 

Ironias – vamos fingir que a questão é o “aborto”

O PSD, acolhendo as ideias sem preconceitos de António Pinheiro Torres, aprovou no seu congresso a reavaliação do modo como a lei do aborto é aplicada em Portugal.

O tema não é a IVG – perdão, o “aborto” -, o tema é a infiltração na JSD e no PSD do conservadorismo extremista obsoleto que se lambuza de alegria com a possibilidade de punição das mulheres espanholas. Os mesmos que fingem desconhecer as regras de um referendo e dizem, com espanto, que uma pergunta de resposta sim ou não, como a CRP manda que seja, não tenha lá toda a regulamentação. Até porque se tivesse, António Pinheiro Torres, Isilda Pegado e companhia teriam sido, claro, a favor da IVG, certo?

Os mesmos que sabendo de todos os bons resultados na aplicação da IVG (por exemplo ao nível da taxa de repetição), resultados esses que traíram todas as suas previsões, encontraram sob os ventos de Espanha uma nova luta: as taxas moderadoras.

Soa bem, mas as pessoas sabem que a IVG pertence à categoria de actos médicos sem taxas nomeadamente por causa do sigilo. Ora vamos ver: se uma mulher decide interromper uma gravidez sem o conhecimento do cônjuge (as razões poderão ser infinitas, mas todas elas … dela) irá a mesma pedir àquele a declaração conjunta de IRS para fazer prova de insuficiência económica? E se uma menor com idade legal para interromper uma gravidez exercer esse direito sem querer, como é sua prerrogativa, que os pais saibam? O que faz? Vai pedir aos pais a declaração de IRS como dependente arriscando o sigilo da sua decisão? E uma mulher que por duas vezes recorre à IVG? Deve ser punida como defende este PSD arcaico? E por quê? O PSD sabe o que levou uma mulher a ter a infelicidade de interromper 2 vezes uma gravidez? O PSD faz desta mulher uma “reincidente”, jogando propositadamente na terminologia do direito penal, na terminologia da culpa.

O tema não é a IVG – perdão, o “aborto” -, o tema é a infiltração na JSD e no PSD do conservadorismo extremista obsoleto defendido pelos nomes de sempre, os que alegram este blogue, que afirma violentamente o que os novos inspiradores do PSD afirmam com uma linguagem aparentemente diferente. São contra tudo o que a lei civil consagre que não seja o espelho do código canónico. São contra o divórcio, são contra os homossexuais – ser contra as uniões de facto ou  casamento (noutra linguagem, casamento entre sodomitas) ou o que quer que seja é consequência -, são contra a lei da mudança de sexo (na petição explicavam como as pessoas podiam organizar-se para cometer grandes crimes e depois mudar de sexo para fugir à lei – apesar de as autoridades competentes ficarem, claro, com os dados identificativos da pessoa em causa antes e depois da mudança de sexo), são contra a educação sexual nas escolas, exigem que o estado financie as famílias que recusam o ensino público, mesmo onde há oferta, e que querem os seus filhos em colégios decentes, são contra a lei da PMA (das mais restritivas da Europa) e sem um pingo de honestidade intelectual continuam a tentar ser um de nós.

Não são. O país não se revê na ideologia totalitária sobre as escolhas pessoais de cada um.

E o PSD?

 

Ontem: excelente declaração política de Eduardo Cabrita

Sra. Presidente

Sras. e  Srs. Deputados

O sr. Primeiro-ministro chegou ao último debate quinzenal em tom de encenada festa e de campanha eleitoral. A execução orçamental de 2013 era o pretexto para essa manhã de ilusões adornada pela melopeia do consenso necessário com o PS por parte de um Governo que, como o Conselho de Ministros de hoje mais uma vez provou, se carateriza por uma relação de reincidente conflito com o estado de direito e de generalizado desprezo pela posição dos parceiros sociais.

O semblante luminoso do dr. Passos Coelho toldou-se quando o líder do Partido Socialista o confrontou com a trágica dimensão dos sacrifícios para tão medíocres resultados e com a circunstância de o milagre orçamental ter pés de barro assentar largamente em receitas extraordinárias sobretudo num perdão fiscal que segundo o FMI e a Comissão Europeia incentiva o incumprimento e cujos custos, em receitas perdidas, o Primeiro-Ministro não foi capaz de explicar.

Igualmente na audição de 24 de Janeiro na Comissão Parlamentar de Orçamento e Finanças a sra. Ministra apresentou-se exultante de auto-estima com os resultados orçamentais e a confiança dos mercados mas surpreendentemente igualmente baqueou quando confrontada com a dimensão dos sacrifícios exigidos aos portugueses para obter uma redução do défice, sem medidas extraordinárias de umas parcas duas décimas de PIB, com a circunstância de a dívida pública ter atingido os 129.4% mas sobretudo voltou a não ter resposta para a despesa fiscal resultante do Regime Extraordinário de regularização de dívidas fiscais e à segurança social que in extremis permitiu maquilhar a medíocre execução orçamental de 2013.

Estranharam o tom de festa os contribuintes, as famílias e as empresas cumpridoras das suas obrigações fiscais em tempos de crise.

Não houve perdão fiscal para os trabalhadores que em 2013 pagaram mais de 35,5% de IRS isto é mais 3200 milhões de euros na sua grande maioria pagos por retenção na fonte.

Não houve perdão fiscal para a restauração que continuou a suportar um IVA mais elevado do que na Grécia, na Irlanda, Espanha ou Itália.

Não houve perdão fiscal para os  desempregados ou para os  doentes  que  passaram a pagar um imposto especial de 5 % ou 6% sobre os subsídios  auferidos  por  circunstâncias que nâo escolheram.

Não houve perdão para os acamados ou fortemente incapacitados com 600 euros de rendimento que deixaram de receber o complemento para situações de dependência extrema.

Não houve perdão para os  mais pobres  e  indefesos que foram vítimas em 2013 da perda ou da redução em  6%  do complemento solidário  para idosos sem  qualquer preocupação do ministro Mota Soares de  qualquer consenso social ou político com o Partido Socialista apesar de  reduzir  o rendimento disponível dos  titulares das pensões mínimas.

Estranharam a festa os empresários das PME que  continuaram a não aceder a crédito em  condições competitivas nem sequer por  parte  dos  bancos  que  beneficiaram do apoio de  quase 6 mil milhões  de  euros  de  apoios  por  parte  do Estado.

Estranharam sobretudo o tom festivo os  quase 200 mil portugueses que  emigraram o ano passado e  aqueles que  deixaram  de procurar emprego contribuindo decisivamente  para o alívio estatístico da tragédia social que é o desemprego.

O PS é  o Partido que  tem estado sempre  ao lado dos portugueses nos  momentos  decisivos  da nossa democracia. Pela  liberdade para todos no PREC e  no pós-PREC, pela Europa solidária nos anos 80, pela união económica e  monetária na década de 90 ou pelo aprofundamento da integração económica e  social no debate  da Constituição Europeia e no Tratado de Lisboa.

A direita portuguesa foi quase sempre  titubeante , chegou ao poder às  cavalitas da troika e  tem uma visão utilitária  do consenso. O PS provou recentemente em  matéria de  IRC que  quando está em causa  defender a economia, a  esperança dos portugueses e  a  criação de  mecanismos  de  confiança tudo faremos  para obter consensos alargados e de  médio prazo.

O perdão fiscal é  um expediente  orçamental de vista curta que reforça o sentimento de  injustiça e  retira credibilidade  ao Governo para lançar propostas  para o futuro.

Ontem finalmente o Ministério das Finanças  veio  prestar esclarecimentos à  Comissão de Orçamento e  Finanças sobre  o perdão fiscal  de  final do ano confirmando uma  receita extraordinária de 1277 milhões  de  euros sem a  qual o défice  orçamental teria  ficado  não só muito acima do compromisso inicial de  4.5% do PIB ma s mesmo claramente  além do objetivo definido já em Outubro, na 8ª e 9ªavaliações de 5.5% do PIB.

Mas  sobretudo veio confirmar as  suspeitas  do Partido Socialista  sobre a dimensão elevada da perda de  receitas que  envolveu este raide fiscal  de curto prazo. Segundo as contas do Governo, a  que  importará ainda acrescer os  casos em que  o  contribuinte  não desistiu de  litigar , custou aos  contribuintes 494 milhões  de euros isto é  mais  de  38% da  receita  arrecadada  em  juros  de  mora, juros  compensatórios, custas  administrativas e  coimas   já  liquidadas.

Lembremos  a dramatização política e a  chantagem  feita recentemente pelo Governo em torno da aplicação retroativa de  cortes  nas  pensões  já constituídas de  aposentados  ou viúvos  com valor  superior  a  600 euros . Essa  medida  orçamental  que  justificou considerações lamentáveis  de  entidade externas sobre o Tribunal Constitucional valia  388 milhões  de  euros e  foi rapidamente substituída por  um agravamento de  cortes  para  todas  as  pensões  superiores  a  1000 euros.

A troika desejada por  esta maioria não pode  ser  alibi para as  escolhas  que  o Governo sucessivamente fez  por  conta própria  aumentando a crise  social, martirizando o mundo do trabalho, destruindo a esperança e  semeando injustiças.

Esta opção de perdoar, para salvar mais um fracasso orçamental, quase 500 milhões de euros enquanto insiste em reduzir salários e cortar pensões é a imagem da justiça e da credibilidade do governo. É o vosso caminho.

Contem com o PS para liderar consensos sociais e políticos alargados que garantam crescimento, emprego, estabilidade económica e justiça social. É tempo de um Novo Rumo!

 

O patriarca inteligente

O atual patriarca de Lisboa é, como é sabido, o D. Manuel Clemente, que tomou posse do cargo e fez a entrada solene no Patriarcado a 7 de Julho de 2013. A pessoa já era sobejamente conhecida –  “muito inteligente” é o que mais ouvi acerca do patriarca. Parece-me justa a qualificação, sendo de resto esperada a sua elevação, a do patriarca, à dignidade cardinalícia.

Prémio Pessoa 2009, ao recebê-lo disse: “Sou um homem de igreja, também tento ser um homem da cultura e da sociedade no sentido mais construtivo do termo e isto agora ainda me responsabiliza para ser mais”.

É um homem conhecido, e bem, pela sua inteligência.

De resto, alia a inteligência a uma aparência não agressiva, a um tom suave que não incomoda, a face de alguém que serve servindo.

Com a sua inteligência, lida com os temas da atualidade com o método da não-contradição aparente. Porque as suas opiniões são espaçadas no tempo, pingos lentos de uma torneira, que se esquecem facilmente se quisermos não perder o norte.

É um homem conhecido, e bem, pela sua inteligência.

Com a sua inteligência, manifestou-se contra a possibilidade de o aborto ser objeto de referendo, esse tema complexo de direitos humanos.

Mas isso já foi há muito tempo, muito tempo para um homem que quer ser visto como homem da Igreja e não da Política do Estado laico, pelo que não hesita em se afastar de ter opinião sobre o aumento do salário mínimo, isso é coisa do domínio da possibilidade do Governo, mas talvez não seja possível aumentar, disse, sem que isso, claro, seja uma tomada de posição ou uma colagem ao governo.

É um homem conhecido, e bem, pela sua inteligência.

Por isso, atento à doutrina social da Igreja e às palavras do Papa Francisco, não responde acerca da bondade da fiscalização de mais um corte formidável nos salários dos funcionários públicos; como afirmou, isso não e matéria da sua competência, mas realmente já viu o TC decidir de forma diferente, pelo que talvez não faça sentido a fiscalização, mas repete que não quer pronunciar-se sobre isso, como sempre faz, depois de o fazer.

É um homem conhecido, e bem, pela sua inteligência.

Quando foi aprovada a lei da co-adoção na generalidade, pensava, imagino, que aquilo já fosse a votação final global, o que é natural, porque mesmo muito inteligente não tem de dar conta das regras da democracia portuguesa. Por isso, explicou que nós, deputados, votámos precipitadamente, provavelmente sem refletir, e até houve faltas no plenário, nós votámos sem a inteligência do patriarca.

Eis que foi criado um grupo de trabalho com 17 audições para discutir o projeto de lei na especialidade. O patriarca fez uma declaração de regozijo por a AR, afinal, dedicar tempo a uma matéria tão importante.

É um homem conhecido, e bem, pela sua inteligência.

Feito o trabalho elogiado, no qual tantos católicos foram ouvidos, e marcada a data para a votação final global, surge a proposta de referendo sobre o objeto do projeto de lei e mais a adoção por casais do mesmo sexo, esta última chumbada no parlamento.

O patriarca que não gostava de referendos sobre matérias complexas e que envolvem direitos humanos aplaudiu. Veio mesmo agora dizer que os direitos das minorias devem ser referendados, uma frase que é o eco da frase do protagonista político que inspira o inteligente e culto patriarca.

Como o próprio explica, não houve (afinal) um amplo debate sobre o assunto e não está a discriminar ninguém, porque está a tratar diferente o que é diferente e igual o que é igual, lema profundo que permitiria tratar diferentemente altos e baixos, destros e canhotos, mulheres e homens, crentes e ateus, ricos e pobres, negros e brancos, homossexuais e heterossexuais.

Só um homem parco de inteligência leria corretamente o artigo 13/2 da CRP para concluir que tem de se tratar todas as pessoas da mesma forma, independentemente das suas diferenças.

Mas patriarca é um homem conhecido, e bem, pela sua inteligência.

 

 

“consenso unilateral”

O atual Governo tem uma estratégia de clivagem radical com o consenso social de  quatro décadas de  democracia enquanto enfeita de vez em quando o discurso com hossanas ao consenso.

Foi assim com as sucessivas revisões do memorando da troika feitas com um êxtase místico de ir além da encomenda sem dar cavaco a parceiros sociais ou ao Parlamento, foi a sofreguidão de pôr em causa  o primado da escola pública como fator de  igualdade social ou a pressa em  vender  monopólios naturais nem que  fosse  a empresas públicas estrangeiras. Como se sabe a única verdadeira abertura a um consenso foi a verificada em matéria de IRC, apesar dos esforços de parte do Governo para que as PME pagassem a redução fiscal em benefício das grandes. Não será assim para lamento dos Mexias habituais…

O fanatismo populista da direita lusitana superou tudo em matéria de investimento público. Na oposição pediam sempre mais despesa sobretudo em estradas e rotundas. O aeroporto e a alta velocidade foram temas de demagogia nunca vista mesmo com um debate público como nunca fora feito(e avaliações independentes)que  alteraram uma localização com décadas e confirmaram a oportunidade única de ligação á rede ferroviária europeia.

No poder, propiciado pelo resgate que desejaram, os compromissos externos foram violados, os fundos perdidos e o investimento diabolizado.

De vez em quando surgem histórias para encantar inocentes como a do terminal da Trafaria agora em trânsito para os fundos lodosos do Barreiro. A deriva de otimismo militante que assola o Governo foi agora adornada com um plano de investimentos com asneiras requentadas ( como o sorvedouro da linha do Norte ),a surpreendente fénix do terminal de Alcântara ou problemas criados por este gerência como a paragem das obras no túnel do Marão. A miticamente consensual ligação de mercadorias a Sines é uma modesta 25ª prioridade…

Esta peça de propaganda obscuramente elaborada por mandatários do Governo está em pretenso debate público com a habitual arenga do consenso. Para criar ambiente Passos vai dizendo que antes tudo era decidido sem estudos nem debate e que a Portela é eterna. Para barrete já chega…

Eduardo Cabrita, Correio da Manhã

Urgência

Uma menina de 9 anos escuta um ela morreu.

Não era para ouvir?

Morreu. Uma outra menina já morta no tempo somado de 730 dias. 730 dias de conversas com uma morta de braço amputado, mas deus chegou-lhe ao ombro e espalhou-se na menina que acordou 730 dias morta, até poder-se sussurrar ela morreu.

A menina comida pela morte da outra menina foi pela primeira vez ao cemitério. A única campa que não viu foi a da amputada. A viagem secular por pedras e monumentos, cruzes e anjos, abandonados porque mortos os vivos dos mortos com eles transformados todos em passado, todos mortos. A viagem secular por pedras e monumentos, cruzes e anjos, ainda brancos, ainda sem musgo, ainda com flores frescas, ainda conservados esses mortos pelos seus mortos adiados.

Parar nessa viagem em cada campa e ver o diabo no tracinho, começar a fazer contas, tinhas 12 anos, tinhas 92 anos, tinhas 41 anos.

Assim começa a urgência.

E a impossibilidade. De chegar a todos os lugares de vidas breves, de mortes adiadas, e fazer render o tempo dos mortos adiados, fazer do diabo do tracinho uma vida que seja a que aconteça, mas que não mereça de Poder algum a condenação à indignidade.

Ficar no horror da pátria, essa coisa que exclui, mas ficar.

Um cão a mijar nos seus pés e algures vozes de uma só voz a clamarem a dispensa do estrangeiro, do imigrante, do cigano, do preto, da mulher que não quer o tracinho ditado por um aborto, do gay, da lésbica, do transexual.

Olhar fixamente para o mijo do cão para não explodir.

Uma menina vê um autocarro passar por cima da jovem angolana que cuidava dela. Uma viagem em cada campa e ver o diabo no tracinho, começar a fazer contas, tinhas 12 anos, tinhas 92 anos, tinhas 41 anos e olhar a tua campa, fazer uma conta e dizer dá vinte anos certinhos, a tua morte.

Assim se aguda a urgência.

E a impossibilidade. De chegar a todos os lugares de vidas breves, de mortes adiadas, e fazer render o tempo dos mortos adiados, fazer do diabo do tracinho uma vida que seja a que aconteça, mas que não mereça de Poder algum a condenação à indignidade.

Ter 20 anos e não ter ouvido a dor abençoada pela lei do estudante do corredor do lado. O poeta magrinho que sentia o que todos sentem, por acaso por jovens do seu sexo, desejar e amar como qualquer um e ser o imigrante das ilhas, paneleiro, cabrão que não gostava da bola: abater a aberração.

Pediu desculpas e saltou.

Assim se assume a urgência.

Não dizer de vida alguma que ela seja um ruído incómodo. Porque não é parecida com o vestuário maioritário.

Visitar cemitérios e dizer morreu disto ou daquilo, mas Poder algum se atreveu a retirar-lhe um lugar.

Urgência.

Na urgência a pulsação, rejeição do jogo, fazer da pátria o que ela não é por vocação, fazer disto um lugar onde todos começam a rastejar e a andar com as mesmas árvores que lançam a única eternidade.

A urgência de exigir do Poder a urgência.

Porque 90 ou 14, ditados por um tracinho preto, é sempre breve. Não há tempo para o tempo dos burocratas; não há tempo para o tempo de esperar por um tempo mais favorável; não há tempo para jogar à bola com a liberdade e a igualdade.

Há apenas tempo para a exigência da urgência de não perder tempo.

Esta coisa é de todos: que ninguém viva morto, sem lugar na terra dos vivos autorizados; que ninguém morra sem ter sido reconhecido.

 

 

 

UE deve proteger minorias sexuais – ouviu, sua excelência extrema direita?

  
 
Numa sondagem, 47% dos inquiridos disseram ter sido discriminados devido à sua orientação sexual  
 
A União Europeia deve aprovar um guião sobre a protecção dos direitos das pessoas lésbicas, homossexuais, bissexuais, transexuais e intersexuais (LGBTI), defende um relatório aprovado pelo Parlamento Europeu.  
 
Na base desta decisão está o nível de discriminação na União Europeia. Uma sondagem de 2013 da Agência dos Direitos Fundamentais revelou que 47% das pessoas LGBTI foram discriminadas ou assediadas em países da UE nos últimos cinco anos, tendo 26% dito terem sido atacadas ou ameaçadas com violência devido à sua orientação sexual.  
 
O relatório sobre o guião da UE contra a homofobia foi aprovado por 394 votos a favor, 176 contra e 72 abstenções. No texto é dito que se “lamenta profundamente que os direitos fundamentais das pessoas LGBTI ainda não sejam sempre plenamente defendidos”. Os eurodeputados pedem à Comissão Europeia, aos estados-membros e às agências da UE que trabalhem em conjunto para a adopção de um plano de acção destinado a proteger os direitos fundamentais daquelas pessoas.  
 
O Parlamento recomenda que o guião defina objectivos em áreas como o emprego, a educação, a saúde, os bens e serviços, as famílias e liberdade de circulação, a liberdade de expressão, o crime de ódio, o asilo e as relações externas. “Esta política abrangente deve ser conduzida no respeito das competências da UE e dos estados-membros”.  
 
A Comissão Europeia, diz o documento, deve promover a igualdade e a não-discriminação com base na orientação sexual ou na identidade de género nos seus programas de juventude e educação. Deve ainda reformular as suas directivas legais contra manifestações de racismo e xenofobia, de modo a incluir o crime motivado por preconceitos e a incitação ao ódio com base na orientação sexual e na identidade de género.  
 
No campo da saúde, o Parlamento Europeu pede à Comissão que continue a trabalhar com a Organização Mundial de Saúde “na eliminação dos transtornos de identidade de género da lista de transtornos mentais e comportamentais”.  
 

Hugo Soares: temos político ou temos política?

Em entrevista ao DN, Hugo Soares, o jovem JSD que deu a cara repentinamente pelo referendo à co-adoção e à adoção por casais do mesmo sexo tem uma opinião: “com a sociedade preparada, sou a favor da adoção gay?”.

A gravidade desta afirmação torna um luxo – tendo em conta o destinatário – atirar-lhe com Stuart Mill ou com tantos que explicaram e explicam como os direitos fundamentais de minorias foram sempre conquistados contramaioritariamente.

Em dois debates com o homem que tinha uma opinião sobre a adoção (votou contra) e que tinha uma opinião sobre a co-adoção (votou contra), sem nesses momentos apresentar qualquer projeto de referendo, mencionei de que lado estaria cada um de nós, num exercício retrospetivo, aquando da declaração de inconstitucionalidade da proibição do casamento inter-racial nos EUA (70% dos americanos era contra) ou, por exemplo, aquando da consagração do voto feminino.

Não respondeu.

Porque este político, agora, não só ignora a história da conquista dos direitos humanos, como não tem posição – o povo (ao qual Hugo Soares aparentemente não pertence) – que lhe diga se ele, deputado e servidor (do povo?), deve ser a favor da adoção por casais do mesmo sexo.

Havendo referendo, o sem-posição póstuma a tê-la tido na AR votará? Ou esperará pelos resultados para, em face deles, dizer sim, não, ou nim?

De resto, desde quando é que quem tudo faz para convocar um referendo não tem posição?

Triste figura a deste deputado que agora tem nova teoria: quem votou contra o referendo tem medo do voto.

Não, jota: quem votou a favor da adoção e perdeu e a favor da co-adoção na generalidade não teve medo dos votos. Já o senhor quando derrotou com o voto a adoção viveu bem, mas quando a co-adoção foi aprovada na generalidade com votos do seu partido e reuniu um consenso científico impressionante na especialidade a favor da co-adoção é que ficou com medo do voto à beirinha da votação final global.

Resta-me acreditar no noticiado: Hugo Soares fez um serviço a Passos, porque prefiro uma marionete desnorteada do que alguém que pede à sociedade, de coração, que o auxilie a ter uma posição (honesta?).

 

Pergunta

Por que razão os jotas do CDS autores da moção pró-liberdade para o analfabetismo não pediram a adesão do ministro crato?

(fui informada e corrigi o texto: ao contrário do noticiado, nenhum secretário de estado do CDS assinou a moção. penso que seria mesmo de apostar no crato)