Lendo opinião que já traduz uma linha de pensamento, pergunta-se: se Deputados do PS da anterior legislatura não integram as actuais listas foram, com toda a certeza, objecto de uma purga, os Deputados do PSD da anterior legislatura que não integram as actuais listas também foram sujeitos a esse horror anti-democrático, certo?
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Diz que à conta do FMI a democracia ficou suspensa
Tenho esperança de que a tentativa de moda não pegue. Colunistas, opinadores nos telejornais, ontem mesmo Marcelo Rebelo de Sousa, todos juntos na mesma missa: que interessa se Passos Coelho escolheu Nobre para ser Deputado e Presidente da AR (coisa sujeita a votação agravada no Parlamento) e que este tenha dito que renunciava ao cargo de Deputado se não fosse a segunda figura do Estado? Sim, esteve mal, mas tentou “emendar a mão” (???) dizia Marcelo, mas adiante! Que importa que a base do derrube do Governo tenha sido a alegação de que este não teria falado com o PSD sobre o PEC, um nojo, uma vergonha nacional, teria havido um mero telefonema, toca de explodir com tudo e ser responsável por tudo, que importa se um candidato a PM mentiu, e esteve reunido umas horas com o PM, o único que manteve a palavra quanto ao sigilo do encontro? Nada, diz Marcelo, adiante, diz Marcelo, quero lá saber se houve uma “ligadela” de 5 minutos ou uma reunião “de horas”, quando o facto é que não houve acordo. Que interessa?- Diz Marcelo. Está cá o FMI, não se ponham com essas coisas, que vergonha.
Para estes comentadores, que puxam pela pátria explicando que continuamos a ser o Portugal de tantos séculos de história, que não desaparece com a vinda do FMI, o eleitor deve ver o Governo a lutar com todas as forças para evitar a situação presente, assistir à sua queda naquele dia em que tirando o PS houve um partido único na Ar, descobrir que o candidato alernativo a Sócrates escolhe para cabeça de lista de Lisboa quem despreza os votos dos cidadãos e que só tem por digno ser a segunda fugura do Estado, dar-se conta de que Passos Coelho andou a gritar como argumento para derrubar o Governo uma ficção, não tendo nada, como projecto alternativo, para apresentar, senão o de ser, seja como for, à minha custa, à nossa custa, poder, essa coisa que lhe cheira tão bem.
A moda não pega, não. O FMI não pára a democracia.
Perdão?
Alguém pode, por favor, enviar-me um sms a explicar se o PSD dos independentes Fernando Nobre e Cavaco continua a ser um Partido político?
Da convergência e da democracia: a disputa necessária
Em face da situação do país, é natural que se levantem vozes, conhecidas e anónimas, pedindo que os partidos “parem de andar às turras” e que se ponham lado a lado na difícil caminhada que temos pela frente. Não sabemos, hoje, o que se passará depois das eleições, se teremos coligações para evitar governos minoritários e, se sim, de que tipo.
Este “desejo”, às vezes cansado, não pode levar a classe política, e quem comenta a política, a esquecer a impossibilidade da clivagem ideológica entre os partidos, o percurso de cada um, as atitudes tomadas em momentos determinantes que marcam definitivamente o curso dos acontecimentos e o carácter de quem se propõe a fazer política e, portanto, a dar o seu melhor por um qualquer conceito de justiça.
Por isso mesmo, é inadmissível aceitar mandamentos como o de Ângelo Correia, há dias, na SICN, no sentido de que quanto a Fernando Nobre está tudo claro: foi convidado pelo PSD e aceitou. Quanto ao resto, o povo que vote. Isto é, até ao dia das eleições estamos impedidos de fazer uma leitura politica do facto de o líder do maior partido da oposição ter escolhido para cabeça de lista de Lisboa um homem que já esteve com o BE, com Mário Soares e que foi candidato à PR com um discurso patético de superioridade moral por não pertencer a partidos, por nada querer com eles e por ter visto horrores no mundo. Para mais, o homem que jurou que jamais aceitaria um convite partidário, aceita-o já sendo putativo candidato à segunda figura do Estado, o que é desrespeitoso para a AR, para não dizer mais. É evidente que isto tem de ser lido e falado, porque a escolha de Nobre mostra ao eleitorado da capacidade de Passos Coelho para fazer boas escolhas a qualquer nível, seja parlamentar, seja governativo. Temos indício forte de que essa capacidade é muito má.
Em democracia, mesmo quando o país está aflito, discute-se, responde-se, demonstra-se a diferença entre o tu e o eu. Sem debate, sem clivagem, não há a essencial demonstração de uma escolha ao eleitorado.
O PSD, que vai vendo boas cabeças fugirem desta liderança, mostra pouco. E insiste em que PS foi teimoso em sublinhar tanto a responsabilidade que coube aos laranjas pela situação actual. Insiste porque não tem alternativa. Mal estaria o PS se não dissesse as vezes que fossem necessárias, cada vez que é desmentido, o que se passou no chumbo do PEC IV, chumbo aprovado por todos os partidos num golpe palaciano anormal, resoluções sem propostas, porque as que tinham umas coisitas aceitaram a proposta do CDS de serem cortadas ao meio para que se votasse apenas o artigo 1º do chumbo do PEC e depois animadamente chumbaram-se reciprocamente. Tudo combinado.
Estamos à espera das propostas do PSD que já variaram muito entre o que saiu da sua boca e da dos seus conselheiros e de um livro escrito por gente da banca, mas Passos prefere perguntar a fazer propostas. É tão irresponsável, tão demagógico, tão indiferente ao interesse nacional, que estando neste momento Portugal a ser avaliado para receber ajuda externa dentro de um programa que terá de ser cumprido por quem quer que seja Governo, Passos explica aos senhores que nem nisso estamos unidos. Passos faz concorrência ao pessoal. Ele quer, agora, neste momento, saber, por exemplo, o número de funcionários públicos por ministério.
Como dizia ontem Nicolau Santos na SICN, o que deu a Passos Coelho? Portanto, o Governo está a falar com os senhores que aterraram na Portela e que precisamente fazem uma avaliação completa da situação financeira do país. Eis que o líder laranja aparece a acenar com um papel com quarenta e tal perguntinhas?
Este homem não pode ser PM. Digo eu.
Curtas
É muito difícil estar deitada após uma correcção do chamado desvio do septo nasal e ter vontade de escrever o que quer que seja.
Ainda assim:
1) A escolha de Ferro Rodrigues para liderar a lista do PS para Lisboa merece que se fale numa medalha de ouro. Boa escolha do PS, sem dúvida, mas sobretudo enorme grandeza do agora candidato, esse a quem eu daria a medalha. Ferro Rodrigues é um político exemplar, sem hesitações ideológicas, um homem verdadeiramente de esquerda a quem o destino pregou uma partida que não o quebrou. É Ferro, mesmo. Está de volta, igual a ele próprio, com espírito de serviço, quando o serviço está difícil. Fossem muitos mais.
2) Ouvi os discursos de Sócrates. Foram brilhantes. Seguiram-se horas de comentários sem comentários pró-PS com imensa dificuldade em explicar que não há quem bata o homem.
3) Pensei que Passos Coelho faria uma jogada pós-congresso PS. Uma jogada assente em ideias, em desmontagem da via traçada por Sócrates. Fez: apresentou o candidato a deputado- a- Presidente da AR Fernando Nobre. Explicou que não tinha nada, mas nada a ver com os 15% obtidos pelo presidente da AMI na candidatura à presidência. Nada, nada a ver. Não há dúvidas: Sócrates é um mentiroso.
Cavaco e Bagão Félix
Cavaco lá saberá por que razão procedeu a remodelações no Conselho de Estado (CE). Este órgão constitucional é presidido pelo PR e é composto por um conjunto de personalidades, algumas por inerência, como é o caso do PM, outras eleitas pela AR e outras designadas pelo PR pelo período correspondente à duração do seu mandato.
O CE é um órgão que se quer plural, daí a existência de membros por inerência relativa a órgãos actuais e passados (pense-se nos antigos presidentes da república e nos membros eleitos pela AR numa lógica de proporcionalidade).
A coisa está pensada, portanto, uma vez que se trata de aconselhar o PR em assuntos tão sensíveis como a dissolução da AR, a demissão do Governo ou a declaração de guerra, entre outros, para que não haja concentração de poderes partidários, hegemonia, mas antes equilibrio de poderes. A não ser assim, não teríamos um órgão de consulta sensível, mas um gabinete de comparsas. Bastaria ao PR convocar uma jantarada com os amigos escolhidos por si e estava cumprida a formalidade exigida constitucionalmente.
Toda a gente sabe que embora o espírito da Constituição tenha sido o de permitir que os membros do CE eleitos pela AR fossem eco de uma certa proporcionalidade, acaba por suceder um monopólio da eleição por parte dos dois maiores partidos, porque efectivamente têm a maioria no Parlamento.
A coisa é compensada pelos membros designados pelo PR com base numa lógica de pluralidade.
Como se pode ver pelos membros designados pelo PR, não parece que Cavaco queira ser aconselhado de forma plural, mas antes abençoado: Marcelo Rebelo de Sousa; Leonor Beleza; João Lobo Antunes; Vitor bento; Bagão Félix
Mais uma vez Cavaco rompe com a prática constitucional no sentido do equilíbrio do sistema e nomeia só e apenas quem o ajudará com “conselhos” a fazer o que ele já sabe que quer fazer.
Para Cavaco, os órgãos constitucionais nunca tiveram qualquer importância e sempre foram cansativos. Dez anos de maioria absoluta no executivo e pouquíssimos idas à AR, num desprezo inesquecível pela casa da democracia. Pergunto-me o que seria do homem com a alteração ao regimento da AR promovida pelo PS que manda o Governo ir amiúde ao Parlamento.
É o mesmo Cavaco que assiste às declarações do novíssimo membro do CE, designado pela sua pena, membro de um órgão cujas reuniões não são públicas, afirmar uma insanidade destas: “Bagão Félix disse esta terça-feira à Antena 1 que José Sócrates mentiu ontem na entrevista que deu à RTP ao negar que um pedido de empréstimo intercalar tenha sido assunto de conversa no Conselho de Estado”.
A resposta veio pronta:
Eis que para cúmulo, Bagão não quer mais do ruído que ele plantou.
E Cavaco? Não quer dizer nada? Não quer ter uma conversa com Félix para que ele tire as consequências da violação da ética de funcionamento do CE e de ter caluniado o PM? Ficamos assim? Será que Cavaco acha normal deitar fora conselheiros de estado como Anacoreta Correia e substitui-los por Bagão para, em dias, assistir a uma vergonha nacional a partir de um dos órgãos mais discretos do sistema?
Talvez Cavaco tenha tudo por normal e ao não fazer nada me permita pensar que ele faz parte do início desta história.
Ele que não consinta para não permitir o ditado.
Chegar à alma de Passos Coelho
Tendo em conta o que já foi declarado por Passos Coelho e por colegas seus como Manuela Ferreira Leite, só para dar um exemplo, assim de repente, por que razão pensa o leitor que o líder laranja votou contra o PEC?
a) não tinha nada contra as medidas em si, mas tudo contra a forma como o PEC foi negociado;
b) não tinha nada contra as medidas em si, mas tudo contra um Governo que perdeu a credibilidade;
c) até votaria a favor do PEC se, de acordo com o sugerido por Marcelo Rebelo de Sousa, o PM se comprometesse a demitir-se a seguir à votação;
d) as medidas do PEC são necessárias mas não suficientemente austeras.
Quid juris?
Esta verdade simples que deve ficar para a história
A situação agravada em que Portugal subitamente está e a eventualidade de termos de recorrer a ajuda externa sofrendo todos as consequências disso é da responsabilidade criminosa do PSD.
Com o maior partido da oposição embarcaram todos os outros num golpe palaciano que ficará na nossa memória colectiva.
(Penso que não vale a pena falar do conspirador de Belém).
Pergunto-me se viverei para ver o dia em que as pessoas não se curvam perante o TEDH como se perante deus
É importante exististir a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH)? É. É importante existir o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem? É.
A partir daqui gerou-se uma procissão de velas dirigida às decisões daquele Tribunal como se fossem todas, mas todas, o direito definitivio, mais: o “argumento” a usar, por exemplo, só para dar um, em matéria de cruxifixos nas escolas. É um “diz que o TEDH disse”.
Em primeiro lugar, é preciso compreender que o TEDH não está inserido na hierarquia dos nossos tribunais no sentido de decidir em última instância quanto à matéria de fundo entre as partes. O que o TEDH decide é declarar que houve violação da Convenção ou dos seus protocolos e, se o direito interno da Alta Parte Contratante não permitir senão imperfeitamente obviar às consequências de tal violação, o Tribunal atribuirá à parte lesada uma reparação razoável, se necessário. Quem paga? O Estado.
A tal da CEDH e os seus protocolos não tem nenhum direito que a nossa Constituição não preveja, antes pelo contrário. O que acontece, o que pode acontecer, é esgotarem-se os meios nacionais de um cidadão, por exemplo, fazer valer o seu direito, convencido, portanto, de que tem razão, e tem mais esta instância para ver ressarcido um hipotético dano se o TEDH considerar que houve algum direito violado.
Em Portugal, fala-se das sentenças do TEDH como de homilias sagradas.
O caso paradigmático do jornalista José Manuel Mestre da SIC dispensa mil palavras. Vi a SIC, claro, a dar os parabéns à enorme vitória da “liberdade de informar”, à liberdade de informar em “liberdade”, com “rigor”, sem censura”. Uma vitória, dizia-se, do “jornalismo e da liberdade de expressão”. O STJ, analisando um recurso extraordinário, alinhou com a sentença do TEDH.
Mudei de canal várias vezes e não vi nada sobre o caso; zero; uma palavra que fosse sobre um caso de anos e anos que representa uma jurisprudência a roçar a infantilidade e ela própria uma legitimação da difamação. Claro que sendo o Pinto da Costa o difamado, a malta vira a cara para o lado.
O triunfante jornalista e os juízes daquele medíocre TEDH têm por normal a seguinte entrevista ao presidente da UEFA:
« R. : Le président de la Ligue [portugaise] est en même temps le président d’un grand club.
Cavaco, um presidente institucionalista
Ontem, mais uma vez, ouvimos um PR que tem saudades do tempo em que chefiava o Executivo. Ouvimos um PR que ataca, denuncia, um homem quase a candidatar-se a um cargo que não é o seu.
Curiosamente, para alguma gente, cada vez que Cavaco faz uma declaração ao país num momento decisivo, ela revela um homem institucionalista. Pode concordar-se ou não com o conteúdo da lição do Senhor Professor, mas diz que ele é um homem institucionalista.
Por que será? Será resultado do dizer banal segundo o qual somos um país dado a aparências? Talvez. Cavaco é de facto Professor, é alto, seco, magro, casado, tem filhos e netos e apresenta um ar engomado e muito sério. Não vejo outra explicação.
Cavaco é um dos políticos com menos sentido do institucional de que tenho memória: não respeita a lógica dos seus poderes elementares; ignora o procedimento dos vetos e atira-se às televisões às 20h em drama sanguinário, odeia a democracia, donde conhecermos várias declarações do PR indignadas com o facto de ter bastado a maioria parlamentar para aprovar leis; planta mentiras nos jornais acerca do Governo; tudo isto numa lista interminável que vai ao requinte de anunciar no seu mui moderno site o pedido de demissão do PM antes que o PM pudesse dizer aos portugueses que apresentara o referido pedido.
Ontem, no seu discurso, cheio de sentido institucional e imparcialidade, Cavaco explicou que ouviu dos Partidos o que já ouvira em 2009: queriam eleições, não havia entendimentos possíveis. Foi uma bonita passagem, essa de nos explicar que anda com isto às costas desde 2009, quando o povo português não quis uma maioria absoluta parlamentar. De resto, tenho memória da posição do PS ter sido outra.
Para mais conforto do sistema, neste momento complicado, Cavaco, que devia saber que desde o AC nº 65/2002 do TC ficou claro que cabe ao Governo em gestão interpretar o preceito constitucional quando este prescreve que aquele pode praticar os actos necessários à gestão dos negócios públicos, lançou o mote para a querela nesta matéria. Juridicamente, a abertura é enorme. Penso mesmo que não seria inconstitucional pedir um resgate ao FMI, simplesmente não cabe a Cavaco decidir isso, mas ao Governo. Não cabe a Cavaco lançar a questão como certa e gerar num minuto a discussão. Cavaco não decide o que pode um Governo de gestão fazer. Cavaco observa o feito e se tem dúvidas recorre ao TC.
Mais importante, porém, é a questão política. Ainda que possamos dizer que há margem constitucional para o Governo actuar, este último tem de fazer um juizo político evidente: tem a ver com a legitimidade reduzida; as consequências disso quando negoceia; e o condicionamento do futuro Governo.
Institucional e verdadeiro como é, Cavaco traçou mais uma vez o seu retrato da situação do país, da situação política e financeira; falou, com as costas direitas, do desentendimento entre os partidos, dos números da dívida, dos juros, do que aconteceu para chegarmos até ali, ali onde ele estava a marcar eleições.
Calhou, calhou numa branca institucional, que nesse retrato do caminho para a crise política não apareceu o chumbo do PEC e as consequências dele.
Calhou e calha bem a alguém.
“A campanha eleitoral vai ser extremamente dura”…
…avisa Passos Coelho no site do PSD. Fico impressionada com o advérbio, mas apenas numa primeira leitura, porque entendo que para argumentos fracos são necessárias palavras fortes. Passos Coelho anda há dias e dias a tentar desfazer-se das suas palavras e das palavras daqueles que escolhe para seus conselheiros, como António Carrapatoso, à frente do Movimento “Mais Sociedade”.
A atrapalhação não surpreende, porque vem de quem lidera um Partido sem norte, um Partido que aprova e desaprova um curso de medidas essenciais para o país com o único e singelo argumento do amuo. Ajudado por um Cavaco mudo e fazer zaping em casa, Passos Coelho chumbou o PEC IV, totalmente responsável por todos os outros e pelos Orçamento vigente e anterior, e agora tem esta eloquente palavra a dizer ao povo:
Digam lá
Pois é, Dr. Mário Soares
Hoje, a não perder
A oposição está com uma espécie de TPM
Não me lembro da última vez que vi a oposição reunida levantar-se para infringir a Constituição com um sorriso na cara. O Governo quase em gestão, as eleições à porta e eis o primeiro acto eleitoral: revogação do decreto-regulamentar que define as regras da avaliação de desempenho dos professores e definição do início de negociações entre o Governo e os sindicatos de professores para a definição de um novo modelo.
Lê-se isto e, para além do oportunismo político, a meio do processo de avaliação, para além de mais uma cambalhota espectacular do PSD, não podemos deixar de ter vergonha de uma oposição inteira que, em mais de três décadas, ainda não aprendeu isto: não é normal que a AR revogue regulamentos administrativos e que dê ordens ao Governo em matéria administrativa. Chama-se separação de poderes.
A noite dos batoteiros e a ver vamos
Foi penoso ver que a banda passa e que ninguém diz nada que corrija erros evitáveis ou omissões perdidas no espectáculo degradante da oposição apostada na resolução da irresponsabilidade.
Começa por ser espantoso ver Portas propor que as resoluções sejam votadas diferenciadamente, por forma a que se vote a alínea que visa o chumbo do PEC e depois todas as outras. Isto não se aplica à nulidade da resolução do maior Partido da oposição que só queria chumbar o PEC, só queria chegar ao poder. Discutir, propor, pensar não é com o Partido que pode ser Governo, que pode ajudar o país, que aprovou o Orçamento em vigor e os anteriores, que aprovou todos os Pactos de Estabilidade até este.
Portas conseguiu que todas as Resoluções, incluindo a dele, ficassem reduzidas a cópias da do PSD, porque realmente Portas não queria saber de umas propostas a fingir que lá foram metidas pelo seu Partido e por outros, todos sabendo sem dor de alma que se chumbariam reciprocamente nessa parte dispositiva.
Ainda assim, lá estava Portas no final da noite afirmando que, ao contrário do que fora dito pelo PM, ele tinha apresentado propostas. Foi bonito. Lutou tanto por elas que as remeteu para votação separada para garantir que o que era aprovado era a rejeição do PEC. Não é pecado, Portas, mas tenha em conta que nós damos por isso.
Depois foi ver o drama lançado em torno da demissão do PM. Na SIC, antes de salvos pela intervenção de Reis Novais, houve certezas de que o PR podia recusar a demissão para que o Governo não ficasse em gestão, certezas de que todos iriam a correr comprar um livro sobre isso do Professor Freitas do Amaral e certezas quanto ao facto de um tal Governo estar limitadíssimo. Não está, o Tribunal Constitucional já o explicou, pode fazer basicamente tudo. A limitação é política. Um dia, escrevi sobre isso e disponibilizei o Acórdão. Por outro lado, o PR não pode recusar o pedido de demissão do PM, embora seja natural que se reúna com os Partidos e com o CE antes de aceitar o pedido. Caso tal anormalidade acontecesse, o PM podia apresentar uma moção de confiança à AR e acabava-se a conversa, como explicou Reis Novais com clareza.
Dito isto, quando o Governo entrar gestão, cabendo-lhe a avaliação daquilo que é estritamente necessário para a gestão dos negócios públicos (186/5 da CRP) teremos, até às eleições, de estar atentos a Cavaco, que tem, naturalmente o poder de fiscalizar os actos praticados, o que implicaria, se Cavaco fosse um Presidente normal, em casos de dúvida, que se socorresse do TC. Calha que sabemos todos que o PR gosta de resolver assuntos jurídicos com as próprias mãos, em declarações ao país às oito da noite. Reis Novais falou nisto, ontem, também. Vamos ver se Belém consegue, perante a crise política, não abrir novas crises pré-eleitorais em cooperação com o PSD.
A frase da noite talvez vá para o simpático José Luís Arnaut, o qual, confrontado por Bernardino Soares, disse que o PSD aprovou os Orçamentos PS e os PEC passados porque “foi convencido pelo PS”, mas que desta vez “já não foi convencido”.
Palavras para quê?
Elizabeth Taylor (1932-2011)
Para não variar, temos Cavaco
As declarações do PR seriam cómicas se não fossem preocupantes, porque mais do mesmo, enganadoras, a revelação à boca de cena de tudo o que já se escreveu sobre a figura. Estou a escrever sobre estas declarações, que mereceram o texto luminoso do valupi.
Já não tolero, tendo de tolerar (pois), que Cavaco use os cidadãos como pregos do caixão que quer meter fundo na terra. A indecência com que afirma que o PEC IV “terá apanhado de surpresa os Partidos e os portugueses” é para lá de qualificação: esse bálsamo chamado PEC, ainda por aprovar, que Cavaco acha que devia ter sido apresentado em forma de projecto aos Partidos “e aos portugueses” , entidades equiparadas e ambas em choque pós-traumático.
O carinho de Belém vem em mais um discurso directo via declarações aos jornalistas explicando que assim não foi possível fazer nada, que agora tem de actuar “com muita ponderação” (shiiiiiiuuuuuuuu), medindo as palavras (iupiiiiiii), e alguma reserva”
Diz ainda que é o último garante do normal funcionamento das instituições democráticas. O último, imaginem.
Bom, deixem lá a Manuela Ferreira Leite falar. Sem reserva.
Sócrates agarrado ao poder?
Dizem que sim, por aí. Agarrado, tão agarrado ao cargo divertidíssimo que lhe calhou nas mãos por obra e graça do espírito santo que continua lá porque é essencialmente um pinóquio, um mentiroso, portanto. Não se percebe por que razão existe, neste momento, em Portugal, uma maioria PS no Parlamento e um Governo em coerência com esse resultado eleitoral. É coisa para agoniar a gente que passa por tantos postos de observação sem outra estratégia que não a do ataque ao carácter de quem misteriosamente nos governa.
O pesadelo a que muita da direita se acomodou, chamado democracia, funcionou e eis que Sócrates é PM, vejam só, a lata do povo português, mas felizmente há luar, para a direita acéfala a crise, um pão de ló para espetar na cara de Sócrates e ganhar tempo, porque enquanto agradecem a Cavaco o mandato mais nojento da nossa história, exercido a cooperar estrategicamente com a oposição na descredibilização infame do Governo, embora sem todos os frutinhos que podiam ter tido, pensam, pensam muito, o que fazer se por uma vez forem consequentes.
Sócrates tão agarrado ao poder, não é? Então, pois claro, aquilo é tão bom! A crise, os números, as metas, pedir sacrifícios aos portugueses, uma maravilha. Ele agarradinho porque sim, um maluco. E não há maneira de o tirar dali.
Mentirinha. Há. E há tanto tempo. Moção de censura, dissolução da AR, então, malta? Façam-nos um pequeno favor, sobretudo com a voz presidencial por trás a dizer que há limites quanto aos sacrifícios que podem ser pedidos aos portugueses: antes de se lançarem sem vontade nenhuma ao poder, digam ao povo das alternativas claras que têm às medidas deste Governo, assim por exemplo em matéria de redução de despesa.
Venha daí uma direita que vê o poder como um escorrega que está ali na hora certa e até agora sem alternativas ao que critica.
Quem é o Pinóquio?