«Nulla dies sine blog».
«Primum vivere, diende bloggare».
«Patria est ubicunque blog est».
Mil perdões, mas acordei neste mísero estado compulsivo. Hoje não respondo por mim.
– Já reparaste as vezes que te telefonam quando estás a pagar numa caixa do supermercado?
– A sério?
– A sério.
– Porque será? Se calhar as caixas atraem os telefonemas.
– Se calhar.
– Ele há cada enigma neste mundo! Ainda outro dia…
– Espera, desculpa, estão-me a telefonar.
– E não estás numa caixa de supermercado!
– Sim, que faria se estivesse… Quem fala?
Anda rebuliço de meia-noite aqui em casa entre os bloguistas Rui Fernandes e A. Neves Castanho.
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Saiu no Brasil uma antologia de poemas de José do Carmo Francisco, Mansões Abandonadas, abrangendo a obra de 1981 a 2001. Parabéns da malta.
Mais informações em www.escrituras.com.br
O sempre atento Eduardo Pitta faz, no seu Da Literatura, uma observação devastadora. Esta.
“Ouvidos pela Lusa, Vítor Aguiar e Silva, da Universidade do Minho, e Manuel Gusmão, da Universidade de Lisboa, disseram: «Sempre admirei muito em Luiz Pacheco o seu espírito de irreverência, a liberdade crítica, a capacidade de destruir corrosivamente as convenções, quase sempre mortas já. […] Era um espírito que, naquela atmosfera passiva, adormecida, dos anos 50, 60 e ainda 70, trouxe, por vezes com excessos de linguagem, uma lufada de ar novo. Era dos espíritos mais irreverentes deste país.» [V.A.S]; «Obra escassa, mas bastante interessante, com destaque para Comunidade e O Libertino Passeia por Braga, a Idolátrica, o Seu Esplendor […] praticou uma fusão entre a literatura e a vida, o que significa uma espécie de projecto de linhagem romântica, mas de cariz surrealista.» [M.G.] Não me lembro, em vida de Luiz Pacheco, de ler uma linha a seu respeito assinada por qualquer destes professores. Mas pode ser distracção minha.“
Levantou-se da cama, pôs a mochila e – não se diria – achou-se vestido. Não era Verão, nem nada parecido, e até sentiu um arrepio.
Na rua, as pessoas olhavam espantadas (modo de dizer, porque era bem pior) e ele perguntava-se que é que dera, agora, ao Mundo.
Chegou ao quiosque, mas já não à bica. Prenderam-no quando estava a fazer o pedido. Foi só então que reparou.
– Só por isto? – e apontou o entrepernas. – Ainda vocês não viram nada.
Apanhou dois meses por ofensas à autoridade.
1.
Não me assiste divino mestre
na dura lida ao touro incerto
mas apenas este vozear terrestre
que tarde noite me mantém desperto
jamais pobre cautério de esteta
mas disciplina de pedra sua calada
condição sequer música que faz alada
a trama viscosa da prosa mais perneta
no sombrio intervalo entre erro e erro
meto suor desespero assobio de medo
por meu engenho demasiado perro
(às vezes há que afiar o esmeril a dedo)
mas no tempo da safra esquecer o berro
que isto de dores redentoras é engano ledo
2.
Tudo no poema é vero e sentido
estertor berro cãibra tudo é final
que contrabandeia a pauta qual
eco repetido ou fugitivo estampido
piéria voz decadente e glabra
que esta rupestre moldura guarda
tudo é esta rouca música em que te vens
pobre poesia que nem o pagode já entreténs
rilkes em muzot perscrutando o adriático?
rimbauds negreiros estações no inferno?
só o meu vizinho e o seu berro ciático
sempre que o calendário assinala inverno
digam lá se a poesia fez ou não progressos
enquanto com o mindinho sondo os recessos
José Luís Tavares
Era um homem que não conhecia o medo. Por isso metia respeito.
«O nosso primeiro e único contacto foi há bem vinte anos, e seria excessivo presumir que você hoje o recordasse. No Largo de São Roque, em tarde ensolarada, trocámos uma dedicatória e uma nota de banco. ‘Levas, mas dás vinte paus.’ Eu fiquei para sempre a ganhar.»
fvm, Maquinações e Bons Sentimentos
Para Confúcio Costa
Mariana sonhou com o jackpot. Nitidamente. Letra por letra. Algarismo por algarismo. E o sonho repetiu-se na mesma noite. A confirmar.
Ela, claro, não era parva. A chance de tudo aquilo acertar era, digamos, uma em um bilião. Se não mais. Mas, então, porque havia o sonho, não lhe diriam, de ser tão insistente?
Mal abriram tabacarias e quiosques, varreu a cidade. Levava o número num papelinho. Lia-o, mostrava-o. Não dizia porquê. Mas era de caras.
O jackpot saiu a um desempregado que se interessava pelo movimento de várias tabacarias. Quando apareceu na televisão, Mariana filou-o. Se era fraca em números, era óptima em caras.
Quando, num beco a que no lusco-fusco o atraiu, lhe retirou a faca e a limpou, achou que, não tendo ficado rica por isso, alguma justiça tinha sido feita.
Não sou iberista. Sou mesmo ferrenhamente, figadalmente anti-iberista. A Península Ibérica é uma racionalização para pacóvios. OK, vou ser simpático: é uma ilusão óptica.
Mas uma Espanha com quatro selecções nacionais parece-me um vizinho muito interessante. No Reino Unido, isso já é rotina.
No primeiro desafio de futebol Portugal-Galiza, ou Galiza-Portugal, lá estarei.
Leia-se mais aqui.
Segundo um relatório do Banco Mundial (referido pelo director do Público no editorial de hoje), crê-se que a roubalheira dos líderes africanos para enriquecimento próprio dá ela por ela com os ‘contributos para o desenvolvimento’ saídos dos nossos bolsos.
E para esses bandidos (e alguns honestos sucessores) houve, há tempos, em Lisboa, intermináveis palmadinhas no ombro.
Francisco José Viegas diz: «Às vezes sou galego». Isto na Origem das Espécies.
Leia «Qual crise?» no sempre visitável Da Literatura.
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Arranje uma temperatura francamente negativa, cinco graus é o ideal. Junte-lhe nevoeiro, preferentemente denso. Convide uma leve aragem, o suficiente para a humidade se mover. Misture bem e atire pela janela. Vá dormir. Quando acordar, ele estará pronto. O sincelo. Pronuncie «sincêlo», não vá ele estragar-se. Pegue na máquina fotográfica e ponha no seu blogue. Isto esteve hoje à vista em Amsterdão.
Com algum atraso – mas as belas coisas são eternas – divulgamos o texto que Lélia Nunes (por extenso, Lélia Pereira da Silva Nunes), professora brasileira, de Florinápolis, nos enviou.«Tomo a liberdade», diz ela, «de lhe escrever do mesmo jeito que tenho deixado meus bilhetinhos no blogue Aspirina B e que tenho adorado visitar. Como “a reforma ou a unificação da Língua Portuguesa” tem merecido maior atenção da mídia brasileira nos ultimos tempos (não tanto quanto os nossos escândalos políticos já tão corriqueiros e banalizados) e tendo em vista a entrada oficial do querido amigo Daniel de Sá na “categoria de enfermeiro” envio-lhe uma crônica que escrevi e que já foi publicada aqui (‘Jornal de Letras’, dirigido por Arnaldo Niskier e Antônio Olinto), em semanários açorianos e da Costa Leste americana. Um grande abraço e muito obrigada pela boa dose de aspirina que chega pelos Caminhos do Mar impedindo um enfarte antes da hora…».
*
Para o Daniel de Sá
Pelo correio eletrônico tenho me correspondido com amigos açorianos. Gente das letras e com eles o aprendizado tem sido uma constante, as trocas de idéias são substanciais e os puxões de orelha quando escorrego no puríssimo vernáculo da matriz, a última flor do Lacio, é “vapt e vupt”. Vêm a galope no mundo virtual, em tons vermelhos, verdes e azuis para não deixar dúvida da infração cometida contra a Língua Portuguesa.
Uma troca gostosa que dá imenso prazer sem qualquer compromisso com a resposta ou o resultado. Até porque se for compromisso, vira obrigação e a cobrança se torna inevitável. Aí estraga tudo e vai para o espaço a alegria da espera. Aquela mesma espera que fazia a gente ficar com a cara colada na vidraça e o olho comprido, espreitando por trás das cortinas, esperando o carteiro aparecer lá na curva da rua ou surgir de repente por trás da vidraça. Tenho saudade do carteiro e do sentimento que provocava quando chegava a nossa casa e gritava: CARTEIROOO, trazendo as cartas numa sacola de sarja atravessada ao peito. Hoje, nem vejo quando as cartas chegam, nem sei quem as traz e já são tão escassas e raras. Pois, tudo chega aqui, online e em tempo real.
Ele faz hoje, em idade, uma bela capicua. Lembro-me de irmos num eléctrico, e de ser o meu bilhete, digamos, 23132, podia até ser mais bonito. E foi quando ele me ensinou essa palavra, «capicua». Eu tinha nove anos, talvez oito. Ele andava, pois, pelos 35. Não é a capicua que, hoje ainda, me espanta. Mas o ele ter estado algum dia nesses 35, e eu estar vendo isso.
Também você se chateia com aqueles casalinhos, muito pombinhos, muito aconchegadinhos, que têm um e-mail a dois? E que assim se vêem para a vida inteira? Bom, até ao dia em que…
– Abriste um endereço de e-mail para ti só?
– Abri. Porquê?
– Podias ter sido menos desagradável.
– Como?! Explica lá isso melhor. Se não te importas.
– Já não confias em mim, não é?
– Eu?!
– Pois. E queres receber umas coisinhas que eu não possa ver.
– Agora quem é desagradável és tu. Não te parece?
– Gostavas que eu fizesse o mesmo?
– O quê?
– Abrir uma conta só para mim.
– E porque é que não fazes?
– Porque não tenho nada para esconder, percebes?
– E eu tenho?
– Pelos vistos…
– Eu abri porque me apeteceu. Ora esta!
– Ai, não duvido. E porque te deu pra uma de desconfiança.
– Desculpa, mas se há, aqui, alguém que desconfia, és tu.
– Ai, agora eu é que desconfio! Está bonito, está!
Você teria saída para esta conversa? Diga como. Tire duas pessoas deste filme.