Agora, JPH embarcou numa longa viagem de circum-navegação em redor daquilo que primeiro teve a dizer sobre o meu post. Já não me acusa de ver no Hamas uma IPPS. Agora, prefere passear por outras paragens, afirmando que a componente social do Hamas é desprezível por incluir apoio às famílias dos bombistas suicidas; que Israel se está nas tintas para essa acção social; que a facção bélica do Hamas é sinistra e que foi esta que venceu as eleições. (Até a foto que escolhi para ilustrar o post, que me parecia explicitar o carácter ameaçador do Hamas, depois de sujeita a um pouco de psicanálise caseira, é “reveladora sobre quem a escolheu” e “chic”.)
Nada disto me preocupa, conclui ele num fabuloso exercício mediúnico. Apesar de eu não ter escamoteado o lado negro do movimento nem o facto de este não reconhecer o direito à existência de Israel. Apesar de eu me ter limitado a reafirmar a complexidade de um fenómeno como o Hamas: não disse que a sua política social era boa ou má, não profetizei uma reacção definitiva de Israel a esta vitória.
Mas tudo bem. Se JPH prefere responder a afirmações que eu não fiz, estará no seu direito.
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Será pecado?
Há algumas coisas a que não consigo resistir, embora por vezes até tente. Pequenos consumos que me deixam a remoer uma culpa vaga e irritante. Depois de matutar um pouco no assunto, escolhi a meia dúzia mais revelante e mais frequente:
Licor de amêndoa amarga
Má-língua
Episódios antigos do “Star Trek”
Historietas do Tio Patinhas
A “Bancada Central” da TSF
Bolachas Oreo
E vocês? O que fazem às escondidas, mesmo sabendo que milhões de outras pessoas o fazem também? Das vossas rotinas diárias, o que é que vos causa uma vergonha injustificada mas persistente?
Entregues à bicharada
Segundo o que o “Público” escreve e a TSF confirma, o deputado Duarte Lima encarregou-se ontem de proferir um animado discurso em que clamava pela restrição das escutas telefónicas a “crimes de terrorismo organizado, de tráfico de droga e crimes de sangue”. Não pensem que a descontextualização altera a intenção do impoluto político: ele confirmou depois que quer ver as escutas “exclusivamente” limitadas a estes três tipos de crime. De fora ficariam, tão somente, os crimes de corrupção, de peculato, de abuso de poder… precisamente as malfeitorias de que “políticos” como Fátima Felgueiras ou Isaltino têm sido acusados. Até aqui, nada de anormal. O homem tem contas a ajustar, relativas a outros tempos, ainda na memória de muitos.
Incrível mesmo é que os bonecos de votar do PS, do PSD, do CDS e do BE se tenham erguido em unânime aplauso a tal ideia. Uma das criaturas do PS chegou a gabar a “sapiência” e a “coragem” de Duarte Lima! Fernando Rosas manifestou o seu deslumbre com o tradicional “muito bem!” Até Ana Drago tratou de parabenizar o autor de tão descarada sugestão. Este, aproveitando a embalagem, teve ainda tempo para alvitrar que as magistraturas devem vir a ser colocadas em boas, desinteressadas e capazes mãos: as dos políticos, claro está.
No mesmo “Público”, pode ler-se um relato sobre o estado actual do famoso concurso dos helicópteros para o SNBPC: o Estado arrisca-se a ter de pagar o serviço ao vencedor do concurso e também a uma empresa que dele foi excluída em circunstâncias perfeitamente incríveis. E, para deixar este ramalhete de histórias deploráveis por aqui, soubémos ontem que a comissão de inquérito sobre o caso Eurominas foi fechada à pressa e à má fila pelo PS.
Estamos bem entregues, sim senhora.
Confissões de um duro ouvido
Hoje, o “Fórum TSF” tinha uma pergunta algo exótica para interpelar os seus ouvintes: “com que coisa do nosso mundo se parece a música de Mozart?”
Aquilo pareceu-me um pouco tonto. Até que me surgiu uma resposta clara, em forma de imagem: a música de Mozart faz-me lembrar um ovo de Fabergé. A mesma perfeição formal; a mesma sensação de nada ali faltar nem estar a mais; a mesma admiração pelo génio, pela mente capaz de imaginar tais coisas. E a mesma sensação de tudo aquilo ser bonito demais, de tudo estar demasiado perfeito para o meu escasso gosto. Sei que cada ovo de Carl Fabergé é uma peça única, um feito irrepetível da sua arte. Mas não tenho grande vontade de ter um em casa.
Pronto. Já confessei: não gosto muito de Mozart. Agora podem flagelar-me em público.
Terroristas no poder?
Quem diria, há uns meses, que a situação no Médio Oriente iria dar esta cabriola: Sharon fora de combate e o Hamas pronto a assumir o poder na Palestina. Em Israel, ainda impera a incredulidade com a dimensão da derrota da Fatah, já à mistura com ameaças de cortes de fundos europeus e americanos à Palestina. É que ninguém esquece que o Hamas nunca reconheceu o direito de Israel à existência e continua a manter uma ala de activos terroristas.
Mas a realidade é sempre difícil de descrever por chavões. Há quase 3 anos, Pacheco Pereira, numa tirada amplamente aplaudida, sentenciava: “não há ‘dirigentes moderados’ numa organização terrorista, ponto”. Hoje, tenho oportunidade de repetir ipsis verbis o que então escrevi algures: ignorar que o Hamas é muito mais do que um grupo terrorista é simplesmente fechar os olhos à complexidade dos factos. É ignorar o que até a Anti-Defamation League constata no seu site: que o Hamas gere uma intrincada rede social, com hospitais, creches, escolas e caridades diversas. É ignorar a própria génese do movimento, surgido como oposição à notoriamente corrupta entourage de Arafat e então apoiado discretamente por… Israel.
Continua a ser instrutivo recordar o livro “The Palestinian Hamas”, escrito por dois académicos israelitas, com a sua explanação das dissensões internas que têm atravessado o Hamas, sempre oscilando entre dois pólos: a brutalidade pura e dura e a procura de soluções negociadas. (Um homem como Ismail Abu Shanab era um dos rostos deste último ponto de vista. Era; até Israel o matar.) O comentário da casa editora, a Columbia University Press, esse notório ninho de simpatizantes dos terroristas, é revelador: “desde que emergiu como desafiador da OLP durante a Intifada Palestiniana, o Hamas foi associado pela percepção pública ao terror e à violência. Agora, dois especialistas israelitas mostram que, ao contrário desta imagem, o Hamas é essencialmente um movimento político e social, fornecendo extensos serviços comunitários e respondendo constantemente às realidades políticas através de negociações (…)”
Por cá, passadas as primeiras ondas de choque, não sei bem qual vai ser a primeira “revolução” nos comentadores do costume: concluir que se calhar Arafat até não era assim tão mau, ou descobrir que, afinal, a Democracia talvez não seja mesmo sinónimo de paz e harmonia instantâneas…
Benefícios da Aspirina B
No meio da apresentação mais importante dos últimos tempos, o projector recusa-se a colaborar com o portátil. Mudam-se os fios, mudam-se as máquinas: nada. Acabo de computador nos braços, passeando face aos dignos Clientes como uma daquelas mocinhas semi-desnudas que andam sempre de tabuleiro a tiracolo a vender charutos nos filmes de gangsters. Só mesmo se de repente apanhasse a síndroma de Tourette e desatasse a vomitar impropérios é que aquilo podia correr pior.
Neste momento acabrunhante, quando só desejo que desça das nuvens um disco voador que me leve para Urano, começo a sentir o efeito balsâmico do Aspirina B, através de um singelo pensamento: “isto agora está a parecer-me terrível. Mas mais logo hei-de escrever um post meio cómico sobre o episódio e a neura passa-me logo”.
Agora, aguardo em jubilosa esperança a última etapa deste processo terapêutico.
Bloquistas, Dadá e Salesianos
O “Acidental” resolveu associar-se à exposição “Dadá”, do Centro Georges Pompidou, através da pena de Jacinto Bettencourt. Parece que um “bloquista” o terá atacado de forma soez e imperdoável. Isto terá também a ver com um alarmante “projecto público que o seu plano holista tem para cada um de nós” (?). Vai daí, o homem tratou de fechar as suas caixas de comentários e de descobrir que a exposição “prolongada a padres salesianos resulta numa redução dramática da massa cerebral”.
Hoje, o autor, que patentemente andou mesmo nos salesianos (como eu, aliás), tratou do conveniente acto de contrição. Mas alguém me indica o caminho para os tais comentários do “bloquista” aleivoso — membro da corja que todos reconhecemos como “incapaz de viver em sociedade de forma civilizada” — capaz de provocar semelhante desvario?
Sentidos proibidos na auto-estrada da Informação
Mesmo agora, com acesso a uma nova versão do Google, os chineses escusam de procurar informação sobre, por exemplo, o massacre de Tiananmen. A auto-censura do motor de busca mais popular do mundo tratará de fazer a vontade ao governo chinês, dificultando a entrada no país de frases ou imagens capazes de perturbar mentes mais débeis. Assim se vê a força do PCC, claro; mas também o poder de quem escolhe a informação a que temos acesso.
Parece que a culpa afinal é dele…
Ao defender as escutas a cidadãos americanos ordenadas por Bush II, o Attorney General Alberto Gonzales citou uma longa série de exemplos de presidentes americanos que, em tempo de guerra, ordenaram a intercepção de correspondência alheia, sem esperar pelos tribunais; começando por George Washington. Para o ano, talvez se esteja a justificar o assassinato de prisioneiros, com o argumento de que o primeiro presidente também se viu envolvido nessa prática (num episódio que viria a dar origem à Guerra dos Sete Anos)…
PS: nem de propósito. Acabo de ler no DN que, a partir de 17 de Fevereiro, os “combatentes inimigos” detidos em Guantánamo podem ser condenados à pena de morte.
Toca aí o hino, mermão!
Já devem ter visto por aí um anúncio de TV com o nosso hino por banda sonora. Uma coisa épica, cheia de bandeiras desfraldadas, de impante orgulho luso. Mas sabem a quem é que a PT, assim auto-proclamada “empresa privada que mais investe em Portugal”, foi encomendar o spot em questão? A uma agência brasileira. Depois, para dar um toque ainda mais genuíno à ode patrioteira, tratou de contratar uma produtora igualmente brasuca. Faz o que eu digo, não o que eu faço, né?
Se Cavaco é Presidente da República, Sócrates primeiro-ministro, Barroso Presidente da Comissão Europeia e Bush ainda anda por aí…
Uma pequena dose de cinismo eleitoral
Por vezes, dá jeito ser capaz de pegar nos óculos de analista e olhar para o processo eleitoral como um mercado. É que logo saltam à vista algumas evidências. Como esta: não existe aqui espaço para duas ofertas periféricas similares — uma estará sempre condenada ao insucesso. Quando surge Manuel Alegre travestido de candidato anti-partidos, exterior ao “sistema”, poético, sonhador e “cultural”, o candidato do Bloco vê-se automaticamente em sarilhos. Ainda por cima quando lhe falta massa crítica em termos de possibilidades reais de eleição; para já nem falar da vetustez e da pose de predestinado que muitos ainda imaginam como imprescindível aos “grandes estadistas”.
O eleitor, na sua crueldade utilitária, sabe que não existem moinhos de vento que cheguem para todos.
Vai ao psicanalista que isso passa
Francisco Louçã e o Bloco de Esquerda tiveram uma indiscutível derrota eleitoral. Mas vale a pena ler o editorial de José Manuel Fernandes (JMF) de hoje [link não disponível]. JMF tenta transformar uma derrota – que, já agora, mesmo que seja fraca a consolação, é o segundo melhor resultado do espaço do BE desde o seu nascimento – numa hecatombe que põe o BE à beira da extinção.
No seu texto, JMF compara (e a compação é pertinente) os resultados das últimas legislativas com os das presidenciais, em vários distritos. Sempre sem dizer a que distritos se refere e sem nunca dar um número. Na verdade, em vários exemplos, os dados com que avança não se aplicam a nenhum distrito ou concelho. Num caso, não encontrando melhor, escolhe uma freguesia, a única que explicita. Mas num texto tão extenso e explicativo – uma novidade nas prioridades de JMF –, nunca o director se dá ao trabalho comparar o totais nacionais de há um ano e de agora. Compreende-se. O seu texto deixaria de fazer qualquer sentido. É que quem o leia fica com a estranha sensação de que perdeu alguma coisa da noite eleitoral e que o BE pura e simplesmente desapareceu do mapa.
Recordo: o Bloco desceu de 6,4 para 5,3, depois de vir dos 3% em legislativas e presidenciais anteriores. Mais uma vez: o seu segundo melhor resultado em 8 eleições nacionais. Mais uma vez: uma derrota. Não uma calamidade, mas uma derrota. Só que, lamentavelmente para JMF, não foi aquela com que ele sonhara. E, já sabemos desde o Iraque, quando as coisas não acontecem como JMF quer, JMF cria-as. JMF abandonou a extrema-esquerda mas o estilo “Voz do Povo” nunca abandonará JMF. Só que, também como sempre, a sua excitação é tanta que acaba por denunciar a sua patologia. No caso do Bloco, trata-se de um caso que só a psicanálise pode resolver.
PS – Fica para mais tarde o contra-factual a todos os “dados” avançados por JMF, mostrando o nível delirante da sua prosa. Não o faço agora, porque me soaria, pelo menos a mim, a desculpas de mau pagador. Uma derrota é uma derrota e quando a derrota vem, aceita-se sem grandes desculpas, deixando para mais tarde a análise cuidada. Mas se é verdade que no dia 22 o Bloco saiu derrotado, com este editorial, é a seriedade do jornal “Público” que fica mais uma vez posta em causa. E mais uma vez pela militância de um director que está a transformar o melhor jornal português num projecto político pessoal. Definitivamente, há homens que não estão à altura do lugar que ocupam.
Moita de Deus?
E se, de repente, um desconhecido lhe enfiar um míssil em casa? (2)
E se, de repente, um desconhecido lhe enfiar um míssil em casa? (1)
Soubemos ontem que os terroristas podem ter já deitado as mãos a mísseis de tecnologia avançada. Isto é terrível. Em breve, qualquer um de nós poderá acordar com o som de uma explosão pavorosa. E ver-se entre os escombros do que era a sua casa, entre pedaços dos seus filhos. Os culpados estarão bem longe, clamando mais uma vitória contra as “forças do mal”, indiferentes ao facto de terem apenas destruído mais uma mão-cheia de vidas inocentes.
Ficção? Nada disso: aconteceu há umas semanas, no Paquistão. Só que, ali, os mísseis não tinham sido contrabandeados da Chechénia; até talvez ostentassem as orgulhosas insígnias da USAF.
O Império contra-ataca
Não sei bem porquê, mas esta versão parece-me mais convincente do que a do camarada Lenine. De onde gamei a foto, já não me lembro. Mas está aqui um texto engraçado sobre o simbolismo da imagem…