Arquivo da Categoria: Nuno Ramos de Almeida

Melhoras na Imprensa

O Diário de Notícias de hoje parece irreconhecível: está francamente melhor, tanto em termos gráficos como em conteúdo. Era muito bom que finalmente houvesse uma alternativa informativa ao Público. Vamos ver se a qualidade se mantém. Não resisto à tentação de passar um diálogo, recolhido pelo jornalista Pedro Correia, na campanha de Manuel Alegre:
” – Olha vamos aparecer na televisão logo à noite.
– Mas tu percebeste bem quem é o homem?
– Sei lá, é um político.
– É um ministro!
– Chama-se Jerónimo de Sousa, acho.
– E esse é ministro?
– Isso não interessa nada. O que interessa é que vamos aparecer na televisão.
– Eu queria aparecer na TVI. Porque dá os Morangos…

Já o Expresso está ligeiramente melhor: não vi a crónica da Bomba Inteligente, espero continuar a ser poupado.

Alegres mentiras

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Manuel Alegre tem uma concepção de si ligeiramente exagerada. Nas suas palavras, foi “a” voz, “o” fundador e o primeiro responsável da rádio “Voz da Liberdade”; garante ter convivido longamente com Che Guevara; “relembra” ter encabeçado e preparado audazes acções de luta armada e, por último, em resposta a Jerónimo de Sousa, afirma ter vivido com Álvaro Cunhal e poder reivindicar o nome do comunista, por ter conhecido Cunhal antes de Jerónimo.
Sejamos claros: Alegre só reivindica Cunhal porque ele está morto e não lhe pode responder. Acerca do resto, há muita gente viva para o corrigir, só não têm provavelmente vontade de perder tempo. Por isso, aqui ficam algumas “precisões” que Alegre necessita para reavivar a memória. Manuel Alegre participou na Rádio Voz da Liberdade, foi uma das suas, muitas, vozes, não foi fundador da emissora de Argel, nem sequer na Frente Patriótica de Libertação Nacional era o responsável da rádio; nunca encabeçou nenhuma acção armada e “conheceu” Che Guevara, entre croquetes a aperitivos, numa recepção na embaixada de Cuba em Argel. Sobre a sua longa convivência com Cunhal, o facto pode resumir-se ao seguinte: Alegre ficou largos meses na casa do PCP em Argel, onde vivia o responsável do PCP (Pedro Ramos de Almeida) e família, e que acolhia os dirigentes do PCP, quando de visita à capital argelina, mas isso não lhe dá o direito de “reivindicar” o dirigente do PCP contra o partido que ele ajudou a construir.

Cartinha de agradecimento

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Li com agrado que o presidente da Síria poderá ter que falar a uma instância internacional para se apurar o envolvimento do seu governo na eliminação física de políticos libaneses que se opõem ao domínio do seu país pela Síria.
Acho que é um bom começo, espero com impaciência a chegada de igual convocatória para o presidente Bush: por ter mandado assassinar algumas dezenas de milhar de pessoas, numa invasão sem mandato da ONU, e sobre pretextos confirmadamente falsos.
Tenho a certeza que só a confusão de cartas na época natalícia terá impedido o Sr. George W. Bush de ter recebido a justa missiva. Não acredito que isso do direito internacional, seja uma coisa para vencedores: uma espécie de “lei dos mais fortes” em papel timbrado. Acho que só com um grande cinismo é que é possível concordar com a afirmação de Kissinger de que o direito internacional só acontece quando as grandes potências estão interessadas que suceda.
Sobre a luta contra o terrorismo, eu sou um “Acidental”, acho que dezenas de civis palestinianos alegadamente mortos por bombas do exército israelita são completamente diferentes de dezenas de civis assassinados por um bárbaro bombista terrorista e suicida. Até as vítimas, com ajuda do Pacheco Pereira, sabem reconhecer a diferença: uns foram limpos por armas legítimas, pagas contra factura e o IVA de lei e outros foram assassinados por armas do mercado negro, que provavelmente escaparam aos negociantes oficiais.
Ninguém de boa fé poderá dizer que é a mesma coisa gente torturada por uma democracia e por uma ditadura: há obviamente choques eléctricos legítimos e outros que são bárbaros. Estou aliás convencido que se a energia eléctrica for fornecida pela Iberdrola, saber-se-á que se tratam de choques santos, ou não fosse a firma representada em Portugal por um “cardeal”.

Eu “copy paste” me confesso (a imagem é gira, é pena não ter nada a ver)

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Quando trabalhava na revista Focus, o patrão Jacques Rodrigues decidia todas os conteúdos editoriais, tendo a certa altura mandado fazer uma capa que era igual à de uma revista Veja, saída há poucas semanas. Os rapazes da Sábado, atentos, descobriram e denunciaram o facto. A notícia terá chegado à própria publicação do outro lado do mundo, uma colega nossa, brasileira, que em tempos tinha trabalhado na Veja, recebeu um telefonema de “gozação” de um editor da dessa revista. Dizia ele, mais ou menos, o seguinte: “já sei que copiaram a nossa capa, fizeram muito bem, nós fartamo-nos de copiar as revistas dos Estados Unidos e outras, e sei que eles também copiam quase tudo. Quando descobrirem, o cara que inventou essas coisas, dêem-lhe os parabéns que a gente não lhe agradeceu, porque ainda não o conseguiu descobrir.”
Eu confesso, não vá o Luís Rainha descobrir, que nunca tive uma ideia original: as poucas que consegui, foi porque me enganei a copiar umas tantas letrinhas.
Irrita-me esta ideia de autoria. Sonho que um dia o projecto Xanadu esteja completo e se descubra que andamos todos, desde o início dos tempos, a copiarmo-nos todos.
Claro que o meu comentário é parcial: como eu gosto de ler a Joana Amaral Dias, desagrada-me esta polémica. Provavelmente se fosse sobre a Bomba Inteligente, eu nem ligava.

A verdadeira pornografia

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Vários artistas europeus exibem obras sobre a União Europeia nas ruas de Viena. Segundo o Expresso, a campanha está a “escandalizar os europeus”, nomeadamente um cartaz em que “uma mulher deitada de forma provocante exibe uma “lingerie” com a bandeira da União Europeia”. Estou de acordo que a ideia de colocar Chirac, Bush e Isabel II a fazer sexo em grupo é demasiado irrealista: não há viagra que tenha potência para alguém se conseguir excitar com tal partouze. Mas chamar pornográfico a uma mulher em poses provocantes é só estupidez e ignorância: se o editor do Expresso fosse um pouco mais culto saberia que a obra se baseia no célebre quadro de Gustave Courbet, de 1866, L’Origine du monde (Lacan foi o último proprietário privado desta pintura que se encontra, actualmente, na posse do Museu d’Orsay).
Era interessante analisar porque é que certas pessoas acham o sexo uma coisa horrível. Qual é a razão que a moral dominante encontra para achar normal exibir,a crianças, filmes em que todo o mundo se massacra alegremente, e defender que é condenável ver-se uma qualquer cena com um palmo de nudez?

Nota: depois de escrever o texto, li o DN que tinha referenciado correctamente a imagem. Do mal o menos, nem todos os jornalistas são tão ignorantes como os imagina Pacheco Pereira…

O meu Natal bloquista é melhor do que o teu

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Luís, eu como sou mesmo militante bloquista – apesar de não ser “director de imagem”como o meu amigo – já descobri o caminho das pedras e tive uma santa quadra muito melhor que essa “pecêzada” sem banho que tu viveste. É bonita a tua conversão, mas não és obrigado a entrar no PSR, podes continuar a ensaboar-te…
A propósito, quando quiseres contribuir com textos para os tempos de antena, escusas de publicar primeiro no blog…

Lénine, Marx e Bin Laden (Afinidades Acidentais)

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O Henrique Raposo tem a ambição de ser uma espécie de professor Marcelo da Blogosfera. Em vez de ler livros: enuncia títulos. Em vez de argumentar: tira conclusões. Infelizmente, a leitura das lombadas raramente nos elucida muito sobre as obras.
Hesitei bastante em escrever sobre os seus escritos : não só porque me sinto esmagado com tantas capas digitalizadas, mas sobretudo, porque tenho para mim claro que só vale a pena discutir livros com alguém que alguma vez leu os autores que crítica. Ora depois de ver a análise que ele fez sobre Negri e Zizek é obvio que o senhor Raposo não se dá a esse trabalho.
Mas a associação de Lénine e Marx ao terrorismo, e a falta de assunto para escrever, levam-me a enumerar umas tantas ideias:
1.Lénine terá os seus defeitos, mas a apologia ao grupos terroristas não faz parte deles. Vladimir Ilich Ulianov sempre denunciou os atentados terroristas como perniciosos.
A sua posição tem razões pessoais e políticas: o irmão mais velho de Lénine, Alexandre, morreu enforcado por participar numa tentativa de assassínio do Czar, o que levou o seu jovem irmão a dizer que “esse não era o caminho”; e, do ponto de vista político, o terrorismo na Rússia foi uma prática de grupos anarquistas e socialistas revolucionários a que o partido Bolchevique sempre se opôs. O líder da revolução de Outubro tem mesmo um texto crítico, escrito salvo erro em 1909, contra o assassínio do rei D. Carlos I de Portugal. Para os Bolcheviques a violência e o terror revolucionário só podiam ser exercidas no contexto de luta de massas generalizada e nunca no quadro político e técnico de atentados terroristas.
2. A rejeição por parte de Marx do terrorismo dá-se no contexto das divergências tidas com sectores anarquistas no quadro da primeira Internacional, nomeadamente em relação a Mikhail Bakunin e, episodicamente, a Netchaev (autor do célebre catecismo revolucionário), histórias que estão bastante bem narradas num livrinho muito fácil de ler, e até editado em português, e para Henrique Raposo em inglês, a biografia de Karl Marx de Francis Wheem.
3. Acerca da pseudo-ligação entre fundamentalistas islâmicos e comunistas, é sabido que os Estados Unidos da América e Israel financiaram e apoiaram o renascimento de sectores do fundamentalismo islâmico, no âmbito da guerra fria, tendo três objectivos principais: combate aos soviéticos no Afeganistão, contrariar os partidos de esquerda árabes de origem nasserista e debilitar a OLP e Yasser Arafat. São histórias mais do que conhecidas e bem ilustradas na foto publicada pelo Luis Rainha.

O Impossível acontece: Durão Barroso foi quase mais parvo que Ribeiro e Castro

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Há experiências enternecedoras: recentemente estive na Hemeroteca para folhear alguns jornais e tropecei no “Independente” de 27 de Janeiro de 1995, em que se publicava um artigo do camarada “Abel” (Durão Barroso), retirado do “Luta Popular” de 2 de Maio de 1975.
A singela peça tem como título: “A Vida e Obra de Estaline”. É preciso notar que o texto foi escrito há 30 anos, mas que na altura José Manuel Durão Barroso tinha mais de cinco anos de idade (pelo menos de idade legal) e uma formação que ultrapassava largamente a infantil. E, embora a redacção deste escrito teórico o pareça indiciar, não está provado que Durão Barroso tenha descoberto as pastilhas ou que tomasse regularmente ácidos.
Feitas estas advertências aos leitores, cá ficam alguns excertos deste documento histórico que espelha algumas das características intelectuais do actual presidente da Comissão Europeia.
“ Onde quer que estejamos mal se pronuncie a palavra ESTALINE (Nota do redactor (eu): o autor escreve quase sempre o pseudónimo de Josef Dugladovitch em maiúsculas) logo um poderoso campo magnético (sic) isola à direita toda a espécie de oportunistas, unindo ferreamente à esquerda os verdadeiros comunistas e os autênticos revolucionários.
Esta é uma das teses fundamentais da directiva do nosso movimento “QUE VIVA ESTALINE!”. Essa directiva é uma contribuição enorme (NR: não consigo ver mesmo nenhuma maior, talvez os Himalaias) ao património científico do Marxismo-Leninismo-Maoismo. (…)
O camarada Saldanha Sanches é que não se demarca dos oportunistas, nem pouco mais ou menos não resistiu à contraprova do campo magnético (NR: uma espécie de “o algodão não engana”); mal se falou em ESTALINE começou a hesitar, titubeou, hesitou, indo cair no campo da contra-revolução, arrastado pelo poderoso campo magnético de que fala o Comité Lenine na sua Directiva. (…)
E isso acontece porque a camarada Gina (NR: parece que não é a das revistas) não ama Estaline (NR: talvez seja a das revistas) e está contra a linha política do MRPP.
E isso porque na sua crítica não toma as posições face a ESTALINE; fala dos “erros” de forma aparentemente correcta mas não diz que o camarada ESTALINE não cometeu erros estando implícito que admite que os cometeu (NR: a pontuação à Saramago é de Durão Barroso) . A camarada Gina não resistiu também à prova do campo magnético. Tentou cair no meio e foi cair ao lado dos oportunistas. E é talvez por isso que na sua crítica não se refere a esta questão, não diz que a questão de ESTALINE é a pedra de toque que demarca os Comunistas dos oportunistas.
A CAMARADA Gina faz a crítica por descargo de consciência. Não se “lembrou” que quando criticamos os outros não podemos cair nos mesmos erros que eles e por isso não estudou pacientemente a directiva “QUE VIVA ESTALINE!”.
A posição da camarada Gina é a posição (NR: é definitivamente a das revistas) daqueles que erguem a bandeira de ESTALINE para partir a cabeça dos que defendem Estaline, daqueles que sob a capa de defenderem ESTALINE, atacam-no. E Gina ataca-o porque não defende (NR: “estar vivo é o contrário de estar morto”). (…)
Devemos varrê-las do nosso seio (NR: o do Barroso) implacavelmente, “agarrar o touro pelos cornos” e não fazer tentativas hesitantes pelo flanco, tal é a posição dos Comunistas (NR: Fica por explicar qual é a posição do touro em relação aos comunistas e aos “deserdados” do campo magnético: os comunistas agarram os cornos e os outros seguram o rabo? ou pelo contrário empurram o touro? e “no meio” onde é que fica a “camarada Gina”?).
Dizer que ESTALINE foi um eminente dirigente proletário e não cometeu erros e não dizer que há erros de 1ª espécie e erros de 2ª tal é a nossa posição.” (…)
“Eu próprio não ousei criticar o camarada Saldanha Sanches, não dei à directiva “Que Viva Estaline” a enorme importância que ela tem, o que é uma manifestação oportunista e cobarde de quem não ama Estaline, de quem não defende intransigentemente os princípios do Marxismo-Leninismo-Maoismo. Por tudo isto, desde já me autocritico (NR: as chibatadas e flagelações eram à quarta feira) manifestando o desejo de ir contra a corrente e defender a vida, a obra e a actividade do grande Estaline não pactuando com todos os ataques – directos ou camuflados – que foram feitos ao grande Estaline.”

Diálogos presidenciais

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– Você não é um homem dialogante.
– Eu sou uma pessoa que toda a gente diz que é de palavra.
– Você não é simpático: todos os meus amigos europeus o dizem.
– Já li muitas memórias de líderes, em que eles escrevem que eu sou o máximo.
– Você só sabe de aritmética.
– Eu tenho um sinal que, a uma determinada luz, me dá muito charme.
– Você recusa-se a falar do futuro.
– Você só quer falar do passado.

Serviço Público: A melhor crónica do grande arquitecto

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(Foto roubada ao “no meu umbigo”)

Esta crónica ao inconfundível estilo Saraiva, foi retirada de um blog infelizmente finado, chamado Umbigo.

Como diria EPC, que em breve esperamos contemplar, os textos do Grande Arquitecto são marcados por uma lógica discursiva desarmante na sua linearidade binária. Para escrever um texto como o Grande Arquitecto, precisa apenas de misturar com água, com muita água, os seguintes ingredientes:
1º – maniqueísmo: contrapor, a golpes de frase curta (e uma frase/um parágrafo), duas realidades, de preferência inesperadas (o locus classicus nesta matéria é a inesquecível crónica de António Pinto Leite no «Semanário» dos anos 80 com o título «Eanes e Stéphanie», ainda hoje analisada, sem sucesso, nas melhores escolas monegascas de ciência política e de jornalismo);
2º – umbigo: tropo literário que se caracteriza pelo uso frequente de expressões do tipo «como já escrevemos nesta coluna…», «há dois meses, dizia…» (= «é triste ter razão antes do tempo» ou «oh, o que custa, rapazes, ser um visionário neste adormecido Portugal!» ou ainda «tenho este ar permanentemente chateado não por causa de ser hirsuto que nem um cacheiro e possuir sobrancelha única, mas porque ninguém dá ouvidos à clarividência dos meus avisos»);
3º – remate – o texto deve terminar com uma frase que dê o ar que se está perante um esmagador tratado de lógica, ou seja, que não se trata de uma opinião pessoal do Grande Arquitecto mas antes de uma conclusão extraída através de processos dedutivos usados nas mais selectas escolas austríacas e inglesas de filosofia analítica. Uma conclusão que, modesto, o Grande Arquitecto se limita a anunciar urbi et orbi.

Um exemplo prático. Exercício nº 1:

Siameses

A semana que passou foi marcada por dois grandes acontecimentos.
Em Singapura, a operação de separação das gémeas iranianas fracassou.
Em Portugal, continuou a falar-se da possível candidatura a Belém de Mário Soares e Cavaco Silva.
Ora, como tenho defendido nesta coluna, considero que Soares e Cavaco são gémeos falsos.
Não são gémeos siameses.
Cavaco é filho de um gasolineiro de Boliqueime.
Soares é filho de um ministro da I República que se converteu em pedagogo e fez um Atlas Geográfico Universal que teve, pelo menos, 23 edições.
Cavaco estudou em Inglaterra.
Soares ensinou em França.
Cavaco gosta de trepar em coqueiros.
Soares gosta de montar tartarugas.
Cavaco é um asceta.
Soares é um sibarita.
Cavaco é um cara-de-pau.
Soares é um cara-de-bolacha.
Cavaco gosta de bolo-rei.
Soares gosta de ser o rei do bolo.
Cavaco escreveu a sua própria biografia (e saiu uma bela merda).
Soares preferiu escrevê-la através de uma idiota útil que meteu perguntas simuladas pelo meio e no final assinou o nome.
Cavaco é magro.
Soares é gordo.
É por isso que, como tenho sustentado nesta coluna, Cavaco Silva e Mário Soares não são irmãos siameses. E, como não são siameses, não precisam de ir a Singapura.
¶ 1:24 AM

Espada em Madrid

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Decorreu esta semana em Madrid, por iniciativa do Professor Eduardo Nolta e da FAES (Fundacion para al Analisis y los Estudos Sociais), instituição que para além de tudo é conhecida pelo o uso de gravatas garridas italianas e a confecção de excelente scones, uma conferência comemorativa do bicentenário do nascimento de Sir Alexis de Tocqueville. O Hotel, que me arranjaram, era muito em conta e estava situado na Calle Mayor, no atrío polulavam os fellows em alegres concílios, sempre com a dignidade que se exige, a excelência que se procura, e claro, fatos a condizer: você já repararam o ar distinto das casacas, mesmo quando não usadas em Wimbledon?
Entre os temas abordados esteve a concepção de liberdade em Tocqueville, que deve ser distinguida claramente de Rosseau e, ainda que menos vincadamente ( a mim as pregas não me ficam muito bem), da de John Stuart Mill. Como por coincidência, recordei aqui no sábado passado, Rousseau (embora não tenha conseguido falar-lhe ao telefone) não aceitava o indivíduo enraizado em qualquer particularismo – dizia-me com muita graça Sir Karl Popper: “Spading (ele tratava-me assim) isso são sinais e faça o favor de me ir buscar o carro” –, como os seus interesses privados, a sua família, o seu negócio ou a sua igreja ( em Messajana há uma particularmente conseguida). Esta hostilidade contra todos os “attachments” particulares (em mails e fora deles), para usar da expressão de Michael Oakeshott, que carteia no bridge como poucos, esteve na origem do jacobinismo e do comunismo, que como todos sabemos não sabem fazer o nó da gravata e não apreciam a Zara e a liberdade.

(Qualquer parecença com a crónica do professor João Carlos Espada, de hoje e de sempre, é casual)

Um quadro

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Quando era pequeno, ir a casa dos meus avós era uma aventura fantástica: passava pelas salas, em que a lareira crepitava, e em que se sentia também o cheiro do couro dos livros. Abria as portas e subia umas escadas em que os quadros se amontoavam. No cimo de tudo, antes da enorme vista para o Tejo, estavam dois quadros de Mário Eloy: este e um outro em que a mesma mulher surge na mesma posição, mas vestida. Uma espécie de exercício de Goya, entre Maya vestida e Maya desnuda.
O meu avô, que era ateu graças a deus (reparem na minúscula), não comemorava o Natal, apenas assinalava o ano novo.
Infelizmente, nenhum dos meus avós é vivo: talvez por isso, mais do que pela indiscritível musiquinha, esta época me irrite tanto.