Arquivo da Categoria: Susana

O RAPTO DAS ASPIRINAS

Na sexta-feira abateu-se uma catástrofe sobre o AspirinaB. Foi logo após a saída dos últimos enfermeiros que se encontravam nas novas instalações, ainda em acabamento. Indivíduos por identificar invadiram o edifício. O incidente foi relatado e parcialmente filmado por um popular que se encontrava nas imediações. Quando eles saíram, com as aspirinas amarradas e amordaçadas, arrastando-as a toque de caixa, eu escondi-me, contou.Receei filmá-los a meter as aspirinas no camião, não fossem partir-me a câmara, ou pior!, levar-me também. Mas seria capaz de os identificar em qualquer lado. Eram de estatura mediana e estavam vestidos de preto, todos encapuçados.
Pouco depois, deu-se a explosão, da qual apresentamos também videoprints. Os bombeiros mostraram-se impotentes na luta contra as chamas, acabando o edifício por ruir, ao fim da noite. De madrugada o fumo substituía as labaredas e os mirones foram evacuados por perigo de sufocação.
Neste momento, e porque pudemos contar com reforços inestimáveis, já temos tudo de pé. Uma falha técnica está a atrasar o visionamento das imagens e estas irão para o ar assim que possível. Podemos voltar a brincar ao recreio da escolinha. Eis-nos, então, de regresso às aulas.

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o que faz falta

Alguns sabiam que estavam em falta. Sim, sabíamos. Mas não sabíamos o que faltava. E o que faltava? Por mais um lapso dos serviços administrativos, a musa ausente. As senhoras, por compreensível inveja – natural, considerando a personalidade em causa –, esqueceram-se dela. Mas prontamente o mais curioso e dedicado recensor da autora reclamou, apontando a incompletude, e a gerência respondeu à sua solicitação. Podem agora consultar o arquivo da escritora, inaugurado pelo seu mais grandiloquente poema. Podem, agora, mitigar soledades.

casa em arrumações

O AspirinaB na Weblog estava pejado de fantasmas brincalhões. Era um fartote, pois era, mas nós não queríamos a casa assombrada. Mudámos. As senhoras dos serviços administrativos do Aspirina (como qualquer instituição que se preze, temos que manter as quotas paritárias) trataram da mudança de arquivos. Foram rápidas, as funcionárias, mas enganaram-se nos dossiers. Sou quase tão boa a pedir desculpa como o João Pedro nos agradecimentos. Aos autores que já não estão no aspirina apresentamos, assim, as nossas desculpas, por terem o acesso aos seus posts truncado. Tudo será rectificado, a seu tempo. Devagar, devagarinho, os posts estão a ser devolvidos à respectiva autoria. Valha-nos o Jorge Mateus ser inconfundível e valha-nos Deus, que assinou sempre os textos.

fait divers

Ontem perguntaram-me como era ser a única mulher num blog de misóginos. Respondi, automaticamente, misóginos, eles?!, coitados.
Pensei que seria preciso saber, antes de mais, o que é ser mulher. E o que é ser única? A única mulher, ainda por cima.
Afinal, o que é um blog? Um blog pode ser tanta coisa. Um blog de gajos? Logo um blog, onde há tantas presenças, mesmo ausentes; olhamos a caixa com escassa dezena de comentários e pensamos a zazie não veio, hoje.
Como se caracteriza um misógino? E um gajo? Não faço ideia.
Respondi, remetendo apenas para a minha experiência: é bom.

susana

olhos nus

Os óculos partiram-se. Mesmo no eixo que assenta na cana do nariz. Não foi queda, nem o ter-me sentado, inadvertidamente, com eles no bolso. Limpava a lente direita quando foi um olho para cada lado. Sucumbiram a anos de uso.
Com olhos cansados, aplicados em leituras ao longo do dia, raramente suporto, agora, as lentes de contacto. E foi assim que saí de casa, pela primeira vez desde os dezasseis anos, sem o recurso a próteses.
Não recordava a carícia do ar quente na córnea, a entrada da luz solar sem reflexos. Já não sabia o que era a visão pura, sem o incómodo de corpos estranhos à fisiologia a mediá-la, no espaço alheio à domesticidade.
Descubro então como as minhas (muitas) dioptrias geraram uma peculiar percepção e modos particulares de olhar. Comentavam que, adolescente, caminhava a olhar para o solo. Sabia que esta disposição aparentemente cabisbaixa me conduziu a representações de um mundo visto de cima. Imagens de perspectivas sem pontos de fuga, traços e manchas nos pavimentos, diferenças na irregularidade das pedras da calçada. Podia ver o que havia na distância reflectido nas superfícies molhadas pela chuva, pedaços de céu nas poças de água.
Depois passei a olhar sobretudo para cima, ávida de distâncias inalcançáveis. Mas continuava a chocar com as pessoas e, aqui e além, a embater em postes. Aprendi a olhar em frente. Hoje percebi as razões do meu apelo inicial. Quando se colecciona detalhes com olhos muito míopes, sabe-se que apenas o chão que se pisa é tangível.

susana