Vou continuar a partir da Palmira: vazio absoluto. Ora, o vazio, mesmo se absoluto, não equivale ao nada. E é inegável que o Ponto Contraponto será alguma coisa. Mas o quê? Vácuo, a única realidade conforme ao conteúdo. Dois factos concorrem para a evidência: (i) a Física ensina existirem flutuações do vácuo, em que do nada surgem manifestações de energia; (ii) o autor é o mais entusiasta defensor da mais vácua liderança no PSD desde que há PSD ou memória das suas lideranças (até o Menezes conseguia ter superior densidade mental). Assim se desvenda a enigmática transmissão semanal de 15 a 20 minutos de inanidade quântica.
Neste programa, o primeiro prato trazia algo que tem mobilizado o País, algo decisivo para o nosso futuro colectivo, algo que não podia ser mais relevante e oportuno quando confrontado com as grandes questões da comunicação social ou da actualidade política, social e cultural: a tipologia dos comentários nas notícias das edições digitais. A escolha do tema faz parte da sua campanha para limpar a Internet. Já se sabia que o Pacheco apagaria 99% da blogosfera se o deixassem, e também ficámos recentemente a saber que nos seus planos está a censura metódica das parangonas. Agora, anuncia que só deviam autorizar-se comentários, nos jornais portugueses, a leitores nascidos nas classes média e alta dos EUA e Inglaterra, dando-se primazia a quem provar ter grau académico. O Pacheco tem nojo da escumalha desse tal pais, chamado Portugal, que na OCDE aparece em 1º lugar nos índices de abandono escolar, analfabetismo e iliteracia. Ele anda a matutar numa forma de impedir que essa multidão tenha acesso à Internet, nem que seja durante 6 meses, por isso ficou tão chateado com os milhares de Magalhães entregues à populaça. É que não é só a chatice de ter putos a mandar bocas sabe-se lá em que blogue, o problema é muito mais complicado. A cada computador entregue aos chavalos tem de somar-se o número de irmãos, pais, avós, primos, tios e empregada cabo-verdiana, ou vizinhos apretalhados e ciganados, de repente com ideias sobre isto e sobre aquilo. Como explicou o Pacheco, em mais um rasgão numa inteligência já cheia de buracos, são estes desqualificados que vão para as caixas de comentários emporcalhar o ambiente, dessa forma criando as condições para que esses mesmos jornais aumentem a sua audiência digital. O que implica haver uma apetência geral para o consumo desse novo género literário-comunicacional javardo que o Pacheco denuncia e abomina. Este contraste entre o gosto popular e o gosto do Pacheco só comprova o acerto dos seus critérios. É que a ralé pode ser barulhenta, mas não consegue disfarçar o cheiro.
Quando começou a ler os insultos que seleccionou para ilustrar a sua indignação, decidi não acreditar no que estava a ver e ouvir. É ainda sob o efeito dessa decisão que me encontro, pelo que não me é possível comentar. Passo para este passo:
[…] E o site do Sol é um site cuidado, design. Se pudermos ver, aqui, como ele é, ele é construído com as regras do design. Ele é pensado para haver um equilíbrio, portanto segue as regras da casa de luxo.
Esta opinião supra, sendo do Pacheco, é válida. O marmeleiro avisou, logo no 1º com repetição no 2º programa, que as opiniões veiculadas no Ponto Contraponto só devem ser avaliadas segundo o critério da autoria. Ele está ali para um monólogo, para ser emissor; e quem não gostar, azarinho. Pelo que os seus considerandos acerca das apelativas temáticas do design e, no caso, do webdesign, são meritórias. O facto do Pacheco não fazer puto ideia de quais sejam as regras do design, e muito menos do webdesign, perde a já pouca importância que tinha à luz do argumento de autoridade; um ponto sem contraponto. Porque a verdade é a de ser possível conceber o design como a disciplina que alcança o equilíbrio tal como o Pacheco entende ser o equilíbrio alcançado pelo design. Será uma verdade sui generis, fruta da época. E só por distracção ou má-fé não se reconhecerá a vantagem em reduzir as disputadas regras da composição gráfica, e da usabilidade interactiva, a esta percepção com assinatura; evita muita discussão inútil, especialmente na Internet, onde deve reinar a ordem e a separação de classes. Para nós, humildes espectadores, resta só o exercício de descobrir se o insulto de ver alguém a ser pago principescamente para epater les bourgesses, inchado de empáfia e bolor, é um luxo ou um lixo.
Seguiu-se aquilo que foi dito ser uma análise dos mecanismos utilizados nos cartazes eleitorais. E o cartaz analisado foi o último do PS:
Pacheco quis ir mais longe, depois de ter lido as parvoeiras e punhetas mentais que já se publicaram. E, virando-se para trás, bolsou o seguinte:
Esse cartaz é muito interessante de analisar. Reparem no cartaz. O carta vive, evidentemente, da figura de José Sócrates. Mas a única coisa que realmente nós vemos neste cartaz é uma senhora que está no canto olhando com um sorriso embevecido para José Sócrates. É muito engraçado, eu não sei o que é que a Comissão da Condição Feminina dirá sobre estas coisas, ou o que é que dirão as feministas, mas este cartaz é profundamente machista e sexista. Porque Sócrates olha para nós, e a senhora olha para Sócrates. Sócrates olha para nós, com um misto de boa disposição e de firmeza, que é para dar aquela ideia de Avançar Portugal, e a senhora olha embevecida para Sócrates. É muito interessante este tipo de mensagem. E eu duvido que haja um cartaz menos feminista, mais machista e mais sexista do que este cartaz. E portanto… esta é uma mensagem muito interessante que se pretende transmitir e que acaba, essencialmente, por resultar para o eleitorado feminino. Eu presumo que ele tenha sido pensado para toda a gente, mas na realidade é um cartaz de sedução, de embevecimento, que realmente não traduz nenhuma ideia verdadeiramente racional, mas traduz, no fundo, uma paixão e uma sedução. O cartaz é bom, é bem feito, mas, de facto, para quem é um firme defensor da igualdade entre homens e mulheres, o homem, aqui, é que está verdadeiramente no centro do poder.
A misantropia do Pacheco vai-se desfraldando imparável. Minutos antes, eram os insultos que faziam aumentar as visitas aos jornais e blogues que os permitiam. Agora, são as mensagens machistas e sexistas que resultam com o eleitorado feminino. Como é que o dito tão inteligente Pacheco chega a tão desconsoladora conclusão? Estabelecendo que machismo e sexismo despertam paixão e sedução, como toda a gente sabe. Segundo o antropólogo da Marmeleira, as fêmeas respondem com estados de embevecimento sempre que um macho lhes mostra quem manda e as mete no seu lugar: no canto da casa ou do cartaz. Por isso, a Comissão da Condição Feminina, uma entidade fundada em 1975 que deixou de existir há décadas, foi mui justamente alertada por esse conhecido defensor das suas causas em tudo o que é areópago onde bota faladura. São lendárias as suas investidas contra o machismo e sexismo reinantes na sociedade, uma situação que manifestamente não suporta, que o atormenta, que o faz abrir jornais e chicotear todo esse putedo que aparece a publicitar os seus desclassificados serviços. De modo que a Comissão da Condição Feminina terá de encontrar maneira de voltar a reunir para tomar posição face a esta afronta, brilhantemente sintetizada pelo Pacheco: Porque Sócrates olha para nós, e a senhora olha para Sócrates. Se as mulheres — especialmente as feministas, frisou bem o orador, as únicas fêmeas que conseguirão resistir à sedução machista e sexista por serem fufas, lésbicas e fuçureiras — se calarem perante a violência de vermos uma mulher a olhar para Sócrates, ainda por cima estando ele no centro do cartaz, é o próprio direito a votarem, irem à escola ou usar calças que estará em risco.
Mesmo assim, após este tour de merde, o aspecto mais extraordinário da analítica do Pacheco está num singular facto: é a primeira vez, no Mundo e em vídeo, que se regista a crítica a um cartaz político que não se pronuncia sobre as suas mensagens escritas. Inverte-se a ordem natural dos factores e as palavras passam a ser o fundo não verbal onde se sobrepõe a narrativa de um olhar. Como já ameaçou continuar a criticar cartazes, veremos se estamos perante um exercício isolado ou se estamos perante uma nova semiótica. Contudo, acaso tivesse conseguido encontrar as letrinhas, teria sido obrigado a confrontar-se com o lema Juntos conseguimos. Este é o mote e o conceito. A partir daqui, a sua celebrada inteligência não teria dificuldades de maior em relacionar o texto de baixo com o de cima, as palavras com a imagem. O que se diz é que há um certo resultado que vai ser alcançado por uma pluralidade, um grupo. (Estás a tomar notas, Pacheco? Isso, não te distraias nesta próxima parte) Ora, o que a imagem mostra é um grupo de pessoas, homens e mulheres, onde aparece Sócrates ao centro. Mas é um centro comum a todos os elementos que preenchem o espaço humano, ele não está acima de ninguém. De facto, ele está abaixo de nós, os que observamos a imagem, por isso olha para cima. À sua volta há um grupo dinâmico, cujos olhares ficam indefinidos, que cruza diferentes eixos de força radiante. Esta composição é inovadora — compare-se com qualquer outro cartaz recente ou passado, seja de que partido for — e estabelece a coerência entre o que se diz e o que se mostra. Recapitulando: juntos conseguimos.
A leitura do Pacheco foi psicanalítica, mas de uma psicanálise que até nos cafés da Marmeleira já não se admite. Ter reduzido a peça a uma mistela incoerente de conas e caralhos, machões e feministas, política e lavagem-cerebral-para-donas-de-casa-com-dois-neurónios, fala apenas de si próprio. Revela os seus fantasmas, a sua sexualidade, onde Sócrates lhe aparece com um poder erótico tal que essa força só pode estar ao serviço da propaganda. Pelo menos, era o que o Pacheco faria nesse caso, se pudesse, ou o que recomendaria a um companheiro de partido com igual cachet. É o que justifica tão grande felicidade ao mostrar-nos que é ele o espertalhão-mor do bairro, o super-caçador dos truques da concorrência — mesmo dos mais bem escondidos, como este de terem posto uma mulher olhando para Sócrates num diabólico apelo à irracionalidade da paixão e subsequente voto. Entretanto (chega aqui, ó Pacheco, e lê com atenção), a tal mulher à esquerda do cartaz não está a olhar para Sócrates, antes para um rosto cuja cabeça se vê à direita virado na sua direcção. Claro que isto da realidade, dos factos, é algo sobrevalorizado, e deve ser consumido com extremo cuidado se pertencermos ao PSD, mas o cérebro do Pacheco merecia ficar a saber que habita na cachimónia do maior pantomineiro da televisão portuguesa. Um putativo especialista, um putativo intelectual, uma putativa inteligência que analisa cartazes apenas recorrendo a putativos olhares das eleitoras putativas.
A terceira denúncia é relativa a uma notícia que não foi confirmada pelo próprio: […] a ser verdadeira essa notícia […]. Quer dizer que o Pacheco dispara primeiro e pergunta depois. Se por acaso as coisas não forem bem como ele achou que foram, a culpa é dos jornais. As notícias, em boa verdade, não têm de ser verdadeiras para que ele as comente, têm é de dar jeito. É a primeira aplicação prática da política da verdade, tal como Cavaco e Manela a elaboraram. Estão avisados, depois não se queixem.
Em quarto lugar, um elogio anunciado com pompa provinciana. Uma reportagem de Cândida Pinto que lhe suscitou uma xaropada de elogios bacocos.
Segue-se novo castigo. Pacheco diz do seguinte título — Multas na recepção aos motards aceleras — o seguinte:
Eu, a primeira vez que li isto, disse, quer dizer, aceleram as multas ou aceleram os motards? De facto é um título mal construído, é um título ambíguo; e mau português, para além disso. E estes títulos, de facto, degradam a qualidade de um jornal.
Ou seja, o Pacheco contribui para o tal 1º lugar em iliteracia que Portugal mantém na OCDE.
Seguiu-se novo elogio, a uma série televisiva. E se dúvidas houvesse, elas desapareceram: não tem jeitinho nenhum para estimular o desejo de conhecermos as suas recomendações. Porque (ó Pacheco, presta atenção), o interesse da audiência não é um efeito que decorra do modo esganiçado como dizes excepcional ou de quantas vezes repetes a adjectivação. Enough said.
Despediu-se com este espasmo de mestre-escola:
E eu espero que o dinamite cerebral evite as patetices que agora vão começar a aparecer nos jornais com o Verão.
Tudo bem, mas responde-me só a esta pergunta: que mal te fez a dinamite para lhe trocares o género? Vamos colocar a questão de outra forma: a Comissão da Condição Feminina foi devidamente informada da masculinização da palavra? É que ninguém duvida da legitimidade da alteração, posto que foste tu a fazê-la, e nem tens de explicar, muito menos terás de nos falar da associação das barras de dinamite com os pénis explosivos que possam atravessar o teu imaginário, mas eu suspeito que até a causa feminista não esteja a ser bem servida pela pólvora seca de um programa feito de improvisos displicentes, de deontologia irresponsável e de ridícula e abjecta vaidade.
*
Para a genealogia do Ponto Contraponto, compare-se com o original. A vida imita a arte:
O programa do jpp é uma vergonha e até aquela malta sempre defensora do inteligente senhor não abre a boquinha…”ainda não tive tempo”, “vi só uns minutos,falava do Nemésio,pareceu-me bem”…Só me custa que a sic notícias passe tamanha aberração,seria melhor ter sido convidado pela tvi
O Pacheco parece estar a deslizar para a demência, efeito da idade, talvez, mas também da compleição. Já dava mostras disso há muito tempo, pois tendo começado como guardião implacável das verdades marxistas-leninistas (é sempre mau), logo revelou também uma preocupante tendência para pirómamo de bibliotecas (nunca é bom sinal).
Um minuto tirado ao acaso do genial diácono Remédios é sempre um milhão de vezes preferível a qualquer elocubração deste balhelhas* azedado no seu ódio descabelado a José Sócrates, um bilião de vezes superior a ele.
* Balhelhas: «aquele que é ou se tornou bobo, tolo, aparvalhado», segundo Houaiss, que conhece bem os regionalismos transmontanos.
porque dizes que o vazio absoluto é diferente de nada? Não vejo diferença. O resto fica para a_manhã.
as flutuações do vácuo quando originam quebras de simetria dão origem a fenómenos interessantes. ora o fenómeno pacheco na sua vertente “situacionista” é mesmo nada, ou talvez interessante do ponto de vista clínico.
o passarão do cordeiro chamou de tudo ao sócrates (mais parecia um membro do jamais) e depois diz que se enganou porque nem sequer leu o que saiu do conselho de ministros. antes da declaração mandou para os jornais uma laracha a dizer que se dimitia; acho que é agora, depois da assumpção do engano, que se vai demitir (eh, eh).
Houve um tempo que até apreciava Pacheco. Mas contra factos não há argumentos: Pacheco está a envelhecer muito mal. É pena.
Porque é de vácuo que se fala e a falta de memória conduz inevitavelmente ao dito, aqui fica mais um pouco de verdade verdadinha do psd.
http://www.youtube.com/watch?v=aQmPPdum-Rg&feature=player_embedded
acho que vão gostar disto. Enfim eu não sei se é propriamente verdade ou encenação, depende do tempo que demorar, se prescreve ou caduca ou não sei quê. Veremos.
O ponto contra ponto é um tempo de antena do PSD disfarçado de mau programa de provas culinárias. A ave que o apresenta passa o tempo todo a provar daqui, depenicar dali e a cuspir acolá. Petisca aqui e ali e, quando não vomita, arrota. No fim, diz se gostou ou não.
Palpita-me que a esta coruja sentinela da torre da Marmeleira lhe está a escapar algo: a sua evidente tendência natural para classificador de roteiros gastronómicos. Se é alguma insegurança o que o coíbe, nada que um pouco de prática não resolvesse rapidamente. Era só manter o formato do programa e alterar um pouco o conteúdo. E para não subverter a linha discursiva podia sempre terminar o repasto com um cocktail molotof de sobremesa para rebentar com as putas das barrigas de aluguer que não se importam de prescindir da massa cinzenta para satisfazer a maldita vontade de comer.
Mas pergunta-se: sendo um tempo de antena, deveria a SIC suspender o programa? Não. Nem pensar. A democracia tem todo o interesse que o programa se mantenha no ar de forma a esclarecer convenientemente os portugueses sobre a merda de oposição que temos.
Parece que há uns dias, um camafeu qualquer chamou o Pacheco Pereira de loira do regime e, por causa disso, ficámos impedidos de ler uma entrevista ao dito cujo. Quem sabe, até seriam textos importantes para perceber a sua curiosa personalidade. Para um historiador, está mal. Desde essa dia que me questiono: e o que é que teria acontecido se lhe tivessem chamado A morena do regime? Ou, por exemplo… A lolita do cavaquismo? ou O marialvas da social democracia? ou O larilas do frente-a-frente? ou A abelha maia da análise política nacional?
Só faltava, agora, alguém ter a ousadia de chamar-lhe o Peido-Mestre da Nossa Democracia…
Sinceramente.
Sinceramente, mesmo muito sinceramente, eu acho que o Pacheco Pereira é só a Patuschka.
A Tradutora da Ferreira Leite.
z, o vácuo não é o nada. O vácuo ainda é espaço. O nada nada é.
As opiniões são como o olho do cú cada um tem as suas. As tuas são como as do JPP, ou seja, uma merda!
“z, o vácuo não é o nada. O vácuo ainda é espaço. O nada nada é.” Uau, que explicação tão científica!
Errata, cu em vez de cú!
Amigo tra.quinas, houve também quem lhe chamasse, com muita propriedade, pavão de monco caído…
FBento, de facto, é uma definição certeira do personagem. Parece faltar sempre alguma serenidade à exuberância que por vezes ostenta.
Valente, Valupi. Adorei.
Quanto ao site do Sol, de luxo, o Pacheco até teria razão se fosse consequente, fazendo um apelo às acompanhantes de luxo para nele colaborarem…