A década encardida

Em 2004, pessoas ligadas ao CDS, PSD, Judiciária e imprensa juntaram-se secretamente para lançar o caso “Freeport” em cima das eleições de 2005. Em 2009, agentes da Justiça operaram ilicitamente para espiar um primeiro-ministro em funções, tendo procurado levá-lo a tribunal com uma acusação infundada nos meses que antecederam as eleições. Também nesse ano, mas tendo começado a seguir ao Verão de 2008, o caso “Freeport” regressou em modo à outrance. Ainda nesse ano, a semanas das eleições, pessoas ligadas à Presidência da República e à imprensa conspiraram para lançar uma escabrosa campanha de calúnias e difamação que permanece como o maior escândalo de sempre a envolver a Casa Civil e o estatuto de Presidente da República. No final de 2014, coincidindo com o lançamento institucional e solene da nova liderança no PS, agentes da Justiça, em conluio com órgãos de comunicação social, organizaram um acontecimento que condiciona gravemente, e imprevisivelmente, a acção política do PS num ano duplamente eleitoral. Estas vão ser as quartas legislativas seguidas, pois em 2011 continuou a fazer-se render os casos anteriores, onde a direita aposta tudo na judicialização da política – como ontem o primeiro-ministro demonstrou no seu melhor estilo.

Entretanto, a “Operação Marquês” permite envolver um número indefinido de actuais e antigos quadros partidários socialistas, chegando para o efeito que tenham desempenhado funções governativas entre 2005 e 2011. Esse envolvimento ficará efectivo mesmo sem que algum deles seja constituído arguido, basta que se seja chamado a prestar declarações adentro do caso para a indústria da calúnia estar servida de material fresco. Mas não só. Correm mais dois processos na Justiça que poderão, a qualquer momento, aparecer como armas caluniosas e atingir quem se quiser abater: a investigação sobre as PPP e a investigação sobre os gastos com cartões de crédito dos membros dos Governos socialistas. À luz do padrão nos casos “Freeport”, “Face Oculta” e “Operação Marquês”, o que tiver utilidade caluniosa e golpista irá ser fonte de manchetes e será utilizado por esta direita. Figuras como Passos Coelho, Miguel Relvas, Aguiar-Branco, Luís Montenegro e Marco António Costa, para dar exemplos ao correr do teclado, ufanam-se de serem exímios nesta decadência a que chamam “fazer política”.

A tese de que “a impunidade acabou” consiste, literalmente, em declarar que Pinto Monteiro e Noronha do Nascimento, entre outros responsáveis superiores na Justiça, protegeram Sócrates e demais bandidos nos casos em que havia indícios suficientes para os acusarem de crimes variados. Temos uma ministra da Justiça que o diz de boca cheia para a posteridade, e uma mole de comentadores e jornalistas que enchem o espaço público com o mesmo veneno. A nova procuradora-geral da República, imune à corrupção socialista, aí está a provar que era possível prender Sócrates. Bastava ter vontade para tal, tantas as pontas por onde pegar; assim corre a narrativa do fim da impunidade. O que este discurso revela, para além da cultura do ódio a que se reduziu a direita desde 2008, é uma predisposição simétrica à das calúnias para cometer violações ao Estado de direito sancionadas pela lógica do “eles fazem pior”. Há muitos estudos, há muitos anos, do foro psicológico e cognitivo sobre os mecanismos em acção nesta frequente hipocrisia que acomete tão mais frequentemente quanto os visados se projectam como pertencendo a uma “raça de homens que paga impostos” e que os restantes (homens, quiçá igualmente mulheres e crianças), para os poderem imitar na exemplaridade moral, teriam que arranjar maneira de nascer duas vezes.

A decadência da direita, todavia, não se explica sem a decadência da esquerda. Os esquerdistas puros e verdadeiros que assistem às chamas que varrem a cidade, felizes da vida ao imaginarem os lindos mamarrachos que lá irão construir quando chegar a sua vez – e ela vai chegar, está escrito – sorriem, uns, aplaudem, outros, e juntam-se à destruição, os restantes. A imbecilidade não perde uma oportunidade para mostrar que aguenta bem sem estar no poder, não aguentaria era o desmame da alucinação.

49 thoughts on “A década encardida”

  1. deixa la ver se percebi, a esquerda pura e verdadeira depois de ver tratadas abaixo de cão pelos sucessivos governos da esquerda realista (?) todas as bandeiras da esquerda, o que podem alguns argumentar será até a razão principal para as chamas varrerem a cidade da forma q, esses, que alertaram, que chamaram a atenção para os problemas que se adivinhavam, esses é que são os alucinados?

  2. quem me dera poder lavar a década com sabão clarim, metê-la a corar ao sol e estendê-la até ficar sequinha. depois engomava-a e abria-lhe as janelas mantendo a porta sempre aberta para assegurar-lhe a boa corrente do ar. ai que fantasia de dezena a minha! :-)

  3. pois, não sei, acho isso tudo muito confuso.
    mas quê, o mundo neste inicio de seculo está mais socialmente e economicamente justo?
    e portugal?

  4. é um aparte mas, tens de encontrar referências objectivas para a comparação. Acho que podemos começar pelo período anterior ao 25 de Abril e o posterior. Qual deles preferes? Depois, podemos olhar para o Mundo. Dá lá um exemplo de um país governado à esquerda que aches dever ser imitado.

    Se nada disto para ti fizer sentido, estás a falar do quê?

  5. ai que riso! também pode acontecer o crime estar mesmo à vista de todos e não ser punido por falta de provas que não estejam proibidas. :-)

  6. faz, claro que sim. estive para fazer a ressalva mas depois pareceu-me estúpido. devia tê-la feito.
    é verdade agora portugal é mais democratico que nesse tempo. mas, e que grande mas, o nível de exigência relativamente ao que se pode ou não designar por democracia também baixou um bocado desde esse tempo, ou não?
    porque na minha opinião achar que não é que não é realista, e isso pode ser fatal para a tal esquerda que o pretende ser.

  7. só para evitar mal entendidos, faço já a ressalva que acho dificil haver democracia e liberdade civica e politica sem justiça económica, ou pelo menos sem mais do que a existente por estes dias.
    a como é que está o ratio? ainda é que um rico tem 522 vezes mais rendimento anual que um pobre?

  8. ah e soluções assim à mão não tenho.
    mas também eu sou daqueles que tem que encher o cérebro com quais os impostos que tem ou não que pagar, contribuições obrigatórias, opcionais e etc. tira-me muito tempo, de certeza que compreendes. mas há por aí uns pensadores, e até alguns de esquerda, se calhar era tempo de experimentarmos algumas das coisas que sugerem.

  9. é um aparte mas, pareces-me um bocado baralhado. Que a democracia é um sistema de distribuição do poder que tem falhas, ou que sempre as terá para alguém, não merece discussão, por ser óbvio. A questão a que aludi, e à qual começaste por reagir, foi à alucinação dos que são coniventes com uma direita decadente porque apenas se interessam em continuar ofuscados com o fim do capitalismo.
    __

    Abraham Chévre au Lait, com quem falas e do que falas?

  10. estar baralhado nestes tempos de incerteza é bom ou mau? nem sei. sei que não sou (ainda) dos quanto pior, melhor. serei optimista?
    por exemplo, não quis ser conivente com nada mas protestei contra o PEC4. olha, pelas mesmas razões que protesto contra esta política de austeridade. provavelmente terá sido o sentimento de esse repudio a essa politica, ou coisa semelhante, que levou este gangue ao poder.
    também podemos discutir o que isso tem de trágico na perspectiva shakespeariana de se provocar precisamente o que se quer evitar, mas acho mesmo que não reflectir no papel que desempenhou nesta história é que pode ter contornos trágicos para a esquerda realista.
    o fim do capitalismo. invoco o paradoxo do Barco de Teseu: a partir de quantas correcções e reformas no capitalismo é que deixa de poder chamá-lo de capitalismo, na tua opinião?
    ou então deixa pra lá. concordo com a generalidade do que diz o post, aquele ultimo parágrafo é que faz comichão.

  11. é um aparte mas, qual é a tua utopia? Ou idade de ouro? Enfim, quando te queixas, a quem te queixas?

    Que eu saiba, existem humanos há uns 200 ou 300 mil anos, fora o resto numa história de milhões de anos de humanização. Ainda há umas décadas, nos países mais poderosos económica, científica e militarmente, com as mais pujantes cidades e instituições cívicas, as atrocidades contra o que agora consideramos a dignidade e a justiça eram a normalidade. Preferias viver numa qualquer outra época histórica? Qual? Onde? Como?

    Os tempos foram sempre de incerteza. E serão enquanto forem tempo. Pode é haver quem não se aperceba ou dessa lucidez queira fugir.

  12. … haverá sempre quem queira incendiar a cidade para a poder purificar. outros ficarão atrás da moita, à espera de tomar a cidade em cinzas. os heróis, bem, esses morrem sempre calcinados no meio da ágora.

  13. sinceramente que não perceboas tuas perguntas, e com isso tudo das atrocidades e injustiças ocorridas há décadas nas civilizações de ponta a unica coisa que me ocorre é: é este gajo que pretende que eu me indigne com o tratamento dado a sócrates, é?
    é que eu até me sinto indignado mas se calhar devia pôr as coisas em perspectiva. omessa, até foi um governo que o homem chefiava que aprovou esta lei! e um governo de esquerda, dizem!
    naquele dia (dias?) deviam estar ofuscados pela alucinação da lucidez do fim do capitalismo, ou assim.

  14. Valupi: «a outrance»

    É «à», lá como cá. O resto está bem. Muito bem mesmo.

    «a investigação sobre os gastos com cartões de crédito dos membros dos Governos socialistas»

    Aí está, para mim, entre inúmeras outras malfeitorias, o mais extraordinário dos símbolos do estado a que isto chegou. Nem por sombras o crime ou irregularidade mais grave, mas uma das anedotas mais eloquentes do que se passa nesta Nabolândia de banditismo judicial à solta e de ministros semi-analfabetos a meterem os pés pelas mãos, sob as cortinas de fumo das invasões pedófilas iminentes de sucesso garantido, sem a mínima chamada à responsabilidade por quem quer que seja, onde praticamente toda a gente já se habituou a tudo.

    Mas alguém já pensou bem nisto? Um sindicato (ou grémio, ou corporação, ou gangue, ou o que lhe quiserem chamar) de magistrados a usar os seus poderes para seleccionar vigilâncias a cartões de crédito de políticos de que não gostam, e em seguida, todos ufanos, a enviar para os mais execráveis tablóides as listas de restaurantes caros que eles, os malvados políticos — que não os incorruptíveis magistrados — frequentam, e sem que isto provoque o mínimo processo (disciplinar ou pior), ou escândalo, ou desaprovação, ou sequer estranheza por parte do público?!

  15. “É um momento desesperado face às acusações de incumprimento de obrigações contributivas (…) Esta forma de fazer política diz tudo sobre quem a utiliza, ao atacar um adversário político que está na prisão a defender-se de imputações injustas, Passos não se limita a confirmar que não é um cidadão perfeito, antes revela o carácter dele e o quanto está próximo da miséria moral.”

  16. é um aparte mas, se achas que pretendo alguma coisa a teu respeito o melhor será largares o vinho. No texto onde vieste comentar falo de factos. Esses factos, independentemente das opções ideológicas e partidárias de cada um, descrevem uma situação de decadência onde a baixa política reina na direita por cumplicidade da esquerda. Resta só chamar a tua atenção para o facto principal: a baixa política prejudica a comunidade, só serve aos trastes que a praticam.

    Tens alguma coisa a dizer a respeito deste assunto?
    __
    Gungunhana Meirelles, agradeço a correcção.

  17. sim, val, já sei que te estás a cagar pra quem te lê. mas juro que pensava que ja tinhas percebido que o meu ponto é que a tal cumplicidade com a decadência e a baixa politica da direita se calhar não veio da esquerda pura e verdadeira como lhe chamas mas sim, como no ultima resposta/comentário escreves e muito bem, “da esquerda”.
    onde imagino que incluis o ps, ou já nem isso?

  18. ah, e concordo absolutamente com isto: a baixa política prejudica a comunidade, só serve aos trastes que a praticam.

  19. é um aparte mas, a cumplicidade do PS com a baixa política também acontece. Aconteceu com Seguro, acontece com Ana Gomes, virá a acontecer com outro qualquer. Mas nunca aconteceu, que eu saiba, com o PS que assumiu responsabilidades governativas. Porque esse PS é do centro, ou do socialismo democrático, ou da social-democracia. Ou seja, é um PS que assume a imperfeição, e as inevitáveis impurezas, de governar.

    Só para quem não quer governar é que é possível continuar fechado numa abstracção onde nunca se sujam as mãos nem se cometem erros. Esta é a atitude da esquerda portuguesa, actualmente representada no Parlamento pelo PCP e pelo BE.

  20. Ó putz, dá-lhe com o martelo, pá, assim livras os gajos do vício e prestas um favor à humanidade. IGNATEZES e derivativos, são como as pulgas e fantasmas perdidos, aparecem com a capa que lhes dá jeito.

  21. quando escreves “… que assume a imperfeição, e as inevitáveis impurezas, de governar” só me fazes lembrar o outro do “não sou um cidadão perfeito”.
    o ps já não representa a esquerda portuguesa no parlamento, dizes tu?
    pois, se calhar não. mas é suposto?
    é que parecem pretender representá-la nas campanhas eleitorais, pelo que imagino que deve ter existido aí qualquer relação escondida entre o ps e a esquerda em Portugal, algures no tempo.
    fico com a sensação que dás como certo que um partido para defender, na Europa em 2015, políticas económicas de matriz social democrata, precisa de ter a palavra radical no nome.

  22. é um aparte mas, começo a desconfiar que tens algum assunto para discutir com alguém do PS e vieste bater à porta errada. Não sou militante nem simpatizante do PS. Não votei PS em 2005, nem em 2009. Votei em 2011 por razões de cariz patriótico. Mas não irei votar PS em 2015.

    Quanto ao que seja a esquerda, o meu conselho é: arranja uma ligação à Internet e começa a estudar o assunto. Vais ter com que te entreter para os próximos meses, anos ou séculos.

  23. esclarecido.
    de facto incorria nessa assumpção errada vejo-o agora de seres militante ou apoiante do PS.
    o ultimo parágrafo assume assim outros contornos, mais compreensíveis para mim, e as minhas reservas passam a ser apenas de forma: se é como dizes, não há razões para adjectivares a esquerda a que te referes de “pura e verdadeira”.
    que não as de estilo, claro.

  24. é um aparte mas, utilizo essa fórmula para descrever aqueles que consideram o PS como um partido de direita. Se para eles o socialismo não radical nem estalinista é de direita, o que é lógico quando se defende uma posição sectária, decorre que esses se consideram os únicos representantes do que seja a esquerda – uma esquerda pura e verdadeira, portanto.

    Isto é simples.

  25. certo, e não te quero chatear mais com isto porque começa a tornar-se um bocado estúpido. mas não posso deixar passar que tu próprio achas que o ps não representa a esquerda no parlamento. que tu próprio consideras” o socialismo não radical nem estalinista” como algo que não é de esquerda.
    e que para além de isto ser simples, implica logicamente que aqueles sectários que “se consideram os únicos representantes do que seja a esquerda” têm razão.
    mas para isto parecer menos a inquisição espanhola, digo que na minha opinião “o ps” é de esquerda.
    o que isso significa hoje em dia, como bem me avisaste, obriga a uma reflexão profunda. mas também algo urgente (e como já te disse atrás, por imposições governamentais e outras que tais não posso de momento disponibilizar-me para ajudar a fazer).
    foi boa conversa, mas já me sinto aqui a encher chouriços.
    fica bem.

  26. é um aparte mas, estás a disparar mais depressa do que a tua própria sombra. Onde foi, nesta conversa, discutida a minha, ou sequer a tua, concepção do que seja a esquerda? A forma como colocas a questão não permite sequer começar a falar do assunto. Todavia, para mim o PS é de esquerda no sentido em que privilegia o papel do Estado na coordenação da vida económica e social, ao mesmo tempo que é liberal, no sentido em que defende e promove as liberdades individuais.

    Como é óbvio, a complexidade ideológica de um partido como o PS, cuja vocação é governar em democracia – portanto, tendo de ir a votos e convencer a maioria do eleitorado – não se explicita recorrendo ao simplismo da divisão esquerda-direita, muito menos ao seu extremo maniqueísta. É por isso que fórmulas como “socialismo democrático” ou “social-democracia” dão conta desse espaço entre um extremo e outro cujo nome mais fácil é “centro”. No caso do PS, centro-esquerda.

  27. orra beie, eue tenho, mase num boue pustá-la aquie. Sendo tue uma peicheira pur isxelencia, num prazizas que te deiem uma, tá beie? oqueie.

  28. assim de repente posso inventar uma, Maria. Mete a cozer camarões. depois coa a água e separa. descasca-os e guarda o miolo. as cascas junta-as à água e passa muito bem até ficar creme. à parte coze alho francês e depois de tenro coloca-o junto do creme das cascas e passa tudo novamente. tempera a gosto com sal, alho em pó e muita salsinha picada. rega com azeite e mistura o miolo do camarão e lombinhos de peixe cozidos a gosto. tenho a certeza que fica delícia. :-)

  29. Ó maria e olinda, é só vazar o pacotinho num litro de água e ferver em 7 minutos e prontes.
    E nesses 7 minutos ainda dá para uma rapidinha!

  30. Olinda!! Lembrei-me agora que nunca te agradeci a receita. Obrigada. e esta é nova, nunca fiz sopa de peixe com uns camarõezinhos que nos dias que correm são um luxozito. Coisas para taxistas como o naumbênada.

  31. ó Maria, eu bejo tudo e muito beie, inté bejo a tua ignorancia e falta de jeito pra encobrir a tua dor de cotovelo que na tua linguagem dirias de outra maneira, num é? hum?oqueie.

  32. dor de cotovelo de quê? oh pah, a mim dói me tudo acredita. aliás tanto se me dá que não acredites, és mesmo palerma :P

  33. baie xamare pá aos teus cunfrades, tá beie? eue num me doue cum gentuça. baie catar piolhos nos pés, sua vadalhóca. palerma éze tu, baie bendere o peiche pró bulhaõe, tá beie? aposto qués pequena e marreca e tens juanetes nessas batatas a que xamas péz. oqueie.cala-te sua cumuna xuxialista operária.

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