Viver e morrer no inferno

As imagens da morte de Khadafi – um linchamento com execução, captadas com telemóveis e sem qualquer distanciamento da agitação a decorrer – dão-nos a ver um homem desorientado, apavorado, destituído de qualquer dignidade ou possibilidade de redenção. Um pobre diabo que viveu a maior parte da sua vida como um faustoso demónio.

26 thoughts on “Viver e morrer no inferno”

  1. Este teu post deixa-me de boca aberta, Valupi, não era coisa que esperasse da tua pena.
    Que o Kadhafi não interessava a ninguém é ponto em que pouca gente discordará. Mas “explicar” o seu comportamento no momento da morte com o modo como viveu a vida é no mínimo “desadequado”, para não dizer quase obsceno.
    Se fosses vivo nos anos 40 do século passado e testemunhasses os momentos finais dos gaseados de Auschwitz, acaso te passaria pela cabeça “explicar” o seu desespero final com as malfeitorias ou benfeitorias das suas vidas prestes a acabar? Acaso terá havido alguma possibilidade de dignidade nos gritos de milhões de gaseados ou de milhares de torturados pela Gestapo, vomitando tripas e borrando-se pelas pernas abaixo? Acaso os gritos deles nos dizem alguma coisa sobre aquilo que foram em vida?
    E que nos diz o modo como o Kadhafi morreu sobre a pandilha Mad Max que o matou? E dos que teoricamente os “controlam”, os chefes da nova “democracia” líbia, com as suas mentiras justificativas, descarada e obscenamente falsas? E que dizer do facto de eles terem a perfeita noção de que, apesar de toda a gente ter visto como o homem morreu e saber que as justificações são falsas, isso não lhes trará qualquer problema, desde que, obviamente, não se lembrem um dia de mijar fora do penico dos interesses das civilizadas máfias humanitárias ocidentais?
    Tem de haver uma diferença entre nós e os Kadhafis deste mundo, incluindo os energúmenos que agora pensam que mandam na Líbia, muitos dos quais verão, mais cedo do que tarde, que não mandam a ponta de um chavelho e terão sorte igual à de Kadhafi às mãos dos sócios actuais. E essa diferença é que, para nós, aquilo que todos vimos acontecer ao Kadhafi não pode senão provocar indignação e repulsa. E também vergonha, vergonha de pertencer a uma “civilização” que escarra nos seus próprios princípios sem hesitação nem pudor, enquanto os invoca batendo furiosamente com a mão no peito!

  2. Que língua fácil e viperina que tu tens, Valupi. Ou, trocado em miúdos, precisamente: é a língua dos sionistas, titereiros de há muitos anos da super-tropa terrorista da Nato com falta de tomates para enfrentar os saladinos no terreno. Não é só a liberdadede que esses assassinos autorizados por parlamentos democráticos estão a roubar pela força à Líbia, é a água, o petróleo, as 150 toneladas de ouro e as ideias de Gadafi para um continete africano verdadeiramente livre do colonialismo.

    Espero poder seguir com interesse durante mais alguns anos o progresso com atamancamentos, revisões e alterações da tua personalidade política só para ver quantos anos vais conseguir debitar sentimentos democráticos como os deste post sem lavares a cara.

  3. Desculpa, Camacho, mas continuas mal informado, não apenas sobre a Líbia e o Gadafi, mas também quando sais da órbita dessa discussão para ensinares moral de pé coxinho ao Valupi. Ok, desta vez escreveste 4 linhas sensatas.

    Saudações marxianas, ou anti isso, ou qualquer coisa desse género.

  4. Tenho pelo Valupi, mesmo com discordâncias pontuais, o respeito que tu não tens por ti próprio. E nisso te acompanho, pois verifico que não tens emenda: chihuahua foste, és e serás, a bexiga maior que tu tapa-te a vista do espelho e por causa disso, como dizem os brasileiros, não se enxergas mesmo, né?

  5. Bom, se tens diferenças pontuais com o Valupi, já enxergo, mas primeiro tenho que mijar porque não vejo bem. Não sei é se o homem corresponderá com o mesmo pau de marmeleiro de espancar fadas com respeitinho. Talvez esta tua confissão do fosso pouco profundo entre os dois te livre de ele te mandar à fava com alusões a brióis.

    Agora que andas muito mal informadito em relação ao que realmente se passa na Líbia, e por extensão a todas as outras coisas onde andou metida a pata do imperialismo intriguista, fardado ou à paisana, nos últimos cem anos, disso não tenho a menor dúvida.

    Saudações dum leitor de jornais que são maus quando dizem mal do Sócrates e bons quando dizem mal do Gadafi.

  6. Val, não deveria ser muito diverso o destino dos Kadhafi ocidentais que se orientaram com os dinheiros públicos antes de conduzirem os seus países a um estouro monumental. Às mãos da turba todos os kadhafi são iguais.

  7. Aquela morte e aquela vida (por esta ordem) de Kadafhi são o exemplo acabado da civilização que ainda somos. O aplauso dos “bons” é a prova esmagadora e aterradora.
    Os “bons”, nestas guerras de vergonhas, são os kadaphis de “colarinho branco”. Sobressaem mais num pescoço moreno.
    Não havia maneira de forçar Saddam sem destruir o Iraque. Como agora com a Libia e Kadaphi.
    Não importam países e milhões de vidas destroçados. Desde que sejam os países outros e pessoas outras. Não é, Ana Gomes?
    Dizem os “bons” , como nunca foi dito na História Humana, que a vida de cada pessoa é única, irrepetivel e insubstituivel. A minha, a dos meus filhos, a dos meus amigos. Ou, simplesmente, a vida dos que sentem e pensam como eu…
    A dos outros pode ser descartada em hecatombes nos iraques dos saddams e nas libias de Kadaphi.
    Os “bons” é que é!

  8. pois eu acabei de ter um pensamento semelhante ao do Val quando escrevi “é por tudo o que em nós corre que se vive e que se morre”. por cá, os que já viveram muito tempo, dizem desses, como ele, que foram feitos com a pila do diabo. e deus também está na pila do diabo – mas desta vez, como em muitas, o diabo venceu.

  9. Quanto tempo demora uma bala disparada a menos de 10m a percorrer o seu trajecto?

    Eu também não tenho a certeza, mas parece-me que é pouco tempo para um Julgamento.

    Talvez fosse bom exemplo para trazer para Portugal. Rápido, eficaz, suprime possibilidade de recurso e parece-me ter um forte efeito dissuasor.

    Falo da rapidez da Justiça, claro…

    O caminho não é o linchamento. Onde está a Justiça, a decência e o respeito pelos Direitos Humanos?

    É óbvio que não apreciava Khadafi nem a sua actuação.
    Há quem lhe chame cão. Estou-me bem nas tintas.
    Mas nem a um cão eu concordaria com tais barbaridades.

    Os Direitos Humanos são como as ruas de sentido único. Só vão numa direcção e tem de se ter a sorte de entrar pelo lado certo…

    Cumprimentos.

  10. Este diabo não escapou ao destino taliónico. Outros, na situação dele, deram um tiro na cabeça. Tentou safar o corpito até à última ou decidiu morrer em combate, para dar ao mundo a ideia delirante de que tinha uma causa, quando a única coisa que tinha era petróleo? Pouco interessa. Não tenho pena nenhuma do diabo morto. Os familiares das suas vítimas vão dormir mais descansados. Os líbios vão poder imaginar um destino diferente do livro verde do ditador. A fortuna gigantesca que amassou vai servir para reconstruir o país e talvez o petróleo possa futuramente beneficiar a maioria do povo. Nunca se sabe, pois não. Mas o nome de Gaddafi já não tapa o horizonte nem tira o sono às criancinhas.

  11. Infelizmente, para mim,o Val está a descarrilar.
    Estes bitaites básicos têm o condão de subverter a credibilidade dos que, como eu, defendem o Sócras do linchamento que a oligarquia nacional (?), através dos seus servos (e outros idiotas), pretende levar a cabo.
    E já agora, como tanto insistem na televisão, mostrando imagens “comprometedoras”,o Sócrates torna-se cúmplice do monstro, não é?
    Apesar de achar que o stôr KALIMATA-MOS pertence à equipa do REX, não posso deixar de concordar com o prof ressabiado quando fala da limitada (e orientada) informação a que temos acesso. Apenas lamento que a sua assertividade entre em pausa no que toca ao inimigo figadal, como ilustra o último parágrafo do post das 10:10.
    Outra coisa: Não percebo a alusão ao holocausto, com tanta desgraça atual ainda se fala nisso? A menos que seja uma pista sobre quem está envolvido no saque.
    Dá jeitinho aos sionistas, não é?
    Quando tiver tempo, deixo um, ou dois links com artigos sobre a Líbia que talvez ajudem a moderar essa celebração boçal que domina a opinião pública.

  12. Joaquim Camacho, tu viste uma “explicação” onde está uma descrição. Se releres, constatarás que começo por apontar o crime: linchamento e execução. Não se pode dizer que tenha sido um serviço à Civilização, nem eu o escrevi, muito menos o pensei. As restantes extrapolações que retiras devem-se à tua interpretação inicial, não ao conteúdo de um texto que, e precisamente, se coloca do lado de todas as vítimas da barbárie, sejam inocentes ou monstruosamente culpadas.
    __

    Vieira, concordo contigo: estou a descarrilar. E não pretendo parar.

  13. dasss…………, até eu que acho que sou um gajo tolerante e paciente começo a perguntar-me se este KALIMERDAS não terá mesmo nada para dizer?

    As imagens são chocantes e preocupantes…………..!

  14. “…dão-nos a ver um homem desorientado, apavorado, destituído de qualquer dignidade ou possibilidade de redenção.”

    tás a ficar parecido com o poeta da treta, querias o quê? se lhe tivessem emprestado uma pistola talvez se tivesse suicidado ou aviado mais alguns e lá terias de mudar o epitáfio.

  15. Val, cenas daquelas não podem suscitar apenas uma “descrição”. O sentimento prevalecente, se sentimos necessidade de falar nelas, só pode ser o de uma fortíssima indignação. Ora o que ressalta do teu texto é a “descrição” do Kadhafi supliciado, e cito, como “um homem desorientado, apavorado, destituído de qualquer dignidade ou possibilidade de redenção. Um pobre diabo que viveu a maior parte da sua vida como um faustoso demónio”.
    Eu sei que começaste por apontar “um linchamento com execução”, mas não sinto nessas palavras uma condenação vigorosa, e tudo o que vem depois, ainda que escapando à tua vontade consciente, soa a “explicação”. Numa situação daquelas, até um santo se borrava todo, nem o Cristo terá porventura escapado a uma involuntária libertação de fluidos. Onde está aí a dignidade, a possibilidade de redenção?
    De uma coisa não tenho dúvidas: os seus algozes, tanto materiais como morais, não são apenas gente como ele “destituída de qualquer dignidade”, são muito piores. Têm todos os defeitos do Kadhafi e nenhuma das qualidades, que também as tinha, e a principal foi ter conseguido durante décadas gozar o império e os subimperiozinhos, mostrando-lhes que o seu poder podia pontualmente ser limitado e obrigando os seus dirigentes a patéticas humilhações públicas de beija-mão. Foi isso que os imperiozinhos nunca lhe perdoaram, tendo aproveitado a janela de oportunidade do levantamento de Benghazi para oportunisticamente surfar a onda e dar o contributo decisivo sem o qual ela não teria chegado à praia.

  16. Joaquim Camacho, não sou responsável pelas interpretações que se façam do que escrevo, nem sinto qualquer obrigação para corresponder à expectativa de alguém que, na sua liberdade, me queira honrar com a sua disponibilidade para ler estes exercícios irrelevantes, típicos das tertúlias de café.

    Assim, registo que te estás a agarrar à tua interpretação inicial, a qual pretendes manter apesar das evidências. As evidências não são as de haja qualquer “explicação”, como escreveste no início, antes as de que há uma descrição. Só que essa descrição está ao serviço de uma ideia. A ideia de que na morte de Khadafi se pode ver um aspecto da condição humana que remete para a miséria. Khadafi foi um chefe político que provocou miséria na sua terra e na terra de outros, e morre da forma mais miserável possível, como um animal.

    Realçar estes aspectos numa reflexão que pretendia ir para além do episódio da sua morte era a simples intenção do texto.

  17. Vieira, a referência aos “gaseados de Auschwitz” não é bem a mesma coisa que uma alusão ao Holocausto. Que eu saiba, nas câmaras de gás nazis não morreram apenas judeus, e é a eles que exclusivamente se refere a palavra Holocausto. A minha intenção foi estabelecer um paralelo, propositadamente exagerado, com uma situação qualitativamente semelhante: a de vítimas de crimes vergonhosos roubadas de qualquer resquício de dignidade nos seus momentos finais.
    Aproveito para te dizer que considero a imensa maioria dos judeus israelitas, que patrocinam com o seu voto as políticas de um Netanyahu, um Ariel Sharon, um Avigdor Lieberman e mais o resto da pandilha nazionista, indignos de falar em Holocausto. Vítimas que foram os seus antepassados de crimes inomináveis, e autoconsiderados como povo eleito, deviam eleger como missão de vida a simpatia e solidariedade para com todas as vítimas. Em vez disso, assumiram com alegria e empenho o papel de algozes de todo um povo, o palestiniano, que roubam e desprezam com um fervor racista de fazer inveja ao Adolfo. E podes crer que não é só aos palestinianos que eles dedicam o seu desprezo. Não vejo, aliás, diferença de monta entre os conceitos de “povo eleito” e “raça superior ariana”, seja lá o que for essa porra! Faz hoje mais sentido falar em Nakbah, devido à sua actualidade, do que em Holocausto.
    Nem todos os israelitas estão sintonizados, porém, na frequência geral, e cito os nomes de alguns que me merecem um enorme respeito: Tanya Reinhart, Ilan Pappé, Uri Avnery e muitos outros. Do americano Justin Raimondo, que tem um site antiguerra onde escrevem alguns israelitas feitos da massa dos que atrás refiro, aconselho-te a leitura do seguinte link, conselho que alargo ao Valupi:

    https://aspirinab.com/valupi/viver-e-morrer-no-inferno/#comment-113935

  18. Val, dá-me prazer ler os teus “exercícios irrelevantes”, e por isso aqui venho, porque eles não são tão irrelevantes como isso. Poderás chamar-lhes “ligeiros”, por força do meio que lhes serve de suporte, mas “auto-irrelevá-los” quase parece falsa modéstia, não leves a mal.
    Encontro muitas vezes nos teus textos, e nos de outros teus companheiros de blogue, a formalização escrita do que me passa pela carola, mas com uma capacidade de síntese que geralmente a mim me escapa (tenho uma certa tendência para enrolar) e um apuro de estilo que se transforma em bálsamo. Daí a minha “disponibilidade” para vos visitar, que mais do que isso é quase sempre, repito, um prazer.
    Quanto ao que nos conduziu a esta divergência, mais não podemos fazer do que concordar em discordar.

  19. “…não sou responsável pelas interpretações que se façam do que escrevo…”

    cá me queria parecer que somos todos burros ou porcos que não digerem as tuas perlas semânticas.

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