Público, acorda, o Relvas já não é ministro!

O Público não respondeu a Passos. Deixou, sem largar um ai, que o presidente do PSD, ex-primeiro-ministro e chefe da oposição carimbasse o jornal como antidemocrático. Isto em cima do 25 de Abril. E fez mais: fez censura. As declarações de Passos onde atacava o jornal não foram noticiadas – se o foram, peço que alguém me corrija – o jornal privou os seus leitores de uma muito relevante intervenção de um importantíssimo político português a respeito de um importantíssimo jornal português. Se ainda estivermos no território da “imprensa de referência”, ou tão-só no da mera imprensa, o mundo surge como um local cada vez mais estranho. Que se passará com aquela gente, dos directores aos accionistas, passando pelos jornalistas? Há aqui uma coerência, contudo. É que a decisão de publicar um editorial onde se manda calar Sócrates é igualmente estrambólica, pelo que tudo acaba por fazer sentido. O sentido da decadência.

Quando nesse editorial se alude aos “fiéis seguidores” de Sócrates, ainda por cima para os reduzir a uma projecção deturpada e raivosa da pessoa que escreveu o texto, de quem se está a falar? Quem é que defende Sócrates no espaço público? Serão os amigos que o visitaram na cadeia e durante a prisão domiciliária? Será o movimento cívico “José Sócrates, sempre”, algo que qualquer caloiro de um curso de Relações Públicas sabe não passar de mais lenha para o auto-de-fé em curso? É que não se vê mais ninguém de ninguém. Por esta lógica, para o Público, Soares será um fiel seguidor de Sócrates. E ainda Guterres, o qual foi duas vezes a Évora e uma vez à residência-prisão, pelo menos. Corremos o risco, calhando ser ele o próximo secretário-geral da ONU, de aterrarem capacetes azuis na Portela para virem proteger o seu ídolo.

E quem serão os “arqui-inimigos” de Sócrates, a que o jornal igualmente alude? Esta passagem é a mais grave dentro do disparate geral da peça. É grave porque, e mais uma vez, não se nomeiam responsáveis. Porém, ao se qualificarem como inimigos, está-se concomitantemente a descrever uma situação em que há abusos. Os inimigos não são adversários. Os adversários obedecem a um conjunto mínimo de regras. Os inimigos apenas obedecem à pulsão para destruir o seu alvo. Logo, de quem se está a falar? De partidos? De órgãos de comunicação social? De agentes de Justiça, incluindo magistrados? De tudo um pouco, fora o resto? De acordo com o Público, os inimigos de Sócrates aproveitam as suas declarações para o atacarem. Esta é uma pista, mas a qual não chega para obter uma conclusão clara, inquestionável. Este hábito de se fazer jornalismo político através de expressões vagas ou cifradas é, de facto, um sintoma de fragilidade democrática. O resultado é uma gosma escarrada num editorial, pela qual ficamos a saber que para essa entidade mediática onde supostamente vigora um qualquer código deontológico da profissão de jornalista é indiferente que Sócrates tenha inimigos. É lá uma coisa dele e ele bem merece todo o mal que lhe fazem, o cabrão. Estado de direito degradado e violado, poderes fácticos impunes e uma questão de regime que se adensa, nada disso interessa ao jornal. O Público não tem uma ideia formada acerca das indecências e crimes que os inimigos de Sócrates têm cometido, e vão continuar a cometer, ao longo dos anos. O Público apenas está interessado em que Sócrates fique caladinho e apareça no tribunal de cabeça baixa para ouvir a sentença.

Miguel Relvas foi o par sem o qual Passos não teria chegado ao topo da cadeia alimentar no PSD. O seu trajecto em comum é um mimo de técnica e de forma. Em 2012, Relvas, então ministro-adjunto e dos Assuntos Parlamentares, fez chantagem sobre a então jornalista do Público Maria José Oliveira por causa das perguntas que esta lhe tinha enviado a respeito das declarações do ministro no Parlamento relativas à sua relação com o espião Jorge Silva Carvalho. Nessa audição na Comissão de Assuntos Constitucionais, Relvas mentiu. Já não me lembro se na ocasião o PSD pediu ao Ministério Público para investigar, posto que mentir numa comissão parlamentar é crime, ou se o laranjal apenas incomoda as autoridades a propósito de socialistas. Seja como for, recordo este episódio para tentar encontrar uma explicação para a atitude obnóxia do Público para com Passos. Vai na volta, andam tão focados no que sai da boca de Sócrates que talvez pensem que o Relvas ainda é ministro.

18 thoughts on “Público, acorda, o Relvas já não é ministro!”

  1. São cagarolas com alma de sipaios, e o cabrão do Sócrates estraga-lhes os ripanços e as digestões, faz-lhes cair o cabelo e amarelece-lhes ainda mais a pele, em resultado da icterícia mental de que sofrem.

    Olha mais um exemplo da falta de vergonha: a TVI anunciou ontem, com pompa e circunstância, que, num qualquer dia do Senhor do próximo mês de Maio (mês de pastorinhos e respectivos borreguinhos, nem de propósito!), os investigadeiros da investigadeira estação, em parceria com o Espesso do Balsemão, disponibilizarão online, para o público interessado, a lista dos entalados da Lusitânia cujos nomes constam nos famigerados Panama Papers.

    Ai que bom, parvalhei eu na minha ingenuidade, essa foi precisamente a sugestão que lhes fez a malta do Wikileaks, ponham tudo cá fora para toda a gente ver quem é quem e quem faz e fez o quê. Mas que parvo que eu sou, como diria a deolinda bacalhoa! Afinal vão divulgar apenas uma parte dos papeles, e o pouco a que teremos direito será todo escortanhado, riscado, criteriosamente expurgado dos nomes dos amigalhaços. Nas imagens que mostraram, aparece um tal “José Manuel XXXXXXXXXXXXXX”, mais uma tal “Margarida YYYYYYYYYYYYYYY” e outros felizardos de que nos sonegam as benditas identidades. Josés Manéis há muitos, Margaridas idem, eu quero é saber quem é o “XXXXXXXXXXXXXX” e a “YYYYYYYYYYYYYYY”.

    “Direito à privacidade”, já estou mesmo a ouvi-los guinchar, mas fica então por saber o que é feito do direito à privacidade dos nomes que os gloriosos investigadeiros já divulgaram, sem esquecer os que nem lá constam e foram divulgados como se constassem, como é o caso do Sócrates.

    Esta gente sem vergonha anuncia com pompa e circunstância, com duas ou três semanas de antecedência, o clímax final da coisa, a derradeira ejaculação cósmica que afogará todos os corruptos da Lusitânia, e afinal a gente olha para aquilo e vê uma catrefa de nomes riscados! Porra, mais vale bater uma punheta!

  2. Num caso atenta contra a liberdade de expressão e no outro pratica a auto-censura. Está explicado o posicionamento politico do Público, entre a matilha do ódio a Sócrates que reune reaccionarios e revolucionarios de esquerda com glamour caídos em desgraça e que tentam refazer a imagem sendo cães de guarda do novo consenso à esquerda, vendo em cada esquina uma ameaça, detestando pessoas livres e apoiando sempre o estado contra o indivíduo (ai que saudades, ai,ai).

    Mas isto é também o caldo cultural de um jornalismo com dono à mistura com o star system politico e suas cumplicidades. São todos estrelas POP.

    Já agora, o sindicato dos jornalistas pediu ao Nexpresso que separasse o trigo do joio
    http://jornalistas.eu/?n=9609#.Vx_3LTdHOgM.twitter

    Como ? Com ou sem gluten?

  3. Joe ainda estou a rir com esta tirada:

    “A credibilidade do jornalismo é fundamental em democracia e não podemos deixar que ela seja minada por suspeitas cuja existência ainda está por provar, nem permitir que toda uma classe fique sob suspeita.”

    Como se fosse preciso os papeis do panama para a dita classe já ter pouca credibilidade…

  4. jpferra, eheheh uma palhaçada.
    Mas vendo bem o script é divertido, os gajos do sindicato são como aqueles feiticeiros das tribos que necessitam de um sacrificio para acalmar o espirito de manitou. Agora vamos ver quem são os escolhidos.

  5. Hum…não acredito, e depois o MP? metia o sindicato todo dentro. ;) e a industria não sobreviveria sem escutas e assassínios de caracter. Tem que ser um bode expiatorio descartavel, para que tudo continue na mesma. Cosmética.

  6. Valupi, por mim eu conto por uma mão as pessoas que se dão ao trabalho de ler a realidade desta maneira.

    O Aspirina B, neste momento, é um blogue momotemático, fora do contexto, e lamentavelmente acho que é uma perda de tempo para os dias de sol que se aproximam.

  7. O amigo do Costa é do Liverpool.
    Diogo Lacerda Machado: “Jamais estive sozinho em todas as reuniões em que participei”

  8. A questão não é saber ” se o laranjal apenas incomoda as autoridades a propósito de socialistas” e sim se as autoridades apenas incomodam os socialistas para propósito do laranjal.

  9. ainda sou do tempo em que as televisões mostravam noite dentro as comissões de inquérito para se confirmar (asseguravam-nos finalmente!) que o sócrates tinha mentido numa qualquer intervenção na assembleia. depois veio o novo governo e num ápice o relvas é apanhado a mentir numa dessas comissões, sobre o nº de encontros que teve com o ex-futuro homem forte das secretas (que o vasco rato, relvas, passos tinham gizado para mandar nos super-serviços secretos ainda antes de se terem lançado ao pote), como ele próprio viria a reconhecer numa outra sessão. depois vieram as comissões de inquério com a participação da miss swaps e aí foi uma orgia de mentiras (até o próprio gaspar lhe chamou mentirosa).

  10. Valupi, saberás tão bem como eu que a leitura de um “objecto” depende das perspectivas por que o observas (preferencialmente para seres capaz de voltares ao ponto de partida e, então, seres capazes de o redefinires sozinho). O que eu deixei subentendido, e mantenho, é que as personagens do teu post fazem parte dessa espécie de passado que torna o teu e o presente dos leitores do Aspirina B fantasmagóricos. Um cenário em que tu (e o file-Passos Coelho é semelhante, não é esta a crítica justa?) parece que vives e onde amiúde te cruzas com os mesmas personagens-sem-tirar-nem-pôr que encontraste em 2005, 2009 ou em 2011 etc. São fantasmas, invisíveis à luz do sol. Se quiseres um conselho, foge daí porque isso não te faz bem.

    Nem a mim, confesso.

  11. RFC, sim, desconfio que a subjectividade leva ao relativismo. Mas peço-te que me ajudes a compreender a tua mensagem, pois ainda não a tenho clara. Estás a sugerir que as personagens encontradas em 2005, 2009 e 2011 (sejam elas quem forem) deixaram de ser as mesmas? Se sim, porquê e em quê? E quais são as consequências prejudiciais a que te referes?

  12. ai! que riso! a imagem de uma brigada de capacetes azuis por cima de colarinhos brancos.:-) e depois o mantra que me sugere o texto: públi co, públi co, existe algum mais leteu do que tu? :-)

  13. Lucas, não te engalfinhes porque não te dou guita mas sempre te digo que assessor se escreve com ss (acho que foste tu que andou por aqui no Aspirina B a cedilhar sem cedilha). Não precisas de.

    Valupi, desculpa o atraso. Eu, tu e ele hoje somos pessoas diferentes. O que eu te disse era que, sendo embora pessoas diferentes, tu continuas a sentar-te à “mesa” como se os teus convidados à mesa fossem sempre os mesmos. Esta imagem ajudar-nos-á, acho. Há uma mesa de jantar, toalha e guardanapos brancos, vinho tinto vintage (colheita de 2005?, é o que há), copos, talheres e pratos. Entradas, azeitonas e peixe ou carne, fatias finas de pão alentejano, cigarros acesos e apagados (e. umas horas depois, serves a sobremesa e os digestivos). Convivas, além de ti: José Sócrates de 2005, fresquinho, Miguel Relvas lui-même e o Pedro Passos Coelho pós-Tecniforma mas sem a Laura. Recusas uma cartada mano a mano que a malta da JSD propõe, sugeres antes falarem longamente de política (do passado, do presente e, se quiseres, do futuro). E, algures em 2016, olhas de cima para a mesa com o olhar enevoado e dirás que amanhã arrumem isto se quiserem! e, no fim, descobres que afinal… estás sozinho.

    Era esta a ideia, objectivando-a um pouco mais.

  14. Acabo de assistir na RTP3 a um debate absolutamente imperdível sobre as off-suores entre Pedro Adão e Silva e uma direitolas que opina no Observador, uma tal de Helena Matos !
    A diretora acha que é “justo” que quem ganhe muito dinheiro possa pôr o dito cujo ao fresco, a render fora de Portugal, e com isso fugir à taxa liberatória, porque sim ! porque quem é rico pode ! e um escravo que ganha 500 euros não pode, porque não, porque é escravo, e os escravos não podem, porque não !
    E arregalava os olhos de espanto de cada vez que perguntava ao Pedro Adão e Silva “mas você não acha que é justo ? (o Messi que ganha 100 000 euros em Espanha ir meter o dinheiro no Panamá para não pagar taxa liberatória em Espanha porque aí pagaria mais) ” e o PAS respondia com toda a calma e a piscar os olhinhos ” não, NÃO ACHO JUSTO!, sabe porquê ? porque ele ganhou o dinheiro em Espanha, por isso é lá que deve pagar os impostos, e o tipo que ganha 500 euros não poder também meter o que lhe sobra no Panamá para pagar menos imposto é uma desigualdade inadmissível” !
    E a gaja ripostava: “Daqui a pouco você está-me a dizer que também é injusto haver salários diferentes “? e o PAS com toda a calma: “não isso, não acho, embora as diferenças entre 100 000 euros e 500 euros sejam também sejam demais, não acha ?”
    E a coisa direitolas completamente fora de si a defender que a gente “bem” deve poder meter a massa nas off-shores e quase à beira de um ataque de nervos …
    Deve haver pouca gente jeitosa na lista, deve …

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