«Na verdade, nenhum destes sistemas de poder deseja a mudança que a lei prevê e talvez só o cidadão se incomode com a omissão de um direito seu. Mas o cidadão deixou de ter voz quando a política se calou. Portanto, silêncio. O governo não regulamenta e assim é que está bem. Todos satisfeitos. Só o Estado de Direito sai a perder, mas é difícil vislumbrar alguém que ainda se preocupe com isso. E no entanto, o que está em causa nesta questão é um princípio político essencial — em democracia, é a política que faz o direito, não é o direito que faz a política.»
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Sugestão do nosso amigo Joe Strummer
Nota
O caluniador profissional pago pelo Público pede que se arranjem novos crimes, assim mesmo à descarada. O deboche é tal que a prosa é obscenamente explícita: “Há quem esteja a esforçar-se por arranjar novos crimes a Sócrates, já que os antigos estão a prescrever.“
Ele sabe quem anda, em esforço, a tentar “arranjar novos crimes a Sócrates”, uma expressão que é todo um programa — e ainda o todo do regime no que à Operação Marquês diz respeito. De facto, tirando a dimensão fiscal (onde Sócrates parece não ter defesa possível), tem de se concluir após a demonstração de Ivo Rosa que o resto foi arranjado e não passa de um arranjinho ou, no caso, num arranjão. Mas, mesmo que haja algum crime de corrupção na origem do dinheiro recebido, algo do qual não existe actualmente prova e que a existir teria de envolver outros ex-governantes, essa eventual realidade não se sobreporia à violência do linchamento em curso a mando dos próprios agentes de Justiça. Querer destruir Sócrates política e publicamente vem do ódio e da inveja, faz parte da antropologia, e transformou-se na obsessão suicida da direita decadente. Querer perverter o Estado de direito para consumar a vingança e obter esse troféu é um estrutural ataque à comunidade.
“Querer destruir Sócrates política e publicamente vem do ódio e da inveja.”
Ainda que essa vontade se mantenha, a coisa há muito ultrapassou a intenção de “destruir Sócrates política e publicamente” para se fixar na obsessão de o destruir até “biologicamente”. Ao inventar novos “crimes” de cada vez que os antigos dão em águas de bacalhau ou se revelam como absolutamente inexistentes, a panelinha mafiosa pretende pura e simplesmente acabar com ele como ser vivo. É ver as últimas “investigações” sobre a remuneração que recebeu durante algum tempo de uma empresa qualquer. Ao tentar por todos os meios impedi-lo de angariar meios de subsistência, querem pura e simplesmente matá-lo à fome, pô-lo a dormir debaixo de uma ponte, obrigá-lo a emigrar para bem longe ou (solução ideal) levá-lo ao suicídio. Estão fodidos, porque o homem não baixa a bola nem dobra a mola e, ainda por cima, sabe escrever, expondo com clareza todos os dados da questão e apontando o dedo sem ambiguidades aos mafiosos que querem acabar com ele e aos sacanas que, por omissão e cobardia, dessa obsessão se tornam cúmplices.
João Pedro Caupers fez um bom relatório do estado da justiça. Minoritário, como é bom de ver:
Juiz conselheiro João Pedro Caupers aproveita abertura da conferência internacional organizada para celebrar os 40 anos do Tribunal Constitucional para alertar para os perigos da “normalização da devassa da privacidade dos cidadão”. Quando as “pulsões securitárias” ganham força “não há liberdade que resista”, avisou.
Na Alemanha, caiu por terra recentemente a utilização pelas forças policiais de software que utiliza os chamados algoritmos preditivos – programas de inteligência artificial que podem definir uma pessoa como suspeita, analisando toda a informação disponível, mesmo antes desta ter cometido qualquer crime. No estado de Hesse esses programas já se usam desde 2017 e agora Hamburgo preparava-se para fazer o mesmo. Uma intervenção do Tribunal Constitucional alemão declarou-o ilegal.
A utilização da AI faz de cada um de nós um perfil, que nos torna um alvo, uma persona, já não uma pessoa, um ser humano que faz escolhas.
A resistencia e a coragem cívica de José Sócrates são das poucas coisas que iluminam a praça pública, nos dias de hoje. À volta, é um negrume e um fedor a ressabiamento, fariseismo e tribalismo pacóvio.
continuar a enfatizar que a impunidade reina, e pousa, em Sócrates é de uma crueldade atroz. essa criatura dá-me nojo – um nojo que se cresce quando diz, tão feliz, a arrotar de pança cheia, que o seu julgamento público está feito. e se em democracia é a política que faz o direito, então aguardem. aguardem porque a vida política de Sócrates ainda não acabou e vai recomeçar. ele está para chegar.
ESTADO DO SITIO
CARTA ABERTA A SUA EXCELÊNCIA O PRESIDENTE DA REPUBLICA.
Por falar em adivinhações presidenciais a propósito de eventual candidatura da Sra. Dra. Ana Gomes ao cargo que agora ocupa, será licito passar para exatidões relativas ao Sr. Presidente Marcelo e assessorias ao seu serviço.
A propósito de uma mensagem que lhe dirigi sobre mau atendimento do SNS recebo em 28/12 pp do Sr. Chefe da Casa Civil a seguinte resposta:
Foi ao exposto dada a melhor atenção mas o caso foi remetido para o Gabinete do Sr. Primeiro Ministro.
Tempos depois recebo deste gabinete a informação de que o assunto foi remetido para o Sr. Ministro da Saúde.
Cabe perguntar ao Sr. Presidente e seus serviços se cuidaram de saber qual o andamento que foi dado ao processo, ou se simplesmente morreu na gaveta de uma qualquer secretária perdida num corredor de passagem.
Os assuntos reais não se resolvem com palpites.
Aarão José Marques