Há um ponto de vista, largo, onde O verdadeiro momento Watergate da democracia portuguesa entra para o anedotário nacional como um dos mais ridículos textos alguma vez escritos pelos fanáticos direitolas. Há um outro ponto de vista, mediano, em que esse ridículo aparece como inevitabilidade lógica quando nada mais se pretende para além da diabolização dos adversários. E há um outro ponto de vista, apertado e esquivo, onde a peça é um exercício típico do que está em causa neste registo: enganar o patego e tratá-lo como uma alimária.
No caso, o patego foi servido com a recordação do episódio Lopes da Mota. Rui Ramos usa-o para colorir um pilar central da estratégia caluniosa a que este tipo de direita está reduzida, a politização da Justiça e a judicialização da política. Atente-se como no parágrafo em causa se começa por falar numa “sensação” e depois se termina a falar de um “ambiente”:
«A Dra. Joana Marques Vidal foi a Procuradora Geral da República que pôs termo a algumas das mais sérias dúvidas que existiam sobre a justiça em Portugal. Entre 2006 e 2011, houve a sensação de que uma parte da justiça funcionava como guarda-costas jurídico do primeiro-ministro, José Sócrates. Era assim, não era assim? Nunca foi investigado, mas houve pelo menos um procurador-geral adjunto, Lopes da Mota, condenado pelo Supremo Tribunal Administrativo por pressões exercidas sobre os magistrados que tratavam do caso Freeport, a quem terá alegadamente ameaçado, em 2009, de que se Sócrates perdesse as eleições por causa da investigação, “alguém iria pagar caro”. Com a nova Procuradora-Geral da República, este ambiente acabou. Finalmente, como se costuma dizer, houve justiça também para os “poderosos”.»
Assim, havia uma “sensação”, “nada foi investigado”, “Lopes da Mota foi castigado” e “Joana Marques Vidal acabou com o tal ambiente”. Faz isto sentido? Nenhum, a eficácia do registo falacioso dependendo do estabelecimento da sua incoerência para a calúnia ser produzida. Quem é que tinha essa sensação para além dele e da sua malta? Ramos não identifica para levar o patego a esquecer-se do sectarismo sensorial inerente. Se “nada foi investigado”, quantos responsáveis será possível elencar para aquilo que se tenta deixar como cumplicidade corporativa e institucional? Ramos utiliza os poderes do pensamento mágico para apagar as autoridades com a capacidade e a obrigação de denunciarem qualquer ilícito ou irregularidade, onde se inclui o Conselho Superior do Ministério Público, o Parlamento e o Presidente da República, aqui metidos no saco das suspeições difamantes e alucinadas deste passarão. Quais os factos que se podem apresentar para defender a suspeita “de que uma parte da justiça funcionava como guarda-costas jurídico” de Sócrates? Ramos não explicita, sequer os lista, porque não os pode apresentar. E não é por falta de espaço ou de ocasião lá no blogue em que escreve, é mesmo porque sabe que não dá sequer para começar a falar do assunto pegando nos processos em causa. Daí encher o patego com sensações, pressentimentos, cheiros, sonhos. Como é que a nova Procuradora-Geral da República acabou com o “ambiente”? Com pesticidas, limitou-se a abrir as janelas, teve de ameaçar que “alguém iria pagar caro” caso os magistrados continuassem a tentar corromper magistrados? Ramos poupa-nos a esses detalhes por estar cheio de pressa para agitar a garrida bandeira de, “finalmente”, haver “justiça também para os «poderosos»”. Ou seja, antes da Joana o Ministério Público era um local mais perigoso do que Chicago nos anos 30, vende ao patego o espertalhão do Ramos.
O caso Lopes da Mota é exemplar da obscenidade com que a direita decadente explora a ignorância, as dificuldades cognitivas e a distracção das audiências. Ramos faz tiro ao alvo a Pinto Monteiro usando um caso em que foi o próprio Pinto Monteiro a abrir o inquérito disciplinar, em que o CSMP recusou as pretensões da defesa de Lopes da Mota e em que este foi suspenso durante 30 dias poucos meses depois, o que o levou a abandonar a presidência do Eurojust. Uma tareia num caso de diz que disse passado num almoço. Mas há mais, e num certo sentido ainda melhor. Francisca Van Dunem, na altura procuradora distrital de Lisboa, corroborou a versão de Lopes da Mota a respeito do incidente, tendo este defendido que a conversa em causa não teve o sentido e a intenção que os seus colegas alegaram. Van Dunem acabaria a votar vencida contra a pena aplicada. Pois bem, porque será que Ramos sonega este aspecto do caso ao usá-lo para dar palha a mastigar ao patego? É que os factos implicam, na sua distorção dos mesmos, que a Francisca é uma mais poderosas e funestas obreiras da tal sensação-ambiente que desapareceu a golpes heróicos da santa e guerreira Joana. E o valentão do Ramos é um macho cheio de bravura para açoitar tudo o que é socialista corrupto mas até ele consegue perceber quando tem de ficar caladinho não vá meter-se com alguém que, definitivamente, não é da sua laia. Nem do seu tamanho.
Uma coisa é certa, este processo de substituição ou manutenção irá definir parte essencial dos trajectos e legados políticos de Costa e Marcelo. – Valupi, a personagem, 9.1.2018.
Em Portugal, a recondução da Procuradora-Geral da República ameaça aproximar-nos de um momento igualmente decisivo na definição do regime. Se em Portugal impera a lei, ou apenas o arbítrio da oligarquia — eis o que podemos descobrir este ano. – Rui Ramos, 10.1.2018.
Legenda: Crónicas de dois valentões: o derrotado e o adiado, olaré.
Nota, em tempo. E censura-me mais uma vez que ninguém no Aspirina B fica a saber, ‘stá?
Valupi, fica aí de atalaia por causa dos ladrões.
(grrrrrrrrrrr!)
assusta o poder das palavras para quem as consome sem massa crítica. são bombas.
Mas QUEM é que ainda passa cartão a este mitómano apalhaçado e desnorteado?
A narrativa bafienta em que estas lesmas ainda vivem é já um assunto do foro psiquiátrico…
O “rui ramos” tem de facto a dimensão de um escarro fascistóide tal como quase todo o “ppd”.
e a julgar pelos comentários lá vertidos, o que não faltam são pategos.
o que é curioso é que ninguém parece ligar a este episódio:
http://observador.pt/2016/03/03/paula-teixeira-da-cruz-admite-agressao-laser-na-cabeca/
nem justiça, nem comunicação social, nem políticos.
dá para ficar com a “sensação” que é melhor não perturbar o(a) (a)m(bi)ente
ninguém liga às bubadeiras da cruz, se fosse uma entrega telepizza ao sócras já havia escutas na pasquinaria e o ministério púbico a exigir mais tempo e meios para investigar a cirrose.