O homem que queria voltar a ser primeiro-ministro

Podia Passos Coelho escolher candidatos de jeito para estas eleições autárquicas? Não só não podia como também não era essa a sua prioridade. Explico: com o actual governo a pôr o país na rota do crescimento, da criação de empregos e do desafogo para milhares de famílias e de empresas, seria difícil a qualquer candidato do PSD, por mais qualidades que tivesse, disputar a presidência das principais câmaras do país e até das restantes. Acresce a isto a inegável qualidade do trabalho do executivo da câmara de Lisboa (e do Porto).

Com o PS no poder, não só não aconteceu nenhum dos cataclismos vaticinados, como também, a nível local, o exemplo do governo central leva os eleitores a olharem para os candidatos consonantes ou pelo menos não hostis ao actual governo com “olhos de ver”, ou seja, alheios à propaganda dos anos em que “não havia alternativa”. Passos não podia, pois, fazer boas escolhas, inclusivamente porque os melhores não se identificam com ele  e muito menos ao ponto de “campanearem” alegremente ao seu lado para as autárquicas.

 

Mas também não era essa a sua prioridade, como a cada dia que passa se vê. As suas intervenções nos diversos pontos do país por onde andou (ai de mim, tenho ouvido a Antena 1)  puxaram sempre o tema das legislativas, que ganhou (esquece que este é um galão sem brilho), e das sementes que diz ter lançado à terra para que o PS colhesse os frutos. O incómodo é que, quanto às legislativas, a vitória de nada lhe serviu por não dispor de uma maioria na Assembleia que lhe aprovasse as políticas, começando desde logo pelo orçamento, pelo que estaria na rua muito antes de o diabo esfregar um olho, aí, sim, criando uma instabilidade perigosa para o país. Quanto às sementes, o próprio disse, durante meses a fio, que o actual governo estava a “estragar tudo o que fora feito” e que, não tardaria, estaríamos na bancarrota e a braços com novo resgate. Logo, deduz-se que, se fosse ele, teria feito muito diferente, o que equivale a dizer que continuaria tudo na mesma como nos anos dos cortes, das ordens para emigrar, da degradação e do subfinanciamento dos serviços públicos – a pagarem-se caro agora-, etc., etc.

 

A par da sua vacuidade, o problema de Passos é que é politicamente um mentiroso. Sempre foi e continua a ser. Não só não havia bancarrota nenhuma em 2011, pelo contrário, tinha-se conseguido um acordo com as principais instâncias europeias para evitar um resgate nos moldes dos da Grécia e da Irlanda, como também se comprometeu a respeitá-lo em reunião com Sócrates. Reunião que foi por ele ocultada, mas, como se fosse preciso para nos lembrar o seu recurso fácil à mentira, mais tarde confirmada e bem confirmada. Também o penoso que foi, para ele, tomar as medidas drásticas que tomou ao assumir o poder, é mentira, tendo o próprio confessado na altura que o FMI era uma oportunidade para pôr o país na ordem e que o radicalismo das suas políticas (dele e do Gaspar) não era nenhuma cruz que carregasse, porque acreditava que só os salários baixos tornavam o país competitivo e o Estado tinha mesmo que reduzir a despesa cortando nas pensões e nos subsídios, e nos direitos em geral, ao mesmo tempo que aumentava colossalmente os impostos. Dizia ele, então, que a classe média estava mal habituada, gastara acima das suas possibilidades e outras pérolas do género. Dizer que foi “obrigado” a alguma coisa pela Troica é, portanto, palhaçada de quem inventou aeródromos movimentadíssimos no interior do país para gamar uns cobres à Europa. Ainda hoje, para além das suas, uma mentira de outros que lhe dê jeito, ele agarra. Em Pedrógão, com os suicídios, foi o que se viu. O “relatório das secretas militares” sobre Tancos, plantado no Expresso, e que se provou ser uma falsidade com intenção, ele agarrou e bem cedinho.

 

Neste contexto, não é difícil perceber que o personagem deu tanta importância às autárquicas como a Voyager ao lixo cósmico. O homem mais não tem feito, à boleia dos seus candidatos, do que campanha para as próximas legislativas, ou o próximo congresso, vá lá. Por enquanto, pode até ser reeleito líder da agremiação PSD. Mas só porque o tempo é de vacas magras para a oposição. Não admira, como aqui já disse, que, em desespero, o André Ventura, no mínimo, lhe dê ideias e, no máximo, seja elevado à categoria de seu alter ego. Mais desenvolto ainda na charlatanice.

Passos não se inibe de afirmar e reafirmar que gostaria de voltar a ser primeiro-ministro. Chegará lá quando o André Ventura tiver mais audiência, mas, se for o caso, o Ventura estará mais fresco.

 

2 thoughts on “O homem que queria voltar a ser primeiro-ministro”

  1. Mas não será uma estrita obrigação do líder da oposição querer vir a ser Chefe do Governo ? Desta vez a Penelope errou o tiro num alvo que, convenhamos, tinha o tamanho da Torre dos Clérigos…

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