Aviso aos pacientes: este blogue é antianalgésico, pirético e inflamatório. Em caso de agravamento dos sintomas, escreva aos enfermeiros de plantão.
Apenas para administração interna; o fabricante não se responsabiliza por usos incorrectos deste fármaco.

Was will das Weib?

«O Chega cresceu em todos os escalões etários e continua a ser um partido mais forte junto dos homens, mas cresceu agora mais entre as mulheres, por comparação com as legislativas anteriores»


Fonte

E sobre o Trump, nas suas duas vitórias, é melhor nem falar nisso.

Perplexidades. Da democracia e da natureza humana.

A percepção (correcta) de que há demasiadas pessoas a viver em barracas

Muito se tem falado nas percepções a propósito do número de imigrantes no país e do que por cá fazem de bom ou de mau. Uns dizem que a criminalidade aumentou por causa dos imigrantes, o que as autoridades policiais desmentem, outros que não há qualquer problema com as comunidades imigrantes, que são necessários braços (de fora) para trabalhar, que todos vêm por bem e que, na sua esmagadora maioria, são pacíficos. Eu estou convicta que sim. Não gosto, porém, como ninguém gosta, da vinda de novas redes criminosas, como o perigoso PCC brasileiro, que podiam bem não se internacionalizar por cá, mas acompanharam a vinda de muitos e pacíficos brasileiros que por cá se têm instalado. Ossos que é preciso roer.

Os números exactos de imigrantes são desconhecidos, o que é de lamentar. Convinha ter um quadro mais preciso para se saber do que se fala. A diferença entre um forte afluxo de estrangeiros que se vêm estabelecer no país e uma invasão é facilmente reconhecível (e explorável). Por exemplo, numa aldeia pacata/definhante de 500 ou 1000 habitantes (ou num bairro lisboeta), a chegada de 500 ou 1000 paquistaneses, nepaleses e indianos aproxima-se do conceito de “invasão”. Aproxima-se, mas não é, pois trata-se de pessoas pobres e sem armas nem poder. Se não estão de passagem (como acontece com as “invasões” de turistas) e começarem a impor os seus hábitos, tradições, culturas e religiões na sociedade pequena em que é suposto integrarem-se, é bem possível e natural que os locais, depois de acharem piada à novidade e até sentirem gratidão pela juventude, reajam mal. Tudo depende também do grau de “acicatamento” dos chamados preconceitos. Mas qualquer preconceito precisa de um período probatório para se desvanecer. Se se desvanece ou não, depende. Mas uma aldeia ou um bairro, por si sós, não podem proclamar-se territórios independentes dentro do país global. Por conseguinte, há a obrigatoriedade de cumprimento das regras em vigor no país. Até agora, é o que tem acontecido. Mas mais ou menos com as barracas… não é?

Por exemplo, não é permitido por lei desviar electricidade ou água das redes de abastecimento, nem é permitido construir sem licença nem condições sanitárias, e muito menos é permitido ocupar terrenos privados para esse fim. Tudo isto é o que fazem os moradores das barracas que começaram a surgir nos arredores de Lisboa quase sem que ninguém se apercebesse. Os movimentos/associações ditas humanistas dizem que, por pena dessas pessoas, há que fechar os olhos. Não têm posses para mais. Nem alternativas (será mesmo assim?). Claro está, não são essas associações nem nenhum dos seus membros os donos dos terrenos nem seus vizinhos. Por outro lado, sabemos que, uma vez permitidas 50 barracas, depressa se avolumarão 5000, o que não pode ser aceite.

Acontece que, neste caso, não estamos no domínio das percepções. As barracas existem mesmo, são muitas e não podem ser aceites nem à face da lei nem à face dos nossos valores civilizacionais e níveis sanitários. O autarca de Loures está a ser bruto? Não me parece. Em Almada faz-se o que ele fez. É um problema. Toda a gente tem que saber o que pode ou não fazer à face da lei. Nenhuma das pessoas que vi entrevistadas me pareceu destituída. O mal já vem de trás, claro. Não devia ter vindo para Portugal nenhum adulto (incluindo as “esposas”) que não tivesse perspectivas de trabalho e de sobrevivência tal como a sociedade, os municípios e o mercado se apresentam. Digo sobrevivência para si e para os filhos também.

E agora que cá estão? Agora, há um trabalho a fazer. Nem todas as pessoas que vivem nas barracas o fazem pelas mesmas razões. Já dei por mim a pensar que o dinheiro que muitos gastaram a comprar as placas de zinco, madeira e outros materiais daria bem para vários meses de renda e de contas de água e luz num apartamento com condições. Nem todos os que ali estão são incapazes de pagar rendas. Ouvi uma senhora moradora dizer que estão melhor ali, nas barracas, porque assim estão mais perto dos seus países, dos seus “iguais”. Enfim. Assim é difícil. E também muito fácil responder o que todos estamos a pensar.

Neste momento, tudo deve ser discutido de forma clara, deixando de lado os chavões do ódio, de um lado, e as acusações de extremismo esquerdista que se alimenta da pobreza e das barracas, do outro. A base deve ser a inadmissibilidade das barracas num país do primeiro mundo, a recusa da indignidade daquelas condições sanitárias, a inadmissibilidade dos roubos e também, sim, o respeito pelo sentir das populações do concelho. Ricardo Leão irá ganhar a Câmara de Loures e não será por “o ódio” ter vencido. Não sejamos básicos. A imigração sem condições deve, de facto, ser resolvida. Sem prejuízo de se resolver ao mesmo tempo o problema dos preços da habitação e da falta dela (que afecta também os não imigrantes) e o da distribuição dos imigrantes por outras regiões que não a grande capital. Cada caso daquelas pessoas é um caso e assim deve ser avaliado e tratado (havendo também oportunistas), de modo a que apenas reste um número residual de barracas até poderem ser eliminadas. Não posso, pois, estar contra os autarcas que querem pôr fim a tanta ilegalidade e falta de higiene.

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Dominguice

Num conflito militar, a parte forte não tem qualquer motivo para escolher a paz. Em vez disso, tenta infligir os maiores sofrimentos que conseguir na parte fraca até que esta capitule. Aceitando um acordo de paz, a parte forte imporá condições vitoriosas. A parte forte ganha sempre, como sempre.

Mas quantos tipos de força existem? Eis o que nem a parte forte pode saber.

Saiu a sorte grande à Ghislaine?

A degradação da democracia americana está a atingir um nível quase inimaginável. Diria que as chamadas “Repúblicas da Bananas” eram, apesar de tudo, mais discretas.

Quem, como eu, segue no X um punhado de ilustres democratas com as entranhas revolvidas desde a reeleição do Trump, constata dia após dia, mês após mês, a repetida e crescente indignação destas pessoas com o discurso, as políticas, o comportamento e os abusos de Donald Trump ao ponto de já quase lhes faltarem as palavras para comentarem o que veem. Esperavam o pior, é claro, mas não com esta gravidade.

Trump, recordemos, é um indivíduo que, alegadamente rico, se julga acima da lei, aliás julga ter todo o direito de não a cumprir, muito menos agora que é presidente e descobriu que pode fazer o que quer, e que, tendo extensa matéria criminal a persegui-lo, resolve passar a controlar as instâncias judiciais do país e garantir assim que não será mais na sua vida incomodado. Mas mais: que, se possível, irá silenciar os adversários com ameaças e acções judiciais (se as chantagens não funcionarem) com desfechos favoráveis garantidos, pois terá os juízes na mão, nomeadamente os do Supremo. É o caso agora com a perseguição a Obama, após se ver “entalado” com o caso Epstein. Pelo caminho, procurará garantir que ninguém o tirará da Casa Branca. Entretanto, transformou a sede do Governo na sede dos seus negócios, ganhando milhões com esquemas vários.

 

Temos então que o homem enche os bolsos na Casa Branca, internacionalmente admira ditadores e assassinos da índole de Putin e Kim Jong Un, desconhece o conceito de aliados, ignora a História, desrespeita todo o mundo (menos os tais ídolos), rodeia-se de fiéis incompetentes, desde que fiéis, manda para prisões rodeadas de jacarés e outras de enorme violência em El Salvador ou no Sudão pessoas estrangeiras que não cometeram qualquer crime enquanto trabalhavam nos Estados Unidos, gaba-se disso e goza, perdoou aos bandidos que assaltaram o Capitólio, enfim. O rol de enormidades e alarvidades é extenso. São abusos e escândalos permanentes de que não há memória num país considerado democrático.

Nas últimas semanas, na iminência de ver comprovadas as suas ligações ao falecido pedófilo Epstein e, suspeita-se, a sua participação nos crimes de abusos sexuais de menores por este cometidos, tornou-se evidente que arrisca perder a sua base de apoiantes, mesmo os mais brutos e fanáticos, incluindo os que por ele invadiram o Capitólio sem problemas em matar pessoas. Tudo isto porque a grande teoria da conspiração abraçada por muitos desses seus apoiantes dizia que os democratas lideravam uma rede de pedofilia a nível mundial, com Hillary Clinton à cabeça, e Trump seria o único ser à superfície da Terra capaz de a destruir. Dizia o Guardian em 2020:

The QAnon conspiracy theory is vast, complicated and ever changing, and its adherents are constantly folding new events and personalities into its master narrative. But the gist of it is that national Democrats, aided by Hollywood and a group of “global elites”, are running a massive ring devoted to the abduction, trafficking, torture, sexual abuse and cannibalization of children, all with the purpose of fulfilling the rituals of their Satanic faith. Donald Trump, according to this fantasy, is the only person willing and able to mount an attack against them.

link

 

Fantástica teoria! Agora, ser ele o pedófilo é que não pode ser. Seria o fim. Ser “impeached”, impensável.

A “Madame” que recrutava as miúdas para consumo de Epstein, Ghislaine Maxwell, encontra-se presa e a cumprir uma pena de 20 anos de cadeia. Está, obviamente, por dentro do esquema todo, sabendo sem dúvida quem eram os outros clientes das jovens prostitutas (que ela angariava) para além do Jeffrey. A Advogada Geral, Pam Bondi (trumpista), disse (em Maio) que tinha diante de si a lista de clientes e que o nome de Trump constava da mesma. Como o ruído e a pressão se tornaram demasiados (apesar dos desmentidos posteriores de Bondi) e vergonha é coisa que não assiste ao Donald, a ideia será agora levar o Departamento de Justiça (totalmente dominado) a interrogar a “Madame” Maxwell (algo totalmente inédito) para, aparentemente, que esta diga que nunca na vida viu Donald Trump a fazer fosse o que fosse de errado, muito menos que fosse cliente ou sequer frequentador dos círculos de Epstein. A paga para esta operação de limpeza, penso eu, será o perdão da pena. Assim, à descarada. Tudo indica que será esta a escapatória escolhida por Trump. Aliás, já hoje lhe perguntaram se iria perdoar a Ghislaine, ao que ele respondeu que o pode fazer, mas que ainda não pensou nisso (para rir).

E os americanos nada poderão fazer a não ser, mais uma vez, escandalizar-se. Até porque o mal está feito: como é que naquele país se pode admitir como candidato a Presidente um vigarista com o currículo e o cadastro do Trump? Como?

 

 

Montenegro assustou-me

Confesso que fiquei assustado. Quando li Montenegro admite que “decisão do Governo pode ser reconduzir o atual governador” do Banco de Portugal: “Centeno reúne todos os requisitos”, no domingo, achei que Montenegro estava na iminência de se revelar um político brilhante. Logo ele, um hino à inanidade intelectual que está na política para servir os seus negócios, e faz negócios graças a estar na política.

Manter Centeno como governador do Banco de Portugal seria quase genial. Porque permitiria dizer que o Governo agia verdadeira e exemplarmente no interesse nacional, imune a pressões partidárias vindas do bloco que o suporta — e, acto contínuo, reforçar a carta-branca para ser, realmente, o governo-assombrado pelo Chega. E depois ainda poderia estar sempre a mandar à cara do PS que tinha mantido uma das suas mais importantes referências políticas num cargo de altíssimo prestígio e influência, deixando os socialistas sem saber como responder.

Felizmente, Montenegro revelou que continua igual a si próprio, e tratou de ir buscar o pastel de nata com sabor a laranja. Sosseguei.

Nas muralhas da cidade

«Ouvimos João Almeida dizer que acabou o tempo em que “nós” tratávamos imigrantes e nacionais da mesma forma (aquela imposição do artigo 15º da Constituição) e ouvimo-lo dizer que o país está a reconfigurar-se, já não o reconhece. Nunca tinha visto no CDS esta pontada súbita de teoria de substituição e parece-me evidente que não é no Príncipe Real que João Almeida se sente ameaçado na sua nacionalidade. O critério, de resto plasmado na obscena proposta de lei da nacionalidade, é cromático, é de sangue: querem, como nacionais, bisnetos de um português distante e não querem os que aqui estão há 5 anos por adesão. De onde vem a sensação de reconfiguração do país? Pergunto se João Almeida sentiria alguma reconfiguração se visse António Costa ou Francisca Van Unem numa rua qualquer do país e fossem ambos pessoas anónimas. Que sensação é essa? Não houve sobressalto geral. O limite do PAR é “fanfarrão”.»


Já está — vai demorar muito

Carneiro, já mediste bem a bocarra deste Leão?

Acabo de ouvir Ricardo Leão a justificar a acção da Câmara que lidera, no Bairro do Talude, com o argumento de que há pessoas a vender barracas por 2 e 3 mil euros. Até custa fazer esta pergunta, mas a câmara prejudicou em alguma coisa quem andou a fazer barracas para vender?

O que o Leão nos está a dizer é que, perante este negócio ilícito, a câmara decidiu castigar quem em desespero de causa pagou um balúrdio por uma barraca. Ora, estas pessoas continuam a não poder pagar por uma casa, no concelho de Loures, ou nos concelhos vizinhos. É, portanto, legítimo pensar que alguns terão de voltar a pagar por outra barraca, ali ou noutro local. Estará o Leão a dar um empurrãozinho a este negócio local?

Exactissimamente

«Um dos sucessos da extrema‑direita foi convencer-nos de que a imigração é um tema que separa de forma clara os dois lados do espectro político. Não é assim: tanto à esquerda como à direita sempre coexistiram posições diversas. Reduzir esta diversidade a um confronto entre uns e outros facilita o discurso no Parlamento, nas redes sociais e no comentário televisivo, mas é pouco útil para além disso.

[...]

Há quem defenda o controlo da imigração por motivos que nada têm de xenófobo ou securitário. À esquerda, houve sempre quem fosse favorável a uma regulação dos fluxos migratórios para evitar o agravamento da exploração laboral, a degradação das condições sociais e o crescimento de tensões comunitárias. Este argumento parte da ideia de que a imigração, se for deixada ao sabor do mercado, tende a beneficiar alguns sectores patronais à custa dos trabalhadores — tanto os que chegam como os que já cá estão. Defender a dignidade de quem migra implica garantir condições de acolhimento, integração e protecção laboral — o que dificilmente se compatibiliza com uma política de movimentos sem restrições.

[...]

Uma política migratória consequente tem de reconhecer que há tensões reais a gerir: entre mudança e estabilidade, entre abertura e sentimentos de pertença, entre direitos individuais e bem-estar colectivo, entre eficiência económica e coesão social.

[...]

Destruir o único alojamento de que as pessoas dispõem, fomentar o ódio ao outro (ou ser conivente com isso), restringir ao máximo o reagrupamento familiar ou colocar os direitos dos trabalhadores estrangeiros na mão dos empregadores, pode ser muita coisa. Não é, de certeza, uma política de imigração razoável, nem a construção de uma sociedade decente.»


Ricardo Paes Mamede

Começa a semana com isto

«A deputada do Partido Socialista Isabel Moreira recorreu, este sábado, 19 de julho, a uma mensagem publicada em várias redes sociais para criticar o que diz ser “um Chega infiltrado no PS”, partido que já fala a “linguagem da extrema-direita” ao se referir a moradores em habitações precárias como “infratores”.

“Adivinho um bom resultado eleitoral para o verdadeiro infrator. Escolho ficar mais tempo em minoria. Isto não é PS. Tenho direito a ter opinião. Isto é um chega infiltrado no PS. Fraco. Como explicou Helena Roseta. Os comentários, o virar de costas a crianças que a cada dia adoecem na rua, são auto-explicativos. Escrevi isto em defesa de todos nós”, publicou.

“Tenho vergonha disto (…) Sei que o estado de direito, a igualdade, a inclusão, até o amor, não são movimentos populares”, acrescentou, ressalvando que não retira "um pingo de responsabilidade ao Governo” no sucedido.»


“Há um Chega infiltrado no PS, tenho vergonha disto”: Isabel Moreira critica despejos em véspera de eleições

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Dominguice

Em Portugal, o termo frouxo não era insulto calhorda, fosse na rua ou no Parlamento, que alguém se lembrasse de usar. A sua semântica é principalmente funcional, frouxo é apenas o que não está apertado ou é mole, sem mais apelo metafórico. Para comunicar fraqueza, preferimos dizer que algo é, ou está, ou se sente fraco. Mas no Brasil o termo frouxo tem outras conotações arreigadas na cultura popular, onde se usa para insultar alguém sugerindo que é cobarde ou não consegue ter erecções (só vale para homens, e daqueles com pilinha, portanto). Tal mudou graças a Ventura. Há vários anos, repetidamente, começou a lançar o frouxo contra os líderes do PS. Não podendo usar “filho da puta”, “cabrão”, “paneleiro”, “maricas” e “impotente”, o que lhe traria problemas inúteis, o “frouxo” funciona perfeitamente como código taberneiro que todos decifram — especialmente os “portugueses de bem”, doutorados em hermenêutica de urinol.

Esta atenção obsessiva ao estado dos pénis de outros deputados poderá parecer estranha ao ocasional espectador da virilidade histriónica do Ventura. Mas não devia. É que faz todo o sentido. Todinho.

Cristal da Marmeleira II

Pacheco Pereira - Eu já digo isto há muitos anos. E mais, e digo isto quando muitos dos que agora são hiper, super antiSócrates, o protegeram. Que eu assisti a altos quadros do PSD protegerem Sócrates. E protegerem-no mesmo quando era mais que evidente que ele estava, por exemplo, a mentir naquela questão da Rádio Renascença, na tentativa de afastar da comunicação social pessoas que lhe eram desfavoráveis, como o José Eduardo Moniz, a Manuela Moura Guedes.
[…] segue-se um relambório confuso e megalómano sobre o episódio em que o Pacheco se fechou numa saleta da Assembleia da República para cheirar as cuecas de Sócrates e Vara […] E quem é que protege o Sócrates? A direcção do PSD na altura, o PC que também impediu...
Carlos Andrade - Foi a direcção que o impediu a si?...
Pacheco Pereira - Sim, sim, foi a direcção do PSD que impediu através das conclusões do inquérito que ele fosse condenado! Eu conheço à letra, cronologicamente, e conheço os papéis todos, conheço os papéis todos...
Pedro Duarte - Foi a direcção nacional do PSD que indicou o Pacheco Pereira para ser o responsável pelo acesso às escutas, foi só um por partido. Eu lembro-me bem disso...
Pacheco Pereira - Não, não, isso não é verdade. Os deputados que quiseram aceder às escutas puderam aceder, e eu não tive nenhuma autorização do PSD para aceder.
Pedro Duarte - Não é verdade. Foi decidido que haveria um representante de cada grupo parlamentar que teria acesso.
Pacheco Pereira - Então se isso foi decidido, isso nunca me foi comunicado porque eu de alguma maneira cheguei e ouvi as escutas.
Pedro Duarte - Pois, por indicação do grupo parlamentar do PSD.
Pacheco Pereira - Não, não é verdade.
Carlos Andrade - Mas o que é que o impediu a si de ir mais longe em função dos?...
Pacheco Pereira - Leia a minha declaração de voto... leia a minha declaração de voto, exactamente sobre estas matérias!...

Princípio da Incerteza_7 de Julho

Por um acaso, porque há uns meses o Pedro Duarte entrou no programa, foi possível vermos o Pacheco a ser exposto como o alucinado narcísico que é. Atenção: todos somos, em certo grau e tipo, igualmente narcísicos e alucinados. Mas nós que nos limitamos a ser espectadores dos programas de opinião não temos as (supostas) responsabilidades que vedetas como o Pacheco têm. Daí dar-lhe atenção, porque é muito influente pelos meios de difusão ao seu dispor.

Vamos esquecer a troca de TVI com Renascença. A parte do “já digo isto há muitos anos” é uma verdade absolutíssima. O resto consiste numa fantasia cuja matriz são os romances de cavalaria medieval. O Pacheco concebe-se como o cavaleiro solitário que, graças à sua pureza de alma, dotes de inteligência superior e coragem sem rival, ousa entrar na caverna do dragão para lhe desferir um golpe quase fatal. Quase, porque para consumar a sua missão heróica precisava da ajuda de uns quantos para arrastar o monstro até ao local do abate final. Para seu espanto e choque, tal como repete “há muitos anos”, viu-se de repente abandonado pelos seus. Como se isso não fosse tragédia suficiente, até os comunas se revelaram mais amigos do dragão do que do Pacheco. Restava-lhe só uma coisa: a declaração de voto. Pelo que hoje, e para as gerações futuras, a história dessa vitória inglória está ao dispor dos cidadãos que tenham curiosidade sobre o que fazem os dragões nas cavernas onde se protegem dos raríssimos Pachecos que possam aparecer para lhes fazerem mal. Têm é que ter o trabalhinho de ler a tal declaração, não há cá pão para malucos.

A sugestão de que em 2010 Passos Coelho e sua trupe, mais o PCP, a que ainda poderia ter acrescentado o BE (pela facto de este partido nem sequer ter querido mandar um deputado ouvir as escutas), andaram a “proteger Sócrates” de uma “condenação” (presume-se, na Justiça) é um delírio que chega a ser admirável só pelo facto de se lhe dar publicidade. O Pacheco nos “muitos anos” de tocar esta cassete jamais perdeu uma caloria a explicar o racional de tal protecção. Era porquê e para quê? Quase toda a ficção depende deste artifício, deixar sem explicação as voltas e reviravoltas do enredo. Sem esse encobrimento, perde-se a magia. No caso, o Pacheco perderia a sanidade mental caso tomasse consciência de ser ele o único a conduzir em contra-mão.

Pedro Duarte tem toda a razão (em segundos se confirma), João Oliveira do PCP nada ouviu de ilícito nas escutas (mais nenhum deputado as consultou), e até os procuradores que montaram a Operação Marquês também com recurso a hipóteses fantásticas não quiseram saber destas escutas pachequianas para nada. Mas o elemento mais importante do episódio vai parar a Mota Amaral, que era quem presidia à comissão de inquérito em causa. Passos Coelho queria que os resumos das escutas fossem incluídos no relatório final da comissão, não porque tivessem indícios de crimes mas para poder continuar no espaço público a chicana e as calúnias alimentadas por elas. Mota Amaral recusou. E, quando se pronunciou sobre o assunto, deu uma lição que reduz o Pacheco Pereira à pulhice que o devora: “Mota Amaral não quis comentar mas fez questão de dizer que apenas respeitou a Constituição. ‘A correspondência privada é inviolável’, disse, recordando que a PIDE chegou a apreender cartas dele.”

Venha o Costa

Refiro-me ao João. Porque José Luís Carneiro perdeu a autoridade liderante ao perder a oportunidade de transformar uma gravíssima crise partidária numa base de esperança. Para tal, teria de ter corrido para junto dos que perderam o seu abrigo por motivos exclusivamente eleitoralistas, deixando-lhes palavras e gestos. O seu silêncio perante a violência que autarcas socialistas cheganos fizeram abater sobre indigentes provocou a reacção de militantes e simpatizantes do PS. A carta aberta é, simultaneamente, uma carta de despedimento. As declarações do despedido, inanes e até vexantes, confirmaram a justa causa.

Quererá João Costa ser secretário-geral do PS? Não faço a menor ideia. Apenas me parece uma excelente ideia.

Cristal da Marmeleira

Não me é possível acompanhar o caudal da matéria publicada, por escrito e oralmente, acerca do arranque e sucessivos desenvolvimentos do julgamento de Sócrates. Mesmo que me pagassem, e nada mais tivesse para fazer, não haveria tempo para essa cobertura. Pelo que me resigno a tratar dos favoritos.

Devo ser o único bípede implume neste planeta a considerar Pacheco Pereira como o maior dos caluniadores profissionais no activo em Portugal. Para quem tenha interesse em acompanhar este tipo de carreira, João Miguel Tavares aparecerá como um muito mais provável candidato ao título. Não só por os seus produtos serem obscena e fetidamente sórdidos, não só por exibir obsessão na perseguição a Sócrates e ao PS, mas também por ter sido consagrado como o caluniador do regime por um primeiro-ministro e por um Presidente da República. Costa envolveu os filhos menores do caluniador numa acção de marketing político ocorrida nas instalações do Governo e em horário de expediente, Marcelo juntou o nome do caluniador a uma lista de portugueses ilustres que só lá entraram depois de terem deixado obra memorável para usufruto da comunidade. Ambos esfregaram na cara do País que se estavam a cagar para as instituições, para a decência republicana, para a mera racionalidade dos poderes que lhes foram confiados em nome do Soberano.

Atribuo o título ao Pacheco porque ele é capaz de assumir valores fundamentais do Estado de direito, como neste exemplo: “Tudo aquilo que são direitos da defesa, são relevantes. Não é para o Sócrates, é para nós!” Esta exclamação saiu-lhe de improviso no “Princípio da Incerteza” a 7 de Julho. Condensa o que há de mais valioso no Estado de direito, essa noção divinal (porque inconcebível para o animal em nós) de que o direito do outro é tão crucialmente importante como o meu — porque são o mesmo: o dele é o meu, o meu é o dele. Seja quem for o outro. Pode ser o mais miserável, pode ser o imigrante, pode ser aquele que é suspeito, ou acusado, ou condenado, no crime mais hediondo. Defender os seus direitos, mesmo que as pessoas nos causem repulsa ou tão-só absoluta indiferença, é sempre um acto de defesa dos meus direitos e dos direitos daqueles que amo, daqueles a quem quero bem. Toda a escolaridade obrigatória poderia ter este ensinamento como prova final; o qual exige um intelecto robusto, versátil e maturo para ser apreendido visceralmente.

O caluniador pago pelo Público, pela SIC e pelo Observador (pelo menos), não perde tempo com o Estado de direito. Descobriu o ouro da pulhice em 2009, vive a partir daí com muita segurança financeira, muito conforto para si e família, a despachar difamações e calúnias enquanto se vende como moralizador da Grei. O seu maior entusiasmo na vida divide-se, em partes iguais, no exercício de ajudar procuradores e juízes a conseguirem voltar a meter Sócrates numa prisão e na ânsia de levar o Ricardo Araújo Pereira a jantar em sua casa. Ora, perante esta indigência deontológica e arrivismo sôfrego, acaba por ter mais desculpa do que o Pacheco. Porque este até consegue ser decente, e defender a decência, e, mesmo assim, não consegue deixar de ser indecente. Fica, portanto, com a taça.

Voltarei ao Pacheco.

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