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Mais vale sozinho que mal acompanhado

Vive como se fosses morrer amanhã. Aprende com se fosses viver para sempre.

Gandhi

Durante a minha infância de bicho social interessado na politica, esse espaço da airada existência que se estendeu dos dezoito aos trinta e seis e do qual acordei de repente, todo excitado com o cheiro de cravos de viveiro, acreditava em quase tudo o que me contavam, quando o que me contavam não perturbava os ensinamentos básicos que tinha adquirido com a leitura de vários panfletos revolucionários e doutras obras avulsas da propaganda politica literária “aconselhável”, dita de descrição dos sofrimentos da humanidade lusa e internacional e das grandes lutas de resposta revolucionária para acabar com tais sofrimentos. Quem, por ignorância ou sabedoria, tivesse a impertinente ousadia de levantar um dedinho de direita para me contrariar já sabia que não seria convidado para o meu casamento, e o facto de nunca ter convidado ninguém para essa importante cerimónia (realizada com intenção ideológica num registo civil de paróquia salazarista) pode ter sido, vejo agora, o primeiro sinal de que um dia não iria perder tempo na fase madura da minha vida a ouvir gloriosos e recauchutáveis sermões, nem dum lado nem do outro.

Quem teve a pachorra de me ler até aqui é capaz de começar a pensar que me deixei de políticas e me entreguei de corpo e alma à cultura das tais malvas com virtudes balsâmicas. Nada disso. Ainda leio jornais (cada vez menos, é verdade, para fugir à mentira organizada e ao esforço sobre-humano de ter que pesquisar no vácuo das entrelinhas jornalísticas) e vibro a bandeiras despregadas com a suposta seriedade da política de esquerda e de direita. O Capitalismo, com a ganância sem fim que gera nos corações financeiros dos seus mais fiéis seguidores, continua a ser um dos alvos favoritos das minhas raivas matinais inexplicáveis e fonte inesgotável de oportunidades para a utilização do dicionário de ferroadas rancorosas que expressamente criei para o efeito. No entanto, há muito que desisti de ver nele a etapa histórica “natural” que fui ensinado a criticar e a combater (abaixo o comodismo do determinismo económico!) a partir de visões baseadas na força dum proletariado de calo e ganga que se tem deixado diluir no molho branco social que o vai empurrando para a robotização geral e completa, transformando-o na máquina anónima de produção que aos poucos o fará esquecer a foice e martelo. Esperem pela pancada, senhores veteranos: andam por ai a esquissar os novos símbolos das bandeiras proletárias.

Reconheço que o pessimismo político, como o que aqui demonstro com saciedade e sem vergonha, pode engendrar atitudes pessoais completamente desafectas ao espírito dos frequentadores de bares em festas partidárias anuais, ou ao dos períodos quentes de eleições da esperança. Não vou chorar por isso e até bebo um copo de reforço à saúde da convicção que tenho de que nada nessa atitude afectará a minha capacidade para continuar a fazer perguntas e a aprender como se “fosse viver para sempre”. E, meus senhores e minhas senhoras, sobre o tema geral do progresso, evolução, consciencialização política e de classe etc., uma das perguntas que apetece fazer, já agora, é a seguinte: mas afinal, que merda é esta de pensarmos que precisamos de situar-nos politicamente à esquerda ou direita de qualquer coisa para darmos uma opinião justa e serena, cheia de bom senso e abalizada sobre as soluções mais adequadas e necessárias a este planeta — planeta que não pertence a ninguém e que ninguém sabe donde veio, muito embora abundem por ai explicações divinas e outras acerca de implosões de matéria e irrealidades palpáveis? E quem são estes importantes Oito, que agora sentaram as suas anatomias com excessos de gordura exactamente iguais às nossas à volta duma mesa enorme, para se porem a combinar, sem mandatos directos de ninguém, sobre a direcção mais apropriada para esta Terra envolta em fogos muito reles que eles, ou aqueles que os precederam nos tronos da Intriga mandona, foram os primeiros a atear de mil e uma formas?

Não me puxem pela língua, por favor!

TT

Porra!

Ontem, numa das minhas voltinhas frequentes pelo dicionário de português, desta vez procurando um sinónimo mais ou menos paronímico da palavra “catamite” — definidora em dicionários ingleses do “rapazito mantido (fresco e saudável) para práticas sexuais”, etimologia latina pela via do etrusco, dizem-me eles — fui completamente distraído pela languidez ou preguiça do meu dedo que decidiu repousar em “catano!” e logo tomar uma bebida fresca, para apreciar com vagar a sua definição, de acordo com o evangelho dos dicionaristas portugueses.

Ficou o Tio Tadeu a saber que “catano!” é uma interjeição vulgar “usada como eufemismo para indicar admiração ou contrariedade”. Mas eufemismo de quê? Em princípio, de “catana”, palavra muito em voga nos anos sessenta nos manuais arsenalísticos dos movimentos de libertação africanos, antes das intervenções e contribuições do dólar e do rublo para animarem as festas balisticamente.

E andei eu um tempão do vergalho a pensar que “catano!” tinha mais a ver com o intuito de poupar certas senhoras e cavalheiros à ignomínia de terem de ouvir outras rimas mais mal sonantes. Por mera curiosidade, então a querer estender-se por influência do refresco, procurei debalde o eufemístico “poussa”, “poussas” ou “pouça”, de “pénis” ou “porra!”, também interjeição. E pagarei um copo de bom grado a quem descobrir no meu dicionário a palavra “caraças”, por vezes também explosão interjectiva na boca do palavroso e pobre vulgo. Se a encontrarem, tenho a certeza que ao lado dela lá estarão um par de carantonhas ou máscaras a provarem as origens e o poder dos eufemismos.

Mas, voltando ao “catamite”, talvez seja interessante notar aqui, a modos de fecho, o peso que as palavras, ou a eliminação total ou parcial dos seus significados, têm na preparação mental das pessoas para a moral política gizada pelas elites do beiço educado. Num dicionário “Oxford” de há dez anos, a palavra “catamite”, além da definição que acima dei dela para benefício do menino e vergonha do seu amo, também tinha uma segunda definição, que se escorria assim, para toda a gente ver: “a pessoa (partner) passiva em sodomia”. Num dicionário mais moderno desse mesmíssimo ilustre estabelecimento de ensino influenciador de governos e governação, tal definição foi pura e simplesmente excluída for good, quem sabe se por decreto ou se em reacção a um simples telefonema dum malandro qualquer. Ponha-se isso em termos de Narração Histórica das Coisas Mais Importantes e imagine-se o que a maltinha não anda por ai no dia-a-dia a engolir como verdadeiro, completo e bem contado. Os mais “progressistas” dirão que a exclusão dessa definição se justifica, para não se abusar da passividade de certa gente. São os que não têm voz activa nem passiva sobre nada, mas vivem na ilusão de que a têm.

TT

Não levem a mal

Espero que não me ponham a ferros por dizer isto, mas eu estou convencido de que a maior parte da rapaziada dos dois sexos que aqui vem matar o tempo ou irritar-se, ler mexerico fresco e novidades do para-socialismo socrático, dar ou levar porrada de criar bicho, fazendo uso de pulmão ou megafone, a primeira coisa que faz é dar um relancear ao nome de quem assina o post. Quando o nome agrada ou convém, algo que tem pouco ou nada a ver com o apreço ou admiração que se tem pelo escriba despejador, já todos têm uma ideia do número de palavras envolvidas. A seguir, computa-se tudo isso em dois segundos e meio e consulta-se a lista de autorizações e prioridades penduradas no interior das próprias cabeças de acordo com as preferências políticas ou outras e perde-se mais um segundito ou dois a coçar queixos, ponderando se realmente merecerá a pena perder o tempo precioso. Se ainda indeciso, apesar do arsenal racionalista que utilizou, o leitor, ou leitora, calmamente dando volta à manivela da rotina defensiva, pode passar à fase seguinte que envolve o sacrifício de ler as primeiras linhas do post, não vá perder algo interessante. Umas vezes, meio-prendido pela curiosidade embriagada lá se vai deixando levar à espera que tudo resulte no orgasmito final que bem precisa, outras não. Sem vergonha, também me confesso vítima ocasional desse vício.

Fiquem com esta mensagem dum senhor cansado. Quando eu aqui voltar novamente, sugiro sem entusiasmo ou interesse de qualquer espécie que continuem a ler-me. Ou, alternativamente, façam o que lhes der na real gana e viva a liberdade saloia e colorida. Não liguem à redundância pleonástica dessa sugestão e desta explicação, pois fazem parte do discurso. O que eu realmente vos queria dizer é que não me leiam por mercê ou obrigação. O obséquio e graça reivindico-os como meus, porque sou eu que tenho de dar volta ao miolo a escrever coisas fastiosas, esforçando-me para excitar sem ofender demasiado, provocar sem cair voluntariamente em subterfúgios linguísticos que frequentemente convidam ou encorajam os menos dispostos ou desmotivados, tipo senhora bigornas, a não lerem. Concluo assim, sem ter encontrado espinhas nenhumas pelo meio. Mas não prometo nada para o futuro na área da franqueza escandalizante, nem posso garantir que as novidades irão ser só gozo, desfile de cabeçudos pela avenida portuguesa abaixo. No entanto, esperança é sempre bom tê-la, pode ser que lhes venha a falar dalguma coisa útil, pelo menos superficialmente lembradora do fundamental, do importante, que vocês depois burilarão, aperfeiçoarão e polirão com a ajuda dos vossos instrumentos de gente mais educada do que eu. Todos sabemos que a “importância” que se dá a certas coisas é sempre, simplifiquemos, relativa, influenciável, corrompível e dependente, sobretudo dependente da maneira como se observa, como se pesa o que se lê e se compara, muitas vezes seguindo fielmente opiniões dos nossos amigos e tutores que não nos conhecem, ou conhecem bem demais, parte deles consumadas varinas da tradição que fomos ensinados a admirar e imitar. Mas não subestimem nem esqueçam, e isso é que é realmente soberano, os perigos, as consequências irremediáveis de não nos importarmos de sermos mais uma das muitas vidas que andam por aí rés ao chão, a debicarem migalhas caídas de papo-secos tradicionais fabricados com farinhas magras e refinadas, roubadas do farelo nutritivo e dos minerais preciosos.

TT

Ida e volta — as opções

Pega comigo e vai comigo num barco qualquer, a remos ou à vela, tanto faz, e vamos procurar a terra dos francos que nos espera no outro lado do mar. Para ganhar e aprender ou para levar no toutiço do juízo, como nos velhos tempos de Paris. Não temas vagas alterosas, nem ligues ao sal frio e liquefeito que inevitavelmente nos refrescará as caras e os corpos na viagem de quase-aventura. Não tenhas medo que não estás sozinha. Irei contigo duma margem à outra, haja o que houver. Os nossos corpos unidos em calor-paixão de procura de lazer-prazer (desnecessariamente caro, necessariamente defendido pelo poder fictício do cartão de crédito que o Big Brother nos pôs na mão) apertar-se-ão ainda mais se os perigos de navegação se apresentarem com caras sujas de ventos contrários à nossa intenção firme e jurada de vermos e compreendermos mais — intenção que força, como tu e eu muito bem sabemos, à limpeza de coisa antigas em caves e arquivos mentais onde se passeiam ratas velhas sob ruínas de teias de aranha dos tempos do Aprendizado.

Era assim que eu gostaria de ter atravessado o Canal da Mancha, com uma companheira presa ao meu destino, num bote ou lancha. Em vez disso, meti-me no ventre duma enorme toupeira sobre carris, que já ameaça desastre financeiro pelas bocas de alarmados e hipócritas Cityistas londrinos, em Folkestone e saí no outro lado, lá para as bandas de Calais, terra de muita cebola e gritos de cebolório!

Mas nada se passa, nem nas idas nem nas voltas, como a gente gosta, isto é, de como gostamos de ver narrado em poemas leves mas ricos em oxigénio e rabanadas de vento. Jubilante e comovedor e realmente gratificante seria eu chegar aqui todo ufano e a suar para contar aos rapazes e raparigas os resultados da Conferência de patriotas americanos em LA sobre a característica indesmentível e inegável de inside job que tresandou do churrasco humano em Nova Iorque há cinco anos. Do meu discurso, se lá tivesse ido a convite, se me tivessem dado importância, se soubessem que existo, sacaria seguramente as passagens mais relevadoras e reveladoras — as do tipo de entrar sem oposição de nenhuma espécie pelas cabeças dentro de qualquer nhurro português com preocupações verdadeiramente democráticas, e tenho a certeza que pasmaria alguns deles. Mas não, em vez disso, volto, como muitos outros voltam doutros lados onde vão esquecer dívidas e frustrações e dizer mal de patrões, cansado de duas semanas de férias self-catering numa manoir, num chateau, como o seu dono gosta de chamar-lhe para acentuar o seigneurismo que escorre dalguns cantos teimosamente escuros e impermeáveis aos olhares de estranhos.

TT

SOBRE AS IDENTIFICAÇÕES – BdIs e BdEs.

Como ontem não vi absolutamente nadinha no Diário de Notícias nem no Público que a mim me parecesse digno das atenções das cabeças desvairadas que aqui vêm largar curas temporárias para males políticos permanentes, ou mobilizante do espírito de combate das infantarias maledicentes, aproveito para visitar a secção da loiça de barro estalado que acaba os seus dias como vaso improvisado, berço de salsa ou salva, num canto de quintal duma senhora pobre e viúva.

Segue-se que aos mais curiosos foi ontem oferecida, sobre a bandeja introdutória do Valupi ao meu escrito sobre os vários cinzentos-osga que dominam os palcos políticos a leste e oeste de todas as ideologias, uma oportunidade única e não repetível para descobrirem, com um pouco de paciência, no BdE, as origens blogosféricas da minha personalidade, as minhas idiossincrasias, princípios da minha identidade a partir do ovo social e grupo sanguíneo… Felizardos, felizardos, seus leonardos, que não sabeis para onde voltar-vos. Tratava-se, para o Valupi, julgo eu, dum dever, duma homenagem, espécie de esclarecimento de roda-pé-não-se-esqueçam com a intenção prima de preparar alguns para a refeição estranha que ele lhes punha no prato.

Mas não era preciso. Assinar o que escrevo sob o pseudónimo de Germano Filipe ou o meu verdadeiro nome de Bomba Madalena II, generala da beira-rio, não influi nem agrava, altera ou beneficia o conteúdo ou significado das declarações nem a verdade das suposições nem o objectivo dos ensinamentos nem a moralidade ou imoralidade das confusões. A verdade independe do preço das maçarocas e das camisas que as vestem. Lembrem-se que o Álvaro Cunhal não assinava tudo o que escrevia. E no fim levou um dos maiores funerais de sempre, se calhar uma estátua inderrubável a eternizá-lo algures numa terra proletária como eu. Uma pessoa tem que pensar na posteridade a que tem direito.

Um dito de anónimo, quando não encerra ofensa de fazer sangue nas honras, virgindades reais, relativas ou perversas, de políticos, banqueiros e padres da melhor estirpe rabo-jesuítica, que não deixe entrever a selvajaria dum cérebro demente, na acepção física, espiritual e aritmética do termo, tem tanto valor, ou tem menos, ou mais, se calhar os dois, como valor tem a frase pomposa e pingante de rodeios e madeixas onduladas do catedrático reconhecido e respeitado. Sem desprimor para os lentes de primeira e segunda que adornam estas páginas. Valha-nos isso, senão este mundo já tinha acabado com os pios de gente como eu.

Queria acabar isto com uma frase de latim, mas não encontrei nada no frigorífico. Raios partam a sorte.

TT (forever)

Crítica Nocticolor

Começa, com o texto abaixo, a participação no Aspirina de uma personalidade de vários nomes e muitos mais enigmas. Temos o gosto da sua companhia desde o BdE, quando o Fernando, eu e ele nos descobrimos numa inverosímil e bombástica afinidade (a que outros se juntaram, como o Luís Oliveira e o Filipe Moura, por exemplo). Coisas desta coisa — palavras escritas, anonimatos, imaginações à solta. Enjoy.

A noite passada, aí por volta das duas, abri os olhos e tive de imediato a certeza de que não iria tornar a fechá-los antes das três, ou mesmo mais tarde, quem sabe até se lá pelas horas dos galispos. Virei-me, portanto, a “trabalhar”. A lucubração na posição horizontal é, como se sabe, um hábito facilitado pelos negrumes de quartos das traseiras. E não custa nada nem dói, é tudo trabalho de cabeça, contas de somar, ejaculações heróicas do estro que duram uma eternidade. Em resumo: produções no vazio com consumos baixos de energia. Daí que até encoraje com gosto estes devaneios nocturnos, em tempos de crise, especialmente, ou quando me envolvo com parvos do meu tamanho na discussão das ideias políticas inventadas para nos distraírem e nos conservarem frios — frio, frio, como as pedras do rio das infâncias de mistério e procura. Ideias que, permitam-me que deixe isto claro não vá cair no ressono novamente, nos empurram constantemente para becos circulares mal iluminados e de arquitecturas bizarras, maldosas na intenção primeira e longínqua, inverificáveis e improváveis sem ajuda de microscópios negros ou de leituras recomendadas pelos santos-ofícios dos partidos.

“Trabalho” é como eu — Homem Bom e de Nobres Sentimentos, algemado a vaidades inexplicáveis, a vícios de apreciação de perfumes de rosas e ervilhas-de-cheiro que a minha mulher transplanta e semeia e trata constantemente com enlevo e a outros bons costumes que diluem em parte as raivas enlatadas que me dormem no peito há um ror de tempo — prefiro classificar os meus discursos imaginários de descontentamento, discursos de apontar o dedo, por vezes o do meio, grosseiro, de reparar com deslouvor, de permanecer convictamente zangado e cansado com a Política. Na malvada vigília de ontem à noite, deu-me para aspergir acusações aciduladas sobre um congresso de indivíduos vestidos de cinzentos corrompidos, contudo crentes (admirai esta inocência!) de que estão a fazer o melhor que podem para o bem do aglomerado-nação que tende cada vez mais a bater menos palmas à excelência musical demonstrada por esses senhores pela via de pandeiretas e outros instrumentos percussão. O teor do meu vigilante raspanete foi simples e quase inofensivo, mas a respeitável amplitude que lhe imprimi encarregou-se do resto pela serra abaixo, atravessou muros e galgou valados e espalhou-se por terrenos com delimitações políticas cada vez mais duvidosas e propositadamente complicantes. De facto, não poupou nada nem ninguém na torrente do derrame quente, mas não excedeu — importa reparar nisto porque é a prova suprema da bondade que vive dentro de mim — a violência da mera arranhadela às peles bronzeadas dos desvergonhados, à mandriice e aos interesses calculistas subordinados ao rolamento de esferas que mantêm a Promessa Politica em eterno movimento igual. Infelizmente, sobrou um único mas importantíssimo problema. Nenhum desses gatos da restrita e exclusiva comunidade palreira, objectos do meu furor à distância, me viu ou ouviu. Tiveram sorte, os malandros.

Há no entanto uma reduzidíssima possibilidade de que os homens de cinzento tenham sentido ou pressentido, detectado com os seus narizes, o gás revelador da presença e da intenção que telepaticamente transferi para os espaços vitais e necessários à expansão dos seus vácuos decretórios. Se isso não passa de suspeita infundada de quem não gosta de passar uma noite a trabalhar para o boneco, também não vou chorar, sequer amuar, ou morder a fronha asseada onde assento a cabeça de menino a quem nunca foi dado o chupa-chupa da absolvição, do reconhecimento, o doce da consolação merecida. Porque ainda tenho forças para levantar-me novamente e teimar, cambaleando, encostando-me aqui e ali, evitando sujar as mãos ou gatinhar como eles com as barrigas a lamberem as lamas da explicação fácil. Daqui, meus senhores cinzentos, pardas almas, ainda consigo manter funcional a capacidade para fixar os olhos num ponto móvel iluminado, esperando o lock perfeito no centro do esplendor, possível e ao alcance de qualquer um numa singela noite de vigília. E por aqui me vou indo, imaginando, medindo e considerando com cuidado, se isso for absolutamente necessário para manter respeito por realismos, a irrelevância ou pouco interesse que esta exposição encerra para aqueles que dormem com as consciências limpas a pensarem na bola redonda e no amor-livre masturbativo. E estendo este braço esquerdo e esta mão direita. Estendo-os sem ideias preconcebidas baseadas em percentagens. E sacrifícios, pois bem, se os há ou houver nesta procura, são de amor puro e dedicação à Nação-querida-da-minha-alma-lusitana, mãe de dez milhões de cidadãos de todas as idades e proprietária orgulhosa dum par de belíssimas e curvilíneas auto-estradas.

TT