Piada jornalística do mês

Clicando na notícia de hoje sobre José Sócrates, lê-se o seguinte:

 

Sócrates perde ação da mordaça ao CM

José Sócrates queria calar investigação do Correio da Manhã.

Por Eduardo Dâmaso”

«Investigação», dita assim pelo Dâmaso (o sublinhado é meu), é um momento de extraordinário humor proporcionado ao leitor. É preciso lata para este eufemismo e para a hipérbole dramática do verbo “calar”. A realidade vai dizer-nos, sim, que reabriram três coisas: a caça, o canal de tráfico de dados e estratégias com as “fontes da investigação” e o armário dos condimentos e venenos da sala de redação. O CM não tem feito mais nada do que “investigar” desta maneira. Fácil, lucrativa, despudorada, assassina.

Durante a mordaça, o CM meteu Sócrates na capa a cada 3,8 dias

02.03.2016 01:45

O Correio da Manhã está há 127 dias impedido de exercer na plenitude o seu dever de informar. José Sócrates conseguiu na decisão judicial montada numa providência cautelar o que não logrou durante os últimos anos de poder. Quando nos tentou aliciar, depois comprar para silenciar. O CM continuará a investigar Sócrates, certo de que o dia da transparência virá. Sempre tarde de mais para reparar os danos de tão prolongada mordaça. Sempre a tempo de fixar o perfil de um homem que tomou o poder para impor uma cleptocracia populista. Onde o jornalismo morreria em propaganda dócil. E quase atingiu o objetivo.


Fonte

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E o prémio de contorcionismo radiofónico vai…

Tcharan! Para David Dinis, diretor da TSF. Comentando, no noticiário das 18h00 (ouvir aqui, a partir do minuto 7.10), a contratação de Maria Luís para a Arrow Global, falou, falou, enrolou, não encontrou final feliz, nem compreensível, para nenhum começo de frase, procurou colocar o centro da questão na manutenção do lugar de deputada e, em suma, não disse nada. Todo este esforço para não censurar a ex-ministra. A nossa comunicação social está assim. Como Passos Coelho, não descolam. Nem desamparam a loja.

Hermeneutas, precisam-se

Carlos Vaz Marques - Também reconstruímos e reinventamos o passado.
António Coimbra de Matos - Sim, mas vivemos do futuro, não do passado. Infelizmente nem sempre é assim, mas é assim que deve ser. Veja na política portuguesa: foi o problema do Sócrates, e antes do Sócrates do Guterres... Noutro dia dizia a um amigo meu: naturalmente, a culpa foi do Afonso Henriques, que conquistou isto aos mouros em vez de ir para a Galiza.

“Somos um país de medrosos”

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Trata-se de uma entrevista que teve notoriedade, onde reencontramos a denúncia acerca do “medo de existir” que deu justa fama ao outro em 2004, nesse caso um filósofo. Aqui, lidamos com um psicanalista, ou talvez seja mais correcto tratá-lo como ex-psicanalista. Para além de dizer alguns grossos disparates, como no episódio relativo aos cavalos, também larga densos ensinamentos, como em relação aos sonhos.

Na passagem citada, aparece o esboço de um raciocínio, o qual não ficou explícito. O jornalista não puxou pelo assunto, talvez por ter entendido o que ouviu, talvez por não lhe interessar a matéria. Mas, para leitores apaixonados por política e com dificuldades na interpretação, como eu, o sentido das palavras está por descobrir: a que problema, exactamente, se está Coimbra de Matos a referir ao falar de Sócrates e Guterres?

Peço a vossa prestimosa ajuda para conseguir perceber.

Cognição revogável

Neste Frente a Frente entre Mariana Mortágua e Diogo Feio podemos admirar as qualidades da bloquista em confronto com a retórica de cassete do centrista. Umas das facetas mais valiosas da sua postura pública em contexto argumentativo é o domínio emocional que exibe. Isso contribui para a capacidade de ir desmontando pedagogicamente algumas falácias bolçadas pelos ocasionais adversários, talento que a Mariana revela ter já num estado amadurecido. O momento igualmente importa como demonstração prática do que acontece quando a esquerda pura e verdadeira põe a sua inteligência ao serviço da esquerda impura e apenas certeira, em vez de se aliar à direita decadente numa oposição de terra queimada e sectarismo encardido. Veremos até quando vai durar o serviço público que BE e PCP estão por agora a prestar.

Todavia, nesta ocasião a mana Mortágua cometeu um erro que tem interesse tanto no plano cognitivo como no plano social, e ainda no mediático – portanto, também chegando à esfera política. Ocorreu quando sacou do gráfico da dívida portuguesa ao longo dos anos recentes e apontou para o seu nível mais alto, meados de 2012, atribuindo esse valor à crise da demissão de Portas. Repetiu várias vezes essa correlação, posto que era a essência mesma do seu argumento na altura. Incrivelmente, Diogo Feio corroborou a associação, o mesmo fazendo a jornalista presente posto que não a desmentiu.

Ora, a “crise do irrevogável” deu-se mais de um ano depois, em Julho de 2013. De facto, tal originou uma subida nos juros da dívida, mas sem comparação com o valor da mesma um ano antes, ainda com Portas e Vítor Gaspar num Governo que prometia ir além da Troika custasse o que custasse e sem qualquer misericórdia para com os piegas. O Feio não deve ter achado nada bonito ter-lhe escapado algo tão básico, ainda por cima em relação ao seu líder na berlinda.

O que me chama mais a atenção no episódio é a facilidade com que um erro cognitivo pode aparecer e espalhar-se, mesmo entre especialistas (no caso, políticos e jornalista) e numa situação de extrema concentração nas informações em discussão. Se tal acontece com esta naturalidade debaixo dos holofotes, e até levando um político a desperdiçar uma oportunidade crassa para descredibilizar o seu opositor, então podemos ter a certeza de que muitos mais, e muito maiores, erro cognitivos estão a ocorrer nas instituições políticas, governativas, admnistrativas, educativas e empresariais no conforto dos gabinetes.

Razões para desesperar? Não, para pensarmos. Cada vez melhor.