Se calhar também eu ando distraído

O sempre atento Eduardo Pitta faz, no seu Da Literatura, uma observação devastadora. Esta.

“Ouvidos pela Lusa, Vítor Aguiar e Silva, da Universidade do Minho, e Manuel Gusmão, da Universidade de Lisboa, disseram: «Sempre admirei muito em Luiz Pacheco o seu espírito de irreverência, a liberdade crítica, a capacidade de destruir corrosivamente as convenções, quase sempre mortas já. […] Era um espírito que, naquela atmosfera passiva, adormecida, dos anos 50, 60 e ainda 70, trouxe, por vezes com excessos de linguagem, uma lufada de ar novo. Era dos espíritos mais irreverentes deste país.» [V.A.S]; «Obra escassa, mas bastante interessante, com destaque para Comunidade e O Libertino Passeia por Braga, a Idolátrica, o Seu Esplendor […] praticou uma fusão entre a literatura e a vida, o que significa uma espécie de projecto de linhagem romântica, mas de cariz surrealista.» [M.G.] Não me lembro, em vida de Luiz Pacheco, de ler uma linha a seu respeito assinada por qualquer destes professores. Mas pode ser distracção minha.

23 thoughts on “Se calhar também eu ando distraído”

  1. A vida verdadeira não está nas cátedras universitárias que, pelo contrário, vivem repletas de mortos. A vida de muitos professores é uma vida de rituais, de títulos, de reverências mas não é vida verdadeira. Essa está com o Luiz Pacheco e com todos os marginalizados.

  2. Eh, eh, Zé do Carmo. Calma aí.
    Há em cátedras universitárias alguma gente muito viva, asseguro-te. E há nas marginalidades literárias muita parvoíce mascarada de malditismo.
    Que mania essa de, a pretexto do Luiz Pacheco, canonizar a marginalidade, onde estaria a «vida verdadeira».
    Esse é um discurso desvairado e solipsista que só cria anticorpos. Pareces-te mais (sim, pareces) com o Vasco Pulido Valente do que pensas. Com mais alguma graça no verbo, ias lá.

  3. A puta da Vida é feita de coisas como essa. Agora que leio tantos protestos de reverência e amizade por Luiz Pacheco quedo-me a cismar por que caralho passou o homem tanta fome.

  4. É precisamente esse tipo de “comentário amargo” do Eduardo Pitta, em que transparece que só “os credenciados para e por podem falar sobre”, que faz com que um jornalista vá procurar a opinião dos mesmos: dois credenciados universitários, suponho que de literatura, sem sequer ter em conta as afirmações que debitam. Por muito bem aplicado, ou não, que possa estar em relação às opiniões dos dois senhores sobre Luiz Pacheco.

    Às vezes, os tais credenciados, que o são, deviam prestar mais atenção à forma como colocam as coisas, para não serem eles próprios os fomentadores daquilo que depois criticam.

    Mas, esta é só a minha opinião, que não sou credenciada para nada.

  5. A verdade é que se não fosse um serralheiro mecânico a dedicar-se à escrita ainda hoje não tinhamos um nobel da literatura. Parece mesmo que a grande parte do tais catedráticos de literatura, de literatura sabem pouco. E passa-se o mesmo no resto do Mundo. Não há absolutamente correlação nenhuma entre a quantidade de títulos académicos e o talento. Os académicos são todos uns chatos vaidosos, ninguém os quer ler ou ouvir.
    E esta teoria não é valida só para a literatura, na música e na pintura passa-se o mesmo. Se estivessemos à espera que algum professor de música viesse por aí mandar umas guitarradas à maneira ainda hoje estavamos a gramar única e exclusivamente música clássica, não haveria rock nem pop para ninguém.
    Claro que há muito poucas excepções que confirmam a regra.

  6. Luís: confundes tudo. O plano da criação e o do estudo do resultado dessa criação. São coisas diferentes. Vá.

  7. Obs. devastadora? Ora, ora…
    Não foi apenas de L.P. que esses profs. nunca disseram nada em vida, mas também de muitos outros.
    E depois? Não têm o direito de dizer, depois de mortos?

  8. É, de facto, a necrofilia que (n)os move. Depois de morto, mal não poderá fazer, nem tão-pouco desdizer os que disserem. Fica bem nas notícias e floreia nas entrevistas arreigar-se o conhecimento da vida e obra de seja-quem-for.

    A verdade é que, em vivo, até para publicar Luiz Pacheco enfrentou enormes, estúpidas dificuldades. Agora morto, a projecção é tal que muita gente se há-de perguntar “mas este gajo não tinha já batido a bota há 50 anos”?

    Contudo, também não entro em cadafalsos para cabeças académicas — ele há-as com todo o tipo de recheios, como as santolas e as sapateiras, umas recheadas a contento, outras vácuas e outras apinhadas de caquinha inoperante. É verdade que a intoxicação do marisco é fodida; e eu tendo a considerar que as bactérias, os fungos e demais microfamília encontram nas universidades um ambiente quentinho e acolhedor.

    Essa argumentação gasta do serralheiro mecânico não colhe. Pulula por aí muita gente que escreve para ganhar a vida (ou impedir que a vida lhe ganhe) que já vendeu sapatos nas lojas, remendou canalizações ou atendeu telefones nos TLP. Eu, por exemplo, limpei rabos e troquei arrastadeiras, o que me deu bagagem q.b. para porventura um destes dias me metamorfosear num escritor tremendo. Um escritor tremendo de frio. E de fome. Pois claro.

    De resto, o Saramago adquiriu o Nobel porque o sistema não é uma meritocracia, antes uma marketingcracia. Os prémios Nobel precisam de manequins para expandirem o seu branding.

    A escrita não deve ser, não é, um exercício de autismo. A este reserva-se o pensamento. A escrita é uma dádiva, um abrigo. E eu encontro dádiva e abrigo em muitos, muitos outros escritores portugueses que estão acima de prémios Nobel. Torga, Namora, Sophia e Ruben A., que fecha bem o rol com “Silêncio para Quatro”.

    Até já.

  9. Mister joaopedrodacosta, os gaijos que estudam o resultado da criaçao não seriam nada sem os criadores. As escolas deviam servir para ensinar a escrever, ou não? Tenho pena é que as escolas sejam más e que se invista tanto dinheiro em tantos milhares de estudiosos da criação, que têm os seus certinhos chorudos salários, enquanto os criadores, os gaijos que realmente importam, andem muitas vezes na penúria. Parece-me que a coisa anda bastante invertida. É só isso.
    Eu sei que tu tens a mania que percebes de música, mas acho que é só mania! Não fazes cá falta nenhuma!
    Vá.

  10. Luís: isso era uma resposta ao meu comentário? Não parece. É que os «catedráticos da literatura» não têm como função «ensinar a escrever», essa nobríssima tarefa está reservada a outros profissionais. A sua função é de dar ferramentas para os seus alunos reflectirem sobre o fenómeno literário, nada mais do que isso. É mais uma confusãozita que terás de resolver nessa tua cabeça.

    Mas gostei da verve fôfa do último parágrafo. Quero mais.

  11. Mister joaopedrodacosta, não há cursos de engenharia da literatura portuguesa onde se possa ensinar a escrever uma obra prima, sabes bem disso, é impossível.
    O que eu queria dizer é que as escolas não deveriam afastar o pessoal com talento, os tais criadores, que as escolas deveriam fazer o possível por incluir os criativos, porque para escrever também é preciso saber algo do que os outros fizeram antes.
    Imagina que nas faculdade de física e química só poderiam ser admitidos os gaijos que queriam estudar a história da física e da química e não haveria lugar aos criativos e à criação de nada. O mundo iria parar completamente!
    Imagina que das escolas de música só saem críticos musicais ou pianistas e violinistas clássicos. Que é que acontece ao rock? Merda, só saem músicas com 3 acordes! É por causa destas tipo de merdas que o Saramago ainda não sabe por as vírgulas.
    Eu não tenho confusãozita nenhuma na cabeça, eu estou é muito mais avançado no tempo do que tu, é por isso que não me compreendes! Mas eu percebo isso, não se pode esperar muito de um gaijo que queria ser músico e acabou em crítico musical (eu não sei se tu és mesmo crítico profissional, espero que não, sei que tens a mania de mandar uns bitaites, mas ainda não te vi recomendar nada de jeito, nada!)!

  12. âncio,
    não, não estavas distraído, não chegou a acontecer, de facto.
    mas diga-se de passagem que foi só desta vez, porque toda a gente sabe que é costume e regra louvar o génio em vida e não depois de morto.
    (só por curiosidade, estes dois são dos tais críticos em que te estribas por hábito quando te zangas comigo na rejeição à rejeição sumária do ‘rio das flores’? não te zangues com a provocação, pá, mas em que mundo é que vives, pá?)

  13. “Gaijos”?… “Gaijos”!?!?!

    “Nobríssima”?… “Nobríssima”!?!?!

    Estarão os Peixinhos Vermelhos fora de validade… Ou serei eu que preciso de ir à FNAC comprar um novo dicionário?

    Luís, isso de não haver cursos de engenharia da Literatura que ensinem a fazer obras-primas é uma refinada mentira. Assim de cabeça (do mindinho) precipitam-se-me pelo menos duas: o Bacharelato de Jornalismo Pivoteado; o Curso Superior de Carreira Futebolística. Para não falar da cadeira Bigbrotheriana no Curso de Arquitectura da Lobectomia Superior.

    Confesso que só lhes conheço as obras. Mas não enjeito que me forneçam os telefones das primas. Também se costuma dizer que há quem confunda a obra-prima com a prima do mestre-de-obras.

    A propósito de música, a lista aqui no Aspirina anda pobrezita… rala de imaginação.

    Até já.

  14. Ruizinho,

    Esses dois não são nada os críticos em que me estribo por hábito quando me zango comigo. (A propósito: isso chegou a acontecer?) Nem um nem outro me parecem muito atreitos a criticar ficção, e quando o fazem fazem-no em código.

    Eu sou mais pela legibilidade.

  15. Luís, repito: o que se aproveita são os últimos parágrafos em que me insultas. Estás tão avançado no tempo que prometo responder-te daqui a 59 semanas.

    Renato C: tava a ver que ninguém mordia o isco. O teu esforço para ter piada é patético e comovente. Vá lá isso.

  16. O Luiz Pacheco era o sacana às claras. E é esse o seu maior mérito. Escrevia bem , divertia , mas humanamente era execrável. Fez sofrer mulheres ( todas de um tipo muito especial , quasi analfabetas-nunca teve uma Simone ou coisa parecida , o que é muito significativo) e os respectivos filhos ; dizia mal à boca cheia de quem lhe dava esmola. A bem dizer era um “palhaço” intelectual que teve a vida que escolheu ( como ouvi dizer a alguém que o conheceu bem).E pronto , a gente ri quando lê o Pacheco , e rir faz bem. Mesmo agora , quando as cenas sexuais que o fizeram famoso já perderam mais de metade do interesse, é um prazer ler a prosa asneirenta do Pacheco.
    E como editor , também era bom.
    Mas não era excelente como o Aquilino ( que não dizia asneiras e a quem quase ninguém liga, mas que é um escritor que pode formar carácteres), mais bem um equivalente do Bocage ou do Vilhena

  17. Mister joaopedrodacosta, quem começou os insultos foste tu, sempre com essa mania de que és mais esperto do que os outros, eu só dei o troco, e nem foi muito. Essa coisa de tentar abafar opiniões a chamar burro aos outros é muito fácil, eu também a conheço.
    Até à próxima!

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