Ventura, um político com raça

Se interrompermos a marcha a transeuntes escolhidos ao calhas para lhes perguntar “Conhece João Marques de Almeida?”, mais de 99% irá responder “Não faço ideia de quem seja.” Se de seguida perguntarmos “Conhece João Miguel Tavares?”, perto de 99% irá responder “Sim, claro, faz parte daquele programa do Ricardo Araújo Pereira.” A separá-los, a radical assimetria na popularidade. A juntá-los, o labor mediático para normalizar o Chega e promover uma aliança com o PSD que permita ter um Governo para continuar a obra do passismo, ou coisa pior.

Neste exercício A marginalização do Chega ou o poder absoluto do PS?, o Almeida agita a fórmula: o Chega é só conversa, o inimigo da democracia é o PS! Dois meses depois, o Tavares imita-o ponto por ponto: Há algum perigo maior do que o Chega? Sim, o actual PS. A fórmula volta a ser repetida: Ventura diz umas porcariazitas, mas quem ameaça a democracia é Costa e o PS! Com Trump e Bolsonaro, a cassete foi igual, mutatis mutandis.

Os dois senhores estão na posse dos seus direitos cívicos, desfrutam de liberdade de expressão e possuem variegados interesses legítimos para quererem ter Ventura como ministro disto ou daquilo. A vida vai correr-lhes ainda melhor com o Chega a provar que compensa apelar ao medo, ao tribalismo e ao ódio — é nisso que apostam. Ao mesmo tempo, espalham uma cultura política onde tudo se resume a diabolizar os adversários e a usar qualquer recurso viável para destruir a racionalidade comunitária do debate político. No caso do Chega, para estes dois publicistas trata-se de validar seja o que for que saia do chunguismo de Ventura. Seja o que for. Eles apregoam que o cão ladra mas não morde, é um cordeiro com pele de lobo, no fundo Ventura é um excelente rapaz que anda a sacrificar-se em números de circo para livrar Portugal dos malditos e criminosos socialistas. O que tem as seguintes principais consequências:

1. Ventura dispõe de um aparelho mediático de grande alcance (pelo Tavares e parte do editorialismo) que relativiza, justifica e normaliza um discurso que instiga à violência. Começa por ser a violência verbal, transforma-se inevitavelmente numa violência emocional e simbólica, ambiciona constituir-se como violência política. E não só, o próprio Ventura já ameaçou passar à violência física explicitamente em diversas ocasiões, mostrando que a sua ligação à extrema-direita é bem mais do que apenas para gasto retórico.

2. Almeida e Tavares, ao fazerem a lavagem do Chega, anunciam que tudo o que já disseram ou venham a dizer sobre o BE e o PCP não passa de vácua propaganda. Quanto a honestidade intelectual, vale zero o que bolçam. Porque se admitem servir-se de quem despreza os direitos humanos e os ideais humanistas para alcançar o poder, então o paleio da ameaça esquerdalha fica reduzido ao ranger de dentes oligárquico.

3. Ao se permitirem cultivar imagens públicas onde brincam ao vale tudo, celebrando uma anomia selvagem em que só se vence pela força, esta parelha revela a sua paixão pelas ditaduras, pelos tiranetes providenciais que não se atrapalham com as “verdades” que têm de ser ditas e as porcarias que têm de ser feitas. O critério do que consideram excelência moral mede-se pelo poder, o poder dos seus. Sem acesso ao poder, sentem-se ameaçados pela democracia.

Quando se deu ao Tavares uma raríssima honra da República, colocando-o numa lista onde estão alguns dos mais ilustres portugueses, essa estapafúrdia decisão não passou de um deboche presidencial, o objectivo foi tão-só premiar um caluniador profissional antiPS numa altura em que estava em curso uma vasta e prolongada campanha para pressionar Ivo Rosa no julgamento da Operação Marquês. Mas se calhar Marcelo merece agora o justo reconhecimento de ter profetizado o que em 2019 ainda não era visível. Isso de o Dia da Raça ser realmente o palco mais adequado para o actual projecto político do fulano.

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Brinde:

10 thoughts on “Ventura, um político com raça”

  1. “Ao mesmo tempo, espalham uma cultura política onde tudo se resume a diabolizar os adversários e a usar qualquer recurso viável para destruir a racionalidade comunitária do debate político.”

  2. No caso da Ucrânia, para estes dois publicistas trata-se de validar seja o que for que saia do chunguismo da NATO. Seja o que for. Eles apregoam que o cão ladra mas não morde, é um cordeiro com pele de lobo, no fundo Zelensky é um excelente rapaz que anda a sacrificar-se em números de circo para livrar a Europa dos malditos e criminosos comunistas.

  3. 1. NATO dispõe de um aparelho mediático de grande alcance (pelo Tavares e parte do editorialismo) que relativiza, justifica e normaliza um discurso que instiga à violência. Começa por ser a violência verbal, transforma-se inevitavelmente numa violência emocional e simbólica, ambiciona constituir-se como violência política. E não só, o próprio Secretário Geral já ameaçou passar à violência física explicitamente em diversas ocasiões, mostrando que a sua ligação à extrema-direita é bem mais do que apenas para gasto retórico.

    2. Valupi e Viegas, ao fazerem a lavagem da NATO, anunciam que tudo o que já disseram ou venham a dizer sobre o BE e o PCP não passa de vácua propaganda. Quanto a honestidade intelectual, vale zero o que bolçam. Porque se admitem servir-se de quem despreza os direitos humanos e os ideais humanistas para alcançar o poder, então o paleio da ameaça esquerdalha fica reduzido ao ranger de dentes oligárquico.

    3. Ao se permitirem cultivar imagens públicas onde brincam ao vale tudo, celebrando uma anomia selvagem em que só se vence pela força pois recusam qualquer tentativa diplomática de negociar a paz, esta parelha revela a sua paixão pelas ditaduras, pela justiça das monarquias absolutistas, pelos tiranetes providenciais que não se atrapalham com as “verdades” que têm de ser ditas e as porcarias que têm de ser feitas, em suma, pelo Império. O critério do que consideram excelência moral mede-se pelo poder, o poder dos seus. Sem acesso ao poder, sentem-se ameaçados pela democracia na Ucrânia em 2014 ou nas regiões separatistas desde essa altura.

  4. É uma evidência que (com ilustres excepções, odiadas, aliás, por este blogue) o PS foi sempre, desde a sua fundação, um bando de burgueses videirinhos (na melhor das hipóteses) ou de bandidos (na pior, com destaque para o sociopata venerado neste blogue), que usa o paleio do “humanismo” e do “socialismo” para arranjar empregos para a família e negócios para os amigos, tirando partido do medo, da miséria, da ignorância, e da falta de oportunidades deste país, em que dois terços das pessoas depende da gamela do estado para sobreviver. Em suma, o PS é o continuador, no paleio, nos métodos e nos resultados, da obra dos “democráticos” da República (só falta o colapso do regime democrático, que virá no dia a seguir a faltar o cheque da UE). Qualquer dúvida que existisse acerca da natureza do PS, acabou no dia em que, por absoluta fome de poder, o A. Costa do século XXI, tendo perdido as eleições mais fáceis de ganhar da nossa história democrática, se juntou àqueles que na véspera apodava de extremistas (os “Venturas” da altura), para formar um governo, com toda a seita a gabar-lhe o “génio político” (com ilustres excepções, odiadas, aliás, por este blogue). Escandalizar-se perante a hipótese de o PSD de fazer exactamente o mesmo, não passa de mais um exercício de refinado cinismo, como é dizer que o Ventura “já ameaçou passar à violência física” quando quem esteve para bater num velhote qualquer foi o A. Costa, e quem bateu mesmo, e a sério, no Assis foram os próprios militantes do PS (aliás, não foram os detractores do PS “quem se mete com o PS leva”, foi um figurão da própria seita). A única coisa que espanta é como precisámos de quase três décadas (contadas desde o livro do Rui Mateus) para ver, ouvir e ler artigos que afirmam claramente a natureza deste PS e tiram daí as devidas conclusões para o futuro da democracia portuguesa.

  5. altamente…assassinaram o assis e seguro por não haver certezas sobre eles respeito a gamelas e negócios.

    (escreves para pessoas que vivem em Portugal, certo? ó pá, lamento informarte, mas estamos a par da situação “deplorável” de grande parte da população; também sabemos que o ps governa ininterruptamente desde 2015 )

  6. muito bom , esse port dos ladrões.
    e sem dúvida que o diagnóstico de falta de casa é fraudulento. segundo os censos do ine de 2021 existem , 5,9 milhões de fogos e 3,5 milhões de edifícios clássicos. ora , dividam 5,9 milhões de fogos por 10 milhões de habitantes…dá menos de 2 habitantes por fogo , nos habitantes incluem-se as criancinhas e os idosos em lares. falta de casas não há mesmo.

  7. Costa deu uma bofetada ao passismo e ao cavaquismo e ao marcelismo e aos chungas e aos azeiteiros e aos racistas e aos xenófobos e aos homofóbicos e aos putinistas com a sua maioria absoluta que está contínua e constantemente a ser boicotada. mas Costa, sendo o melhor entre os medíocres e péssimos e execráveis, é resiliente e esperto e conta com a ajuda dos que denunciam a raça do ventura, esse cretino abominável. e com a minha também, pois claro, no que depende de mim desfaço-o até aos tendões da verdade e da razão.

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