Saudades do Abril futuro

«O que faltou dizer a Marcelo e a Santos Silva é que as ameaças ao tempo, às regras institucionais, à necessidade de uma “respiração pausada” ou ao pluralismo vêm em grande parte do Governo. O caso TAP, a impunidade dos poderosos e o estilo pasmaceiro e complacente de António Costa não justificam a histeria do Chega, que se estendeu a uma parte do PSD e à nova liderança da IL ou à imprensa — a histeria do Bloco é outra coisa. Mas se não responsabilizarmos o Governo pela degradação da política, pela erosão das instituições e pelo consequente fulgor do populismo, estaremos a fugir à realidade.»

Manuel Carvalho, 25 de Abril de 2023

Este fulano, então ainda director do Público, termina com o parágrafo acima mais um dos caudalosos editoriais sépticos despachados ao longo de 5 anos. Porquê ir buscar a sua prosa inane, na solenidade dos 50 anos do 25 de Abril, de que ninguém se lembra nos poucos que a leram, nem o próprio autor? Por causa da liberdade, essa forma de viver que nos humaniza infinitamente.

Passou um ano. O Governo socialista foi alvo de uma golpada judicial, o Presidente da República aproveitou-a para dissolver uma maioria absoluta no Parlamento, as eleições deram ao Chega uma vitória estrondosa em número de votos e de deputados, uma AD de fancaria foi à rasca para S. Bento mostrar a sua encardida incompetência, e o tal Presidente da República, que anda há dois anos a exibir-se como pessoa cognitivamente diminuída, acaba de pedir ajuda urgente do foro neurológico e psiquiátrico. Comparemos com a lista do valente Carvalho: o “caso TAP” (está só a falar do Galamba, vítima de um taralhouco e da exploração mediática e política que se seguiu), a “impunidade dos poderosos” (quais poderosos? qual impunidade? que tinha o Governo anterior a ver com isso?), o “estilo pasmaceiro e complacente de António Costa” (ou seja, a responsabilidade, ponderação e confiança de Costa como governante, a que se junta o seu exímio sentido de Estado). É isto que tem o topete de invocar como causas do “fulgor do populismo”. Não contente, ainda lava as mãos ao dizer que a “histeria do Chega” se estendeu à imprensa.

A “histeria do Chega” nasceu na imprensa, a partir de 2004. E teve no Público um dos órgãos mais “histéricos” na promoção do populismo de extrema-direita, logo em 2007, na sequência da OPA falhada que a Sonae lançou à Portugal Telecom. Um dia depois da votação na assembleia-geral da PT, literalmente, José Manuel Fernandes (o qual tinha interesses acionistas na operação da Sonae) iniciava uma campanha negra contra Sócrates, e contra o PS, que nunca mais terminou e a qual apontou aos pilares da República. Em 2009, o mesmo Zé Manel lançou a meias com Cavaco a Inventona de Belém. Em 2013, foram buscar o João Miguel Tavares ao Correio da Manhã, com a ostensiva intenção de lhe dar um palco supostamente mais credível para a sua actividade de caluniador profissional. Ainda em 2019, o bravíssimo Manuel Carvalho inventou isto — Citizen Karvalho — em que chafurda numa alucinada teoria da conspiração lançada pela direita após a crise internacional de 2008, quando os seus bancos começaram a cair. O Carvalho fez uma manchete em que trata Vítor Constâncio como mafioso do que seria o crime do século, mesmo do milénio, em Portugal e na Europa. O pânico celerado, pois não tinham quem fosse competitivo face a Sócrates, deu azo à utilização da Justiça, em conluio com a imprensa, para tentar destruir politicamente os socialistas num inaudito vale tudo, inclusive com recurso a incontáveis e normalizados crimes. O Carvalho vestiu essa camisola, nisso sendo apenas mais um no ecossistema da imprensa nacional que está toda, sem excepção, nas mãos das direitas. O milhão de votos no Chega não seria possível sem o efeito decadente e pestífero produzido pelos jornalistas portugueses com poder editorial, e seus apaniguados, há já duas décadas.

A democracia permite os ataques à democracia. A liberdade que começou com o 25 de Abril, portanto, nunca está plenamente realizada. É por isso mesmo que precisamos de a festejar. Para nos recordarmos do nosso futuro.

9 thoughts on “Saudades do Abril futuro”

  1. Concordo em Portugal não existe jornalismo já que fazem opinião, formatam opiniões ,
    como esse.Carvalho que tem palco devido aos seus patrões do Norte do país do mais retrógrado que existe eles pagam e ele.faz o trabalho sujo mas, as redacções de jornais e.tvs
    estão pejados dessa gente que mente com desfaçatez e depois recebem o prémio tal Bugalho .

  2. Parabéns valupi, era difícil um post mais de fação. Festejar e lutar pela liberdade que assegure o “Nosso Futuro”.

    Está aqui muito bem representado o que de pior tem o 25 de abril e algumas das razões que trarão alterações ao “nosso futuro”, quer “queiramos”, quer não. Emendem-se ou assumam culpas.

    E pare lá com isso do golpe judicial, o governo derrubou-se sozinho durante bastante tempo e imolou-se por Lacerdas, Escárias e afins.

  3. Já agora, com tanta comoção que ai anda com a pêga (comparo-o ao pássaro) e as suas diabruras, não vos vi durante oito anos fazer outra coisa que não fosse usufruir e alimentar a cabeça de vento do maluquinho. Foi, orgulhosamente, o vosso candidato ao 2º mandato. Agora descobriram que o Mergulhos afinal é um perigoso estratega que veio ao mundo para destruir o PS. Tenham calma, nem o PS é tanto, nem o Marcelo tão pouco.
    Preparem-se mas é para saber estar, quando for preciso tomar posições sérias a que estão obrigados. Ou parece-lhe que não vêm ai consequências de conversas de reparações e outras anormalidades?

  4. que paciência , gpd. temos pena , mas o único grande feito do zezito , um vanguardista , foi alimentar o chega a biberon vitaminado e pôr-nos ao lado dos outros países europeus como a espanha , a holanda e a frança…todos hoje com partidos populistas populares como a vox , lixando o monopólio dos partidos populistas chiques como o be ou o ps.

  5. e que o Abril futuro, a começar já amanhã, faça os deputados no parlamento bravos e corajosos – fazendo uso dos mecanismos que têm ao dispor -, para honrarem, com liberdade, a democracia quando estão ao seu serviço, e serviço assalariado muito acima da média, nisto de combater os golpes na democracia. podem começar pela recente facada no António Costa. obrigada.

  6. 50 ANOS. Comemorações caricaturais. Farsa.

    Farsa horrível desde logo pela multidão de atores participantes e muitas “personalidades” referenciadas.

    Na assistência… , um desmazelamento arrepiante, mormente alguns obreiros, já velhotes, da democracia que, receosos de não figurarem na HISTÓRIA, vivem conformados e acomodados às recentes golpadas e à canalha que acedeu à gestão da vida pública e da comunicação e da justiça.

    Apetece-me fazer um destaque, de alguém que toda esta gente decidiu lançar nas catacumbas da HISTÓRIA, que talvez um investigador Mineiro, no futuro, venha a desenterrar para o erguer na sua dignidade, ponderação e sabedoria políticas.

    https://cdn-images.rtp.pt/arquivo/2021/03/melo-antunes-1.png?ixlib=php-1.1.0

    (Sobre o Carvalho, do jornal de que sou assinante, há uns tempos que não o leio. Deixei-lhe essa mensagem de desprezo na caixa de comentários)

  7. Excelente postada!
    Não pelo MC que é uma vacuidade com a qual não vale a pena perder tempo, mas por colocar em perspetiva, por sistematizar, uma série de interferências ditas “jornalísticas” que nos lembram para que servem os órgãos de comunicação social, de há muitos, muitos anos para cá.
    Hoje por hoje os OCS não são mais que megafones e montras da direita e extrema direita, ou como se dizia antigamente, não passam de aparelhos de “agitprop” direitola.

  8. “Se fosse o meu neto mais velho e preferido, com 20 anos, eu sentir-me- -ia corresponsável. Mas, com 51 anos, é maior e vacinado”

    o presidente da república alugou uma sala e pagou um jantar de 4 horas, no vila galé opera, em vésperas do 25 de abril, a 30 trinta jornalistas nacionais e estrangeiros, para chamar saloio ao primeiro-ministro em funções e monhé ao cessante. de caminho excomungou a família que lhe restava para salvar a pele num imbróglio influências e abuso de poder.
    e assim vamos gastando o orçamento da presidência em cenas da vida privada, intriga e vingança, com representações de taberna e fralda de fora, acompanhado de assessora e segurança oficiais. entrou na fase que já não se distingue se é punheta ou parkinsson.

  9. “para chamar saloio ao primeiro-ministro em funções e monhé ao cessante. de caminho excomungou a família que lhe restava para salvar a pele num imbróglio influências e abuso de poder.”

    E de caminho, porque é uma pêga que não consegue estar calado (sempre foi um desbocado sem controlo armado em brilhante – não fosse a degradação institucional que o descrédito da figura tem, não tinha um pingo de pena, mas é mais um belo exemplo do “regime”): “Há ações que não foram punidas e os responsáveis ​​não foram presos? Há bens que foram saqueados e não foram devolvidos? Vamos ver como podemos reparar isso…”. Parvalhão, peço desculpa, mas não tem outro nome.

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