Era giro vivermos num país onde um partido da oposição, um qualquer, não descansasse até obter as seguintes respostas.
Esta história da maçonaria só serviu para uma coisa: para se deixar de falar da maior rebaldaria, de uma rebaldaria gigante, que se passa nos serviços secretos portugueses, no SIS e no SIED e tudo o mais. Porque isto serviu para que nós não falássemos no seguinte:
Porque é que o Sr. Primeiro-Ministro, depois de saber aquilo que soube, manteve as pessoas nos seus cargos? Porque é que as pessoas que denunciaram os procedimentos errados, e toda essa rebaldaria que se passava no SIS, foram afastadas e os tipos que foram responsáveis por esses disparates se mantiveram? Porque é que o Jorge Silva Carvalho, um indivíduo que se mostrou que, alegadamente, andou a traficar segredos de um lado para o outro, esteve a poucas semanas, por um fio, de ser o director-geral do SIS e do SIED, um tipo que fazia este tipo de situações? Porque é que o Ministério Público não faz nada? Do que é que está à espera? Porque é que ninguém actuou em relação à fiscalização? O que é que é feito da sindicância aos serviços de informação, depois do Marques Júnior e do Jorge Bacelar Gouveia terem dito coisas do género “Bom, a gente quando quer saber alguma coisa daquilo, telefona para lá e diz que vai lá no dia seguinte ver os computadores…”? Como é que o Primeiro-Ministro conseguiu pactuar com os relatórios internos que não passavam de histórias da carochinha?
E não carecia de ser um partido com representação parlamentar. Podia ser o MRPP, ou o MEP, ou o PPM. Ou partidos ainda mais esconsos, como o Partido Humanista, ou o Partido Trabalhista, ou o Partido Liberal-Democrata. Até partidos já desaparecidos, mas ressuscitados para esta causa, como por exemplo o Partido Comunista Português (reconstruído), ou o Partido da Solidariedade Nacional, ou o Partido da Gente. Raios, até um fantasma que invocasse ter militado na União Nacional Republicana, ou na Federação Anarquista da Região Portuguesa, ou na Cruzada Nun’Álvares servia.
Escreve, Valupi, enquanto não te silenciam, que não deve faltar muito.
Os espaços onde se pode ainda desmascarar o poder negro e vil que minou as instituições da República, poderão ter os dias contados. Já reparaste, com certeza, como foram “esquecidas” pelos microfones da rádio e da TV as vozes discordantes do poder ou das leis emanadas do poder. O que resta é um mísero arremedo do que existia até ao “5 de Junho” e apenas para simular o pluralismo na informação.
O que está a acontecer um pouco por todo o mundo e que em Portugal ganha contornos nítidos de uma forma despudorada e alarmante, porque largamente apoiada pelas “elites”, é a chantagem do poder económico-financeiro sobre aqueles que sonharam com a “pátria do cidadão”. E os chantagistas têm rosto e nome e nâo são, minimamante, os anónimos “mercados”. Mas é conveniente falar no anonimato dos mercados, para que ninguém possa apontar a dedo os belmiros e os soares dos santos, para falar só dos chantagistas caseiros. “Ou me dão os lucros que pretendo ou vou fazer negócio para outra pátria, que é a minha, a do menor imposto e do maior lucro”.
Mataram e enterraram a pátria do cidadão. E os assassinos têm rosto e nome e a sua intelectualidade servil defende-os e justifica-os de forma lapidar: o dinheiro não tem pátria.
O povo da iliteracia nem percebe o que lhe estão a fazer e colaca-lhes todo poder do voto nas suas mãos assassinas.
Com a cumplicidade empenhada dos magistrados, o que se vislumbra no horizonte é a entronização dos chantagistas. É o fim da pátria dos cidadãos. A ficção do cinema já fez o filme da multidão de excluidos, famintos e miseráveis, perseguidos e encurralados pelo exército de robôs saídos das suas fábricas automatizadas.
Esta ficção só será uma realidade se nos calarmos. O pior é se nos começarem a calar à força e de vez. Já faltou mais.
E eu que tinha tanta fé na humanidade humanista! Começo a perdê-la, quando aquelas nações que consideravamos as mais avançadas na ideia da pátria dos cidadão, se transformaram, passivamente, no refúgio dos chantagistas. A Holanda é um bom exemplo e o caso da Jerónimo Martins teve o condão de pôr a nu o verdadeiro patriotismo dos chantagistas do poder económico-financeiro. Que a intelectualidade sevil, transformada em criadagem fiel-assalariada, o tenha defendido acriticamente e com todas as forças só revela até que ponto vingou o idelal da pátria do lucro contra o ideal da pátria do cidadão.
Caro Mário,
Yo no creo en brujas, pero que las Hay, hay!
Gostei de ler o seu post, Mário. Nunca me passou pela cabeça que passados 30 e tal anos depois da madrugada libertadora do 25 de abril estivessemos a viver um pesadelo. Onde é que estão os indignados deste país, a geração à rasca, o movimento contra os recibos verdes, as manifestações de 200 mil ou mais professores, os sindicatos dos enfermeiros e dos médicos, os agricultores e as suas organizações, as várias comissões de utentes, os movimentos de estudantes contra o aumento das propinas, pela educação sexual nas escolas públicas, pela defesa do ensino e escola pública, por mais verbas para a ciência, investigação e bolsas, onde é que estão os reitores a exigir mais autonomia? Onde é que está toda esta gente, que no governo anterior não se calava e exigia sempre e sempre mais? Onde é que está? Tristes tempos estes.
Não deve ser por acaso que a ditadura salazarista durou 40 e tal anos.