O navio de George Clooney

Louçã — que quando for primeiro-ministro irá nacionalizar a GALP e EDP (para começo de conversa), arrastar os banqueiros por uma trela, proibir os despedimentos e, portanto, acabar com o desemprego em Portugal, e ainda substituir o capitalismo global por uma outra coisa que leu num livro que tem guardado lá em casa — é um piadista. Um piadista que se imagina chefe da oposição, e que se deita e acorda a pensar em Sócrates. A soberba apela à facécia:

Os assessores de comunicação, que lhe sugeriram este título de um filme de George Clooney, esqueceram de lhe dizer que n’A Tempestade Perfeita o navio de George Clooney naufraga, e não há nenhum sobrevivente.

Sócrates tinha usado a expressão tempestade perfeita como metáfora do conjunto de crescentes crises que marcaram a legislatura, começando com a crise orçamental e culminando na crise económica internacional que se abateu como um cataclismo. Louçã goza o prato. Ele olha para o Governo e vê inimigos, não concidadãos. Nada do que essas pessoas tenham feito, decidido, viabilizado, promovido, apoiado pode ser bom porque… veio deles, dos gajos do poder. A natureza do poder é radicalmente simples nas ideologias extremistas: se é dos outros, é diabólico; se é nosso, é santo. Por isso a cena do naufrágio aparece especialmente deleitosa para os bloquistas, precisamente porque ninguém se salva. A violência mal contida com que Louçã invariavelmente discursa, que o faz ser um exímio representante da moral presbiteriana, adoçou o tom apenas para projectar um desejo de morte. Daí a explosão de risota na sala. O prazer de imaginar Sócrates, ministros, secretários, assessores, dirigentes partidários e militantes a afundarem-se sem possibilidade de salvação, desaparecendo no abismo oceânico, encheu de entusiasmo os apoiantes de um Portugal onde os Reis de Espanha, ou o Presidente de Angola, não têm dignidade para serem recebidos no Parlamento. São estas as águas para onde nos querem levar, cantando e rindo.

Entretanto, e não sendo obrigatória a utilização de um assessor, haja alguém que diga ao Louçã que ele nunca será um Clooney. Demasiado canastrão.

12 thoughts on “O navio de George Clooney”

  1. De facto, é de um ridículo quase doloroso que raia, por excesso de proximidade, a total falta de credibilidade, esta postura arrogante (bem caracterizada pelo termo “soberba”) do discurso demagógico de Louçã… que sim, jamais chegará a qualquer coisa como “um Clooney” porque, além de “demasiado canastrão”, falta-lhe tudo: postura, atitude, seriedade e firmeza convincente… e tudo o resto – como é, por demais, evidente.
    Um abraço.

  2. Caro Valdemar Lucas Pinto (um excelente pseudónimo, não?), lamento permanecer lúcido mesmo no auge da tormenta, mas o facto é que o Louçã, na Oposição, dá cartas.

    Não tem rival em nenhum Partido (talvez o Mário Crespo lhe consiga dar alguma luta, mas é só a fingir…), não há “Pai” para ele. Tomara o P. S., se um dia for Oposição (espero que não), chegar aos calcanhares do Louçã! No Parlamento, nos “media” e no contacto directo. Palpita-me que umas doses de Milupa, ou Maizena, ainda poderão até vir fazer falta a muitos socialistas, a começar pela senhora dona Belém Roseira e outros que tais…

    Claro que, no Governo, Louçã correria o risco de ser pior ainda do que o Santana e o Portas, mas a verdade é que um bom defesa-esquerdo não tem que ser o melhor goleador da Equipa, e ver a política como uma partida de “bridge”, entre cavalheiros bem-intencionados, é coisa que o Louçã sabe muito bem ser tolice. A Direita ensinou-nos isso ao longo de Séculos, só o bonzinho do Guterres é que não aprendeu. Por isso foi tão longe…

  3. Uma ideia (ma, como são sempre as ideias, mas é o que temos),

    Deixem-se de merdas e façam uma campanha à esquerda, com um programa de esquerda democratica e pedindo co-responsabilização a um dos outros sectores da esquerda, e hoje em dia até podem escolher qual… Um programa que poderia ser, por exemplo, uma reforma efectiva do sector publico, baseada num pacto social (com os sindicatos, porque não?), para que ele passe a funcionar de forma satisfatoria (ou mesmo apenas de forma minima).

    Alguma vez existiu, em Portugal, tão obvia oportunidade de impôr responsabilidade à esquerda “dura” ? Nunca, digo eu. Na melhor das hipoteses, se os outros partidos recusarem, saem descredibilizados e vocês beneficiam do voto util. Na pior das hipoteses, têm um ou dois ministros do pc ou do bloco (escolham). Têm medo de quê, que eles façam uma revolução bolchevique na semana seguinte ?

    Em vez disso colam-se ao centro, tentando ganhar uns votos ao PSD, que esta obviamente de rastos. Para ganhar o quê ? Um governo minoritario e uma crise daqui a 6 ou 8 meses ?

    Parece inacreditavel que o PS não se preocupe em convencer os seus proprios eleitores, que, tanto quanto me lembro, são maioritariamente de esquerda… Assim não vão la.

  4. O combate político é assim… o BE arranjou um nicho de “mercado” com o alto patrocínio do PS. É uma espécie de câmara de descompressão para os descontentes do PS. Quando a pressão sobe muito o BE chaga aos 10% e fica com a “garganta” que lhe conhecemos hoje, mas toda a gente sabe o que se passa (alguns distraídos talvez não!). O tempo reporá a verdade dos factos. O pessoal do BE faz falta no panorama político português, assim saibam eles cumprir o papel que lhes foi atribuído pela História.

  5. considero tão absurdo que o Bloco e o PS não possam entender-se a propósito de um programa de governação que nem tenho palavras para a imaturidade deste país expressa nos seus partidos; mas do que percebo quem se retira declaradamente, à partida, de qualquer hipótese nesse sentido é o Bloco. Pois não leva o meu voto.

    já agora: palmas para estes,

  6. Caro Z o absurdo é uma realidade. Todavia, desde 74 este filme a que te referes
    já passou num cinema perto de mim e várias vezes em outros mais ou menos afastados. Tenho infelizmente que conviver com “… a imaturidade política deste país expressa nos seus partidos;…”, pois os únicos bens que possuo são alguns vasos numa varanda com vista para o Tejo e aí não posso cultivar o melhor azeite do meu tempo como Herculano, nem retirar-me para o Minho como o Sá de Miranda. Olha, resta-me o British Bar e a mesa do fundo.
    Queres melhor exemplo para sublinhar o que apontas que a impossibilidade de uma coligação à Esquerda em Lisboa? Há pessoas nessa mesma Esquerda que de uma forma autofágica vivem da gestão do impossível, coisa que a Direita não faz. Esta é a triste realidade e o absurdo a que te referes.
    Vou voltar para a leitura do D.Pedro V, da irmã Monica,e de uma biografia do Abd
    El-Kader, por dever de ofício. Desculpa lá o incómodo.

  7. amigo JAfonso, eu sei, aquilo é um desabafo, pode ser que água mole …, um dia …, mas até lá não levam o meu voto não.

    Não esqueças a fonte, no Calvário, ao domingo, a galinha (do campo) corada com esparregado,

    O D. Pedro V era um gajo porreiro, até mandou pôr uma caixa verde à porta das Necessidades para o povo apresentar reclamações. Tifo ou cianeto?

    para ti, aos pulinhos,

  8. Penso que o aqui foi comentado,traduz com muita clareza aquilo que seria o desejo de uma grande franja de eleitores que se identificam com uma esquerda que fosse mais coerente com a realidade política actual do nosso país, que se tornasse num solução válida e não no seu principal problema.
    Loução inicialmente foi uma lufada de ar fresco, pela inteligência e irreverência duma certa maneira de fazer política. Actualmente com o engrossar das suas hostes deixou-se corromper pelo poder tornando-se um factor negativo para esta esquerda, pela sua radicalização oficial de não permitir a formação de qualquer governo de esquerda mais moderada. A consequência será empurrar-nos para o vazio e mediocridade da nossa direita actual,com o único objectivo de a médio prazo poder aumentar o seu score eleitoral. Até lá continuaremos a adiar e a cromprometer irremediavelmente o nosso futuro.

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