Aqui, a esta estrambólica cena em que o maior partido da oposição, antecipado vencedor de qualquer eleição que lhe apareça pela frente e excêntrico inventor de estrambólicos presidentes da Assembleia da República, subitamente se vê isolado, desorientado e em implosão? A resposta tem um singelo nome: Sócrates.
Sócrates é o tipo de líder que o PSD daria tudo para ter. Encaixa na mitologia guerreira do baronato social-democrata como Aquiles na Ilíada. Como não o tem, o desejo transmuta-se fatalmente em ódio. À sempiterna conflitualidade do jogo político, junta-se um fenómeno que extravasa o campo ideológico ou programático e se consome em incontrolada pulsão destrutiva. Para a medíocre elite social-democrata, o confronto com Sócrates é por algo mais do que a ocupação do Poder – trata-se de uma luta desesperada pela auto-estima individual e a dignidade do clã. A simples existência daquele ser que os derrota sem piedade é insuportável, pesadelo agravado por eles não terem ninguém que lhe faça frente. Vai daí, se não o podem vencer, nem a ele se podem juntar, resta só a fuga para o exorcismo. Veja-se este magnífico exemplo, onde o esforço do gozo acaba por caricaturar e expor os opressivos limites racionais do gozador, mas uma peça que poderia ocupar com vantagem o espaço onde foram e são despejadas milhões de palavras, todas reduzíveis a uma infantilóide oração: Sócrates é mentiroso. A monomania, já com quatro ininterruptos anos de bacanal, vai aos poucos liquefazendo o cérebro a estas infelizes vítimas da sua própria impotência.
Pois bem, comecem já a armazenar conservas na despensa para o longo cerco. É que Sócrates, mesmo que saia do palco em 2011 seja lá por que razão, tem pelo menos mais 10 anos garantidos à sua espera na vida política (caso não se mude a Constituição para o evitar): quando quiser, chegará a Presidente da República. Nessa altura, alguns portugueses ainda estarão aqui. Exactamente os mesmos que daqui não conseguem sair.
Suspeito que Sócrates previu, com inteligência e a bem da eficácia, que seria Passos Coelho, ele mesmo, a desmascarar-se.
Sócrates poderia tê-lo desmentido aquando da abertura da crise, quando se apresentaram como vítimas de inaceitável desrespeito, referindo-se ao mísero, insultuoso telefonema na véspera da cimeira. Não o fez, e a única explicação que vejo é a determinação em levar o próprio a publicitar a mentira. Genial!
«O problema é que a mentira tem perna curta e por isso é mais fácil apanhar um mentiroso do que um coxo e numa entrevista com uma jornalista amiga ficámos a saber que Sócrates tinha reunido com Passos Coelho durante quatro horas, isto é, ficámos a saber que num dos temas mais sérios que se colocaram ao país nas últimas décadas Pedro Passos Coelho mentiu para obter benefícios políticos, para fundamentar uma crise política inútil e manteve essa mentira porque Sócrates não se comportou como o Bagão Félix e respeitou a confidencialidade da reunião»
http://jumento.blogspot.com/2011/04/umas-no-cravo-e-outras-na-ferradura_13.html
Esta liderança do PSD não consegue prever o “day after” (a bem dizer, nem o “minute after”das posições que toma: o plano ía só até à queda do governo. Mas continuam a portar-se como se do outro lado da barricada estivesse um zé maria qualquer, e não um dos maiores “animais políticos” de que há memórica cá na terra. Esta estupidez chega a ser aflitiva…quase dá pena.
Aí vem lobo:
Numa Aldeia qualquer havia uma família que se dedicava à exploração da criação da raça de gado ovina. José e Pedro, assim se chamavam os dois filhos de Aníbal. Desde a sua nascença, José era visto pelo pai como um indesejado, da cabeça de Aníbal nunca lhe saiu a ideia de que o primeiro filho devia de ser uma menina. Ideias malucas – dizia, Maria – sua esposa, onde se vê um homem, que se preze de o ser, no primeiro filho querer uma menina! Isso são coisas de mulheres – dizia-se na Aldeia – outros diziam, não é bem assim, olhem que está para nascer pessoa igual, este vale por dois.
Neste entretanto quem padecia era o José. Já não valia o ter de ir para o monte com o rebanho dos carneiros e estes eram em maior número e mais difíceis de guardar – por isso se chamavam carneiros – que o rebanho de ovelhas do Pedro. José não se manifestava, estava habituado a esta desconsideração, talvez um dia, quem sabe, venha a vingar-se do seu pai e de seu irmão Pedro.
Na Aldeia, comentava-se que tudo era derivado a que José era um pouco alheio à veracidade que por tudo e por nada gritava: aí vem lobo. Embora José fosse mais velho que Pedro, ambos se pareciam na voz, portanto não se sabia quem gritava. Como em tudo, há os prós e contras, essa aldeia não fugia a essa regra. Na certeza porém, a maioria, dizia que era o José que se prestava a esse tipo de atitude. Desde pequeno que demonstrava esses atributos. Nunca se rendia, desse para o que desse, ia sempre à luta. Dizia quem o ouvia, que tinha uma frase que ficou célebre na Aldeia: quem o comesse tinha de o cagar.
Pedro que era parecido com ele na voz mas no resto ficava a anos-luz, quer nas ideias, até havia quem o apelidasse de “vazio”, não ficava indiferente quando ouvia dizer que o irmão tinha falta de veracidade e até jurava – naquela Aldeia não havia telefone – que ele, raramente lhe dava conhecimento de qualquer acto.
Um dia ouviu-se na Aldeia a gritar por aí vem lobo. Como os aldeões tinham combinado, desde o último grito, que iam estar de atalaia quer num quer noutro, quando ouviram o grito já estavam em cima do acontecimento e depararam com o Pedro aos gritos, aí vem lobo, aí vem lobo, vão-me dar cabo dos carneiros. Quando viu o aglomerado de pessoas à sua frente, ainda tentou culpabilizar seu irmão mas, todos o ouviram gritar aí vem lobo, vão-me dar cabo dos carneiros, quando o que guardava era ovelhas.
O pai Aníbal sabedor de todas estas tramóias nunca chamava à realidade Pedro, parecendo que era o que queria. Aliás, dizia-se na Aldeia: tal pai tal filho.
Rectificação:
Onde se lê, ideias malucas – dizia, Maria – sua esposa. Deve-se ler. Ideias malucas – dizia Maria, sua esposa – onde se vê um homem, que se preze de o ser, no primeiro filho querer uma menina!
é mais fácil Socrates vir a ser presidiário que presidente.
Mas terá sempre o Valupi para lhe levar os cigarros à cadeia.
Manuel,
estas tuas fábulas são uma delícia :))
Valupi, genial a análise mordaz que faz do partido que deveria mostrar um mínimo de dignidade na crise interna que eles próprios agravaram!
Eu continuo a estar aqui a tomar a “nossa aspirina” todos os dias! Se não o fizesse, já teria “rebentado”, ao assitir ao quotidiano da tragédia que são os partidos – quer à direita, quer à esquerda do PS!
Será que estamos “condenados” a passar mais uma vez na nossa história pela tragédia de deitar fora o que nos é excepcional!?!
o meu comentário é para o Manuel Pacheco… muito bom o seu texto.
“Para a medíocre elite social-democrata, o confronto com Sócrates é por algo mais do que a ocupação do Poder – trata-se de uma luta desesperada pela auto-estima individual e a dignidade do clã. A simples existência daquele ser que os derrota sem piedade é insuportável, pesadelo agravado por eles não terem ninguém que lhe faça frente. Vai daí, se não o podem vencer, nem a ele se podem juntar, resta só a fuga para o exorcismo”.
Excelente observação! Os momentos de verdadeira loucura que parecem viver-se naquele partido de “farsolas” vêm daqui. Perderam a tramontana! A raiva e o ódio subiram-lhes à cabeça e estão a dar com os pobres em doidos.
Já se viu maior confissão de impotência perante a superioridade do adversário que esta de não terem vergonha de dizer publicamente: Não, com aquele menino não brinco!!!
Para o M.G.P.Mendes. Não tinha tomado consciência disso. Foi por isso delicioso tê-lo ouvido. É bem verdade. Esta diária toma da Aspirina B também a mim me ajuda a manter a sanidade mental no meio deste vendaval de irresponsabilidade e sacanice que varre o país!