Cofinados – I

«It is difficult to get a man to understand something when his salary depends upon his not understanding it.»


 

Upton Sinclair

 

A 24 de Dezembro, Fernanda Câncio informou numa rede social ter entrado na sua conta o valor de uma indemnização que o esgoto a céu aberto e cinco jornalistas tinham sido condenados a pagar-lhe por actos de difamação e calúnia. No dia seguinte, noutra rede social, repetiu a divulgação. Tratando-se desta jornalista, com a sua notoriedade, tal implica que todos os principais jornalistas e políticos em Portugal — dos patrões e editores da “imprensa de referência” aos dirigentes dos partidos com representação parlamentar e membros do Governo — tivessem nesses dias recebido a informação relativa ao acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa em causa, o qual confirmou a decisão da 1ª Instância. E tratando-se de atentados contra o seu bom nome e honra por mentiras ligadas à Operação Marquês, crucialmente por serem mentiras que inventavam diálogos atribuídos a supostas conversas privadas com Sócrates captadas pelas autoridades, esta confirmação da Relação de Lisboa tem, ou permite tirar, incontornáveis ilações e ponderosas lições para a comunidade jornalística e política. Donde, os ingénuos ficaram à espera que se publicitasse e discutisse com urgência e profundidade na comunicação social as questões suscitadas pela condenação. Esta é a segunda indemnização (!) que os mesmos pulhas lhe pagam por causa da perseguição que fizeram com o objectivo de destruir a sua reputação e prejudicá-la profissional e socialmente com o maior dano possível. Estamos a 7 de Janeiro. Que aconteceu, entretanto, a respeito?

Como qualquer um pode confirmar em segundos por busca no intervalo de tempo, quase nada é a resposta. Saíram duas notícias, duas. Primeiro no JN, dia 27, depois no DN, a 28. Ambas com uma enigmática característica: existem na edição em papel, nunca existiram na edição digital desses jornais. Portanto, não estão acessíveis para memória digital futura, não podem gerar comentários nem partilhas a partir desses órgãos. Porquê? Qual o critério? Não sei, mas sei que o alcance das mesmas ao ficarem presas no papel é o mais baixo possível, é residual, é absolutamente irrelevante.

No mundo da opinião, e que tenha apanhado, apenas Luís Aguiar-Conraria falou no assunto. Esse texto, bem-intencionado, meritório, apresenta também a sua curiosidade. O autor começa por declarar ser amigo de Fernanda Câncio, o que tem como primeira impressão aumentar a sua autoridade moral por via da honestidade exibida antes dos argumentos. Todavia, numa leitura final, após a digressão que em parte é acerca de si próprio, podemos questionar se ele teria tido a mesma atitude de defesa isolada de um alvo de assassinato de carácter da Cofina calhando não existir esse laço relacional e afectivo. Especialmente, quando a vítima foi apanhada no vendaval de calúnias ligadas à Operação Marquês e a Sócrates. Os 10 euros que tenho no bolso vão para a aposta na negativa.

A duplamente indemnizada, há meses, já chicoteou o silêncio cínico, cobarde, moral e politicamente cúmplice dos seus colegas de profissão e respectivos chefes e patrões, a que se junta o prolixo comentariado: Media livre de qualquer jornalismo. Acontece que, repetindo-se o fenómeno, tal sentimento de desilusão, desgosto e nojo deve ser estendido à sociedade inteira. Voltarei a esta miséria.

10 thoughts on “Cofinados – I”

  1. Sim. No que se refere a calúnias e maningancias mediático judiciais, Luis Aguiar Conraria tem exibido um critério para julgar Fernanda Cancio e outro para José Sócrates. É tema para algum discípulo de Freud aprofundar.

  2. “há meses, já chicoteou o silêncio cínico, cobarde, moral e politicamente cúmplice dos seus colegas de profissão e respectivos chefes e patrões, ”
    suponho que não havendo qualquer” laço relacional” positivo entre a senhora e os colegas ( na volta detestam-na) não se sentem obrigados a nadinha.

  3. Ah, outra vez a Câncio… uma das santinhas da casa. Como disse alguém, salvo erro o autor de uns livros sobre o 44, ou a Câncio é muito distraída ou é burra. O problema é que a sua profissão não é compatível com tamanha distracção, e basta lê-la para saber que não é burra.

    Torna-se assim difícil acreditar nela, o que é pena, pois entre o jornalixo que temos ela é das menos más. Sujou-se por férias, casas e ‘lifestyle’ de luxo: quem não gosta de tão boa vidinha? Não é certamente um jornalista – nem um ex-PM – que consegue pagá-la. Tudo parece claramente, rasteiramente banal: fechou os olhos, facilitou… e mamou no saque, porque a mama sabe bem.

    Ser-se indemnizado pela Cofina não prova inocência alguma: como já sabemos duas coisas podem ser ambas más; uma ser má não implica que a outra seja boa. Até o Farfalha, esse outro herói do PS, já foi indemnizado por ataques ao seu ‘bom nome’. Uma das especialidades deste país-bandalheira é a defesa do ‘bom nome’, sobretudo pelos bandalhos que jamais o tiveram.

  4. é tendenciosa. hoje uma cena : paquistaneses , violações , uk , bla bla , bla coitadinhos coitadinhos . musk . mau mau , homens brancos maus maus . -:) -:) tristeza, esquece que na suécia estão com o mesmo problema. tem um funil , com funil não se pode ser jornalista.

  5. Filipe, não sente palpitações de asas e sombras derredor de si?
    É que o seu repetitivo discurso pode atrair corvos que, a páginas tantas, frustrados, o devoram a si.

  6. «é tendenciosa»

    Convenhamos que não é um pecado raro, yo: quanta gente realmente isenta há por aí a escrever em jornais… ou em qualquer lado? Perante a ‘dissonância cognitiva’, como agora se diz, quase todos ignoram o que lhes convém ignorar – seja o mamão Trump, o gangster Putin ou, do outro lado, muçulmanos que maltratam mulheres, decapitam gays ou violam criancinhas.

    (Se vamos por aí, o que havia para dizer da Igreja… né, yo?)

    O caso da Suécia, uma das capitais do politicamente correcto, é um caso evidente da técnica da avestruz, a cabeça bem enterrada na areia. E tal como em Rotherham, ou no ataque em massa na passagem de ano de 2015-16, se não se consegue ocultar o assunto resta reduzir-lhe a importância. Tudo isto se resolvia observando a regra de ouro: uma trampa não exclui outra trampa.

  7. «Filipe, não sente palpitações de asas e sombras derredor de si?»

    Às vezes, Fernando, quando acordo com a cabeça dentro da gaiola da caturra. Também lhe acontece?

    E sobre a Câncio, o que acha – é muito distraída ou é burra? E todos os que no PS andaram anos ao lado do 44, os Bostas, beiçolas e Santos Silvas? Acha que são distraídos, cegos, burros ou grandíssimos FDP?

  8. (Se vamos por aí, o que havia para dizer da Igreja… né, yo?)
    sociologicamente deveríamos observar o ideal tipo ou a estrutura dos crimes sexuais e seus perpetradores ignorando o circunstancial.
    os homens têm um problema , sejam padres , treinadores , pais de família , parentes consanguíneos , pastores ( ai , as ovelhas ) , brancos , pretos , amarelos e albinos , novos , velhos ou seminovos , ricos pobres e remediados , feios bonitos ou nem por isso , casados e solteiros , hetero ou homos . -:) -:)

  9. Notas para o Filipe Bastos, que evidencia sinais de demência!

    Radicalidade da posição: o caráter inédito da declaração do Juiz Desembargador José Reis sobre a especial complexidade da Operação Marquês.

    José Reis não argumentou apenas que os indícios seriam insuficientes ou que havia fragilidades na investigação. Ele afirmou que os factos imputados pelo Ministério Público não existiam e que o processo é um vazio. Este tipo de declaração é incomum porque, mesmo quando juízes divergem, há normalmente um reconhecimento de que existem controvérsias ou interpretações distintas dos factos.
    Chegou a sugerir que investigar “o nada” não pode ser considerado complexo, o que vai além de uma mera crítica ao MP, atingindo o cerne da condução do processo.
    O voto de José Reis foi vencido por 2-1. As juízas Laura Maurício e Teresa Féria concluíram que havia indícios suficientes para justificar a declaração de especial complexidade, enfatizando a dimensão transnacional dos factos e a necessidade de cartas rogatórias, algo que contradiz frontalmente a posição de José Reis.
    É raro, num tribunal colegial, que um voto vencido adote uma posição tão diametralmente oposta à da maioria, sem qualquer reconhecimento da validade das suas argumentações.
    O juiz não se limitou a criticar a decisão sobre a complexidade; ele questionou a própria essência do caso. A posição de José Reis foi mais que uma discordância pontual – é um desacreditar completo do trabalho do Ministério Público e das fundamentações que sustentaram o caso desde o início.
    Ainda que possam existir paralelos com outras decisões críticas em processos mediáticos, a declaração de José Reis pode ser considerada inédita por algumas razões:
    -A forma direta e contundente: “Não há complexidade alguma em investigar o nada, o vazio.” Este tipo de linguagem é extremamente raro em declarações judiciais e contrasta com a habitual formalidade e diplomacia nas divergências entre magistrados.
    – A total rutura com a visão da maioria: não apenas discordou; considerou que a própria base do caso está ausente, um afastamento radical da posição da maioria das juízas, que viam uma complexidade real e justificável no processo.

    O juiz José Reis é honestíssimo!

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