À polícia o que é desta Justiça

Joana Marques Vidal anunciou a abertura de um inquérito por “eventual violação do segredo de justiça” resultante da publicação de supostas declarações de Ricardo Salgado e Hélder Bataglia ao serem interrogados pelas autoridades. Que se irá passar a seguir? Se o passado servir para prever o futuro, nada de nadinha de nada. Ocasião para fazer perguntas:

– Quantos inquéritos já foram abertos por violação do segredo de justiça na história do Procuradoria-Geral da República?
– Onde é que se podem consultar os resultados? Existe tratamento estatístico dos resultados?
– Quantos inquéritos conseguiram identificar os responsáveis pelas violações?
– Se algum inquérito alguma vez conseguiu identificar algum responsável, ele chegou a ser punido? Se sim, de que forma?

Esta problemática não tem no sistema político, na arena partidária e na comunicação social qualquer paladino, apesar dos fogachos deste e daquela. A sociedade portuguesa convive amansada e risonha com este tipo de crimes. Aliás, esta particular actividade criminosa está institucionalmente aceite como vantajosa para os poderes fácticos, pois algumas das violações são de imediato integradas – ou seja, lavadas, como se faz ao dinheiro ilegal – no ecossistema mediático. É assim que vemos o Ricardo Araújo Pereira ou o Paulo Baldaia, para dar dois exemplos que chegam e sobram, a usar o resultado dos crimes alheios nas suas actividades profissionais, sancionando-os como social e culturalmente legítimos. Ou seja, há muita gente a ganhar dinheiro com a actividade criminosa dos criminosos que pertencem aos quadros da Justiça portuguesa.

Quando calha falar-se do assunto e na conversa aparece um representante dos magistrados do Ministério Público, ouvimos sempre a cassete onde a culpa é dos arguidos, através dos malandros dos advogados, e onde os procuradores é que ficam a sofrer, coitadinhos, por causa desses segredos derramados na via pública. Claro que tal também pode acontecer, mas o problema não está aí seja pela quantidade ou relevância. O que está em causa é uma prática onde aqueles a quem pagamos para defender e aplicar a Lei a estarem a infringir impunemente. Isto é, não só os crimes são cometidos por agentes de Justiça mas ainda por cima acabamos a ser gozados por quem devia estar na linha da frente do combate ao que é um escândalo que põe em causa o Estado de direito. Porque é simples: se os crimes de violação do segredo de justiça se repetem sistematicamente – como a “Operação Marquês” é disso o exemplo supremo – então os criminosos em causa sabem-se completamente protegidos para repetir quando e como quiserem as acções ilegais. E se cometem estes crimes tão públicos, os quais igualmente envolvem a cumplicidade de jornalistas, sem o mínimo receio de serem apanhados, que outros crimes não cometerão lá onde nem sequer precisam de ajuda de colaboradores externos e a coberto dos holofotes mediáticos?

Perante esta realidade, que talvez até tenha repercussões em matérias de segurança nacional, assistir ao silêncio dos nossos representantes políticos, da chamada “imprensa de referência” e da sociedade em geral resulta numa lucidez implacável onde todos os poderes estruturantes da vida comunitária surgem unidos numa coreografia farsante e torpe.

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20 thoughts on “À polícia o que é desta Justiça”

  1. e agora o Ricardo Araújo Pereira dizia assim: ah, pois, e tal, sorte grande a nossa termos uma Justiça transparente e sem segredos. :-)

  2. jpferra
    6 DE MARÇO DE 2017 ÀS 14:21
    eu diria muito bem 2 vezes, ficas satisfeito básico?

    JRodrigues, o papagaio da ordem-que-é-o-da-Ordem dos Papagaios está a falar contigo?
    (ou isto é um eco, ou a chuva, ou o vento, ou ou, Valupi?)

  3. Contumaz
    6 DE MARÇO DE 2017 ÀS 14:33
    EXCELENTE!
    Mas eles não têm vergonha nenhuma, todas as castas são assim.

    Valupi, é mesmo o que há qu’isto não dá para mais.

  4. Ninguém fala na PJ…ninguém fala na PJ….e os jornalistas…bem, diga-se que o “expresso” até indica as suas fontes…

  5. A Dra Maria José Morgado já explicou o fenómeno na televisão. São os arguidos que o violam só para descredibilizar o Ministério Público.

  6. Parece que há um medo surdo-mudo nos políticos no activo em meter-se com a injustiça da actual justiça. Será que todos têm telhados de vidro e sabem que os vidaleiros e vidaleiras do MP sabem disso e têm tudo esmiuçadamente organizado e arquivado para uso em momento adequado!
    Realmente o abuso, evidente e flagrante no caso “marquês”, do MP para usar a justiça como meio corporativo poderoso e legal para cometer ilegalidades de ajustes de vingança poliítico-pessoais, já merecia que alguém com um mínimo de dignidade democrática e moral levantasse a voz contra os mascarados de balança na mão que atacam a Cidade contra quem a defende.
    Caso, durante muito mais tempo vozes sábias e respeitáveis, não se revoltarem e denunciarem tal estado doentio desta “justiça” a Democracia portuguesa será tomada por golpe institucional e implantação de uma juristocracia que fará justiça caso a caso a seu belo prazer de amizades e compadrio.

  7. «esmiuçadamente organizado e arquivado», …?

    1. Não te supunha fã dos Gatos Fedorento, quem diria?
    «Estiamos Runtos!», olha aqui a performance de um engraçadista aos 2:11!

    Aqui: https://www.youtube.com/watch?v=dvm2nhd-KtY

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    «contra os mascarados de balança na mão que atacam a Cidade?, …?

    2. Não te supunha fã da Olinda, quem diria?

    _____

    «juristocracia», …?

    3. Muito bem, melhorzinho.

  8. Ah, repara José Neves que eu não senti necessidade de dizer um “engraçadista” e o RAP.
    (mas pode subentender-se, nomeadamente na tua cabeça)

  9. O texto muito bom, depois dum bom almoço venham umas boas sobremessas ( comentarios). São bons comentarios, boas risadas ( um galego diria risotadas), graças a Deus.
    Sempre recordo nos anos que ando ” aspirinando” um animador dançando por cá. O atual de plantão é dos melhores. Breve e incisivo. Será pago, será de borla?

  10. quem for fâ da Olinda, aeiou, não o pode ser também do RAP. ora essa!

    (eu sou muitíssimo mais inteligente e engraçada, carago, além de cair nas graças dos deuses) :-)

  11. Pois é, Olinda, mas quem é que escreve umas cenas daquelas sobre o «esmiuçadamente organizado e arquivado» com a confusão a que já nos habituou?
    O ilustre José Neves, pois claro!!

    esmiuçados = Gatos Fedorento
    cidade = Olinda

    Ou seja,
    cidade + esmiuçados = Olinda + RAP
    (aqui ficas a par, está por ordem alfabética e tudo)

    _____

    Aliás, começa aqui a notar-se um outro padrão que é uma coisa que, tal como os editoriais do Libération que eu lhe vou dedicando, ao Valupi e `Penélope [aqui, relembre-se: https://aspirinab.com/penelope/pouca-uva/#comments ] interessará também ao Meirelles por supuesto:

    amar ≠ saber ler = o Valupi refere-se sempre à Polis, aportuguesado para o redondo vocábulo a Cidade por ti.

    Sabe-se que «o Amor é cego», de facto.

  12. aeiou, confesso que percebi nadinha da tua mixórdia de temáticas. :-) caso queiras, explicar eu ouço.

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