Bárbara e Miguel

Quando a expectativa do sentido da decência não o deixava prever, a Direção do jornal Público decidiu especificar os termos da chantagem de Miguel Relvas, a saber, que este divulgaria na Internet, caso Maria José Oliveira o continuasse a incomodar com perguntas sobre – ou até a investigar – as suas ligações e interações com elementos ou ex-elementos dos serviços secretos, a informação de que a jornalista vivia com um conhecido membro de um partido da oposição. Até aí, os comunicados da Direção ficavam-se, discretamente, pela referência à divulgação de “dados sobre a vida privada da jornalista”. Hoje, li no DN que a jornalista em causa e toda a redação do Público ficaram revoltadas com a decisão da Direção, que não consultou para tal nem sequer a interessada. Pergunto: o que terá levado Bárbara Reis a dar o salto para a especificação dos referidos dados?

Segundo fator de estranheza: disse posteriormente a Direção do jornal Público que a ideia (acusação?!) de Miguel Relvas de que a jornalista vivia com um homem da oposição era falsa. Mais uma vez, porquê? Qual o interesse?

Em ambos os casos, parece-me estarmos, por um lado, perante mais um enorme desrespeito pela privacidade da jornalista e de um abuso e, por outro, perante um favor descarado a Miguel Relvas. Então não é que a populaça ao ouvir que se tratava de um membro da oposição é levada a pensar que Relvas tem razão? Pois é! Olha a descarada! A gente para quem o PSD fala enquanto atira areia, é assim. Serve-se-lhes o que eles querem. E querem o que são orientados a querer por gente de maus princípios e baixo nível. Um circuito fechado.
E, dois dias depois, ao dizer-se que afinal o homem estava enganado, que a afirmação era falsa, o objetivo é ou não que a dita populaça o transforme imediatamente num pândego, num pobre diabo, que se exaltou num momento de irritação e que nem os espiões ao seu dispor sabe usar como deve ser? Ai Público, ai Bárbara. O recurso para a ERC dá tempo para estas coisas.

Ouvi ontem Carlos Amaral Dias e Daniel Proença de Carvalho sugerirem, sintonizados, que os jornais portugueses, em nome da clareza para com os leitores, deviam declarar a respetiva orientação política. Como o Le Monde, o Libération, o Guardian, a The Economist, o El País, o El Mundo e tantos outros. É uma bonita sugestão, porém com um pequeno senão: quereríamos mesmo confirmar o que já sabemos? Em Portugal, só há uma orientação. Basta olhar para os proprietários dos meios de comunicação social. Quando rebentam escândalos na direita, são guerras de interesses intestinas ou crimes de tal maneira graves que é impossível ninguém falar neles e os jornalistas entram na dança (também querem vender). Ainda que depois haja uma agitação medonha para os branquear. Hoje em dia é necessário dispormos de algumas informações prévias para ler jornais.

14 thoughts on “Bárbara e Miguel”

  1. A direcção do Público fez o frete completo ao PSD e a Relvas: ao revelar que a jornalista vivia com um homem da oposição estava a insinuar que Relvas fora atacado pela oposição por entreposta pessoa. Isso permitiu tambem ao Presidente Cavaco desvalorizar o caso como de simples luta politico-partidária.
    O que passou para o grande público e lá continua é, afinal, a mentira de que a jornalista tem um companheiro da oposição. Eu, por exemplo, estou a saber agora da falsidade.
    Isto cheira ao método da intentona de Belém.
    A direita é pulha até ao fim.

  2. E alguém acredita que as denúncias do bufo Relvas tivessem que ver com quem a jornalista dorme? Isso era coisa que a prejudicasse? As pessoas dormem com quem querem e às vezes não dormem com as mais indicadas. Mas isso era denúncia que o bufo Relvas apresentasse para achincalhar a jornalista e ainda por cima com origem nas secretas?

    Não era, de certeza, e foi a situação que o gabinete do bufo Relvas e outros especialistas em contra-informação arranjaram para menorizar o caso. Pulhaços…

    Tem isto a vantagem de agora ficarem mal-vistos (até dentro de portas) se bufarem outra coisa qualquer. Enfim…

  3. Por estas e por outras, deixei , há muito,de gastar dinheiro em jornais e pasquins. Para lixo bastam-me as notícias das TVs o que já sai caro . Leio blogs .

  4. Lucas Galuxo: Não, não é fogo nenhum. Não tinha visto, nem ouvido, nem lido as declarações da Fernanda Câncio (obrigada pelo link), pelo que supus que a diretora do Público avançara com a especificação em primeira mão. De qualquer modo, o que li ontem foi que a Redação do jornal não gostou que a diretora o tivesse feito sem consultar previamente a jornalista, tanto mais que (e cito) “a frase do ministro é falsa”. Donde, deduzo que também não tenham gostado que outras pessoas públicas o tenham feito (e nem sequer sei se a Fernanda foi a primeira). Mas isso já está fora do seu controlo (da Redação) e não diz respeito ao jornal. Era possível que mais tarde ou mais cedo se soubesse (tanto mais que, pelos motivos que já expliquei acima, poderia servir ao ministro). No contexto do jornal, nada obrigava a diretora do Público a declarar de que tipo de dados privados se tratava e, a meu ver, não deveria tê-lo feito, muito menos sem o consentimento da jornalista. Mas tudo isto é desviar as atenções do essencial: viva, tenha vivido ou esteja a pensar ir viver qualquer jornalista com alguém que não é simpatizante ou militante do partido de Miguel Relvas, este não pode utilizar dados da vida íntima daquela pessoa para a intimidar e coartar a sua liberdade e o exercício da sua profissão. Recordo que a dita jornalista não acusara o ministro de nada nem falseara nenhuma notícia. Limitou-se a fazer-lhe algumas perguntas, objetivamente pertinentes, tendo em conta as afirmações de Relvas na Assembleia.

  5. agora é q’uisto tá bom a discutir quem quéca com quém. fase seguinte quantas deu e quantas levou.

  6. Apenas para acrescentar o que acabei de ler no site do provedor do leitor do Público (obrigada à Maria Estrela Serrano) -http://blogues.publico.pt/provedordoleitor/2012/05/27/verdade-e-verosimilhanca/ – a resposta da jornalista Maria José Oliveira a perguntas que ele lhe dirigiu:

    “Lamento que a direc­ção não me tenha pedido auto­ri­za­ção para o fazer. E não tenha, ao escre­ver sobre a dita ame­aça, subli­nhado que se trata de uma infor­ma­ção falsa que pre­ten­dia colar-me a uma agenda ide­o­ló­gica e des­cre­di­bi­li­zar o meu trabalho.

    Lamento pro­fun­da­mente que ao exe­cu­tar publi­ca­mente a ame­aça do minis­tro, a direc­ção do jor­nal tenha trans­for­mado em facto a ideia de que eu vivo com uma pes­soa da opo­si­ção, quase cor­ro­bo­rando as quei­xas do minis­tro sobre a “per­se­gui­ção” que lhe faço.

    Neste momento, e isso é visí­vel nas redes soci­ais e nas cai­xas de comen­tá­rios dos sites de jor­nais, os lei­to­res acusam-me de estar a tra­ba­lhar para a opo­si­ção e que as crí­ti­cas do minis­tro tinham sustentação.

    Não per­cebo como é que nin­guém da direc­ção teve luci­dez e inte­li­gên­cia para não pen­sar nes­tas con­sequên­cias que estão agora à vista de todos.”

  7. Estes métodos dos que nos desgovernam são uma “pesada herança” do fascismo. Temos que dar nomes aos bois e não continuar com paninhos mansos dizendo que é preciso “esperar para ver” . Acho que já vimos o suficiente para tirar conclusões.

  8. ambiente de cortar à faca lá no Público (inside information), dissidências e acusações…
    Mas o Relvas é sereno, o Relvas fiacrá “mais forte”. Pudera.

  9. Relvas usou um facto falso para tentar amedrontar e descredibilizar a jornalista. É próprio do aldrabão mafioso, do mixordeiro político e do foleirote rasca que ele é.

    Mas essa mentira não é o aspecto mais obsceno da chantagem que Relvas fez sobre a jornalista. É que se acaso o facto invocado fosse verdade, Relvas acharia condenável que uma jornalista do Público tivesse um namorado da oposição e que, com esse terrível handicap, ousasse fazer perguntas desgradáveis a um membro do governo. Isso é que é o mais escabroso!

    Recordo as várias campanhas de intoxicação com que esses reles Relvas, Ferreiras Leites, Aguiares, Rangeis, Pachecos Pereiras, Balsemões, J. M. Fernandes e o resto da cambada laranja, secundados caninamente pelos habituais criados vermelhos, tentaram fazer crer que Sócrates “convivia mal com a liberdade de imprensa”. Por exemplo, a despudorada campanha da “asfixia democrática”, com que se pretendeu inverter a realidade, que é a de uma comunicação social que, ao nível dos lugares dirigentes, responsáveis e decisores, está obviamente, monoliticamente AO SERVIÇO DA DIREITA. Escapam alguns jornalistas, comentadores, etc., mas mesmo esses são inexoravelmente usados, controlados, chamtageados e manipulados pelos chefes. Apenas a pluralidade de interesses (geralmente inconfessáveis) entre os magnatas e os mandantes é que permite algumas brechas em questões realmente importantes.

    Sugere-se que a imprensa portuguesa (e, já agora, as direcções de informação das TVs) declarem publicamente a sua orientação política. Mas isso para Portugal é uma ideia cómica, que só entendo se tiver um propósito irónico. É unicamente a aparência de isenção desta comunicação social monolíticamente de direita que interessa alimentar aos magnatas e aos seus lacaios responsáveis. Jamais confessariam a situação de monopólio de informação em que vivem. Apenas a mentira, nua e crua, lhes interessa.

  10. Cesário Verde dizia «a imprensa vale um desdém solene» mas este caso é mesmo típico de «bússula doida». Safa!

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