João Carlos Espada continua a ser o comic relief que anima o leitor, cansado depois de passar os olhos pelos milhões de caracteres de mais uma edição do Expresso. Hoje, ele aproveita o seu cantinho para pregar contra o casamento entre homossexuais.
Eu até o entendo um pouco. Ver a sua adorada Albion tombar sob o assalto das tribos gays, carregadas de pó-de-arroz e sedentas de novos direitos, deve custar ao homem. Imaginar os corredores dos seus queridos clubs — onde ainda consegue cheirar a presença tímida do afável fantasma de Sir Karl — pejados de parzinhos de homens de mão dada ou de mulheres a lambiscarem-se… deve ser mesmo demais para uma alminha tão frágil e pequena.
Mas ele até se entreteve a congeminar uns argumentos para concluir que não existe qualquer discriminação no acesso exclusivo dos pares “normais” aos casamento. O primeiro é o do “proverbial slippery slope (declive escorregadio)”: se permitimos esta aberração, quem sabe o que virá aí a seguir? A poligamia? A poliandria? O incesto? Começaremos a testemunhar enlaces matrimoniais entre robustos agricultores beirões e voluptuosas vacas mertolengas? (Atenção, que só inventei a última hipótese.)
Eu, por acaso, sempre tive como certo que a culpa do alcoolismo recai sobre os ombros do primeiro fulano que se lembrou de beber água; depois, vieram logo o capilé, a cerveja, a aguardente e as cirroses. Não se está mesmo a ver?
Para Frei Espada, é a mesma coisa um par homossexual querer casar e não poder ou um homem ser impedido de desfilar numa passagem de lingerie feminina. Com efeito, outra aplicação do princípio do “proverbial slippery slope (declive escorregadio)” é que nunca deviam ter estendido a alfabetização aos tontos; estava-se mesmo a ver que ainda íamos dar com eles a encher páginas no Expresso.
Por fim, ele argumenta que o casamento, sendo uma convenção social, só poderá ser alterado com a conivência da maioria. É que “em democracia resta saber se a maioria considera ou não que o sexo dos parceiros é relevante para a definição do casamento perante a lei.” Olha… tinha eu ideia que é mesmo isso que se pretende: que os poderes da nossa democracia representativa tomem essa decisão. Mas parece-me excelente a ideia de ter a maioria no papel de guardiã dos direitos das minorias. Na realidade, julgo que os direitos dos judeus, na década de 40, estavam mesmo bem entregues ao arbítrio da populaça alemã; e que ninguém poderia decidir melhor qual o lugar dos negros americanos do que as lynching mobs do Alabama.
Cada vez que leio uma prosa deste senhor, até fico convencido que o João Pereira Coutinho é dono de opiniões ponderadas e civilizadas.
Olha, e a tua Bomba é que já foi à vida. Confesso que até sinto falta das suas coluninhas… ;)
Podem tirar-me tudo; mas não me tirem o Espada aos sábados…
O’ Luis a malta tem que dar um desconto a esta malta porque o esta gente vive num permanente slippery slope, como entretem podemos fazer apostas onde e’ que as pro’ximas escorregadelas destes gajos vao acabar.
(JPC o que e’ que o teu comenta’rio quer dizer.)
João Trebaldo e Catarino Tulherias, operários enfornadores de segunda da Tijoleira do Minho e Cia, vêm por este meio convidar o Sr. Luís Rainha a assistir à cerimónia simbólica não-religiosa que selará, com dois lindos anéis de brilhantes, o compromisso do seu futuro enlace matrimonial perante a lei de S. Bento.
Agradeceriamos que o Sr. Luis nos informasse, com a brevidade possivel, se a sua agitada vida profissional e privada lhe permitirão honrar-nos com a sua presença. A cerimónia terá lugar perante a boca do Forno número 5 da fábrica onde trabalhamos, depois da saída do último turno de sábado à noite, para acabarmos com a propaganda nojenta de que estas coisas só acontecem entre pequeno-burgueses com comichões sociais.
Além dos muitos amigos e amigos e amigos que já nos prometeram vir assistir, será lida uma mensagem do Elton, uma jóia, e já nos foi garantida a presença dum procu-rador do Movimento Espanhol Contra as Injustiças da Sexualidade.
Dada a espiritualidade que presidirá ao evento, gostariamos que ficasse ciente que sempre temos respeitado as normas concernentes à manutenção da virgindade que, aqui entre nós, estão a ficar meio abandalhadas no mundo gay entre o Tejo e o Mondego, e, em decorrência disso, decidimos não dormir juntos nessa noite, nem noutras seguintes, até à vitória final.. Alguém tem de sacrificar-se. Outrossim, agradeceriamos uma pequena nota no Aspirina para publicitar a nossa causa profunda entre os pequeno-burgueses de esquerda que visitam o blogue.
O homem é muitio inteligente e culto. Tem é ideias do século XIX.
Olhem que alguns elementos de Lord Sword até estão bem achados. E a crónica do JPC desta semana está com piada, em especial a que fala da sesta.
Esse somatório utilitarista da maioria democrática … no fundo, não será a mesma coisa que a vontade geral Rousseauniana? A tal que Sir Espada (se tivesse nascido em Albion) tanto deplora? Há argumentos que levam pela frente e apanham por trás. Enfim …
É bem visto e tem graça.
:-)