Balada da casa morta

Tem a data na chaminé
Mil nove e vinte e sete
O pedreiro vem de boné
E encosta uma biciclete

Chegam carros de areia
Uma carroça com cal
E a poça já ficou cheia
De água do meu quintal

Pois as pedras não são nada
Sem cal e areia em mistura
Na parede levantada
A negação da amargura

Uma casa construída
Num ano de confusão
Foi afirmação de vida
Hoje é só desolação

Caem telhas de canudo
E barrotes de madeira
Do telhado caiu tudo
Há entulho na soleira

19 thoughts on “Balada da casa morta”

  1. o querido mudou a casa. olha lá oh saloio da benedita, biciclete dá jeito para rimar com 7, mas em português escreve-se bicicleta.

  2. O 5 de Agosto:
    É um dia como outro qualquer. Mas do que eu quero falar é do de 1964. Neste dia, como em todos os outros, estava a trabalhar na oficina do Neca “Papa”, na Cavada em Paços de Ferreira, junto a esta, havia outra que pertencia ao João “Russo”. Da parte da tarde começa-se a constar que o seu irmão tinha morrido num acidente de viação a caminho da Feira do Cô, – nesse dia comemorava-se ali uma feira/festa. Fernando “Russo” que é dele que se trata, deslocava-se para ali com a finalidade de conviver com os amigos, o que é apanágio, de muitos que se deslocam para as festas para matar saudades, beber umas copadas de vinho, comer umas iscas de bacalhau e pôr a conversa em dia. Mal sabia ele o que lhe ia acontecer. Era um homem na casa dos trinta e poucos anos.
    A notícia correu de boca em boca e toda a gente sentiu consternação pelo sucedido. Era uma pessoa relacionada com toda gente, era de Paços de Ferreira e tinha família em Freamunde – os seus sogros. Ainda estávamos incrédulos com a notícia quando outra surge. As sirenes dos carros dos bombeiros continuavam a tocar o que dava a entender que não era devido ao dito acidente.
    Cada vez se ouvia mais sirenes com os toques infernais, algo de mal estava a acontecer. Como nestas situações depressa se vem a saber qual a causa, não demorou muito a constar que era um incêndio na fábrica “Grande” de Albino de Matos Pereira & Barros, em Freamunde, que tinha começado na secção de estofos. Esta secção foi a minha primeira escola profissional. Comecei a rever todos os cantos e quem ali laborava. Oxalá que nada de mal lhes tivesse acontecido.
    Nessa altura trabalhava também na oficina do Neca “Papa” como polidor de móveis o José Maria Pinto Antunes, para os amigos o “Pranchadas” que era bombeiro da corporação de Freamunde. Como é lema dos bombeiros quando há um incêndio larga-se logo tudo o que se está a fazer para dar a colaboração necessária.
    Foi o que aconteceu. O lugar da Cavada dista da fábrica “Grande” para cima de dois quilómetros e ele a correr a pé, nessa altura era a forma como se movimentavam os mais humildes. Quantas vezes vi o meu pai a correr como um desenfreado quando ouvia a sirene dos bombeiros. Eles conheciam o toque a desastre ou a incêndio.
    A maioria das corporações de bombeiros do distrito do Porto foram solicitadas para dar o seu contributo pois junto à fábrica havia umas bombas de gasolina e se o fogo se aproximasse era uma catástrofe de proporções incalculáveis. O trânsito ali foi cortado – a fábrica fica na berma da estrada nacional – e no centro da vila também.
    Eu continuava a trabalhar, nesse tempo o trabalho era muito, quem dera aos industriais de hoje metade desse trabalho e o que relato foi-me contado pelo meu pai que ali trabalhava e alguns amigos. Foi uma catástrofe como relato em cima. Os funcionários previram o pior. Quando assim é vem logo o desemprego e não era como é hoje. Havia menos protecção social ou quase nenhuma. O meu pai anteviu logo dificuldades familiares. O cabeça de família desempregado causa transtorno. Mas a administração, os sócios gerentes e os empregados meteram mãos à obra e nada disso aconteceu. Em Freamunde é assim. Nada lhes mete medo e transformam o impossível em possível.
    A fábrica foi remodelada. Mais tarde após a vinda do ultramar, em mil novecentos e setenta e três, fui novamente para ali trabalhar até mil novecentos e oitenta. Depois dei outro rumo à minha vida. Mas, relembro estes factos para dar conhecimento aos mais novos e vindouros.
    Hoje a fábrica não labora. Fechou acerca de seis anos. Era a “Rainha” de todas as outras que existiam nas suas redondezas. Ali criaram-se grandes artistas que pelo tempo fora foram para outras onde o ordenado era maior mas a protecção social menor. Ainda hoje ouço alguns lamentarem-se de ganharam tão pouco de reforma. Os que foram reformados da fábrica “Grande” vieram com uma reforma razoável e no seu encerramento não ficou a dever um euro a nenhum seu funcionário. Mas este feito teve a mão de um grande homem que é: Teodoro Pereira.
    Gosto de relatar estes factos e o dia 5 de Agosto de 1964 não podia passar despercebido. Foi um dia trágico.

  3. Parabéns caro Manuel Pacheco, belíssimo texto nos enredos da memória. Como diz um poeta meu amigo «todos se lembram mas poucos recordam»…

  4. Isto não está para brincadeiras. Quem vos avisa é o Adolfo Dias. Diz o povo que não há 2 sem 3. O que estará para acontecer? Ao Francisco a casa foi abaixo e agora arde a fábrica ao Pacheco.

    Oh! Coitado do Pacheco,
    que teve um grande desgosto,
    tudo aquilo estava seco,
    e logo a 5 d’Agosto!

    Já nesse tempo o país ardia no verão como agora. Não há nada a fazer. Agora falando a sério: hoje na Feira ardeu uma fábrica de tintas.

  5. Pois não oh! Francisco, como acertaste? Normalmente não vou longe, fico-me ali pelas bordas e já chega. Nesta altura, com um governo a fazer o que faz, é preciso alguma dose de humor. Se não tens tás tramado.

  6. Casa branca

    Casa branca em frente ao mar enorme,
    Com o teu jardim de areia e flocos marinhas
    E o teu silêncio intacto em que dorme
    O milagre das coisas que eram minhas.

    A ti eu voltarei após o incerto
    Calor de tantos gestos recebidos
    Passados os tumultos e o deserto
    Beijados os fantasmas, percorridos
    Os murmúrios da terra indefinida.

    Em ti renascerei num mundo meu
    E a redenção virá nas tuas linhas
    Onde nenhuma coisa se perdeu
    Do milagre das coisas que eram minhas.

    Sophia de Mello Breyner Andresen
    in Poesia I (1944)

  7. Arre! Chiça! Dessa poesia não sou capaz de fazer. A minha é mais terra a terra, mais rasteira, mas às vezes mais certeira. Como neste caso:

    Se merda valesse ouro
    o povo não a “cheirava”,
    e longe vá o agouro
    mas o pobre, nem cagava!

  8. Cumo cumentador residente da assoelhada deste vlogue, benho apresentar os meus protestos. Num há direito de se bir assim puvlicar outro poema em riba do poema do senhor dr. poeta José do Carmo Francisco. Ele já disse que nom tem medo dos bersos desta sinhora. Ele já cuntou um milhaõe de bezes que tem librinhos seus puvlicados na colecçãoe adonde a dona Sufia tem os dela, carago! Cumo o poeta disse , trata-se de probocar, cumo quem diz, «toma lá que já almoçaste!». Cumo seu admirador num gosto nada que benham probocar assim um poeta, inda se fosse um poeta sem libros e sem bersos de categoria, inda bá lá. Mas cumo nom é, tendes-me à perna, garanto-bos. Qué que bale uma casita vranca na praia acumparada com a do senhor dr., dizei-me? Comprimentos.

  9. Desculpe lá oh! jcfrancisco: está a falar de quem? É que não percebi a quem se dirigia: se ao Adolfo Dias se a outra pessoa. Sendo assim, não sei que lhe responder. Para o Passos Dias Aguiar ainda temos o Pinto Ramos de Oliveira, a Alice Faria Leite sócia da firma Leite Faria Filhos,. Ldª., temos a Maria dos Prazeres e Morais e o Jacinto Leite Capelo Rego. E há também aquele cujo nome termina em ão. Não conhece? O Cabral.
    Mas pronto!Se não esclarecer ficará sem resposta.

  10. Sinhã vi essa chaminé numa viagem entre Sintra e a Praia das Maçãs. No regresso percebi melhor o volume dos escombros. Ainda por cima o ano de 1927 tem a ver com um nascimento de uma pessoa muito querida. O poema tem muito sangue pisado…

  11. Oh| H. Romeu: também não sou um génio, não me posso lembrar de tudo, saber tudo, não ando para aí a gritar “eu” génio.
    Eugénia era uma prima minha que teve um acidente de carro. Vê lá tu que ficou debaixo do motorista e daí resultou uma gravidez!!!

  12. Os meus cumprimentos, amigo Adolfo. Transmita a sua prima as minhas felicitações e uma hora pequenina.
    Sempre que vier aqui por estas bandas pode passar aqui pela minha empresa, uma sociedade que fiz com dois amigos, um irlandês e um holandês, chama-se H. Romeu, Lamb & Schouppe.

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