O sempre atento João Pedro da Costa faz, no nosso Aspirina B, uma observação devastadora. Esta.
Há uns valentes meses atrás (adenda: no dia 26 de Junho de 2005, segundo um não menos atento comentador), o Eduardo Pitta escreveu um post muito engraçado sobre o poeta (e meu amigo) Daniel Jonas. Tudo a propósito da edição, pela Cotovia, do livro de poemas Os Fantasmas Inquilinos. No dito post, o Eduardo Pitta lamentava, de forma muito engraçada, a ausência, no livro, de qualquer informação biográfica desse poeta «desconhecido» que teve a suposta honra de ver uma obra sua publicada na prestigiada colecção de poesia da Cotovia (isto é, de facto, mesmo super engraçado, porque toda a gente sabe que a poesia, e sobretudo a contemporânea, é simplesmente ilegível sem qualquer informação biográfica do respectivo autor). O post, que, repito, era mesmo muito mas muito engraçado, terminava com o resultado pictórico de uma pesquisa Daniel+Jonas no Google: uma fotografia janota de um simpático e homónimo cozinheiro.
Ora, entretanto, o post desapareceu. O que é uma pena, porque, de facto, o post era, como já o disse aqui algumas vezes, mas não custa nada repeti-lo, muito mas mesmo muito engraçado. Mas talvez mais engraçado ainda seja o facto de, nesse mesmo entretanto, o Daniel Jonas ter traduzido e anotado para a Cotovia o Paradise Lost de Milton, recebido inúmeros elogios (como este) pelo livro que serviu de mote ao post muito mas mesmo muito engraçado do Eduardo Pitta e publicado mais um belo e arrojado livro de poesia pela Cotovia (Sonótono), o que me leva a supor que, talvez, ele tenha deixado de ser «desconhecido», segundo os padrões do Eduardo Pitta. HTML volant, scripta manent, dirão alguns. É. E acrescento que, por vezes, esse voo é cirurgicamente assistido. Mas pode ser suspeita minha.
lembro-me, de facto, desse post, porque alguém chamou a minha atenção para o facto de não ser o daniel jonas poeta, que eu já tinha conhecido, quem figurava na fotografia.
mas alerto-te para o facto de o teu link conduzir a outros dois posts em que o nome dele está incluído num rol de elogiados, o que é completamente incongruente com a publicação, anterior, do dito post e do seu conteúdo.
deve haver aqui algum engano.
Não são lá muito elogiados, Susanita. De resto, o tom dos posts é particularmente neutro. Mas numa coisa tens razão: deve haver aqui algum engano. Ó diabo.
sim, tens razão. o tom é neutro. mas chama-lhe poeta, o que, para quem escreveu livros com poemas, é mais elogioso do que chamar-lhe, sei lá… cozinheiro.
Faça recuar os seus valenttes meses attrás atté 26 de Junho de 2005, datta em que o postt pitta foi publicado. Entrettantto, o auttor do excelentte humor deve tter mettido a mão na consciência ou nouttro síttio qualquer, e achou por bem rettirá-lo do mercado.
Muito obrigado. Essa informação é, de facto, fundamental: 26 de Junho de 2005. O facto de teres a data memorizada (?) leva-me a perguntar-te, os dedos trémulos, o seguinte: não terás por acaso gravado essa pérola de humor? Era giro partilhá-la com o resto da malta e, já agora, devolvê-lo ao autor (quem sabe? se calhar foi por lapso que o mesmo foi retirado do mercado…).
João Pedro da Costa, li agora o seu post. Vamos por partes. Verdade: apaguei esse post. Não desapareceu. Foi apagado, como umas boas dezenas deles, e só não apaguei os 276 que entretanto coligi no livro «Intriga em Família» (2007) porque alguns amigos e leitores escreveram no sentido de o não fazer. Esse que refere, se, como diz, é de Junho de 2005, foi mesmo à vida. A rasura atingiu talvez catorze ou quinze meses. Por mim teria apagado os 276. Mas rendi-me a argumentos de terceiros. Quanto ao livro do Daniel Jonas que deu origem ao post, continuo a achar que os livros devem incluir informação biográfica mínima. Dou-lhe um exemplo recente: a Campo das Letras reeditou «Sedução», o clásico de José Marmelo e Silva (1913-1991) que teve primeira publicação em 1938. O livro não traz nenhuma indicação de quem é o autor: se vivo, ou morto, se autor de obra canónica ou estreante, se a obra é inédita, etc. Acha bem? Eu acho mal. No milieu literário, José Marmelo e Silva é um nome reconhecido. Mas as livrarias não vendem livros para o milieu. Ora, há 30 meses atrás, Daniel Jonas nem no milieu era conhecido, quanto mais reconhecido. Em todo o caso, o post era uma chamada de atenção ao editor [André Jorge, Cotovia], não beliscando o autor, salvo no fazê-lo passar por um chef famoso… Vejo que alguém classificou o seu post como «observação devastadora». Aconselho-o a oferecer a esse alguém um dicionário de adjectivos. Quanto aos outros dois posts em que Daniel Jonas é referido de passagem, só um deles [«Pathos»] é que é de minha autoria. Mande sempre.
Caro Eduardo Pitta,
O «devastadora» do João Pedro é uma gracinha intradiegética bloguítica ao meu «devastadora» no recente post «Se calhar também eu ando distraído». Leia. Diz-lhe respeito.
No atinente ao tratamento a Marmelo e Silva: é, de facto, lamentável. Mas seria do maior interesse cultural saber o que pensou hoje do livro quem supusesse o autor vivo, jovem (como realmente então era) e ignorado.
Um abraço.
Caro Fernando Venâncio, obrigado pelo esclarecimento. Voltando ao Jonas: há muitos anos (quinze ou dezasseis) já eu escrevera, fora da bloga, contra a edição de um Ian Hamilton [Cotovia] que chegava às livrarias sem indicação nenhuma. Esta presunção de que as pessoas sabem (mas que pessoas?), traduz um elitismo deslocado da realidade. Pois se já ouvi universitários dizer que Pater significa Platão em inglês… Enfim. Um abraço.
Eduardo Pitta, li agora o seu comentário. Vamos por partes.
Registo o facto de ter apagado este post que, presumo, não foi incluído no livro «Intriga de Família» e de não ter apagado os que, de facto, foram incluídos na obra. De facto, o critério faz todo o sentido.
O exemplo que dá como argumento não é passível de rendição. Comparar a pertinência da inclusão de uma nota biográfica entre a edição princeps do livro do Daniel Jonas com a recente reedição de um livro originalmente editado em 1938 não faz, como é óbvio, qualquer sentido. Repare que nem sequer estou aqui a discutir a pertinência da inclusão dessas notas na edição de obras literárias (onde tenho uma opinião oposta à sua), mas apenas na eficácia argumentativa da sua comparação. De resto, o comentário do Venâncio é particularmente eloquente na forma como apenas lamenta a ausência da nota biográfica no livro do José Marmelo e Silva e não no do Daniel. Reparo agora que faz outra comparação descabida: comparar a edição princeps do livro de um jovem autor português com a edição da de um estrangeiro (Ian Hamilton). Não, assim ainda me consegue convencer que não tenho dois palmos de testa. Eu, pelo menos, tenho sempre em conta a sua inteligência. Agradecia que a cortesia fosse recíproca.
Diz que, à data de publicação do post, o Daniel Jonas não era conhecido no milieu. Para já, depende do milieu. Nessa data, o Daniel já tinha dois livros publicados, meia-dúzia de prémios na algibeira e até já tinha vindo referido em artigos de gente tão conceituada como a Rosa Maria Martelo. Depois, até parece que é preciso pedir licença para ser conhecido nesse milieu. Finalmente, quem assinou o livro não foi o Daniel cidadão e contribuinte, mas o Daniel poeta. Para conhecer um poeta, não há nada como ler a sua obra (e repare que a Cotovia até lhe deu uma ajudinha nesse capítulo ao ter publicado – e, se calhar, enviado – o livro).
Contrariamente ao que diz, o post, de facto, beliscava o autor. E de que maneira. De resto, o mesmo (que parafraseio de cor, mas que, quem sabe, ainda poderá ressuscitar do limbo do HTML) fazia um elenco dos nobres poetas já editados pela colecção, pondo em causa a pertinência da entrada do Daniel na galeria desses ilustres autores.
Finalmente, o elitismo é todo seu. O Eduardo não é um leitor qualquer, é um profissional da leitura. E invocar, nessa qualidade, o livro do Daniel apenas devido à ausência de um paratexto é um gesto cujo significado é de fácil e airosíssima compreensão. É eloquente a forma como, enquanto representante do milieu, dá as boas-vindas ao Daniel ao mundo elitista das supostamente nobres publicações.
Mande sempre. Vai ver que nenhum escrito seu será aqui alguma vez apagado. Quer entre posteriormente num livro. Ou não.
Se a cortesia não fosse recíproca eu não lhe tinha respondido. Voltando ao ponto: a intenção inicial foi apagar os 276 posts coligidos em «Intriga em Família». Mas, tendo sido coligidos em livro aqueles que considerava (e considero) melhor conseguidos, de quantos publicara entre 13 de Janeiro de 2005 e 15 de Fevereiro de 2007, deixar de fora os menos conseguidos, entre os quais aquele que tanto o incomoda, daria uma ideia frouxa do blogue. Se o que ficava era o “lixo” (o meu), mais valia apagar. E comecei a fazê-lo, uma tarefa morosa (havia e há posts de outros colaboradores, o que me inibia o delete automático) entretanto interrompida nas circunstâncias acima descritas. Na rasura, foram à vida posts que estão no livro e outros que não estão. Esta parte está explicada. Sobre os livros terem ou não terem informação biográfica, pensamos de maneira diferente, e não vem daí mal ao mundo. Por maioria de razão acho pertinente a minha comparação entre Jonas e Marmelo, ou entre Jonas e Hamilton. Do meu ponto de vista (não tem de concordar com ele) fez todo o sentido chamar a atenção para a «ausência de um paratexto». Eu não quero saber da vida pessoal do autor A ou B para nada. Mas, não sabendo de quem se trata, quero saber se estou a ler um autor vivo ou morto, se alguém com 30 ou 80 anos, e por aí fora. Esse tipo de informação cabe em três linhas numa badana estreita. [No caso concreto de D.J., eu até sabia de quem se tratava. Mas, lá está, não era “eu” que tinha de saber. Eram os leitores em abstracto.]Quanto ao milieu… diria que não comento regras de clubes privados.
O conhecimento que os leitores «em abstracto» tinham de travar com o Daniel Jonas passava pela leitura da obra. É esse de resto o funcionamento da galáxia: o autor escreve, o editor publica, o leitor lê, o crítico comenta, divulga. Basta olhar, de resto, para a riquíssima tradição editorial de poetas portugueses em Portugal para ver que a regra não é a inclusão, mas a omissão de qualquer nota biográfica.
Se para si fazia sentido chamar a atenção para a ausência desse tipo de paratexto, registo (ou melhor: registe-se) o método por si utilizado. Cínico, insultuoso, despropositado e volátil. Enfim, nada disto é grave e, de certa forma, até são atributos potencializados pelas características da plataforma que utilizamos (os blogues). Mas cria um contraste flagrante e muito giro com a gravitas e o moralismo que gosta de aplicar aos outros (ver o caso recente, destacado aqui pelo Venâncio, em que critica o Vítor Aguiar e Silva e o Manuel Gusmão).
Para terminar, é óbvio que sabia quem era o Daniel Jonas. Em 26 de Junho de 2005, ele era, para si, um zé-ninguém despropositadamente legitimado por uma colecção de poesia de prestígio. O elitismo é isto. E é bom de ver que ele é uma das regras pelas quais se rege o seu «clube privado».
Ora aí está o meu problema: sou um excelente poeta com um péssimo currículo.
Ok, ok. Sou um péssimo poeta com um péssimo currículo. Mas então, por que não me contactam as editoras…?
Até já.
Para Eduardo Pitta e João Pedro da Costa,
Eu agradecia menos blablá acerca de obras. O mérito está em fazê-las.
Isto anda tudo à volta do milhõ. O João Pedro Costa diz que o post era cinico e daninho, mas não diz porquê. Não é preciso. O milhõ lá saberá. O milhõ regista essas coisas. Suponho que não fosse apenas insultuoso por causa por causa da referência à ausência de biografia… Ou era? Eu gosto de ler as biografias dos autores. Bem, isto de qualquer forma são coisas que apenas ao milhõ dizem respeito.
Compra um par de óculos, ó caramelo.
So agora tive conhecimento do interesse pelo Post “Jonas qual?”, colocado no Blog
“Da Literatura em Junho de 2005, não querendo alimentar qualquer tipo de polémica
mas sempre atento ao contributo que possamos dar, pela positiva, tendo em vista o efeito de algo no passado e os reflexos no presente e possívelmente no futuro, posso enviar o referido e “elo-quente” Post, se ainda não tiver sido obtido.
Caro Augusto: ficaria eternamente grato se, de facto, me enviasse esse elo-quente. Meu e-mail: joaopedrodacosta seguido de arroba seguido de gmail seguido de ponto seguido de com.
O referido Post foi remetido, espero que tenha sido localizado, pelo facto de estar incluído entre vários temas, agradeço a confirmação da plena recepção do
mesmo.
Recebido. Já te enviei um e-mail. Muito obrigado, Augusto.