O velho carregava uma montanha de anos pelo outeiro acima. Curvado sobre uma cana a servir de bordão. Ia muitas vezes ao mato buscar uns gravetos para a lareira ou o forno. Nesse tempo, não havia subsídio de invalidez nem de velhice. Só invalidez e velhice.
Por isso procurava passar sempre à hora certa, mas fingindo que o fazia por acaso, pela cafua onde pai e filhos comiam ao meio-dia. A pergunta do convite era invariável, a resposta também. E lá vinha a bendita fatia de pão de milho, com um chicharro ou um bocado de cavala.
Aquele pão, assim partido e repartido, assemelhava-se à bênção da Última Ceia.
DANIEL DE SÁ
Chicharros e cavalas parecem-me mais um costume das ilhas que do continete. Estou certa?
Bela prosa a recordar os bons tempos em que ainda se convidava alguém para petiscar…
a minha avó tinha uma família grande, mais de uma dezena, lá em casa. mas havia sempre dois ou três lugares a mais, à mesa, não fosse aparecer alguém. é grata, a disposição para dar, porque se tem; mesmo que não apareça alguém a querê-lo.
Ana, é peixe habitual nas ilhas, sim. O chicharro é o que no Continente se diz carapau; o que aí se chama, ou deveria chamar chicharro (carapau grande) nós por cá, pelo menos em S. Miguel, às vezes chamamos canecos.
Estes peixes (chicharros e cavalas) eram a comida dos pobres. Do tempo em que dar de comer a quem tinha fome, meu caro luís eme, podia querer começar-se em casa e não ter com quê.
Susana, a história é real. Um dos filhos do homem caridoso é meu vizinho, com a casa encostada à minha.