Dos vários fenómenos sociais extraordinários que resultaram das reformas levadas a cabo pelo actual Governo, e também do modo simbólica e politicamente viril como o Primeiro-Ministro assumiu a chefia, não há nada que se compare ao que aconteceu à direita: desapareceu. No PSD os loucos tomaram conta do hospício, a custo lá foram metidos nas celas, porém não se calam e ameaçam voltar para acabar de vez com o partido. Entretanto, os enfermeiros de serviço não encontram sequer as ligaduras, quanto mais os comprimidos. No CDS, há muito que todos se demitiram, mas só agora começaram a contar uns aos outros. Para além destes partidos, temos a direita dos negócios, onde o dinheiro não tem ideologia. Segue-se a direita das ideias, que convive tranquila e galharda com um monaquismo de veludo, ganhando o pão na universidade e variegados institutos públicos e privados. Digna de nota é também a direita publicista, mas os magnos exemplos de Rebelo de Sousa, Pulido Valente e Pacheco Pereira apenas confirmam o evangélico preceito que avisa contra o serviço a dois senhores. Entre escolher a solitária reflexão ou o apoteótico espectáculo, estes pantomimeiros correm para o palco, onde fingem não envelhecer. Resta a direita da cultura popular, as famílias abastadas ou remediadas, mais as geográfica ou historicamente porque sim, onde a política é um assunto sujo e difícil, e, por isso, o que dava jeito era ter um senhor com ar sério a tomar conta disto e a manter a corja na ordem.
Falta uma direita inteligente e corajosa, capaz de pensar a politica como prova de carácter. Uma direita que não se limite a ser de direita.
«Falta uma direita inteligente e corajosa, capaz de pensar a politica como prova de carácter. »
mas isto é possível? Pode ser preconceito meu, caso em que agradeço que o desfaças, mas acho que não é: o domínio próprio da direita, assim como o da esquerda totalitária, é o da perversão, da hipocrisia e da manipulação,
Z, entendo. A conotação que dás à direita não tem necessária relação ideológica com a mesma, antes com o exercício do poder. Como todo o poder tende para a sua conservação, estás a identificar direita com conservadorismo, e esquerda com progressismo e até revolução. São divisórias clássicas, e obrigatórias. Deixando de lado a dimensão onde estes simplismos perdem o sentido, dada a complexidade e variedade das práticas e dos casos, convido-te a ver a direita como um necessário complemento da esquerda, como noções interdependentes. Como yin e yang.
Sim, tudo bem Valupi, como complementaridade dialéctica, e até inevitabilidade. Mas a questão não é essa, é se essa direita pode ser portadora dos valores que reclamas. Isto não tira as nojeiras históricas da esquerda, ao nível da praxis política, mas estávamos a colocar-nos no plano dos valores,
no entanto acho bem que abras a possibilidade
Tudo isto aconteceu porque este governo está a fazer o trabalho que a direita não foi capaz de concluir. Daí resulta esse vazio.
A direita, sociologicamente falando, existe e actua sempre, sem paragens, nem fins de semana, nem férias. O poder fundiário e financeiro não cessa nem intervala. Os detentores e herdeiros de privilégios, os que mandam nos negócios e condicionam os mercados, os que mandam nas consciências e crenças religiosas nunca descuidam nem largam, por um segundo, o controlo da sociedade. Os partidos que são supostos representar a direita é que andam, de facto, às aranhas, como tu, Valupi, bem dizes. Sócrates calou-os, melhor, desorientou-os completamente. Não porque esteja a realizar programas políticos direitistas – como os comunas, os bloquistas e os alegres gostam de sustentar (por efeito de uma qualquer disfunção eréctil mental combinada com paranóia esquizofrénica). Mas sim porque tem realizado reformas políticas tão possíveis quanto urgentemente necessárias para o país, contra aquilo que normalmente se diz da esquerda – que é despesista, irrealista, utópica ou lunática. Isso é que lhes dói e os desorienta.
Cá para mim, a direita sociológica está-se a cagar para o circo patético do PSD e do PP. Normalmente, não são esses partidos que asseguram a reprodução quotidiana do sistema de privilégios e de castas ou o andamento dos negócios. Quem o faz, no dia a dia, são os poderes fácticos instalados, enraizados na sociedade, no tempo e no espaço concreto. O Cordeiro das farmácias, os falsos agricultores que enganam Bruxelas, o engenheiro que quer a TMN porque não soube pôr a Optimus a render, os comerciantes que não querem pagar os impostos e outros que tais NÃO SÂO essenciais à direita sociológica. A Ferreira, porque é inteligente, já percebeu isso. Ela não quer apadrinhar as causas perdidas da direita vigarista e aldrabona. Estarei a ser demasiado opimista?
Z, lembra-te do conceito de liberalismo. Historicamente, tanto serviu de bandeira à esquerda como à direita. É um bom exemplo do relativismo desta divisão.
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jcfrancisco, capaz de concluir? Capaz de iniciar!
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Nik, muito bem exposto. A direita fáctica gosta do Sócrates por várias, e boas, razões. Mas mesmo isso não explica a decadência do CDS e PSD, a qual é muito anterior ao Sócrates, e que vai parar ao Cavaquismo. Foi Cavaco que secou o PSD, e o transformou numa máquina completamente cínica. Enfim, talvez não pudesse ter sido de outra forma.
Seja como for, é mau não termos uma direita ideologicamente bem pensada e melhor representada. E não vejo como a Ferreira o poderá fazer estando cercada por aqueles monos que produziram esse peido dado há 3 dias, e depois de um “tour de force” silencioso nunca visto em lado algum do Mundo. Fico sempre assarapantado com o desperdício grotesco da inteligência. Quanto a uma suposta nova ética que consiga dominar os corruptos, a Ferreira está demasiado comprometida, sabe de demasiadas histórias, tem demasiadas ligações pessoais para as poder pôr em causa. A corrupção é uma força demasiado forte para esta geração de políticos que fizeram a carreira a conviver com ela.
Este último parágrafo do Valupi é de ouro. Vale a pena repetir:A CORRUPÇÃO É UMA FORÇA DEMASIADO FORTE PARA ESTA GERAÇÃO DE POLITICOS QUE FIZERAM A CARREIRA A CONVIVER COM ELA.
Estão todos contaminados.
entretanto este ressuscitou assim,
http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1342223&idCanal=12
A Direita política está hoje em Belém e nos Estados-Maiores das Forças Armadas, a receber e a executar ordens directas de Washington, de Londres e de Roma.
A Direita ideológica e intelectual está no topo superior do aparelho do Estado (Autonomias Regionais e Autarquias Locais incluídas) e nas Universidades, incluindo as públicas, mas sobretudo nas Católicas (Lisboa e Porto) e restantes privadas.
A Direita social está sobretudo nos empresários e nos quadros médios e superiores das empresas privadas, sobretudo as multi-nacionais, e igualmente nos escalões etários do topo da pirâmide, usufruindo de elevadas pensões de reforma.
A Direita mediática está praticamente em todo o lado, incluindo as estações públicas.
Só a Direita partidária é que parece estar, momentâneamente, numa crise grave, que mais se assemelha a um coma profundo.
Bastante intrigante, sem dúvida, e de resultados imprevisíveis…
Verdade, bastante intrigante. Acima de tudo, é bisonho não aparecerem novos talentos. O Passos Coelho, por exemplo, é intelectualmente muito fraquinho, tendo como maior mérito a fotogenia de beto boa-onda. Não se entende o que esteja a causar a desertificação.
Sim. Não se entende. É de facto um mistério. Uma questão geracional? Seria talvez esclarecedor um estudo sociológico sobre o comportamento político dos eleitores nas diversas classes etárias…
Será que já existem estudos tais? Ou os existentes perdem-se demasiado com a (hoje) menos relevante questão das distribuições geográficas (claro, são ainda relevantes por causa da existência de “círculos” eleitorais, de nível regional e distrital; tornar-se-iam obsoletas se passasse a vigorar um círculo único nacional eleitoral, como foi por exemplo já adoptado em Israel – e que faria todo o sentido também entre nós, penso eu…)? Se alguém quiser esclarecer…