Que pensas desta proposta da Isabel Moreira?
Por mim, fogo à peça. A Constituição não é uma idiossincrasia continental. Mas ressalvo que o crucifixo, sem catecismo ou liturgia que lhe dê sentido, não passa de um folclórico e benfazejo ícone identitário. A assepsia antropológica nunca foi boa conselheira.
Concordo absolutamente com a tua ressalva.
Sim, crucifixo como símbolo folclórico…Mas os fundamentos do despacho são outros.
Por outro lado, o Alberto João consegue dar uma lição ao passos perdidos: para quê alterar a Constituição para impôr uma ideologia ou um regime? Que se lixe a Constituição e directos ao assunto.
Nunca havemos de chegar à Madeira…espero.
É por ser ícone identitário. Essa é a questão.
Há vários ícoes identitários de várias identidades comunitárias na sociedade. A escola pública deve ser lugar de promoção de todos eles? Ou só de alguns? Quais?
«Mas ressalvo que o crucifixo, sem catecismo ou liturgia que lhe dê sentido, não passa de um folclórico e benfazejo ícone identitário.
Ou seja, o crente, mesmo sem a ciência do sermão ou de outro discurso afim, se tiver um crucifixo sobre a cama ou num terço, é apenas um elemento decorativo, de gosto saloio. Um pouco como a Bola! Quem não for doutrinado sobre as pernas e os empurrões e as faltas e os frangos, aquela não passa de um folclórico e benfazejo ícone identitário. O Benfica, «por esse andar», vai perder muitos «diabos vermelhos». O que será uma bênção para o universo dos sportinguistas, que até já formama doutores na arte de chutar a bola.
Coisa estranha, não acham os caríssimos leitores?
Acredito na contribuição do Cristianismo na formação da civilização europeia, apesar do mal que a Igreja Católica fez a muitos cristãos; mas aa suas raízes assentam na cultura greco-romana.
A norma, há muito pacífica, é a separação entre Estado e Igreja; a Escola Pública é em si mesma o Estado.
Na minha opiião quanto a símbolos; no átrio, o mastro com a bandeira nacional e lá dentro nas salas, os professores e os alunos.
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Símbolo de identidade feminina, maioria da população portuguesa, pilar fundamental da sociedade…nas escolas, JÁ!
http://conversademenina.files.wordpress.com/2009/01/simbolo_feminino_blog.jpg
edie, queres substituir a cruz cristã pelo símbolo da deusa Vénus? Então e a tal separação entre religião e estado?
;-)
Acabei de descobrir no facebook que o Paulo Querido, que não gramo nem pintado, tem um familiar meu na lista dos amigos. Digo sinceramente que tenho vergonha de ver o nome do meu familiar na lista dos amigos desse parvo.
Parvo na acepção latina “pequeno”. Para não haver confusões…
MANDO O ASPIRINA B À MERDA E TODA A POLÍTICA TRATADA AQUI SOB MÁSCARAS ANÓNIMAS DE NÃO ASSUMIDOS.
VALUPI ANÓNIMO, CORTA-ME O IP, BARRA-ME A PASSAGEM QUE ME FAZES UM FAVOR, OK?
BLOGUE DE MERDA. JÁ DEU O QUE TINHA A DAR.
JOSÉ DO CARMO FRANCISCO É INCOMPETENTE E TU SÓ DESBOBINAS TEORIAS CHATAS.
ADEUS. BLOQUEIA-ME QUE ME FAZES UM FAVOR.
ANOS NESTA TABERNA INSALUBRE. É DESTA QUE BATO A PORTA PARA SEMPRE.
CIAO. CIAO. CIAO.
ANDA LÁ, NÃO ÉS TU O CENSOR?
Cláudia, larga o binho!
Vai à merda, DIABO
Há algo de errado com esta Cláudia…..não terá um namorado?
Para mim, basta que os crucifixos não sejam proibidos nas aulas de religião e moral.
Admito que se discuta os méritos ou desméritos de todas as normas jurídicas, dos legisladores bem como do “espírito” da lei.
Já não admito que se responsabilize a lei por fazer criminosos.
Daqui a 30 anos, ou 100, ou 200, acham que o tal “ícone identitário” ainda terá lugar nas escolas públicas? No museu, ao lado de outros, sim, para objecto de estudo socio-antropológico , mas na escola pública? Um homem pregado a uma cruz de madeira com pregos nas mãos e nos pés, nalguns casos ainda de olhos abertos olhando o Além e a jorrar sangue? Uma selvajaria dessas? Please.
Por mim, acho que qualquer dia é bom para começar a não toldar os horizontes da criançada. Repito: o museu é o lugar certo.
Mas tem de ser um museu de instrumentos de tortura, porque é disso que se trata, um símbolo de tortura.
Vega, estou a ironizar quanto à defesa de afixação de ícones identitários de certas comunidades na escola pública ou outro local do Estado, simplesmente porque o são… Não leste o que disse antes??
Se é folclórico é mais um motivo para não estar lá. Certo? Afinal de contas a esmagadora maioria das pessoas gosta de pensar que a religião é coisa muita séria e evitava-se induzir as criancinhas em erro.
E o “E PLURIBUS UNUM” do SLB, edie. Estamos a falar de uma mão cheia de milhões de crentes ; )
edie, estava a ironizar com a tua ironia. E leio sempre o que dizes… :-)
Vega, eu também…mas desta vez, demasiado depressa…sorry :)
tra.quinas, eu também sou crente. A águia no topo do quadro, JÁ!
O crucifixo, enquanto herança histórica, une os legados judaico-cristãos e greco-romanos. É um excelente símbolo da Europa (mas não o único, claro), logo de Portugal. Para milhões, transporta um território de identificação que oferece uma axiologia e uma transcendência – ou seja, um sentido de vida. Até para os que combateram esse mesmo território o crucifixo é significativo, narrativo. Para mais, servimo-nos de conceitos cristãos para recusar a sua influência, como é o caso da noção de “pessoa”. Mas, apesar da sua importância, a Constituição da República Portuguesa é um factor identitário muito mais poderoso. É o que significa o secularismo, essa separação entre Estado e religião e religiões. Moral da história: não passa pela cabeça de ninguém ir colocar crucifixos nas escolas públicas.
Contudo, a perseguição a crucifixos que estão pacífica e indiferentemente pendurados há décadas em vetustas salas de aula pode não passar de fanatismo.
Val, discordo de parte da primeira parte e do final. O legado greco-romano é uma relação saudável com o mistério da existência. Os deuses são o espelho exacto das nossas angústias, sentimentos e da visão da época da Terra e do universo. A noção de pecado não existe.
O cristianismo, uma vertente mais virtuosa e pacífica de outras religiões violentas existentes numa zona do mundo, ainda hoje, pouco recomendável, apresenta essa faceta inovadora da bondade e do pacifismo, mas não se liberta da violência e insensibilidade das referidas outras religiões. Assim, Jesus Cristo pregaria o amor do próximo, mas era filho de deus. Deus, que, por sua vez, era de tal maneira cruel que determina e assiste à morte do próprio filho. E para quê esse sacrifício terrível? Para salvar a humanidade. De quê? Lá está, do pecado.
O crucifixo, concordo, é narrativo. Mas, para mim, chega ter sido narrativo de uma lenda de extrema crueldade durante 2010 anos.
Além disso, sejamos práticos: Nas novas escolas construídas, tem cabimento tal peça? Não tem, nem que seja por uma questão estética. Então por quê confrontar as crianças das escolas mais antigas com um objecto intrigante, representante de uma vítima do próprio pai, em estado de agonia? Seria até uma discriminação…
Val, mas o cristianismo não surgiu de geração espontânea a partir do nada e se procurarmos símbolos para identificação não faltarão escolhas porque não éramos todos uma cambada de trogloditas autofágicos até aparecer o cristianismo. Além disso, a História está cheia de mártires devido à defesa de ideias e opiniões que eles próprios tiveram como mais convenientes e que cada um de nós aprecia ou desvaloriza. Os caminhos para o multiculturalismo são inevitáveis e sinónimo de desenvolvimento e esforços como o do Joãozinho são inglórios. E o fanatismo maior é dele.
Penélope, apresentas uma argumentação engraçada, porque descontraída (e nada contra, bem pelo contrário). Vamos lá acrescentar mais umas notas:
– Os Gregos e os Romanos tinham relações tanto saudáveis como doentias com os “mistérios da existência”. Não eram diferentes dos restantes povos de todos os tempos. Uns obtinham vantagens do culto religioso, outros desvantagens. Terias de explicitar o que entendes por “saudável” para o pleno entendimento do que disseste.
– Pode não existir a noção de “pecado”, mas tanto Gregos como Romanos tinham um sistema de castigos para falhas de índole religiosa. Esses castigos, num certo sentido, em nada diferem do que se concebe usualmente como pecado.
– A religião cristã não tem um começo unívoco, antes é o resultado da complexidade cultural e política daquele tempo e daquela geografia. Precisou de vários séculos para estabilizar o seu cânone teológico, e continuou sempre a operar um processo de desenvolvimento e adaptação.
– O significado do Novo Testamento implica a sua relação com o Antigo Testamento. Assim, para dares sentido à narrativa evangélica, a história de Jesus, tens de estar munida do código que está a ser usado. Trata-se de um discurso religioso e étnico, simultaneamente, onde a audiência compreende o que ouve e vê à luz da sua realidade presente e passada. Aí chegada, terás de conceder que não és capaz de perceber o que lês. Por exemplo, não és capaz de perceber o que possa ser “Deus”, quanto mais perceber uma declaração onde alguém, igual a ti, se declara “Filho de Deus”. O mesmo para todas as outras narrativas bíblicas. Se te escandaliza a suposta passividade de um “pai” perante a morte do seu “filho”, que tens a dizer dos relatos que dizem ter esse mesmo “pai” criado o Céu e a Terra a partir do nada? Que te é mais incrível?…
– Jesus não representa uma “lenda de extrema crueldade”. Isso é factualmente falso, e absolutamente contrário com o que ficou a associado à sua figura. Do que talvez estejas a falar é do uso criminoso, ou violento, ou destrutivo, ou psicótico, ou explorador, que alguns deram ao crucifixo. A estes, porém, deves juntar aqueles que, em nome desse mesmo crucifixo, deram as suas vidas para salvar as dos outros. Imagina que um familiar teu, ou alguém que ames, tinha sido salvo da doença, ou da fome, ou da guerra, ou da injustiça, só graças à coragem e misericórdia de pessoas religiosas (independentemente do seu credo)? Naturalmente, passarias a entender o fenómeno da fé de uma forma completamente diferente da tua actual frieza e distância. Não é que tivesses de te converter ou aceitar valores e ideias dessas pessoas, apenas não dirias mais que elas espalhavam, ou representavam, a “extrema crueldade”.
– As crianças das escolas públicas também passam por ruas onde estão igrejas, e irão confrontar-se com o fenómeno religioso ao longo da sua vida, de variadas formas. A razão para manter os crucifixos nas salas de aula das escolas públicas, na minha humilde e errónea opinião, teria de ser sempre comunitária, mas sujeitando-se ao protesto de algum cidadão que nela tivesse o seu educando.
– O cristianismo, enquanto matriz cultural, é algo que ultrapassa a esfera religiosa. Querer apagá-lo à força é uma auto-mutilação. Contudo, e este é o ponto essencial, é preferível ter uma lei que afaste os crucifixos da esfera pública do que uma lei que os imponha nessa mesma esfera. Nisso, não há discussão possível.
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tra.quinas, mas eu defendo o secularismo. E a Constituição. A ressalva quanto ao crucifixo é parte de uma discussão maior, onde constato que se fala da religião – e, em especial, do catolicismo – com ignorância, sectarismo e ódio.
Sei que defendes, Val. Mas reconhecerás que esse ódio (negativo, certamente) também tem um contexto e que a bondade e sinceridade da fé de muitos crentes não apaga muitas atitudes lamentáveis, históricas e actuais, de instituições e da hierarquia da igreja. Critico os crucifixos na escola da mesma forma que discordo que as autarquias, nas actividades integradas nos programas escolares, ofereçam chapéus e bonecada com as cores dos partidos que as dirigem. São opções pessoais e pessoais devem ficar. Tal como critico que haja a disciplina de religião e moral para quem quer e não haja alternativa para quem não quer.
tra.quinas, nada apaga os erros ou crimes da Igreja. Quanto aos últimos, serão até mais graves, pois vêm de quem promete combatê-los. E é inquestionável que o Estado deve estar separado da religião – portanto, não devem existir crucifixos nas salas de aula.
Dito isto, é à mesma possível pensar excepções à regra, ou um sistema misto. Que mal faz um crucifixo numa aula, ou mesmo aulas de catecismo ou religião e moral, afinal? À luz do que ficou registado na História, essas tentativas de evangelização produziram mais ateus e revoltados do que cordeiros do Senhor…
…? Não.
Mas é certo que produziram mais indigência e expectativas tolas à pala de conceitos estupidificantes do que alguma vez se houvera visto.
Ou então, se achares por bem, podemos comentar o senhor não sei das quantas Azevedo do patriarcado de lisboa a propor vinte por cento dos honorários dos politicos para…? eles.
Não tenho opinião, mas vou tentar documentação e argumentos..
O que produziu indigência não é passível de separação do seu tempo histórico e contextos políticos, sociais, culturais e individuais. Teríamos de ver em cada caso. O que é seguro dizer-se é que o cristianismo não apresenta nenhum preceito que conduza necessariamente à indigência, bem pelo contrário. Quanto às expectativas tolas, essa é uma avaliação subjectiva, claro.
Como propositado ignorante do assunto, aquela parte da confissão do pecado para absolvição, conduz à…? Regenaração!
Já todos tinhamos percebido. Há milhentos anos que temos uma sociedade nova e saudável todos dias.
Esses são aspectos litúrgicos e espirituais cuja avaliação escapa à sociedade civil. Diz respeito aos crentes, a cada um. Ao limite, é um mistério. Mas o cristianismo é mais do que uma estrutura religiosa, é também uma matriz cultural e civilizacional. Nesta altura, tem vindo a aprender a viver no secularismo. É uma aprendizagem lenta, como se constata em inúmeras situações.
Claro, meu caro Val. A matriz cultural e civizacional está feita há muito e é só isso que podemos debater.
Exacto. Espaço onde aparece a problemática dos crucifixos nas salas de aula, pois – como neste caso da Madeira – o que está em causa nem sequer é do foro litúrgico ou espiritual, meramente do domínio do simbólico, do cultural, até do supersticioso ou mágico (embora esta dimensão não possa ser assumida pelos que reclamam o direito a ter o objecto na escola pública, talvez nem sequer esteja consciente).
supersticioso, mágico, litúrgico, espiritual e muitos outros conceitos próximos não percebo que possam fazer falta aos meus filhos. até perceber gostava de os poder manter afastados. mas já sei muito bem que não vou conseguir.
Conhecer esses conceitos faz parte de uma educação completa. O saber não implica submissão, antes promove a autonomia. Eu teria era receio que os meus filhos não soubessem o que é a religião e a natureza humana. Aliás, quanto mais se estuda a religião e a espiritualidade, mais os pés vão ficando solidamente plantados na terra. São os mecanismos mágicos encapotados, ou não desconstruídos, que causam as alienações. Por exemplo, acreditar que se deve proibir a expressão da fé, como tentaram fazer os comunistas. Com isso, apenas criaram uma outra religião, a do partido.
Val, longa argumentação a tua. Não vou ser tão longa assim. Só não entende o que é a religião quem não quer. É um fenómeno compreensível. Historicamente inevitável, mesmo. Das que melhor conheço, da Ásia para cá, oscilam entre códigos de conduta, explicações para o desconhecido, transmissão/perpetuação de lendas, preparação/compra de garantias para a morte, veículos de dominação, ópio para os miseráveis.
Quando digo “saudável” referindo-me aos gregos/romanos quero dizer que os deuses são de tal maneira criados à nossa imagem que traduzem até a alegria da vida. Há deuses felizes no Olimpo, da música, do amor, do vinho. No fundo, representam todas as facetas dos homens. Nem tudo são trevas, punições e expiação como no cristianismo e afins. Falta a estes a celebração da vida. O ícone que tanto prezas é paradigmático. Pretende culpabilizar-nos. Afinal alguém morreu por mim (etc. e toda a história de deus pai).
Quanto às boas acções das pessoas religiosas, não as desdenho. Apenas acho que não é condição sine qua non para ajudar os outros professar-se uma religião. Sem religião, é-se egoista? Mais discutível não há.
Ninguém quer apagar o cristianismo à força. Aí estão as igrejas e o papa. Têm a sua utilidade para muita gente. Dão, aliás, emprego a muita gente. Sem ser cínica, gosto de igrejas. São locais de arte, de silêncio e de história. Dão beleza aos casamentos. Agora, como muito bem dizes, as escolas públicas, que são do Estado, não têm que ter símbolos religiosos.A religião é um affaire privé. Se as escolas modernas não os afixam, as mais antigas também o não devem fazer. Para pintar as paredes, costumam tirar-se os objectos decorativos primeiro. Como em nossas casas, alguns já não regressarão. É isso, a pintura das paredes é uma boa razão para cumprir um princípio.
Penélope, se os deuses Gregos e Romanos, estes cópias daqueles na sua maior parte, celebram a alegria da vida – e agora teríamos de continuar a explicitar o que seja essa “alegria” – igualmente é verdade que representam as maiores desgraças da vida: a destruição, a morte, a vingança, o ódio, a inveja, o engano, e por aí fora. Por outro lado, no judaísmo e cristianismo encontras a louvor da Natureza, da Humanidade, do amor, da misericórdia, da paz, da vida eterna. Creio que estás a interpretar muito superficialmente, e preconceituosamente, ambas as esferas religiosas.
Como aqui tenho defendido desde o princípio, a sociedade deve ser secular. Logo, as escolas não devem ter símbolos religiosos. Contudo, as identidades das populações também merecem respeito. Imaginemos que existe uma escola pública com crucifixos nas salas de aula, ou qualquer outro símbolo religioso, sem que tal tenha suscitado protestos de algum encarregado de educação. Qual seria o problema? É esse o sentido da ressalva que fiz. A situação seria a mesma se uma escola antiga, com estátuas, azulejos ou pinturas de cariz religioso, passasse para a posse pública. Devíamos destruir ou esconder essas representações? Creio que ninguém o defende, considerando-se antes mais importante conservar os objectos enquanto herança artística e cultural. Pois bem, o crucifixo também poderia ser conservado como herança simbólica. Ao mesmo tempo que ele estaria pendurado, os alunos estariam a aprender as matérias que o Estado secular assume como válidas. Não creio que viesse daí qualquer mal ao mundo ou ao futuro cívico desses jovens.
O meu “não percebo” referia-se obviamente à utilidade das práticas e não à compreensão dos fenómenos.
O estado não tem nada que proibir. Nem promover. Os fenómenos religiosos, só por si, já têm meios de promoção e propaganda mais do que suficientes.
“…no judaísmo e cristianismo encontras a louvor da Natureza, da Humanidade, do amor, da misericórdia, da paz, da vida eterna…”
Val, que boa vontade a tua! Retira-lhe a vida eterna, e as religiões de que falas seriam o último sítio onde onde me ocorreria ir procurar esse louvor (ver história da igreja, nomeadamente os capítulos Idade Média, os Borgias, Inquisição, entre outros).
Mas vejo que a vida eterna te diz muito. Resta-me respeitar.
“qual seria o problema?” À parte ser um símbolo religioso e estar numa escola pública, nenhum. Mas assim como dantes não havia tal símbolo nas escolas e alguém ordenou que se lá pusesse, também será legítimo que de lá se retire para não fazer letra morta de um princípio do Estado. Os pais não protestam e por isso pode ficar? Os pais, que vivem já depois da época da luzes, aceitarão concerteza. Afinal, não vêem ao lado de Cavaco Silva nem de Sócrates nenhum representante da Santa Madre Igreja.
Um santo domingo!
Pénelope, as escolas, depois da queda do Império Romano, passaram a ser todas da responsabilidade da Igreja. A Europa desenvolveu-se cultural e intelectualmente por sua causa. Foi a Igreja que foi promovendo o conhecimento científico, juntamente com o enorme contributo do Império Árabe para a conservação do saber dos Gregos e os muitos avanços intelectuais e técnicos da cultura árabe. Durante longos séculos, foram as religiões que guardaram e fizeram crescer a inteligência.
A noção de escola pública sem influência da Igreja é muito recente e acompanha as grandes alterações da História. Isso quer dizer que é natural ainda encontrar quem pretenda manter o símbolo ancestral do catolicismo nas salas de aula. A única questão que tal levanta não é a da sua constitucionalidade, posto que não se deve permitir símbolos religiosos nas instituições de ensino público, apenas a da excepção à regra. E se falamos do assunto agora, é só por obra e graça da excentricidade da Madeira.
O que dizes do passado da Igreja está correcto, pois existem incontáveis crimes e desgraças que se podem relacionar com a existência do cristianismo e do catolicismo. Contundo, essa crítica perde legitimidade se não for contextualizada pela História e pelos outros factos benéficos que também nascem das religiões – e do composto judaico-cristão em particular, visto ser aquele que mais nos influencia.
Em suma, não é difícil ser contra ou a favor da Igreja Católica, difícil é a lucidez.
Não nego o papel que a Igreja possa ter tido na evolução da cultura ocidental, das artes, nomeadamente. Honra lhe seja feita. Nem todos os membros da Igreja eram corruptos, debochados ou inúteis. A Igreja conquistou poder e influência. Era nela que estava a elite culta. Certo. O dinheiro também.
Por outro lado, a Igreja “foi promovendo o conhecimento científico”… foi, mas só até certo ponto. Em relação a descobertas científicas que viessem pôr em causa a sua ordem do mundo, a sua atitude começou, e continua, a ser de resistência, se não de negação e rejeição. Ultimamente de um total fechamento sobre si própria e a sua linguagem. Nem de outra forma poderia ser. Para não falar de Galileu, lembro-te que Darwin bem hesitou, 50 anos como sabes, em publicar a Origem das Espécies. Muita coisa mudou desde então. Hoje em dia tudo se publica. A esmagadora maioria dos cientistas é completamente indiferente ao que a Igreja pensa ou deixa de pensar sobre as suas descobertas. A Igreja perdeu qualquer papel no desenvolvimento intelectual da humanidade. Criam-se células, clonam-se animais e brevemente pessoas, ou pelo menos órgãos humanos. Estuda-se a criação de vida a partir de vírus dos computadores. Sei que está no horizonte de algumas equipas um “upgrade”, digamos assim, do homo sapiens, como forma de entender o que ainda não entendemos. Procura-se vida noutras paragens cósmicas.
Val, não vou mais pronunciar-me sobre o crucifixo nas escolas públicas. Espero que percebas porquê.
A Igreja, durante a Idade Média, conservou e ampliou o conhecimento científico, embora sem recurso ao empirismo, apenas na área da lógica e da filosofia. Mas foi isso que também permitiu o Renascimento e subsequentes alterações no paradigma do conhecimento – de que Galileu é apenas um exemplo, pese a sua decisiva importância. Assim, está tudo ligado. Sem a Igreja não haveria cultura europeia, provavelmente. O Império Árabe talvez tivesse conquistado toda a Europa, ou grande parte dela, e hoje seríamos outra cultura. Não que isso fosse pior, ou melhor, apenas o refiro para situar a nossa discussão num âmbito histórico, onde não há culpados nem maus da fita, apenas seres humanos a agir em circunstâncias que não são as nossas.
Hoje não se vê a influência da Igreja, ou do cristianismo, nas sociedades ocidentais, pós-industriais e pós-modernas. Existe um deserto que tem sido ocupado por crenças orientais, ateísmo, magia, alienação, tecno-ciência, cultos medicinais, etc., etc., etc. Contudo, para milhões de pessoas, a fé segundo os moldes católicos e cristãos é uma parte da sua identidade. Tem real influência nas suas vidas. É só isso que aqui está em causa nesta conversa que iniciei, pois uma cultura humanista não pode ignorar as fontes de sentido para as diferentes populações e povos.
Val,
Porque te referes ao católico e cristão como a mesma coisa ???
Carmen, onde foi que o fiz? Pergunto para entender a tua pergunta e os pontos de interrogação. Contudo, esclareço já o óbvio: o catolicismo é uma das variantes do cristianismo. Assim, todo o católico é inerentemente cristão, escusado será dizer.
Ao longo dos teus textos, Val. Pelo menos foi assim que entendi.
Os católicos não são inerentemente cristãos.
Os cristãos, dizem estudiosos da matéria, foram os verdadeiros seguidores do tal Jesus que dizem os mesmos estudiosos, foi assassinado por questões politicam. No espaço de 2000 anos existiram muitos aproveitamentos políticos, exercidos pela igreja dita católica, dos quais resultaram inclusivamente o extermínio dos cristãos, por exemplo os Cátaros, que considerados hereges, arderam na inquisição. Ainda hoje podemos encontrar os autoproclamados numa seita secreta, da qual se sabe pouquíssimo, embora exista algum folclore comunicacional em seu redor – a maçonaria.
Carmen, estás a fazer referência a estudiosos na matéria que estão completamente errados. Não existem “verdadeiros seguidores do tal Jesus”, apenas variados grupos religiosos que, ao longo dos dois mil anos, se foram reclamando cristãos – um deles, e a mais importante por razões históricas, a Igreja Católica. Já agora, quem são esses estudiosos? Que os faz serem preferíveis a outros estudiosos que os contradigam? Seja como for, convido-te a pensar nisto: pode uma religião que tem Jesus crucificado como seu símbolo principal não ser cristã?…
A Maçonaria tem as origens, e as influências, que cada um quiser ver. É um ramalhete de esoterismos.
Val, concordo que o bom senso proíbe, digamos assim, que se ponha em causa a questão da identidade judaico-crstã da Europa e a importância do cristianismo na formatação da nossa sociedade. Coisa diferente e frequente é sobrevalorizar o contributo cultural da igreja na perspectiva de o transformar numa enorme virtude de extraordinário mérito.
O modelo de produção intelectual até ao final da idade média, pelo menos, era baseado no mecenato e, nesse sentido, a produção científica, cultural e artística estavam, basicamente, dependentes do poder, quer fosse do imperador e das elites senatoriais, quer, mais tarde, da realeza, nobreza e clero. A importância da igreja nessa matéria era, por isso, uma inevitabilidade. Até podemos considerar patética a discussão se o contributo da igreja foi maior ou menor do que os constrangimentos que determinou. Constatar a sua importância na matéria é perfeitamente admissível, mas atribuir-lhe extraordinários louros é duvidoso, senão mesmo falacioso: como o progresso e o desenvolvimento são intrínsecos à natureza, senão fosse a igreja teria sido qualquer outra das forças sociais a promovê-los.
Não existe poder que não aprecie alapar-se nas elites intelectuais porque elas representam a face mais avançada da sociedade e não é por acaso que a igreja católica procura, de há umas décadas a esta parte, retomar esse brilhantismo em grande parte perdido: é sinal do seu declínio e de perda da sua influência na sociedade.
tra.quinas, trazes aí várias questões, que naturalmente se ligam, mas que também pedem destrinça se o propósito por analítico. De um modo geral, parece-me que estás a argumentar contra um qualquer excesso de importância dado à Igreja, ou ao cristianismo, que detectas nas minhas palavras. Obviamente, essa tua opinião comportará inevitáveis critérios polémicos, até subjectivos. Não é de esperar consensos, tal a complexidade e melindre das questões.
Dito isto, a mim aparece-me como inquestionável o papel decisivo da Igreja na construção da cultura e política europeia durante a Idade Média. Claro que é um simplismo excluir outros factores, tais como o papel das monarquias, da burguesia nascente e da cultura árabe. Contudo, o olhar que reconhece a importância da Igreja é meramente histórico, não religioso, político ou ideológico. Apenas se pretende enunciar factos: depois da queda do Império Romano do Ocidente, a Europa era uma manta de retalhos de povos e tribos bárbaros, sem instrumentos intelectuais que pudessem servir de base para uma unificação geo-política, quanto mais para o desenvolvimento civilizacional. Foram os mosteiros, e os monges copistas, que criaram o legado a que hoje chamamos Ocidente. Roma também teve um papel de unificação política e cultural, criando um tecido de evangelização que se confundia com o sistema de educação de todas as classes. Este sucesso veio a ser a causa da sua progressiva perda de poder, como seria inevitável. Aos poucos, as sociedades foram-se autonomizando, através de saltos e crises variadas.
A Igreja Católica actual vive a sua maior crise. Está cercada e em extinção. À cada vez mais reduzida capacidade de captar e manter sacerdotes, junta-se um ambiente culturalmente muito adverso. As populações abandonaram os templos, e em nada seguem a moral estritamente católica. Ficou apenas um caldo moral genérico que se inscreve como identidade. Por exemplo, o culto da pessoa, da misericórdia e da paz são heranças cristãs fundamente inscritas até nos valores seculares. Tal como rematas, ninguém hoje é constrangido pela Igreja, ninguém sofre com a sua presença. Por isso, ainda mais estranho, ou pernicioso, fica a constante perseguição que se lhe move.
Comecei logo por concordar que o papel decisivo da Igreja é inquestionável, Val. O contexto assim o determinou a partir do momento em que o politeísmo começa a perder importância e se foram definindo novas cumplicidades entre o poder religioso e o secular. No que poderei estar em desacordo é mais com uma visão linear da sociedade, mais imaginada do que real, que coloca a questão da identidade histórica e cultural num patamar quase sobrenatural e inatacável. A monarquia também fez parte durante séculos da nossa narrativa histórica e cultural e não foram os seus aspectos positivos, nomeadamente o seu contributo para o desenvolvimento intelectual, que impediu a ruptura. O contacto, cada vez mais banal, com outras culturas e diferentes entendimentos da nossa relação com o mundo também irá produzir efeitos naquilo em que nos reconhecemos para lá das tradições e do legado geracional.
E regra geral discordo com o papel de vítima que a igreja católica tanto gosta de assumir e tenho dúvidas que não haja quem se sinta constrangido por algumas das posições da igreja. Mas isso seria outra conversa.
Haverá quem se sinta constrangido por algumas posições da Igreja, e há mesmo quem seja vítima de actos criminosos de elementos da mesma. Contudo, esse é um registo avulso, porque vivemos em sociedades seculares. Isso quer dizer que a própria Constituição, e a legalidade daí decorrente, impede qualquer eventual abuso da Igreja enquanto instituição e organização. Qualquer cidadão pode denunciar o que quiser que diga respeito à Igreja.
Não sei porque falas de um “patamar quase sobrenatural e inatacável”, posto que temos estado aqui os dois a repetir o mesmo: a Igreja perdeu o seu projecto político, séculos atrás. A Europa teve no cristianismo, o qual também manteve o legado Romano através do ordenamento jurídico e valores correspondentes, um pilar fundamental, mas preferiu a separação entre Estado e religião. Essa separação também é um patamar inatacável da nossa identidade histórica, mas tal como os anteriores.
Nós somos o resultado do nosso passado, e falar disso com lucidez não implica abdicar de alguma conquista do nosso presente.
De acordo, Val. Naturais divergências de pormenor resultantes do posicionamento de cada um relativamente ao fenómeno.
Sem dúvida, tra.quinas. Estamos só a discutir um dos assuntos mais incendiários do cardápio, até ficava mal se concordássemos. Mas ainda acrescento que falar da influência histórica do cristianismo não significa qualquer tipo de apologética. É o mesmo que falar da importância de D. Afonso Henriques: não se está com isso a dizer que ele fez bem em ter matado mouros às carradas, mas também não se está a defender que devemos devolver Algarve e Alentejo a Marrocos.
Val,
Com o maior respeito pela tua opinião e conhecimentos que revelas ter nesta matéria, fico surpreendida quando afirmas:
” estás a fazer referência a estudiosos na matéria que estão completamente errados”
Como referi no comentário anterior, 2000 anos é muito tempo, mas é o tempo suficiente para gerar ideias que se perpetuam dogmaticamente.
Segundo Margaret Starbir, “houve numerosas versões da cristandade que não sobreviveram. Por exemplo a igreja de Jerusalém, da qual Tiago, o irmão de Jesus, foi o primeiro líder, permaneceu muito judaica na orientação e não equiparava Jesus a Deus.”
Para uma ideia mais clara daquilo que penso, relembro que o Vaticano trabalha arduamente na canonização de João Paulo II. Todos nós fomos contemporâneos desta pessoa e sabemos que nada lhe é conhecido como “atributo especial” para que semelhante pessoa seja digna de veneração. Logo, o que existe é uma manipulação de factos, de dados, de fontes, de eliminação dos mesmos para que surja outra realidade. E assim temos a verdade da chamada moral judaica/cristã.
Penso insistentemente como seria a vida num planeta liberto da falsa moral das religiões, respeitando a religiosidade que cada pessoa pode estabelecer com a natureza, a sua e a envolvente.
Para terminar, Val, porque raio os maçons são esotéricos e os católicos não ??
Carmen, ninguém nega que existiram versões do cristianismo que desapareceram. Está em qualquer manual de História. O que é impossível de afirmar, por ser conceptualmente contraditório, é que os católicos não são cristãos. Católicos, ortodoxos e protestantes, todos são cristãos. Claro que tens inalienável direito a considerar a Igreja Católica uma religião falsa, e até perversa. Mas essa será outra questão.
A Maçonaria é esotérica porque o culto não é público e os ensinamentos são secretos. No caso do catolicismo, e do cristianismo em geral, também existem grupos e saberes esotéricos, mas o culto é público e o texto sagrado conhecido e divulgado. “Esotérico” apenas quer dizer “escondido”, não é um termo pejorativo.