A crescente, imparável, digitalização do nosso acesso à realidade provoca o efeito paradoxal de transformar o livro em papel num objecto tecnológico mais poderoso do que os nossos ecrãs ligados à Internet e, agora, à inteligência artificial gratuitamente ao dispor das massas. Em certas circunstâncias, que são estas: quando queremos crescer, e quando queremos ser livres. Não é pouco, certo? O crescimento resulta de se conseguir viajar até ao local onde a nossa consciência está em ligação com o nosso inconsciente. A fragmentação cognitiva que os ecrãs provocam não nos leva até lá — a menos que haja neles uma narrativa que crie um mundo, como numa série televisiva que nos agarre ou numa sala escura de cinema. A liberdade vem de o livro em papel apenas precisar de luz ambiente para funcionar na sua capacidade máxima, assim como de ele não registar a nossa actividade nem a partilhar com terceiros. No mundo digital, somos comercializados pelos operadores, quais animais de pecuária entretidos na mastigação.
Há uma terceira vantagem: quão mais lermos livros em papel, melhor conseguiremos aproveitar as maravilhas (que o são) da realidade digital.
Tudo verdade.
A porra toda é que os ecrãs estão a entulhar de caca as cabeçorras criativas dos nossos dias.
Quem é que anda por aí que valha a pena?
Não tenho nenhuma referência válida.
(Os ecrãs, sejam eles quais forem, põem-nos tontos, avariam-lhes as potencialidades. Ficam desnorteados com os holofotes, as referências públicas, e perdem o pé. Dão o cu e a cona, se for preciso, para “a parecerem”, e, depois, mais tarde, se o ganho é frustante, aderem ao MeToo movement; e passam a apoiar ditadores, militares para a pres. da República – há casos em que até defendem a democracia direta)
Mas há sempre exemplos que nos animam:
https://www.theguardian.com/media/2025/jan/04/washington-post-cartoonist-resigns-jeff-bezos?fbclid=IwY2xjawHngQJleHRuA2FlbQIxMAABHSkJ6FQuxByiQ5Cd_YQ3p_wvH93LvMvxOCwGzUv6TPOcg3xPeyrwiLxrlw_aem_5SuX1QkJjxl1LUOJgPrrKg
Fernando, também fiquei a pensar nesse episódio da cartoonista. Com admiração por ela.
«A fragmentação cognitiva que os ecrãs provocam não nos leva até lá —»
Nem a lado nenhum, para além de criar e cultivar uma categoria de sábios em ignorância.
Sem a leitura feita de modo estudada, lida e relida até suscitar ligações com outras leituras, analogias e comparações com acontecimentos reais, intuições e deduções mentais correlacionadas com as ideias contidas e guardadas para consulta face a outra leitura relacionada que provoque lembrança para nova abordagem deste ou daquele pensamento já lido, digo eu, sem tal trabalho de pesquisa feito ao longo de anos e persistentemente atualizado não só não se obtém conhecimento como, ao contrário, adquire-se uma ideia falsa de conhecimento que é a pior ignorância tal como aquele que se pensa sábio e só inventa idiotices ou impossibilidades ou impronunciabilidades absurdas.
Ler apenas os fragmentos dos pré-socráticos ou da mitologia grega desligados ou desintegrados da crítica dos filósofos e tragediógrafos imediatamente posteriores nunca tais pensamentos, assim fragmentados, nos fariam luz acerca do pensamento desses filósofos arcaicos tão importantes que ainda hoje são atuais, estudados e debatidos universalmente.
Uma prova atualizada de sábios em ignorância são Trump e Elon Musk. O que dizem e pensam realizar acerca do mundo tornando-o um modelo desse seu pensamento como se o mundo fosse assim tão plástico que se pudesse moldar pelo pensamento e acção de dois homens, tão somente, isto é, por magia.
E se por acção da sua, deles, ânsia, de mudar o mundo dos outros acabam por mudar tão somente o seu próprio mundo? Supunhamos que querem alargar os USA com mais o Canadá, o México, Panamá e, claro, porque não, ir por ali abaixo até à Argentina? E querem ao mesmo tempo destruir a Europa e a sua cultura democrática de sua própria origem?
Bem, neste caso também podemos supor que todas essas pretensões não passem no Senado ou no Congresso. E mesmo que ai passem podemos supor que há uma oposição de Governadores de Estados que podem opor-se aos dois super-homens, declarem-se independentes e desligam-se da Federação dos USA. Por este ou outro motivo imponderável qualquer pode acontecer uma nova guerra civil.
Supondo assim dificilmente um Cesarismo trumpista para criar um império megalómano terá alguma hipótese de vingar. Contudo, assim ou de qualquer forma ou mesmo com o “apocalipse nuclear” o mundo só pode ser obra e pertença de todos os humanos e nunca de dois ignorantes que se pensam sábios e super-homens.
Que imaginação, José. O Trump de conquistador do continente americano todinho. E a mandar bombas para arrasar a ” cultura democrática” europeia ( não era má ideia arrasar com a cultura da corrupção) -:) -:).
E depois há os muito ilustrados inúteis e os desenrascados que sabem fazer de tudo na vida de todos os dias, desde plantar batatas a montar uma canalização.